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QUEM ERA MÍOPE, AFINAL?

por André Felipe de Lima


Para muitos, João “Sem medo” Saldanha estava louco ou, no mínimo, no ápice de seu furor costumeiro, que oscilava entre um estilo docemente ranzinza e ações capazes de desferir um tiro. O ex-técnico Yustrich e o ex-goleiro Manga conheceram bem esse traço da personalidade de Saldanha. Mas a “loucura” que causou uma comoção nacional aconteceu durante as eliminatórias para a Copa do Mundo de 1970. Saldanha, então treinador do escrete canarinho, chamou de míope ninguém menos que Pelé, e publicamente e sem subterfúgios, como era sua característica. Papas na língua não eram do seu feitio. Sob o pragmatismo que lhe era comum, falava que Pelé tinha dificuldades para cabecear a bola e que enxergava mal à bola em jogos noturnos.

A notícia desencadeou uma comoção nacional. A imprensa se incumbiu disso. Saldanha tivera acesso aos exames oftalmológicos de Pelé, que acusaram graus de 2 no olho direito e de 2,5 no esquerdo. Os médicos se lixaram, afinal a miopia, especialmente no grau detectado no Rei, não lhe traria transtornos em campo. A prova disso é que Pelé foi em campo o que jamais outro será. João Havelange, que presidia a Confederação Brasileira de Desportos, a antiga CBD, não gostou do, digamos, excesso de sinceridade de Saldanha. Ambos iniciaram ali uma animosidade nos bastidores da seleção, que culminaria na saída do treinador, sobretudo após a interferência do então presidente da República, o ditador Emílio Garrastazu Médici, que impusera a convocação do centroavante Dario, despertando a ira do João “Sem medo”.

Zagallo, que ocupou o lugar de Saldanha em 70, sempre afirmou que a rusga entre Pelé e o então técnico começara numa preleção. O Rei questionara o esquema tático adotado no jogo contra os argentinos. Saldanha respeitou a opinião, mas conhecendo seu histórico é previsível o desfecho do “debate” com Pelé. Quando Zagallo assumiu (palavras do próprio Velho Lobo), Pelé pediu ao novo comandante para que não fosse mais sacaneado como vinha ocorrendo.


por André Felipe de Lima

“A miopia ficará pior. Há um ano, mais ou menos, percebi que Pelé já não enxergava direito. Isso explica suas más atuações no Santos e na própria seleção. Precisamos de muito mais do que meio jogador. E Pelé, como está, é meio jogador, pelo menos em partidas duras como as que teremos no México”, resmungara João nos jornais logo após sair da seleção. “Isso é golpe dele. Saldanha sabia que ia ser demitido e, por isso, me barrou, usando-me como uma espécie de ‘bode expiatório’. Ele sabe, há muito tempo, que tenho uma ligeira deficiência visual no olho direito. Desde 1958, quando participei de uma seleção pela primeira vez, essa minha miopia, que penso ser hereditária, é conhecida por todos que estão ligados ao futebol”, rebatia Pelé.

Muitas décadas depois do episódio Pelé voltaria a falar da miopia que tem desde a infância. Até aquele exame em 1969, ignorava o problema ocular. Não o incomodava. Afinal, o cara já batera a marca dos mil gols quando bateu boca com Saldanha. No Santos mesmo já haviam identificado a miopia. Ninguém deu bola para isso na Vila Belmiro. Somente Saldanha, pelo visto, encasquetou. Resultado: barrou Pelé e deflagrou a sua fritura no cargo.


A imagem do Rei no banco era inimaginável, mas Saldanha ousou desafiar as forças da natureza futebolística ao retirar Pelé do combate. Para muitos, uma infâmia. Resignado, o Rei sabiamente aceitou o banco (com reservas, claro), que, sabemos, seria repentina e indolor. Retomou a camisa dez que lhe é ternamente de direito, jogou uma barbaridade na Copa e trouxemos, em definitivo, para casa a “finada” Taça Jules Rimet, roubada na noite de 19 de dezembro de 1983 e, certamente, derretida. Mas essa é outra história. E, para encerrar o papo, Pelé terminou a carreira usando lentes de contato.

SENNA E PELÉ

Tentativa de entender a ingratidão de um povo…

por Israel Cayo Campos


Como diria Rauzito, eu também vou reclamar. Gosto muito do Senna como piloto, mas não dá pra comparar. Até aposto que numa votação de quem foi o melhor, Senna ganhe de lavada! O fato do povo brasileiro ser racista de carteirinha e não aceitar um negro como o maior atleta de todos os tempos, a proximidade das gerações, o fato da Globo ter criado uma aura quase santa em Ayrton e, principalmente, o fato de ele ter morrido aos olhos de todo povo brasileiro contribuem pela predileção do povo pelo piloto! Quando Pelé morrer farto em dias, acho difícil que essa geração se importe!

Para justificar tamanho desrespeito com alguém que nos deu tanto, aquela desculpinha bem safada de que Pelé não é ídolo por suas atitudes na vida pessoal! Como se o telhado de todos que lhe apontam o dedo fosse de aço! A velha história de ele não ter reconhecido a filha continua como pretexto, o que por sinal não é verdade! Pois após exame de DNA (até porque ele não tinha como saber depois de 30 anos se era pai da Sandra Regina), ele não só a reconheceu legalmente, como até hoje paga pensão para seus netos, filhos da já falecida ex vereadora de Santos, mesmo esses já tendo ultrapassado os 18 anos de idade! 

O que ele nunca quis foi ter contato com uma pessoa que depois de 30 anos aparece dizendo que é sua filha! O que é direito de cada um e não cabe a ninguém julgar! Agora dizer que ele não assumiu a filha é o cúmulo da desculpa falsa para atacar o Pelé! Por sinal, antes de Sandra Regina aparecer na mídia, as desculpas eram outras, como a dele não se orgulhar da própria cor, o que beira ao escrutínio perseguitório de uma sociedade conservadora como a nossa! 


Quanto a vida pessoal de Ayrton, compreendo que é até chato falar dos mortos… Mas se vale uma análise crítica igual a que fazem com a de Pelé, foi sempre uma existência blindada pela Globo. Era o famoso príncipe do Brasil (sua cor e boa aparência ajudavam nisso). Suas mensagens de cunho religioso hipócrita, pois nas pistas ele não agia conforme suas frases, hoje repetidas na televisão e em foto-mensagens de Instagram e Facebook, sua visão conservadora e malufista, e principalmente o fato de sempre ter se colocado naquilo que eu chamo de monopolista da verdadeira virtude! Pois tudo que ele dizia, ou fazia, não importa se fosse a maior abobrinha do mundo, era e ainda é tido como a verdade absoluta inquestionável! E ai daqueles que discordarem, pois os fãs de Senna são tão fanáticos como hooligans ingleses! Mostram que Senna nunca foi o santo infalível que até hoje o pintam!

Com isso não quero denegrir a imagem de Senna, quem sou eu para isso, mas viso mostrar que ao contrário do que a maioria dos brasileiros pensam, a vida não é uma novela. Onde há sempre um vilão e um mocinho. Se Pelé cometeu erros na vida, Senna também os fez, e perdi as contas! 

Se Senna foi o maior atleta brasileiro em esportes individuais de todos os tempos, ele não foi metade do que Pelé é para o Brasil como atleta em um contexto geral! Embora tenha certeza que quando o Edson for embora, não terá metade do respeito que Ayrton teve ao morrer (o que também não questiono, foi muito merecido!).

Senna também era espetacular. Campeão em todas as categorias de base do automobilismo e tricampeão do mundo na Maclaren com 31 anos! Até o aumento no número de Gp’s por temporada, era o vencedor absoluto da principal categoria de automóveis do planeta com 41 vitórias (fora as que venceu, mas foi garfado por Jean Marrie Ballestre) e 65 pole positions. Até hoje o Rei do principado de Mônaco, no autódromo de Monte Carlo! Mas em comparação a outros pilotos da fórmula 1, Senna não entra nem entre os cinco maiores da história (Schumacher, Fangio, Prost, Vettel e Hamilton estão a frente do tricampeão mundial brasileiro). 


Já no caso de Pelé, em um esporte onde surgem muito mais desportistas de alto nível do que em algo tão caro e elitista como a Fórmula 1, o eterno camisa 10 reina absoluto! Mesmo que alguns digam que Maradona ou Messi sejam melhores, a quantidade de pessoas que concordam com tal opinião é ínfima. O que me leva novamente a não entender o motivo de tamanha aversão pelo Rei do futebol, curiosamente no “país do futebol”…

Gosto de Fórmula 1, e assim como fã de Ayrton, também sou de Fangio, Stewart, Clark, Lauda, Hunt, Fittipaldi, Peterson, Prost, Hamilton e principalmente de Gilles Villeneuve (que nunca ganhou um campeonato do mundo!), assim como além de Pelé no futebol, admiro Garrincha, Di Stéfano, Zico, Romário, Zidane, Cruyff, Cristiano Ronaldo, Messi, Maradona, Ronaldo e tantos outros… Não pelo que eles fazem ou fizeram em suas vidas pessoais, mas sim pelo que eles representam e representaram para ambos os esportes!

São dois exemplos de cidadãos brasileiros que venceram no mundo todo, e merecem todo o respeito por isso (inclusive da irmã e da viúva não assumida de Senna, que não param de se promover as custas de um finado). Mas construí esse texto para tentar entender o motivo de no nosso país um ser tão exaltado e outro tão execrado! A conclusão que chego é que Pelé, cidadão do mundo, além de bem maior esportivamente falando que Ayrton (e isso é uma grande honra para ambos), não merece o país onde nasceu! Infelizmente!

A COPA DO MUNDO E SUAS INJUSTIÇAS

por Mateus Ribeiro

Todos nós sabemos que o futebol está longe de ser um esporte dos mais “justos”. Coloco a palavra entre aspas, porque se pararmos para pensar, existe uma justiça no futebol: quem faz mais gols vence o jogo. E fim de papo.

Porém, sempre existem aquelas equipes que cativam muita gente, e quando perdem algum campeonato, deixam a sensação de que o resultado não foi o mais justo. E a Copa do Mundo é um grande palco para grandes dessas “injustiças”.


Quem é que não se lembra, ou nunca ouviu falar do Brasil de 1982 e de 1986? Um time recheado de jogadores do mais alto escalão, comandados por um dos treinadores mais cultuados e respeitados da historia do futebol brasileiro. Na Espanha, foi Paolo Rossi quem acabou com o sonho brasileiro. Quatro anos depois, no México, a França e as penalidades máximas fizeram com que milhões de pessoas lamentassem o fato de Zico, Sócrates, Telê Santana, Leandro, Osar, Waldir Peres, Éder, Cerezo e tanta gente boa terminasse a carreira sem uma Copa do Mundo no currículo.

O povo brasileiro ainda pode se gabar de ter cinco mundiais, dois desses conquistados depois das decepções oitentistas. E onde é que os holandeses encontram conforto, após três vice campeonatos?


A Laranja Mecânica deixou o planeta chocado com sua forma de jogar. Comandados por um gênio chamado Johan Cruijff, em 1974, foram derrotados pela eficiência dos alemães. Quatro anos mais tarde, na Argentina, já sem seu principal jogador, perderam para os donos da casa. Até hoje, as derrotas são lembradas. Na Copa da África, em 2010, Robben e seus companheiros tiveram a chance de lavar a alma de seus compatriotas, mas esbarraram no sólido time espanhol, e amarguraram mais uma vez a tristeza de perder uma final de Copa do Mundo. Já neste último caso, vale ressaltar que qualquer Seleção que vencesse iria ser lembrada. Não que a Alemanha de 1974 ou a Argentina de 1978 não fossem merecedoras (apesar do “polêmico Argentina x Peru…), mas até hoje, fica a sensação de que aquele time da década de 1970 merecia um título de Copa do Mundo. Na verdade, a Holanda merece estar no seleto hall de campeões mundiais. Uma pena que em 2018 não disputarão o Mundial.


Outro caso bastante falado é o de Messi. Um dos maiores jogadores dos últimos trinta anos, o argentino não conseguiu conquistar o tri para sua seleção. É bem verdade que suas companhias em 2010 e 2014 eram um tanto quanto contestáveis. Porém, para o povo argentino, tão apaixonado por futebol, não importa que Messi tenha conquistado o Universo pelo Barcelona, encerrar a carreira sem dar um título para a Argentina no futebol profissional vai ser uma marca em sua vitoriosa jornada futebolística.


Cristiano Ronaldo, seu eterno “rival”, até poderia entrar nessa estatística, mas se lembrarmos que Portugal tem uma relevância bem menor do que a Argentina no futebol, e que os gajos foram campeões europeus em 2016 (mesmo com o craque não jogando a final, e com a seleção passando de fase na bacia das almas…), a barra do jogador do Real Madrid fica limpa. Seria o mesmo, por exemplo, que lamentar o fato da Irlanda da Norte não faturar um Mundial contando com George Best.

Voltando a falar de seleções, tivemos injustiças quase criminosas, cometidas em 2002. Ou ninguém se lembra da “forcinha” que a Coréia do Sul recebeu contra Itália e Espanha? É claro que os coreanos só foram beneficiados porque conseguiram chegar até as fases finais., portanto, seria leviano de minha parte afirmar que só alcançaram o quarto lugar por erros de arbitragem. Mas não dá pra ignorar o gol mal anulado contra a Itália, a expulsão de Totti, os gols anulados contra a Espanha, e por fim, o goleiro Lee Won Jae praticamente dividindo a bola com Joaquín para defender sua penalidade máxima.

Ainda no campo das zebras, mas falando das “zebras do bem”, podemos citar a Croácia de 1998, que por pouco não chegou na final,o que poderia facilitar (ou dificultar) as coisas para o Brasil naquela fatídica final. Também vale lembrar da Bulgária em 1994, que foi parada apenas na semifinal pela Itália. Mas isso já é mais algo sentimental, de torcer pelo time menos expressivo. Algo parecido com o fenômeno São Caetano do início do Século presente.

Para 2018, o Brasil chega como grande favorito. Vocês, caros leitores, irão considerar uma injustiça qualquer outra seleção que não a Canarinho vencendo a Copa? Opine nos comentários!

Até a próxima, ótima Copa do Mundo

LEMBRANÇAS DA COPA DO MUNDO

por Jorge Eduardo Faria

Em 1962 eu tinha sete anos completos. Morava num pequeno prédio de quatro andares perto do Campo de São Bento em Niterói, que era o nosso grande quintal, meu e da minha turma, a “Turma dos Sete”, como a do programa da antiga TV Record (canal 7), nossos ídolos. Eu era o Juca. 


Domingo, dia 29 de junho, depois do almoço, a turma se reuniu na portaria do prédio para ouvir o jogo. Mas faltava uma coisa muito importante. O rádio. E agora? O jogo iria começar às 15h, e a gente tinha que arrumar um rádio. Foi então que o “Chuvisco” chegou, e avisou que o pai do Mauro tinha colocado o rádio em cima do muro da casa para todo mundo ouvir. Foi uma correria só. Lembro-me que o Serginho levava no bolso um amarrado de chilenas e uma cabeça de nego. 

A casa do Mauro era do lado da padaria do Seu Antonio. O pai dele tinha colocado um fio longo lá de dentro da casa até o radio, um poderoso Mullard de seis válvulas e três faixas de ondas, que imponente, e cheio de estática, nos fazia ouvir a voz de Fiori Gigliotti anunciando o inicio do jogo: Brasil x Tchecoslováquia, diretamente de Santiago do Chile. 

A turma ainda tentava se arrumar na calçada quando Masopust, considerado o melhor jogador da Europa, marcou o primeiro gol dos Tchecos. Foi uma ducha de água fria. A gente já não tinha Pelé, e ainda levava um gol no comecinho do jogo. Não dava pra acreditar. 

De onde eu estava não conseguia escutar direito o rádio, então entrei na casa do Mauro, passei com cuidado por baixo do fio que ligava o rádio e subi no muro, me sentando bem do lado daquela caixa enorme com três faixas de onda. Não demorou muito para o João, o cara metido a mau da rua, chamar a minha atenção.

– Se derrubar o rádio vai levar uns cascudos!

 Fingi que não escutei e fiquei lá, que nem pardal no final da tarde, quietinho, empoleirado, tentando ouvir o jogo. E não demorou quase nada, Amarildo empata o jogo. Me jogo lá de cima no meio da galera. A turma toda se abraçou e comemorou junto. Aí eu falo. Todo mundo para o lugar que estava, que deu sorte. E corri de volta para o muro. E novamente o João Valentão falou comigo.

– Ô guri, já não te falei pra não ficar aí? 

E o pai do Mauro, que o tempo todo tinha acompanhado a minha peripécia, bateu o martelo da cadeira da varanda.


– Deixa ele aí. Deu sorte. Todo mundo no lugar que estava na hora o gol.

Aí eu estufei o peito que nem pombo, cheio de moral. O meu lugar, a partir de agora, era do lado do rádio. 

O primeiro tempo acabou 1 a 1. A turma correu para a padaria do Seu Antônio para tomar um suco de groselha bem gelado, servido naqueles copinhos cônicos de papel e suporte de plástico. O Serginho então tirou uma chilena do bolso, acendeu e jogou do lado do gato que, preguiçosamente, cochilava em cima de um saco de batatas (sim, naquela época padaria também vendia batata). Saímos correndo e ficamos de longe esperando a explosão e o susto do gato dorminhoco. Serginho fazia a contagem regressiva. O pavio vai se aproximando do papel. A turma toda põe a mão nos ouvidos. Serginho diz …. “é agora” … e puff … a bomba falhou. Nem precisou esperar mais, todo mundo caiu de molho no Serginho.

– Vai começar! – gritou o Mauro, e a turma voltou, cada um pro seu canto, pra ouvir o segundo tempo.

Era a época do rádio, e a voz do locutor nos levava pra dentro do estádio, imaginando os nossos craques lutando pra virar aquele jogo. E os locutores passavam toda a emoção na narração. Seu olhos eram os nossos sonhos de um dia estar vendo de perto uma final da Copa do Mundo. E aos 25 do segundo tempo Amarildo faz um estrago pela esquerda e centra na cabeça de Zito. Era o gol da virada. Era o gol do Bi. E a turma toda estava abraçada de novo, pulando juntos, até o óculos do Alfredo cair no chão e quebrar. Para tudo. O Alfredo faz cara de choro imaginando a bronca que ia levar da mãe, mas a turma é solidaria e diz pra ele que todos juntos íamos à casa dele explicar que o óculos quebrou por acidente, e ele não teve culpa. A partir daí resolvemos ficar todos juntos, ao lado do Alfredo (o Sabe-Tudo). 


Mas a tristeza não durou muito. Aos 34 minutos Vavá, depois de uma pixotada do goleiro Tcheco, só teve o trabalho de empurrar a bola para dentro do gol. Brasil 3 a 1. Os rojões se ouviam por todo o bairro, e não queriam parar mais. O Brasil era Bicampeão Mundial de Futebol. E a turma toda junta, abraçada, voltava para o prédio cantando.

– A Copa do Mundo é nossa. Com brasileiros, não há quem possa!

Na portaria do prédio nos divertíamos com uma chuva de papel picado, confetes e serpentinas. Serginho então tira do bolso todas as suas bombinhas, chilenas, e junta tudo com uns pedaços de serpentina no canto da calçada da portaria, e prepara uma fogueira de bombas. Não satisfeito, pega a cabeça de nego, acende e enfia por baixo de tudo.


Quando a galera viu aquilo, nem precisou ninguém mandar. Saiu todo mundo correndo. Ia ser a nossa super explosão em comemoração ao título do Brasil. De longe a gente só vê aquela fumacinha subindo … subindo … subindo… e parou. Caramba, falhou novamente? Corremos todos para lá pra ver o que tinha acontecido, e na hora que a galera colocou a cara bem pertinho da fogueirinha de bombinhas, ela explodiu. Me lembro que fiquei com os ouvidos apitando por um bom tempo. Mas não importava nada. O Brasil era campeão. 

Essas são as lembranças da minha primeira Copa do Mundo, e desde aquela época até hoje, sempre que vai começar uma nova Copa, eu me lembro deste episódio, e me lembro dos meus amigos. Alguns eu encontro até hoje, outros já se foram, a maioria eu nunca mais vi. Mas eles estão vivos na minha lembrança, a Turma dos Sete, de uma época em que ouvia a Copa do Mundo e se sonhava estar em campo com os nossos heróis.

Bons tempos … bons tempos!

GOLS ILUSTRADOS


“Quando observo um torcedor ou ex-jogador vendo meu desenho, naquele olhar vejo que voltam no tempo e se permitem sentir aquela emoção novamente”. Durante uma das muitas trocas de mensagens da nossa equipe com a rapaziada que nos segue no Facebook, fomos surpreendidos com uma bela coletânea de gols ilustrados. Se no futebol não existe nada mais mágico do que o contato da bola com a rede, o ilustrador Marco Sousa tratou de usar sua habilidade com as mãos para eternizar esses momentos. Com rabiscos fiéis à realidade, o artista desenvolveu o projeto GOLS ILUSTRADOS, que, como o próprio nome diz, conta com jogadas que entraram para a história de alguma maneira.

Tudo isso começou em 1977, quando seu pai mostrou uma Revista Placar com 24 gols do Corinthians no Campeonato Paulista ilustrados pela dupla Gepp e Maia. Se encantou pela produção dos artistas e deu o “pontapé inicial” ilustrando o gol de Basílio que tirou o Timão da seca.

A equipe do Museu quis saber mais sobre a vida de Marco Sousa e o resultado dessa resenha vocês poderão conferir abaixo:


Como foi seu início na ilustração?

Foi bem cedo, aos 7 anos. Eu pegava caderno da escola e ficava desenhando ou tentando desenhar Godzila, mergulhadores do seriado “Viagem ao Fundo do Mar”, entre outros. A ilustração de Futebol surgiu em 1977, quando meu pai me mostrou uma Revista Placar que contava com 24 gols ilustrados do Corinthians da conquista do Campeonato Paulista daquele ano. Aqueles desenhos da dupla de ilustradores Gepp & Maia me conquistou de tal maneira que pensei comigo: “Nossa, que show estes desenhos! Vou desenhar igual a eles ou melhor um dia, e acho que consegui o meu objetivo”.

Qual foi o primeiro gol ilustrado?

Foi com certeza o gol do Basílio de 1977, porque assim que eu peguei a Revista daquela época já fui rabiscando o gol que já havia sido ilustrado pela dupla Gepp & Maia.

Quando a “brincadeira” começou a ficar séria?


Em 1989! Fiz contato na Revista Placar e consegui falar com o Walter (Anjinho), um cara fantástico e que me deu vários toques de como melhorar o desenho. De 1992 a 1994, ilustrei em edições especiais para a Revista Placar, uma experiência única e maravilhosa para o desenho que ainda não estava como eu queria, mas foi muito válido o trabalho.

Você ilustrava seus gols também?

Claro, mas com o tempo os desenhos foram se perdendo. Cheguei a procurar por muitas vezes, mas nunca achei. Eram gols de peladas e também de campeonatos disputados no futsal e no futebol de campo. Confesso que alguns eu imaginava fazendo pelos clubes aonde fiz peneira e passei, mas não dei sequência.

Já teve algum contato com a dupla Gepp & Maia?

Há muitos e muitos anos, se não me falhe a memória em 1994. Lembro que eles ficaram comigo no estúdio deles para me mostrar como era aquela fábrica de desenhos e tudo mais que eles faziam naquela época, mas eu resolvi seguir meu caminho.


Qual foi o gol mais difícil de ilustrar?

Até hoje não surgiu desenho difícil de se desenhar, alguns foram complexos, como o gol do Basílio de 1977 e o gol do Falcão de 1976, aquela tabela de cabeça não foi fácil!

Em média, quanto tempo demorava para ilustrar um gol?

Para ilustrar um gol, defesa ou jogada de outro esporte coletivo tipo NBA, NFL, lembrando que também ilustro jogada de tênis, demoro de 2 a 3 dias. Agora quando o prazo é curto para emissoras e jornais costumo levar umas 5 horas.

Por que houve esse intervalo de 1998 a 2012?


Parei de ilustrar em 1998 porque fiquei triste e sem perspectiva para o desenho, e voltei em 2012 sonhando com possibilidade de patrocínio ou ajuda ao trabalho e projetos Gráficos que tenho na gaveta. Fora que para comercializar o trabalho preciso muito de apoio de patrocínio.

Já foi chamado para participar de programas de televisão por conta dos desenhos, correto? Quais foram?

Sim já participei do Tá na Área em 2015, na SporTV, do Esporte Fantástico, na Record, CBN – Rádio, em 2014, e neste ano estive no RESENHA – ESPN.

Onde jogava bola na infância? Chegou a treinar em clubes? Quais?

Jogava bola na rua, pés descalços no asfalto e em estacionamentos lá no Conjunto Habitacional José Bonifácio. Os colegas viram que eu levava jeito para a bola e começaram a me levar para jogos pela região. Fui fazer peneira no São Paulo, Juventus e Portuguesa, passei nos dois primeiros quando tinha 14 anos, mas não fui aos treinos e deixei de lado, pois gostava mesmo era de jogar futsal. Com 18 anos resolvi buscar uma oportunidade no futebol de campo e, através de indicações, fui até Limeira, consegui uma avaliação no Inter e fiquei no clube durante alguns meses, mas desanimei totalmente. 

Por que abandonou o futebol?

Fui até onde me foi permitido, não tive apoio e nem forças para continuar. Vi e vivi momentos chatos no meio da bola e isso me desanimou muito, mas depois somente lazer.

Ainda joga peladas? 


Hoje, com 51 anos, não jogo mais, somente brinco com um de meus filhos de gol a gol. Já tem quase 4 anos que não disputo uma peladinha.

Qual é o seu time e quem é o seu maior ídolo no futebol?Eu já deixei de lado a fase de torcedor e passei a torcer pelo GOLS ILUSTRADOS, meu desenho. Nos anos 80, torci e vibrei muito com Flamengo de Raul, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior, Andrade, Tita e Adílio, Zico, Nunes e Lico. Aí tivemos a seleção de 1982, que seleção! Mas acho que faltou o Careca ali na frente, só isso! E nos anos 92 e 93 o São Paulo tinha um timaço comandado pelo mestre Telê capaz de encarar qualquer clube do planeta.

Por fim, o que é a ilustração para você? Qual é a importância de eternizar esses momentos mágicos do futebol?

A ilustração é tudo em minha vida profissional, pois desde 2013 tenho tirado meu sustento dos gols ilustrados ou pelo menos tento. Já trabalhei com um pouco de desenho, mas em outra área, durante 30 anos em agências de Propaganda, mas o desenho sempre esteve presente.

A importância em ilustrar aquele gol, aquela defesa, aquele momento histórico do futebol é muito mágico mesmo, pois é um dom que foi me dado para eternizar o que o artista fez dentro das quatro linhas e eu transfiro para meu desenho, imortalizando para sempre aquele momento. Demais poder fazer isso.

Quando observo um torcedor ou ex-jogador vendo meu desenho, naquele olhar vejo que voltam no tempo e se permitem a sentir aquela emoção novamente.

Agradeço a Deus por este dom maravilhoso.