A COPA DO MUNDO E SUAS INJUSTIÇAS
por Mateus Ribeiro
Todos nós sabemos que o futebol está longe de ser um esporte dos mais “justos”. Coloco a palavra entre aspas, porque se pararmos para pensar, existe uma justiça no futebol: quem faz mais gols vence o jogo. E fim de papo.
Porém, sempre existem aquelas equipes que cativam muita gente, e quando perdem algum campeonato, deixam a sensação de que o resultado não foi o mais justo. E a Copa do Mundo é um grande palco para grandes dessas “injustiças”.
Quem é que não se lembra, ou nunca ouviu falar do Brasil de 1982 e de 1986? Um time recheado de jogadores do mais alto escalão, comandados por um dos treinadores mais cultuados e respeitados da historia do futebol brasileiro. Na Espanha, foi Paolo Rossi quem acabou com o sonho brasileiro. Quatro anos depois, no México, a França e as penalidades máximas fizeram com que milhões de pessoas lamentassem o fato de Zico, Sócrates, Telê Santana, Leandro, Osar, Waldir Peres, Éder, Cerezo e tanta gente boa terminasse a carreira sem uma Copa do Mundo no currículo.
O povo brasileiro ainda pode se gabar de ter cinco mundiais, dois desses conquistados depois das decepções oitentistas. E onde é que os holandeses encontram conforto, após três vice campeonatos?
A Laranja Mecânica deixou o planeta chocado com sua forma de jogar. Comandados por um gênio chamado Johan Cruijff, em 1974, foram derrotados pela eficiência dos alemães. Quatro anos mais tarde, na Argentina, já sem seu principal jogador, perderam para os donos da casa. Até hoje, as derrotas são lembradas. Na Copa da África, em 2010, Robben e seus companheiros tiveram a chance de lavar a alma de seus compatriotas, mas esbarraram no sólido time espanhol, e amarguraram mais uma vez a tristeza de perder uma final de Copa do Mundo. Já neste último caso, vale ressaltar que qualquer Seleção que vencesse iria ser lembrada. Não que a Alemanha de 1974 ou a Argentina de 1978 não fossem merecedoras (apesar do “polêmico Argentina x Peru…), mas até hoje, fica a sensação de que aquele time da década de 1970 merecia um título de Copa do Mundo. Na verdade, a Holanda merece estar no seleto hall de campeões mundiais. Uma pena que em 2018 não disputarão o Mundial.
Outro caso bastante falado é o de Messi. Um dos maiores jogadores dos últimos trinta anos, o argentino não conseguiu conquistar o tri para sua seleção. É bem verdade que suas companhias em 2010 e 2014 eram um tanto quanto contestáveis. Porém, para o povo argentino, tão apaixonado por futebol, não importa que Messi tenha conquistado o Universo pelo Barcelona, encerrar a carreira sem dar um título para a Argentina no futebol profissional vai ser uma marca em sua vitoriosa jornada futebolística.
Cristiano Ronaldo, seu eterno “rival”, até poderia entrar nessa estatística, mas se lembrarmos que Portugal tem uma relevância bem menor do que a Argentina no futebol, e que os gajos foram campeões europeus em 2016 (mesmo com o craque não jogando a final, e com a seleção passando de fase na bacia das almas…), a barra do jogador do Real Madrid fica limpa. Seria o mesmo, por exemplo, que lamentar o fato da Irlanda da Norte não faturar um Mundial contando com George Best.
Voltando a falar de seleções, tivemos injustiças quase criminosas, cometidas em 2002. Ou ninguém se lembra da “forcinha” que a Coréia do Sul recebeu contra Itália e Espanha? É claro que os coreanos só foram beneficiados porque conseguiram chegar até as fases finais., portanto, seria leviano de minha parte afirmar que só alcançaram o quarto lugar por erros de arbitragem. Mas não dá pra ignorar o gol mal anulado contra a Itália, a expulsão de Totti, os gols anulados contra a Espanha, e por fim, o goleiro Lee Won Jae praticamente dividindo a bola com Joaquín para defender sua penalidade máxima.
Ainda no campo das zebras, mas falando das “zebras do bem”, podemos citar a Croácia de 1998, que por pouco não chegou na final,o que poderia facilitar (ou dificultar) as coisas para o Brasil naquela fatídica final. Também vale lembrar da Bulgária em 1994, que foi parada apenas na semifinal pela Itália. Mas isso já é mais algo sentimental, de torcer pelo time menos expressivo. Algo parecido com o fenômeno São Caetano do início do Século presente.
Para 2018, o Brasil chega como grande favorito. Vocês, caros leitores, irão considerar uma injustiça qualquer outra seleção que não a Canarinho vencendo a Copa? Opine nos comentários!
Até a próxima, ótima Copa do Mundo
LEMBRANÇAS DA COPA DO MUNDO
por Jorge Eduardo Faria
Em 1962 eu tinha sete anos completos. Morava num pequeno prédio de quatro andares perto do Campo de São Bento em Niterói, que era o nosso grande quintal, meu e da minha turma, a “Turma dos Sete”, como a do programa da antiga TV Record (canal 7), nossos ídolos. Eu era o Juca.
Domingo, dia 29 de junho, depois do almoço, a turma se reuniu na portaria do prédio para ouvir o jogo. Mas faltava uma coisa muito importante. O rádio. E agora? O jogo iria começar às 15h, e a gente tinha que arrumar um rádio. Foi então que o “Chuvisco” chegou, e avisou que o pai do Mauro tinha colocado o rádio em cima do muro da casa para todo mundo ouvir. Foi uma correria só. Lembro-me que o Serginho levava no bolso um amarrado de chilenas e uma cabeça de nego.
A casa do Mauro era do lado da padaria do Seu Antonio. O pai dele tinha colocado um fio longo lá de dentro da casa até o radio, um poderoso Mullard de seis válvulas e três faixas de ondas, que imponente, e cheio de estática, nos fazia ouvir a voz de Fiori Gigliotti anunciando o inicio do jogo: Brasil x Tchecoslováquia, diretamente de Santiago do Chile.
A turma ainda tentava se arrumar na calçada quando Masopust, considerado o melhor jogador da Europa, marcou o primeiro gol dos Tchecos. Foi uma ducha de água fria. A gente já não tinha Pelé, e ainda levava um gol no comecinho do jogo. Não dava pra acreditar.
De onde eu estava não conseguia escutar direito o rádio, então entrei na casa do Mauro, passei com cuidado por baixo do fio que ligava o rádio e subi no muro, me sentando bem do lado daquela caixa enorme com três faixas de onda. Não demorou muito para o João, o cara metido a mau da rua, chamar a minha atenção.
– Se derrubar o rádio vai levar uns cascudos!
Fingi que não escutei e fiquei lá, que nem pardal no final da tarde, quietinho, empoleirado, tentando ouvir o jogo. E não demorou quase nada, Amarildo empata o jogo. Me jogo lá de cima no meio da galera. A turma toda se abraçou e comemorou junto. Aí eu falo. Todo mundo para o lugar que estava, que deu sorte. E corri de volta para o muro. E novamente o João Valentão falou comigo.
– Ô guri, já não te falei pra não ficar aí?
E o pai do Mauro, que o tempo todo tinha acompanhado a minha peripécia, bateu o martelo da cadeira da varanda.
– Deixa ele aí. Deu sorte. Todo mundo no lugar que estava na hora o gol.
Aí eu estufei o peito que nem pombo, cheio de moral. O meu lugar, a partir de agora, era do lado do rádio.
O primeiro tempo acabou 1 a 1. A turma correu para a padaria do Seu Antônio para tomar um suco de groselha bem gelado, servido naqueles copinhos cônicos de papel e suporte de plástico. O Serginho então tirou uma chilena do bolso, acendeu e jogou do lado do gato que, preguiçosamente, cochilava em cima de um saco de batatas (sim, naquela época padaria também vendia batata). Saímos correndo e ficamos de longe esperando a explosão e o susto do gato dorminhoco. Serginho fazia a contagem regressiva. O pavio vai se aproximando do papel. A turma toda põe a mão nos ouvidos. Serginho diz …. “é agora” … e puff … a bomba falhou. Nem precisou esperar mais, todo mundo caiu de molho no Serginho.
– Vai começar! – gritou o Mauro, e a turma voltou, cada um pro seu canto, pra ouvir o segundo tempo.
Era a época do rádio, e a voz do locutor nos levava pra dentro do estádio, imaginando os nossos craques lutando pra virar aquele jogo. E os locutores passavam toda a emoção na narração. Seu olhos eram os nossos sonhos de um dia estar vendo de perto uma final da Copa do Mundo. E aos 25 do segundo tempo Amarildo faz um estrago pela esquerda e centra na cabeça de Zito. Era o gol da virada. Era o gol do Bi. E a turma toda estava abraçada de novo, pulando juntos, até o óculos do Alfredo cair no chão e quebrar. Para tudo. O Alfredo faz cara de choro imaginando a bronca que ia levar da mãe, mas a turma é solidaria e diz pra ele que todos juntos íamos à casa dele explicar que o óculos quebrou por acidente, e ele não teve culpa. A partir daí resolvemos ficar todos juntos, ao lado do Alfredo (o Sabe-Tudo).
Mas a tristeza não durou muito. Aos 34 minutos Vavá, depois de uma pixotada do goleiro Tcheco, só teve o trabalho de empurrar a bola para dentro do gol. Brasil 3 a 1. Os rojões se ouviam por todo o bairro, e não queriam parar mais. O Brasil era Bicampeão Mundial de Futebol. E a turma toda junta, abraçada, voltava para o prédio cantando.
– A Copa do Mundo é nossa. Com brasileiros, não há quem possa!
Na portaria do prédio nos divertíamos com uma chuva de papel picado, confetes e serpentinas. Serginho então tira do bolso todas as suas bombinhas, chilenas, e junta tudo com uns pedaços de serpentina no canto da calçada da portaria, e prepara uma fogueira de bombas. Não satisfeito, pega a cabeça de nego, acende e enfia por baixo de tudo.
Quando a galera viu aquilo, nem precisou ninguém mandar. Saiu todo mundo correndo. Ia ser a nossa super explosão em comemoração ao título do Brasil. De longe a gente só vê aquela fumacinha subindo … subindo … subindo… e parou. Caramba, falhou novamente? Corremos todos para lá pra ver o que tinha acontecido, e na hora que a galera colocou a cara bem pertinho da fogueirinha de bombinhas, ela explodiu. Me lembro que fiquei com os ouvidos apitando por um bom tempo. Mas não importava nada. O Brasil era campeão.
Essas são as lembranças da minha primeira Copa do Mundo, e desde aquela época até hoje, sempre que vai começar uma nova Copa, eu me lembro deste episódio, e me lembro dos meus amigos. Alguns eu encontro até hoje, outros já se foram, a maioria eu nunca mais vi. Mas eles estão vivos na minha lembrança, a Turma dos Sete, de uma época em que ouvia a Copa do Mundo e se sonhava estar em campo com os nossos heróis.
Bons tempos … bons tempos!
GOLS ILUSTRADOS
“Quando observo um torcedor ou ex-jogador vendo meu desenho, naquele olhar vejo que voltam no tempo e se permitem sentir aquela emoção novamente”. Durante uma das muitas trocas de mensagens da nossa equipe com a rapaziada que nos segue no Facebook, fomos surpreendidos com uma bela coletânea de gols ilustrados. Se no futebol não existe nada mais mágico do que o contato da bola com a rede, o ilustrador Marco Sousa tratou de usar sua habilidade com as mãos para eternizar esses momentos. Com rabiscos fiéis à realidade, o artista desenvolveu o projeto GOLS ILUSTRADOS, que, como o próprio nome diz, conta com jogadas que entraram para a história de alguma maneira.
Tudo isso começou em 1977, quando seu pai mostrou uma Revista Placar com 24 gols do Corinthians no Campeonato Paulista ilustrados pela dupla Gepp e Maia. Se encantou pela produção dos artistas e deu o “pontapé inicial” ilustrando o gol de Basílio que tirou o Timão da seca.
A equipe do Museu quis saber mais sobre a vida de Marco Sousa e o resultado dessa resenha vocês poderão conferir abaixo:
Como foi seu início na ilustração?
Foi bem cedo, aos 7 anos. Eu pegava caderno da escola e ficava desenhando ou tentando desenhar Godzila, mergulhadores do seriado “Viagem ao Fundo do Mar”, entre outros. A ilustração de Futebol surgiu em 1977, quando meu pai me mostrou uma Revista Placar que contava com 24 gols ilustrados do Corinthians da conquista do Campeonato Paulista daquele ano. Aqueles desenhos da dupla de ilustradores Gepp & Maia me conquistou de tal maneira que pensei comigo: “Nossa, que show estes desenhos! Vou desenhar igual a eles ou melhor um dia, e acho que consegui o meu objetivo”.
Qual foi o primeiro gol ilustrado?
Foi com certeza o gol do Basílio de 1977, porque assim que eu peguei a Revista daquela época já fui rabiscando o gol que já havia sido ilustrado pela dupla Gepp & Maia.
Quando a “brincadeira” começou a ficar séria?
Em 1989! Fiz contato na Revista Placar e consegui falar com o Walter (Anjinho), um cara fantástico e que me deu vários toques de como melhorar o desenho. De 1992 a 1994, ilustrei em edições especiais para a Revista Placar, uma experiência única e maravilhosa para o desenho que ainda não estava como eu queria, mas foi muito válido o trabalho.
Você ilustrava seus gols também?
Claro, mas com o tempo os desenhos foram se perdendo. Cheguei a procurar por muitas vezes, mas nunca achei. Eram gols de peladas e também de campeonatos disputados no futsal e no futebol de campo. Confesso que alguns eu imaginava fazendo pelos clubes aonde fiz peneira e passei, mas não dei sequência.
Já teve algum contato com a dupla Gepp & Maia?
Há muitos e muitos anos, se não me falhe a memória em 1994. Lembro que eles ficaram comigo no estúdio deles para me mostrar como era aquela fábrica de desenhos e tudo mais que eles faziam naquela época, mas eu resolvi seguir meu caminho.
Qual foi o gol mais difícil de ilustrar?
Até hoje não surgiu desenho difícil de se desenhar, alguns foram complexos, como o gol do Basílio de 1977 e o gol do Falcão de 1976, aquela tabela de cabeça não foi fácil!
Em média, quanto tempo demorava para ilustrar um gol?
Para ilustrar um gol, defesa ou jogada de outro esporte coletivo tipo NBA, NFL, lembrando que também ilustro jogada de tênis, demoro de 2 a 3 dias. Agora quando o prazo é curto para emissoras e jornais costumo levar umas 5 horas.
Por que houve esse intervalo de 1998 a 2012?
Parei de ilustrar em 1998 porque fiquei triste e sem perspectiva para o desenho, e voltei em 2012 sonhando com possibilidade de patrocínio ou ajuda ao trabalho e projetos Gráficos que tenho na gaveta. Fora que para comercializar o trabalho preciso muito de apoio de patrocínio.
Já foi chamado para participar de programas de televisão por conta dos desenhos, correto? Quais foram?
Sim já participei do Tá na Área em 2015, na SporTV, do Esporte Fantástico, na Record, CBN – Rádio, em 2014, e neste ano estive no RESENHA – ESPN.
Onde jogava bola na infância? Chegou a treinar em clubes? Quais?
Jogava bola na rua, pés descalços no asfalto e em estacionamentos lá no Conjunto Habitacional José Bonifácio. Os colegas viram que eu levava jeito para a bola e começaram a me levar para jogos pela região. Fui fazer peneira no São Paulo, Juventus e Portuguesa, passei nos dois primeiros quando tinha 14 anos, mas não fui aos treinos e deixei de lado, pois gostava mesmo era de jogar futsal. Com 18 anos resolvi buscar uma oportunidade no futebol de campo e, através de indicações, fui até Limeira, consegui uma avaliação no Inter e fiquei no clube durante alguns meses, mas desanimei totalmente.
Por que abandonou o futebol?
Fui até onde me foi permitido, não tive apoio e nem forças para continuar. Vi e vivi momentos chatos no meio da bola e isso me desanimou muito, mas depois somente lazer.
Ainda joga peladas?
Hoje, com 51 anos, não jogo mais, somente brinco com um de meus filhos de gol a gol. Já tem quase 4 anos que não disputo uma peladinha.
Qual é o seu time e quem é o seu maior ídolo no futebol?Eu já deixei de lado a fase de torcedor e passei a torcer pelo GOLS ILUSTRADOS, meu desenho. Nos anos 80, torci e vibrei muito com Flamengo de Raul, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior, Andrade, Tita e Adílio, Zico, Nunes e Lico. Aí tivemos a seleção de 1982, que seleção! Mas acho que faltou o Careca ali na frente, só isso! E nos anos 92 e 93 o São Paulo tinha um timaço comandado pelo mestre Telê capaz de encarar qualquer clube do planeta.
Por fim, o que é a ilustração para você? Qual é a importância de eternizar esses momentos mágicos do futebol?
A ilustração é tudo em minha vida profissional, pois desde 2013 tenho tirado meu sustento dos gols ilustrados ou pelo menos tento. Já trabalhei com um pouco de desenho, mas em outra área, durante 30 anos em agências de Propaganda, mas o desenho sempre esteve presente.
A importância em ilustrar aquele gol, aquela defesa, aquele momento histórico do futebol é muito mágico mesmo, pois é um dom que foi me dado para eternizar o que o artista fez dentro das quatro linhas e eu transfiro para meu desenho, imortalizando para sempre aquele momento. Demais poder fazer isso.
Quando observo um torcedor ou ex-jogador vendo meu desenho, naquele olhar vejo que voltam no tempo e se permitem a sentir aquela emoção novamente.
Agradeço a Deus por este dom maravilhoso.
COUTINHO, O GENUÍNO ‘FEITIÇO DA VILA’
“Pelé para Coutinho; Coutinho para Pelé, que devolve a Coutinho, que ajeita para Pelé e… gol, meus amigos, é mais um gol espetacular, memorável, do imbatível Alvinegro Praiano”. Era mais ou menos assim que os locutores narraram mais de mil vezes em jogos do Santos. Ora quem fazia gol era Pelé, ora Coutinho, o aniversariante do dia. Conheça um pouco mais sobre esse grande ídolo do futebol.
por André Felipe de Lima
Quem o viu jogar sabe que Coutinho é um dos maiores centroavantes da história. Pelé jamais teria um parceiro de ataque como ele. Se Pelé não existisse, Coutinho talvez não brilhasse tão intensamente. É o que muitos especulam. Mas acho isso injusto. Coutinho sempre teve luz própria. Não o vi jogar, mas os registros de vídeo das tabelinhas dele com Pelé são sensacionais. Nunca vi dois jogadores de ataque se entenderem tão bem como eles. As gerações mais recentes se encantam com Messi, Suarez e Neymar. Um trio verdadeiramente formidável. Mas experimentem ver os vídeos de Pelé e Coutinho. Não se arrependerão, tenho certeza.
Juntos, os dois ídolos santistas marcaram 1.456 tentos. Mas Coutinho sozinho foi capaz de marcar 370 gols [fez 399 ao longo da carreira] em 457 jogos por somente um time: o Santos, ora. É o terceiro maior artilheiro santista em todos os tempos e, eventualmente, chamado de “O Feitiço da Vila”, como batizou o locutor Ernane Franco, e de (bem antes de o Cruyff “batizar” o Romário) “Gênio da Pequena Área”.
O ex-zagueiro Aluísio de Almeida, o “Bolero’, do Flamengo, chegou a confundir a dupla Pelé e Coutinho, na goleada de 7 a 1 que o Rubro-negro sofreu no Maracanã, em 11 de março de 1961. “Eles entraram tabelando e saiu outro gol. O time do Santos não parava de atacar. No final, não sabia mais quem era Pelé, quem era Coutinho, na velocidade eles se pareciam”, contou. Alguns repórteres pediam aos dois craques alvinegros que usassem um esparadrapo no pulso para que não se confundissem.
Chama-se Antônio Wilson Honório. E onde se enquadraria o “Coutinho” em seu nome? Mistério até hoje sem explicação. Mas foi com o apelido que o craque santista ficou famoso, pelos dribles, gols e tabelinhas geniais com Pelé. Ambos tinham predileção por fazer gols no Corinthians. Pelé marcou 50 e Coutinho, 13. São os dois maiores artilheiros santistas contra o Timão. No Verdão, Coutinho fez 14, e no São Paulo, repetiu a mesma dose. “Sou do interior, de família humilde, família bastante pobre, onde todos trabalhavam. Eu, inclusive, comecei a trabalhar com oito anos. Eu saía do colégio e ia trabalhar. E minhas irmãs trabalhavam. A partir dos meus 13 para 14 anos, começou a melhorar um pouco porque vim para Santos. Vim fazer um treino no Santos e, graças a Deus, correu tudo bem, e, aí, começou as coisas, a se clarearem um pouco”, contou Coutinho para o projeto Futebol e Memória, da FGV/Cpdoc.
Parceiros perfeitos dentro de campo, Coutinho e Pelé não repetiam o mesmo fora dos gramados. Após encerrar a carreira bem antes da de Pelé, Coutinho abriu o verbo para a imprensa ao declarar que se não fosse ele, Pelé jamais alcançaria o sucesso.
Coutinho nasceu em Piracicaba, no interior de São Paulo, a 11 de junho de 1943. Treinador das divisões de base do Santos, Luiz Alonso concluiu que Coutinho seria também craque.
Quando estreou no Santos, em 17 de maio de 1958, depois de ser descoberto por olheiros no XV de Piracicaba, Coutinho tinha apenas 14 anos e 11 meses de idade. É o jogador mais jovem a jogar pelo clube na equipe principal. O jogo amistoso foi em Goiânia, contra o Sírio Libanês, e o Santos venceu por 7 a 1.
Com o time da Vila Belmiro, Coutinho venceu os campeonatos paulistas de 1960, 61, 62, 64, 65 e 67; a Taça Basil de 61, 62, 63, 64 e 65; o torneio Rio-São Paulo de 1959, 63, 64 e 66; o Roberto Gomes Pedrosa [Taça de Prata], em 68; a Taça Libertadores da América e o Mundial Interclubes, ambos em 1962 e 63. Foi artilheiro do Rio-São Paulo de 1961, com nove gols, da Libertadores de 62, com seis, e da Taça Brasil de 62, com sete.
Pela seleção brasileira, Coutinho marcou seis gols em 15 jogos. Estreou contra o Uruguai, em julho de 1960. O último jogo foi em novembro de 1965, contra a Hungria. Foi campeão das taças do Atlântico [60], Oswaldo Cruz [61/62], Bernardo O’Higgins [61] e Roca [63]. Atuou com Pelé nove vezes pela seleção. Na Copa de 1962, no Chile, Coutinho viajou e retornou contundido. “Não dei muita sorte em seleção brasileira. Eu me machuquei muito. Me machuquei demais na seleção brasileira, até que chegou um ponto em que eu não queria mais, entendeu? Não queria mais. Seleção, fico torcendo, é melhor. Pelo menos, fico torcendo, não acontece nada, porque eu vou lá para tentar ser o titular e eles me convocam como titular e eu não jogo. Acabo me machucando. Eu jogo e acabo me machucando. Então, fiquei meio cabreiro com o negócio de seleção”.
Além de contusões seguidas, o atacante tinha problemas para manter o peso. Em 1968, jogou pelo Vitória, por uma temporada em que marcou seis gols. Em 1969, defendeu a Portuguesa de Desportos e fez um gol no Paulistão. Voltou ao Santos, em 70, mas logo foi para o Atlas, do México, onde marcou 10 gols. Entre 1971 e 72, Coutinho defendeu o Bangu, marcando somente dois gols. Parou de jogar aos 30 anos, em 1973, no Saad de São Caetano do Sul, fazendo quatro gols na segunda divisão do Paulistão.
O melhor parceiro que Pelé já teve retornou à Vila Belmiro para trabalhar nas categorias de base e foi campeão paulista de 1979, na categoria juvenil A, e em 1980, no juvenil B. Treinou o profissional em 1981 e depois foi vice-campeão da Taça São Paulo de Juniores. Treinou Comercial e Aguidana, de Mato Grosso do Sul, Santo André, São Caetano, Bonsucesso e Valeriodoce, que levou à semifinal do campeonato mineiro de 1985. Em 1993, mais uma passagem pelo juvenil do Santos.
É de Coutinho o gol de número 5000 da história do Santos. Não poderia ficar em melhores mãos. Ou melhor, em melhores pés. Coutinho foi um cracaço!
DESPEDIDA
por Leandro Ginane
A bola estava prestes a rolar e, com os olhos fixos no campo, o menino sentia a pulsação do seu coração subindo pela garganta. Estava ansioso para entrar no campo de terra batida, em São Gonçalo.
O juiz apitou, a bola rolou e aquele menino de sorriso largo jogou como se fosse a última vez. Depois daquele jogo, sua vida mudaria. Assinou contrato com apenas dez anos com o clube de coração. Saiu de São Gonçalo. Foi para a Gávea. Saiu da arquibancada e foi para o campo. Estava no lugar que sempre sonhou.
Sua ascensão foi meteórica. Conquistou as crianças e os velhos. Vestiu a amarelinha, ganhou tudo que disputou e seis anos depois assinou contrato com um grande clube na Europa. Viveu cada segundo intensamente, jogando por amor. Se despediu como ídolo no maior palco do mundo, diante da Maior Torcida do Mundo que o acolheu desde a chegada e gritava seu nome.
O sorriso largo deu lugar às lágrimas e com ele desabou a Nação. Sua vontade era ficar. Com apenas dezessete anos vai desbravar o mundo, sem a dança do passinho e o rubro-negro que o consagrou.
Boa sorte, Vinícius! A Nação estará aqui torcendo e esperando sua volta.