CULPADO OU INOCENTE?
por Washington Fazolato
A final da Liga dos Campeões, entre Real Madrid e Liverpool, teve dois personagens marcantes: o goleiro dos Reds, Louis Karius, que falhou miseravelmente em dois gols, de Benzema e Bale, e Sergio Ramos, zagueiro do time espanhol, que tirou de campo o atacante egípcio Mohamed Salah.
Até o lance que provocou sua saída, o jogo pendia ligeiramente para o Liverpool. Mas a sua saída, da forma que ocorreu, abateu a equipe inglesa, que ainda teria um desempenho sofrível de seu goleiro.
A dividida que tirou Salah, à primeira vista, parece uma daquelas disputas de bola acirradas, com agarrões mútuos, que resultam em queda. Uma observação mais atenta, no entanto, revela que não.
Ramos, com seu braço esquerdo, prende o braço direito de Salah, desequilibra-o e o derruba, aplicando a chamada chave de braço. A Associação Europeia de Judô (EJU) publicou uma foto do lance no seu Twitter, criticando a jogada. Segundo a EJU, o Waki-gatame é uma técnica perigosa e, que por isso, não é permitida no judô.
Ironicamente, no texto publicado sobre a imagem se lê: “Técnica de chave de braço proibida no judô, mas no futebol bom o bastante para ganhar a Champions League”.
A turma do judô deve saber o que fala. Mas antes do jogo acabar a discussão sobre o lance já dominava a comunidade boleira.
Li, vi e ouvi muitas abordagens sobre o lance. Nos programas esportivos, as chamadas “mesas-redondas”, o de sempre. Aqueles comentaristas que jamais calçaram uma chuteira afirmavam, do alto de um suposto conhecimento conseguido nas faculdades de jornalismo, tratar-se de uma disputa de bola normal: “Salah teve azar no lance”, “não soube cair”, “nem falta o juiz marcou” e outras baboseiras.
Os ex-jogadores, dividiram-se. Alguns, em nome de uma suposta ética profissional, afirmaram que o zagueiro evidentemente não quis tirar o maior jogador adversário de campo. Outros preferiram a ironia, tergiversando para tampar o sol com a peneira.
Como sempre, a verdade está com os boleiros. Com absolutamente todos que conversei, companheiros de jornadas memoráveis, de disputas sangrentas, zagueiros que atravessavam os famosos “choques de locomotivas”, a turma forjada a fogo, o veredito era unânime: foi claramente maldoso e a intenção era tirar Salah de campo.
Sergio Ramos tem um histórico farto de entradas violentas. Há quem diga, maldosamente, que ele compõe a cota atual de carniceiros do Real Madrid, vaga antes ocupada pelo troglodita Pepe.
Eu, que sempre joguei como zagueiro, confesso que, disputando com atacantes, já usei o recurso de prender o braço do adversário, mas sempre tive o cuidado de soltá-lo antes da queda.
Infelizmente, já presenciei até fratura exposta em lances semelhantes. Como para mim, a sabedoria está com os boleiros, fecho com eles: foi maldade.
A final perdeu muito sem Salah. Se o resultado seria diferente, é outra história
PEDE PARA SAIR, 01!
por Fabio Lacerda
Era questão de tempo depois do primeiro equívoco – a negação para trabalhar no mundo árabe – até pedir o boné na derrota para o Botafogo, em São Januário, pela oitava rodada do Brasileiro. Zé Ricardo, outrora visto como “salvador da pátria”, recolheu seu material da Colina e meteu o pé!
Independente das relações políticas extra-campo, pois ninguém tira da minha cabeça que essa peculiar ciência tão importante na vida humana, e ao mesmo tempo tão desprezada pelo interesse do cidadão, tenha refletido nas quatro linhas. Alguém conseguiria explicar-me, a escolha do Bruno Silva, não aquele ex-Botafogo, e sim, ex-Ferroviária de Araraquara, como titular em dois jogos cruciais na Libertadores quando o moço estava apenas há 30 dias no clube?
Zé Ricardo, sujeito pacato à beira do campo, de pouca vibração, de pouco incentivo e modesta demonstração de gana, começou a sua saga de erros técnicos no decisivo jogo do Campeonato Carioca no Maracanã quando o Vasco debruçava-se sobre a vantagem do empate.
O Vasco jogou por um gol. A escalação deflagrou uma das maiores catástrofes táticas vistas no Maracanã. Escolheu uma equipe com quatro laterais, recuando o Pikachu, jogador este autor de dois gols no primeiro jogo da decisão. E dois zagueiros, nada mais natural numa formação defensiva. Ao término do jogo, Zé Ricardo fechou a partida com dois laterais e quatro zagueiros. Sem falar que deveria ter lançado o Paulo Victor para correr na direção da bola rechaçada da defesa cruz-maltina nos últimos 15 minutos de jogo, quando o Botafogo já adiantava seus zagueiros na intermediária do Vasco em busca do gol que saiu dos pés do zagueiro Joel Carli. E obviamente finalizou a obra escalando muito mal os cobradores de pênaltis.
Por falar em zagueiros, miolo de zaga, Zé Ricardo também “inovou” nas suas escolhas repetidas em algumas oportunidades: uma dupla de zagueiro canhotos. Eu nunca vi um zagueiro canhoto jogar pelo lado direito do campo! E além disso, o escolhido pelo ex-técnico do Vasco chama-se Erazo, um defensor que nega-se a dar chutão e coloca o sistema defensivo em apuros sempre que escorrega a bola pelo gramado. Quando escuto o Luis Roberto classificar o equatoriano como “El elegante”, eu não sei se rio ou choro! E você, Paulo Cezar Caju, chora ou desespera-se?
A partir daí, os erros permaneceram nas escalações durante os jogos da Libertadores. É bem verdade que o plantel muito mutilado, com vários atletas contundidos, reduziu as chances de colocar em campo uma equipe mais confiável, ou melhor, contendo os melhores jogadores. Durante a principal competição Interclubes da América, Zé Ricardo recuou, sem mais nem menos, o jogador mais efetivo no ataque. Yago Pikachu já havia sido bagunçado na partida contra o Jorge Wilstermann, na Bolívia, quando o brasileiro Serginho deitou os cabelos sobre o jogador que homenageia um dos Pokemóns.
Um rodízio para formar a dupla de ataque começou a acontecer. E também no meio-de-campo. Por conseguinte, não foi capaz de definir uma equipe titular. Suas últimas convicções na titularidade do jovem Caio Monteiro é um flagrante do quão perdido esteve no meio de um plantel de nível técnico medíocre. Mas como o futebol é jogado com a cabeça, nem quero referir-me ao intelecto do time. Deixa para lá!
Chega o Brasileiro, e com ele a Copa do Brasil e a inexplicável vitória sobre a Universidad de Chile pelo placar mínimo que permitiu o Vasco manter-se na América por segurar a corda da Sul-Americana. Até a derrota para o Vitória, em casa, o Vasco deu a falsa impressão que as angústias e agonias na luta pelos salvadores 46 pontos seria motivo de sátira junto aos torcedores rivais. Mas antes de fechar dez rodadas, o Vasco já apresenta um rendimento abaixo de 50%. Creio que as luzes amarelas de São Januário já estão ligadas há 30 rodadas para o final de mais uma edição de Campeonato Brasileiro. As duas derrotas sofridas para o Bahia, pelo mesmo placar, nas duas competições nacionais reforçam meu apontamento para a eliminação do Vasco para o Tricolor da Boa Terra na Copa do Brasil.
Nada que três vitórias consecutivas não coloquem o Vasco na parte de cima da tabela, mas essa resposta, essa reabilitação, já deveria começar na próxima rodada, no Mineirão, contra o Cruzeiro. Mas é assustadora a média de gols sofridas por jogo do atual Vasco da Gama. É o time mais vazado do futebol brasileiro. E, hoje em dia, não tem um ataque que faça um gol a mais que os sofridos, como acontecia com o time de 1997, que virava todos os jogos em São Januário ao levar gol antes dos de primeiros minutos de jogo.
Por fim, nas ultimas rodadas do Brasileiro preferiu improvisar um zagueiro que não joga desde a Taça Guanabara na lateral-direita a colocar um jogador da posição, mesmo que promovido do sub-20. A passagem de Zé Ricardo pelo Vasco assemelha-se com sua estada no Flamengo! Jogador das categorias de base não tem prioridade. E devemos lembrar que foi a categoria de base sub-20 do Flamengo que o ascendeu ao profissional após a conquista da Copa São Paulo de Juniores.
Zé Ricardo, quem tem medo de evacuar, não come! Suas equivocadas escalações, com sucessíveis mudanças, sobretudo no meio-de-campo, setor que determina se você vai atacar ou ser atacado no decorrer de uma partida de futebol, e algumas escolhas sem pé nem cabeça, eu posso deduzir que seu trabalho sofreu interferências. Ainda mais no clube que não dá chance à harmonização política e social pelos rincões da sede. A conturbada e nociva política do Vasco promete novas páginas para os próximos meses. É esse cataclismo existente e interminável no clube que forçou o técnico a pedir sua demissão. O comandante das quatro linhas e seu temperamento tibetano não fez o Vasco pulsar. O novo técnico não precisa comportar-se como um Lord. Precisa, ao menos, ter gogó para “cantar” o jogo durante os 90 minutos e mais os tempos de acréscimos. Um técnico sem vibração, que não cerra os pulsos explodindo as veias dos antebraços para pedir garra e hombridade ao time, sempre vai deixar devendo. Então, pega a viola, coloca na sacola e zarpa. Pede para sair, 01!
MARIO FILHO E LINS DO REGO
por André Felipe de Lima
Dois monstros da literatura brasileira — e, em especial, da futebolística — nasceram em um dia 3 de junho: Mario Leite Rodrigues Filho, em Recife, faria hoje 110 anos e o mais rubro-negro de todos os escritores, o paraibano José Lins do Rego Cavalcanti, cuja pequena Pilar apresentou ao mundo, completaria 117 anos.
Lins do Rego era um apaixonado pelo futebol a ponto de envolver-se com as coisas do seu Flamengo como nenhum outro cartola de praxe ousaria fazer, ou, na mais amena das hipóteses, teria competência para tal. O genial escritor chorava nas derrotas e nas vitórias também. Abraçava-se a torcedores tão apaixonados pelo preto e o vermelho quanto ele. Eram anônimos, mas considerados por Lins do Rego singularmente iguais a ele na irmandade que lhes fez Flamengo. “Muita gente me pergunta: mas o que vai você fazer no futebol? Divertir-me, digo a uns. Viver, digo a outros. E sofrer, diriam os meus correligionários flamengos. Na verdade uma partida de futebol é mais alguma coisa que um bater de bola, que uma disputa de pontapés. Os espanhóis fizeram de suas touradas espécie de retrato psicológico de um povo. Ligaram-se com tanta alma, com tanto corpo aos espetáculos selvagens que com eles explicam mais a Espanha que com livros e livros de sociólogos”. Lins do Rego trouxe — e não temo afirma — Schopenhauer para o futebol brasileiro.
Mario Filho, por sua vez, é sinônimo de história deste schopenhaueriano futebol brasileiro, que se curva a dor consentida, porém feliz e resignada com ela. Não se conta essa história sem antes mencioná-lo e a sua maior obra: “O negro no futebol brasileiro”. Era amigo do futebol como ninguém conseguiu até hoje sê-lo. Abraçava o esporte, escrevia sobre ele e seus personagens com uma maestria e emoção cativantes. O devotado (quase santo!) Mario Filho, como o seu irmão de aura Lins do Rego, amava, sobretudo, os torcedores. Respeitava-os e a eles conferia uma força quase sobrenatural capaz até de mudar o rumo de um jogo. Para o cronista dos cronistas, até mesmo um juiz sucumbia diante desse mágico, potente e deliciosamente schopenhaueriano torcedor brasileiro, cuja vontade cega, insaciável, inquieta (e às vezes irascível) o leva a dor eterna, porém inequivocadamente apaixonada pelo seu clube de coração. “Há torcedores, aliás, com força moral sobre o juiz. Com uma voz poderosa de comando. Uma voz assim de Victor McLaglen. Grossa. Estentórea. Hipnótica. O juiz não quer apitar e apita a ordem de offside! hands! foul! corner! Contra isso o juiz não pode lutar. Trata-se de alguma coisa mais forte do que ele. Felizmente, são raros os torcedores privilegiados com uma voz de comando. E, além disso, os que tem a voz de comando, não a gastam assim, sem mais nem menos. Guardando-a para ocasiões solenes. Quase cívicas”.
Tenho saudades de Lins do Rego e de Mario Filho. Confesso-as publicamente, porque aprendi a lê-los ainda menino, e jamais esqueci que um pouco da paixão pelo texto que pretensamente assinamos “futebol” tem origem nas linhas destes dois gênios da literatura brasileira. Com os dois, tenho certeza, Schopenhauer seria feliz ao amar o futebol que escreviam, e faria do seu clássico “As dores do mundo” a “As dores queridas do futebol”.
Paulinho
O VOLANTE DA DEMOCRACIA
entrevista: Paulo Escobar | texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Daniel Planel
Muito antes do jogador que hoje atua no Barcelona e na Seleção Brasileira, um outro volante Paulinho era idolatrado pela torcida do Corinthians. Através do parceiro Paulo Escobar, o Museu da Pelada foi até São Paulo encontrar o ex-jogador para relembrar sua carreira.
Casagrande e Sócrates; Paulinho, Zenon e Biro-Biro
Formado nas divisões de base do Náutico, onde deu os primeiros chutes com 10 anos de idade, Paulinho chegou a seleção sub-20 e quis trocar de ares após vestir a amarelinha. Exprimiu seu desejo ao treinador Roberto Brida, a quem é muito grato, e se transferiu para o Corinthians no início da década de 80, conquistando dois títulos estaduais e participando ativamente da Democracia Corinthiana.
– As pessoas pensam que a Democracia era um tipo de bagunça, mas não era nada disso. A Democracia permitia que o jogador opinasse na contratação de um treinador, de um jogador… O grupo do Corinthians era maravilhoso, todos tinham amizade, então por isso era uma democracia. Mas havia uma cobrança interna forte em caso de derrota.
Inicialmente, a transferência do Náutico para o Corinthians assustou. Ainda garoto, Paulinho trocou o conforto da casa dos pais e uma titularidade absoluta por um lugar em que sempre ouviu falar mal e haveria forte concorrência.
Se não contava com a habilidade de um Rivellino, por exemplo, o volante compensava com uma raça muito além do normal, característica muito admirada pela torcida alvinegra. Dessa forma, não demorou a cair no gosto da Fiel e garantiu a titularidade ao lado de jogadores que idolatrava.
– Quando eu entrei no vestiário me deparei com Zé Maria, Wladimir, Caçapava, Basílio… Todos muito humildes! Eu gostava de colecionar álbum e tinha figurinhas deles! – lembrou.
Outra fator que impressionou vinha da arquibancada:
Campeão de 1983. Em pé: Leão, Sócrates, Casagrande, Eduardo, Biro-Biro e Zenon; Agachados: Mauro, Alfinete, Paulinho, Juninho e Wladimir.
– A torcida do Corinthians é uma coisa fenomenal. Só quem jogou ali saber dizer. Quando time está em boa fase, ganhando, você é impulsionado a correr.
Vale lembrar que naquela época o futebol brasileiro vivia sua época de ouro, com uma pluralidade de craques que atormentavam a vida dos marcadores. Ao ser perguntado sobre qual era o jogador mais difícil de se marcar, Paulinho não titubeou:
– O que mais me deu trabalho foi um tal Zico! – brincou.
Em 1985, seu ciclo no Timão chegou ao fim e ele tomou mais uma decisão corajosa: trocou o alvinegro pelo rival Palmeiras. A transferência, obviamente, não foi muito bem vista e Paulinho teve que se desdobrar para ser respeitado. O maior feito foi ajudar o Verdão a chegar na decisão do Paulista, mas foi derrotado para a Inter de Limeira.
Depois do Palmeiras, vestiu a camisa do Novorizontino e de outros clubes do interior de São Paulo. Assim que pendurou as chuteiras, decidiu abrir a Escolinha do Paulinho para passar um pouco da sua experiência para os garotos e, quem sabe, formar novos talentos.
Veloarte
VELOARTE FUTEBOL E AMIGOS
fotos e vídeo: Daniel Perpetuo
Houve um tempo em que as praias do Rio de Janeiro eram muito mais do que uma simples opção de lazer para se refrescar. A areia era palco de duelos que entraram para a história do futebol, lotavam os calçadões e resultaram em amizades eternas.
Se na Praia de Copacabana o Areia Leme era um dos que comandavam, em Niterói, na Praia de Icaraí, o Veloarte era o rival a ser batido. Literalmente, pois o time era uma seleção com os melhores craques de cada time.
Reponsável por convocar as feras, como uma espécie de olheiro, Pedro Vilella explicou a origem do nome e se mostrou orgulhoso pela história da equipe:
– A gente conseguia reunir velocidade e futebol arte. Vale ressaltar que somos o único clube da Praia de Icaraí que teve várias categorias.
Inevitavelmente tinha aqueles que reclamavam da verdadeira “panela” do Veloarte, que dificilmente perdia para os rivais da região. Por isso, o clube passou a buscar novos ares, disputando torneios no Rio de Janeiro e até mesmo em Santos.
– Era um futebol de primeira qualidade, coisa que não se vê mais hoje em dia. Muitos que jogavam nas nossas peladas foram parar em clubes! – ressaltou João Artur.
Auxiliar de Vanderlei Luxemburgo no Real Madrid na época dos Galáticos, Paulo Campos também ressaltou a força do Veloarte:
– A diferença é que era uma alegria monstruosa jogarmos juntos.
Uma história tão bonita dentro das quatro linhas não poderia acabar quando chegasse a hora dos craques pendurarem as chuteiras. Até porque, grande parcela do sucesso se dava pelo entrosamento e amizade dos jogadores. Por isso, os craques decidiram fazer encontros anuais para colocar a resenha em dia.
Engana-se, no entanto, que a reunião é exclusiva para ex-jogadores do clube. Toda a rivalidade ficou no passado e qualquer um é bem-vindo para relembrar a época de ouro do futebol de praia.
Se ainda resta alguma desconfiança, o grupo do Facebook “Veloarte e Amigos do Futebol de Niterói” trata de zerá-la: “A finalidade desse Grupo é de nos proporcionar reencontrarmo-nos, mantendo acesa a chama da nossa amizade”.
Por isso, a equipe do Museu ficou muito orgulhosa com o convite e marcou presença no 8º Encontro do Veloarte e Amigos para conhecer um pouco mais dessa história.