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Vendaval Azulino

VENDAVAL AZULINO

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Daniel Planel 

Uma das equipes mais populares do Norte brasileiro, o Remo carrega uma multidão por onde passa. Não por acaso foi recordista de público entre todas as séries do Campeonato Brasileiro de 2005, quando estava na terceira divisão.


Por isso, não pensamos duas vezes antes de aceitar o convite para um encontro de remistas no Rio de Janeiro, na Praia do Pepê. Com faixas e bandeiras, dezenas de torcedores viajaram para homenagear três jogadores que fizeram história no clube: Robinho, Luciano Vianna e Paulo Verdan.

– Hoje eu sou muito grato por vocês virem até o Rio para essa homenagem. Poucos jogadores têm o privilégio de curtir o que eu estou curtindo hoje – disse o “Robgol”.

Em seguida, um torcedor deu aquela moral para o artilheiro:

– O Robinho fazia gol de tudo que é jeito!

Outro homenageado, Luciano Vianna também destacou o carinho da torcida e lembrou o dia em que conquistou o acesso para a Série A.

– Eu não esqueço nunca mais a festa do Remo no aeroporto.


O curioso é que o craque é chamado de Risadinha e o motivo é óbvio:

– Eu só sabia jogar rindo, até porque eu amo futebol e fazia com prazer. Isso incomodava os adversários, principalmente os zagueiros do Paysandu! – provocou.

A rivalidade com o Paysandu, aliás, é uma das maiores do Brasil e por isso os torcedores sempre fazem questão de lembrar a sequência de 33 jogos sem saber o que é derrota no clássico.

No fim da resenha, os remistas soltaram a voz para cantar o hino do clube e nem o vendaval que atingiu o Rio de Janeiro foi capaz de atrapalhar a festa!

 

MILHÕES DE CORAÇÕES BATERAM NO PEITO DE UM SÓ HOMEM: PASSARELLA

por André Felipe de Lima


A tarde daquele frio de 25 de junho de 1978 foi mais que especial para o zagueiro Daniel Passarella. É um dia inesquecível. Exatamente 30 dias após completar 25 anos, o jovem zagueiro, o “El gran capitán” do povo argentino, ganhara um presente sensacional. Levantava, portanto, a tão sonhada Copa do Mundo, e em pleno e lotado Monumental de Nuñez, em Buenos Aires.

Não vamos discutir aqui se aquele Mundial foi ou não arranjado pelos milicos da ditadura local com a suspeitosa turma da Fifa. Isso já está mais do que discorrido e provado. Houve mutreta. Mas não se pode apagar da história a qualidade daquela seleção, especialmente da figura de Daniel Passarela, que sem exagero é considerado um dos melhores zagueiros em todos os tempos e, a meu ver, o mais emblemático da história do futebol da Argentina.

Daniel Alberto Passarella foi exatamente o que achavam dele. Um grande capitão. Um zagueiro espetacular que todos queriam ter em seus times. Sorte do River Plate e do escrete biceleste tê-lo em suas fileiras. Há muitos jogadores relevantes na história do futebol argentino, mas somente ele, o Passarella, guardará algo que nenhum outro jamais igualará: foi o primeiro argentino a tocar uma Copa do Mundo. A beijá-la e a acariciá-la. Foi o primeiro a ver de perto aquele reluzente e cobiçado ouro maciço.


Naquele frio de 25 de junho de 1978, havia alguém para aquecer milhõesde corações que batiam aceleradamente em todo o solo no qual cantou Gardel, em que sorriu enternecida Evita Perón. Um solo onde sempre se luta pela democracia. Um solo do povo daquela grande zagueiro. Naquele dia, milhões queriam ser Passarela. Milhões foram, sim, o Passarella.

TRAGÉDIA DO SARRIÁ

por Eliezer Cunha


Copa do Mundo de 1982. Três derrotas e um único jogo. Brasil x Itália. Estádio Sarriá, Espanha.

Nosso Brasil respirava futebol, a nossa seleção respirava confiança e nosso povo respirava supremacia. Todos os jogos até então foram superados, ganhar era como simplesmente apertar o play. Era assim a seleção de Zico, Éder, Sócrates e Cerezo.

O carnaval futebolístico iniciou-se em junho de 82. Coretos montados e bagaceiras formadas davam conclusão ao óbvio e ao natural: vitória. Brasil acaba de vencer mais um jogo em busca do campeonato mundial de 82. O verdadeiro futebol triunfará finalmente sob o comando de nossos heróis Zico e companhia.

A alegria popular surgia naturalmente através de um conjunto de foliões que formavam o movimento chamado bagaceira. Surgia do nada após cada vitória e trazia em seus movimentos Maria Celeste, linda e perfeita como a magia imposta pelas vitórias da seleção.


A cada jogo uma bagaceira, um flerte e uma nova oportunidade de estar ao lado dela. A cada partida aumenta a intensidade deste encontro e os flertes aumentavam a cada jogo jogado.

Brasil x Itália, partida decisiva para nós. Mas pra que se preocupar com um time que não venceu nenhuma partida neste mundial? O jogo é jogado e o flerte é flertado.

Marcamos eu e Maria Celeste para enfim sacramentarmos a nossa vitoria na bagaceira formada após o confronto Brasil x Itália. Essa era minha esperança e oportunidade celestial de enfim conquistar Maria Celeste a mais cobiçada do bairro. Venceria o Brasil rumo a conquista da Copa de 82 e eu conquistaria a menina de meus sonhos.


Tarde ensolarada, começaria a partida, os bumbos e repiques aguardavam o momento da vitória. O contexto já havia se formado: vitória brasileira, bagaceira e finalmente um romance trabalhado a cada vitória.

Final de tarde … perdemos o jogo … o futebol arte não prevaleceu, a nação se calou e a bagaceira não saiu. Casei-me com Maria Vitória só pra esquecer as derrotas da vida.

A SELEÇÃO PERDEU… ESPAÇO

por Idel Halfen


(Foto: Paulo Araújo)

Se buscarmos na lembrança o comportamento da população em ano de Copa do Mundo, iremos certamente perceber que atualmente a seleção brasileira não tem mais o mesmo espaço nas conversas, na mente e nos veículos de mídia que tinha no passado. Aqui deve ser explicitado que nos referimos ao espaço proporcional, pois pode até ser que o número de páginas dedicadas ao tema num jornal, por exemplo, tenha se mantido, porém, outros assuntos, entre os quais a política e os fatos que dali se derivam, passaram a ter uma participação maior. 

Existem várias teses para se explicar esse fenômeno. Alguns defendem que a mudança na comunicação através da internet, com maiores opções de mídias e conteúdos, propiciou uma acessibilidade e um cardápio maior de opções. 

Outros citam que o fato de a seleção ser formada por muitos jogadores que não atuam no Brasil deixa os torcedores menos identificados e mais distantes da seleção. 


Há ainda os que citam o maior engajamento da população com a política em função dos escândalos da Lava Jato e das transmissões dos julgamentos via TV. Provavelmente muitos dos que estão lendo esse artigo se lembrarão espontaneamente de mais nomes de juízes do STF do que dos jogadores da seleção. 

Quando que isso aconteceria no passado? 

Não creio que seja possível isolar e escolher apenas um desses motivos para explicar o quadro atual, na verdade, penso que a causa seja um mix de todos eles, cuja ponderação variará de acordo com o perfil de cada pessoa. 

Tenho poucas ou nenhuma esperança de que esse cenário se altere radicalmente no futuro, todavia, seria perfeitamente factível se desenvolver um plano de ações para que a seleção passasse a ocupar um espaço maior na mente do povo. 


Estabelecer aqui quais seriam as ações táticas para isso seria irresponsável e prematuro sem a elaboração de um planejamento estratégico, ainda que muitas pessoas e até organizações não se atentem para a importância dessa ferramenta. 

Como a seleção está sendo percebida? Como quer ser? O que precisa fazer para isso? São algumas das perguntas vitais para o planejamento preconizado. 

E quais são seus concorrentes? Não me refiro aqui ao campo exclusivamente esportivo, ainda que outros esportes e até times tomem também espaço na mente, na lembrança, na atenção e, trazendo para aspectos mais tangíveis, nos orçamentos dos patrocinadores e na mídia. Enfim, como a seleção precisa se posicionar para ter, além do destaque que almeja nas competições esportivas, uma posição diferenciada e privilegiada nos variados espaços citados? 


O fato aqui explorado, além de nos chamar a atenção para uma situação que talvez não tenha até então provocado a devida reflexão, nos propicia a oportunidade de aplicar conceitos fundamentais para uma boa gestão de marketing. Ressaltando que, ao contrário do mercado tradicional, onde os concorrentes costumam elaborar estratégias de marketing para sobressaírem no mercado, nessa “competição” poucos, ou nenhum dos ofensores, tem como objetivo tomar espaço da seleção. 

DINO SANI FOI ÍDOLO EM TODOS OS CLUBES QUE DEFENDEU

Os italianos o queriam na Azzurra, mas o coração do brasileiríssimo Dino Sani o impediu de vestir o manto azul quatro vezes campeão mundial. No Palmeiras, no São Paulo, no Milan ou no Corinthians. Em todos esses clubes, o grande centromédio, que esteve na Copa de 58, na Suécia, brilhou intensamente. Conheça um pouco mais sobre esse ídolo do passado nas linhas a seguir.

por André Felipe de Lima


O menino Dino tinha apenas quatro anos quando ganhou do pai sua primeira bola. Sob as vistas dos pais, Caetano e Maria Sani, e de Claudia e Silvia, irmãs mais velhas que ele, chutava-a contra a parede, no fundo do quintal, sem imaginar, contudo, que aquele lúdico momento representava um preâmbulo de magistral carreira nos gramados daqui, da Argentina e da Itália. Foi aquele fundo de quintal o palco para o despertar do grande Dino Sani, um ídolo de uma época em que os volantes não se resumiam a jogadores de contenção. Eram, acima de tudo, craques de verdade.

“Meu pai não implicava, não falava nada. Acho que ele nunca foi me ver jogar bola. Acho que ele não foi, não. Eu nunca vi ele também. Ou ele olhava escondido. Não sei. Eu sei que eu me encaminhei sozinho. Ninguém me levou. Eu que fui pra lá. Eu gostava muito de jogar bola. Jogava bola na rua também, aquelas peladas da molecada, vinha com os dedos tudo arrebentado. Àquela época, a gente andava muito descalço, então na hora na pelada, meu filho, a gente chutava pedra, chutava tudo, viu. Aparecia ali, a gente chutava”, declarou Dino Sani ao projeto Futebol, Memória e Patrimônio, do CPDOC/FGV).

Descendente de italianos da Toscana e de Ferrara [os avós vieram junto com os Matarazzo e com a rica família trabalharam em São Paulo], Dino Sani é cidadão paulistano, nascido no dia 23 de maio de 1932. É reconhecido como um dos mais técnicos que já se viu na posição de centromédio. Já rapaz, defendendo o time de aspirantes do Palmeiras, isso ficou evidente. Tão evidente que, embora não justificasse a decisão que planejara, optou por abandonar os estudos no último ano ginasial no Colégio Oswaldo Cruz, onde só jogava handebol, para dedicar-se exclusivamente à bola de futebol. “E eu saía de casa, corria cinquenta metros de rua, pulava o rio, tinha um riozinho ali, subia no muro e caía dentro do Palmeiras. Ia brincar lá dentro. E ia treinar também, porque eu tinha onze, doze anos aí”.


Dino Sani foi campeão do mundo em 1958, era titular da seleção, mas perdeu a vaga para Zito. Atuando em clubes, teve como títulos mais importantes o campeonato paulista de 1957, pelo São Paulo, e o italiano, de 62, e a Copa dos Campeões, de 63, ambas pelo Milan. Era tão talentoso no domínio da bola que muitos o acusavam de individualista, o que especulavam ter influenciado Vicente Feola a substituí-lo por Zito na Copa da Suécia. Mas o que lhe tirou do time foi uma distensão muscular na virilha durante o jogo contra a Inglaterra.

Formado nas divisões de base do Palmeiras, Dino começou a carreira profissional no Alviverde, em 1949, durante um período de fartura de craques no Parque Antarctica, como Waldemar Fiúme, para quem Dino fazia de sombra na linha média, Rodrigues Tatu, Achiles, Liminha e Jair Rosa Pinto. Como não era aproveitado, foi emprestado, em 1950, ao XV de Novembro de Jaú, que disputava a segunda divisão paulista. Voltou ao Palmeiras em 1952, mas foi logo emprestado ao extinto Comercial da capital paulista junto com Gino Orlando, outra revelação das bases palmeirenses, que também acabaria contratado pelo São Paulo. Dino Sani jogou bem durante duas temporadas pelo time do interior e foi contratado pelo São Paulo, em fevereiro de 1954, para o lugar do centromédio e ídolo tricolor Bauer. No Tricolor, Dino Sani formou uma meia cancha formidável com o seu ídolo Zizinho mais a frente. Gino Orlando, seu ex-companheiro dos tempos de juvenil no Palmeiras, marcou muitos gols graças aos passes do volante, que durante a temporada de 1956 surpreendeu ao ser o segundo principal goleador do São Paulo ao assinalar 29 gols. Até 1961, Dino disputou 322 jogos com a camisa tricolor, venceu 169, empatou 81 e marcou 108 gols, segundo dados compilados por Alexandre da Costa para o Almanaque do São Paulo. Talvez não haja na história do futebol brasileiro um volante com faro de artilheiro como Dino Sani.

Em 1961, o Boca Juniors, que já tinha no elenco os brasileiros Paulo Valentim [ex-Botafogo], Maurinho [ex-São Paulo e Fluminense], Orlando Peçanha [ex-Vasco] e Edson [ex-América], pagou um milhão de dólares pelo passe de Dino Sani, que permaneceu apenas uma temporada na Bombonera, período em que disputou 14 jogos e marcou 4 gols. Ficou mais tempo na reserva de Rattin, que se tornaria um dos maiores ídolos da história do Boca Juniors. Porém, desde a Copa de 1958, o Milan tinha interesse pelo craque e a negociação se concretizou em 1961, com Dino estreando no dia 12 de novembro, quando o time vermelho e preto derrotou a Juventus pelo placar de 5 a 1.

As grandes conquistas na Itália tornaram-no ídolo local, mas o que fez mesmo Dino Sani cair nas graças da torcida milanesa foi um lance casual em que o craque brasileiro quebrou o nariz de Mauro Bicilcli, da rival Internazionale.


No rubro-negro de Milão, Dino jogou com Giovanni Trappatoni e Cesare Maldini, pai de Paolo Maldini, e marcou 14 gols em 62 jogos até sua despedida do clube, em 1964.

Àquela altura ídolo inegável dos italianos, Dino Sani acabou convidado para atuar pela seleção italiana na Copa de 1962, no Chile: “Não aceitei. Sempre joguei sério e não conseguiria enfrentar o Brasil. Continuei pela Europa e tenho certeza que sempre consegui elevar o nome do futebol brasileiro em todas as partidas que fiz”, alegou.

Faltava-lhe defender mais um clube do “Trio de ferro paulistano”, mas o Milan fez, em meados de 1964, jogo duro para que deixasse o clube italiano. “Meu contrato com o Milan havia terminado e, apesar de receber uma boa proposta para renovar, preferi voltar ao Brasil. Além das saudades, que já eram imensas, precisava estar no Brasil para cuidar dos negócios. Preferi deixar de ganhar um bom dinheiro na Itália para poder estar presente nas negociações dos meus bens. Realmente houve um impasse entre o clube e eu. Tudo porque me haviam prometido passe-livre ao final do contrato e, quando isso ocorreu, muitos clubes se interessaram por meu concurso. O Milan então se aproveitou da situação exigindo bastante dinheiro para me liberar. De nada adiantou garantir o que o que eu queria era voltar ao Brasil. Eles fizeram pé firme e acabaram conseguindo o que desejavam”. Mas por apenas alguns meses.

Repatriado em dezembro de 1964, Dino Sani, já acima dos 30 anos, baixou no Parque São Jorge com honras e pompas para jogar ao lado do garoto Rivellino, que o considera o melhor companheiro que já teve em campo. Seu passe custou 38 milhões de cruzeiros ao Milan.

Dino jogou 116 partidas pelo Timão entre 1965 e 68. Venceu 66, empatou 21 e marcou 32 gols, destaca Celso Unzelte, no Almanaque do Corinthians.

Em 1969, depois de três anos ensaiando a despedida dos campos, Dino aceitou o convite para treinar o Timão com a missão de acabar com o jejum de títulos paulista. Mesmo sem conquistas expressivas pelo Corinthians, foi convidado para treinar a seleção brasileira, às vésperas da Copa de 1970. Dino não aceitou, em respeito ao amigo João Saldanha, defenestrado do cargo.

No Internacional, Dino Sani ganhou três campeonatos gaúchos consecutivos, de 1971 a 73, ano do pentacampeonato do clube. Foi a sua melhor fase como técnico de futebol. O ex-volante treinou outros clubes brasileiros, como Goiás, Palmeiras, Coritiba, Fluminense, Flamengo e Ponte Preta, mas longe dos resultados obtidos com o Colorado.

No exterior, também lembraram de Dino Sani, que comandou Peñarol, clube que levou ao bicampeão uruguaio em 1978 e 79 e onde lançou o craque Ruben Paz, Boca Juniors [1984], Humiuri, no Japão, e a seleção do Catar. Dino treinava o time do Grêmio na final da Copa do Brasil de 1991, quando o time gaúcho perdeu o título para o Criciúma de Luís Felipe Scolari. Já rico e atuando como empresário na capital paulista, Dino Sani treinou o recém-fundado Ecus-Suzano-Sonda, em 2005.

Uma das grandes frustrações de Dino Sani foi não ter jogado no futebol carioca. Confessou isso durante uma entrevista à antiga Revista do Esporte. Azar dos clubes do Rio de Janeiro, porque deixaram de vibrar com um dos melhores jogadores da história do futebol brasileiro.