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FUTEBOL NO CÉU

por Émerson Gáspari


Confesso que nem sei como aquilo foi me acontecer.

Recordo-me vagamente de algumas coisas: o hospital, o suor escorrendo pelo rosto do doutor, as dores atrozes, a face de minha esposa em prantos dizendo-me algo que não pude ouvir. Tentei me despedir dela, mesmo sem entender direito o que ocorria.

Não sei se consegui balbuciar um “Amo você!” antes de cerrar os olhos. Juro que tentei, com todas as minhas forças. Espero ter conseguido.

Minha esposa e o futebol foram as coisas que mais amei na vida.  

Mas agora tudo ficou muito escuro, frio e ainda mais incerto, neste túnel estreito, longo e angustiante pelo qual atravesso, mesmo sem saber onde vai dar.

É nesse momento que me recordo de minha mãe, recentemente falecida, mas que passou por experiência semelhante, quando foi considerada clinicamente morta em 1968, justamente em razão de meu parto, que apresentara complicações. 

De súbito, o corredor chega ao seu final e à minha frente surge uma claridade intensa, radiante, que ofusca os olhos, impedindo que se veja do outro lado.

Por um instante eu hesito. Até que a coragem sobrevém, tomo impulso e adentro o desconhecido. Imediatamente o cenário se modifica por completo.

Pareço pisar em algodão, pois o chão agora é todo branco e azul, irregular e muito, muito macio. Não vejo nada construído.

A paisagem é de uma beleza incomparável e o “teto”, todo azul, se encontra com o piso, branco-azulado, a uma distância incalculável, naquilo que, creio eu, costumam chamar de firmamento.  Ao longe, árvores frutíferas abrigam pequenos grupos de crianças, todas vestidas de azul e branco, que cantam cantigas de roda, conversam e se alimentam de suas frutas.

Interpelo-me sobre o que aconteceu: será que morri?


Consigo lembrar claramente que estava com inúmeros problemas de saúde, desempregado e em situação difícil, esquecido pelos amigos, afastado dos familiares e que as únicas coisas que vinham fazendo minha vida valer à pena ultimamente, eram o amor incondicional de minha esposa e os textos baratos que eu semanalmente escrevia para o Museu da Pelada, com direito a resenhas formidáveis, depois.

Todavia, tudo isso agora soava deveras distante e irreal para mim.

Decidi me sentar e diante daquele vazio contemplativo, preferi fechar os olhos, atendo-me somente às lembranças do que vivi.

Pela minha mente, toda minha vida passou como num filme interminável. Os primeiros anos – a infância e adolescência – tão felizes, ainda na minha querida terra natal. Meus pais, os amigos, os professores do colégio Divino Salvador, os jogos do meu time, o Paulista de Jundiaí, acompanhados pela rádio Difusora ou no estádio Jayme Cintra.

Depois, os tão sofridos anos na fase adulta; já em Ribeirão Preto: a dura acolhida, a faculdade não completada, a fome, as oportunidades profissionais negadas, a triste desilusão com as pessoas, a morte dos meus avós e pais, o câncer de minha esposa.

Meio século de vida recordado em pormenores.

As alegrias, tristezas, conquistas, frustrações, amizades, conflitos, doenças, amores…

E me emocionei muito, muito, muito!

Em meu coração, a saudade infinita do amor de minha vida; a primeira vez que a vi, o primeiro beijo, o casamento, nosso convívio tão prazeroso, apaixonado, que chamava a atenção de todos pelo modo singular como nos amávamos.

Além do sentimento de missão inacabada, por não conseguir sequer sobreviver como escritor esportivo e ainda por cima, justamente quando o Museu da Pelada entra na minha vida, perco as resenhas, as amizades, o direito de escrever transmitindo todo o meu saudosismo por um tempo no qual o futebol viveu seu auge.

Permaneci ali, sentado e introspectivo, por um período que não consigo mensurar. 

Ao final, só me restou o sentimento de gratidão pelas experiências que pude ter e por isso mentalmente agradeci ao Criador, desculpando-me pelas vezes em que blasfemei ou não fui um bom filho. Então, abri os olhos e a paisagem permanecia a mesma. As árvores, as crianças ao longe. Foi como se aquele tempo incomensurável que passei recordando toda minha vida, na verdade representasse alguns poucos segundos, no céu. Muito intrigante… especialmente quando olho para baixo e tomo um susto!

Sem que eu houvesse me apercebido antes, vejo que minhas mãos estão menores.

Não apenas elas; mas também meus braços, pernas…todo meu corpo parece pequeno. Infantil, eu diria. Apalpo meu rosto e sinto sua maciez, a ausência de barba. Talvez eu esteja com meus dez anos de novo… mas como e porque?


De repente, as crianças param de brincar e uma delas vem ter comigo. É um garotinho mais ou menos da minha idade (aliás, todas parecem ter uns dez anos, também). 

Ele se aproxima e com um sorriso sincero, me convida:

– Venha com a gente! Já está na hora!

Sem fazer a mínima ideia do lugar para onde vão, obedeço. Até porque, não quero ficar sozinho. Ele percebe as dúvidas pairando em minha cabeça e começa a me explicar, no caminho:

– Percebi que você ainda está confuso. Não tenhas medo! Aqui, somos todos felizes; não há fome, guerra, doenças.

– Mas porque somos crianças? – pergunto, angustiado.

– A idade é mera ilusão! O ancião, o velho, o adulto, o jovem e a criança nada mais são que o mesmo ser, em épocas diferentes. Habitam o mesmo corpo, que apenas se modifica, entende? Aqui, somos crianças, pois é justamente nessa idade que possuímos o coração mais puro, livre de inveja, raiva, preconceito, ganância, avareza, competitividade, vaidade, ódio. Só temos espaço no peito, para o amor.

Confesso que estremeci com as palavras do meu amiguinho. Lembrei-me de que, em vários textos que escrevi em vida, aconselhei as pessoas a fazerem o mesmo que eu fazia: deixarem uma foto da infância sempre à mão para se perguntarem todos os dias: “Onde foi que me perdi de mim e como faço para reaver o coração que eu tinha?”.

Escrevia isso no fundo, por observar que a vida mundana prostituía nossos mais tenros sentimentos, transformando-nos em seres humanos piores, com o tempo. Isso lá podia ser chamado de “evoluir”?

– Você não precisa ficar triste, aqui! Todos nós temos uma vida celestial feliz e plena. E não sentimos tédio, pois costumamos vir para cá, todos os dias! – diz meu agora entusiasmado colega, apontando para frente.

Então olho e mal posso acreditar no que meus olhos testemunham: no meio daquele chão de nuvens, há uma imensa depressão, oval, com uma espécie de degraus em toda a volta, sendo que, bem no centro daquela cratera, existe uma superfície lisa. Boquiaberto, pergunto:

– É um teatro de arena?

– Não! É nosso campinho de futebol! – ele responde, já descendo alguns degraus.

Só daí, reparo nas traves (coloridas, como o arco-íris) e nas demarcações do campo (em branco) contrastando com o “gramado” (inteirinho em azul claro).

Juntamo-nos então, às centenas de garotos, todos atentos ao “campo”, onde um joguinho parece prestes a começar.


Surgem dois times mirins, um de azul e outro de branco. Todos descalços; aliás, como nós. Ninguém parece usar sapatos, no céu. E o jogo começa! Noto que não há xingos.

Não dão pontapés, nem ao menos cometem faltas. Jogam realmente muito bem! Melhor inclusive, do que eu costumava ver ultimamente na TV, quando era vivo.

Percebo na equipe branca, um garotinho quase ruivo, que parece se multiplicar, correndo, incansável, por todos os lugares do campo. E o reconheço:

– Cruyff?!

– Não sei! Mas esse aí não para em lugar algum; só falta querer jogar de goleiro! – esclarece-me o companheiro ao lado.

Então observo os demais garotos do time branco. O goleiro é o único que usa roupinha preta e só pode ser o Yashin, porque realmente é excelente debaixo dos três paus.

Há um loirinho bem alto, que atua ali atrás e sabe sair jogando como ninguém. Questiono meu parceirinho de arquibancada:

– É o Beckenbauer, não é?

– Não sei! Não conheço nenhum deles, pelo nome. Você o conhecia?


Noto que meu amigo não é exatamente um entendido de futebol e por isso, me ponho a lhe explicar um pouquinho de cada um. Interessado, ele me pergunta se conheço os demais, também. Olho mais um pouco e vejo um bem gorduchinho, cabelo penteado para trás, que chuta forte, com a perninha esquerda, gorda e curta.

– Só pode ser o Puskas… seu apelido era “canhãozinho pum”, lá na Terra.

Meu coleguinha solta uma gostosa gargalhada e pede:

– E quem são os outros?

– Olha; aquele branquelinho ali, que corre pela direita, muito rápido, driblando sem parar, com certeza é o Stanley Matthews. Já o garotinho negro, atarracadinho, na área, creio que seja o Eusébio. Ah… tem ainda aquele outro loirinho, que joga atrás, ao lado do Beckenbauer… é Bobby Moore, com toda certeza! Agora estou entendendo: é uma seleção mundial, formada por jogadores que já se foram… apesar de que tem gente aí no meio, que ainda não havia morrido, quando vim para cá… como é possível isso?

Ele me explica:

– Na verdade, todos que aí estão já se despediram da Terra. Acontece que nossos dias são contados como os dias de Deus, não como no calendário terrestre, entende? Você, por exemplo, está aqui, faz apenas um ou dois dias. Mas na Terra, isso deve equivaler a dez, vinte anos. Compreendes agora?

– Puxa – respondi surpreso – por isso, quando estava recordando minha vida, tive a sensação de que aquilo durara muito menos tempo do que na Terra, então!

– Sim, isso mesmo! Aqui, algumas coisas são diferentes: além do tempo, não existem vários idiomas, porque o céu pertence a todos, ninguém é dono de um território, um país. Note como os meninos dessa “seleção mundial” mesmo, que você falou, conversam tranquilamente, uns com os outros, em campo.

– Tem razão, amigo!

– E o outro time? Conheces alguém, também? – prosseguiu ele, curioso.

Fixo os olhos naquele gramado celestial (que loucura!) e começo a prestar atenção no time azul, agora. Aliás, um azul bem escuro, parecido com o manto de Nossa Senhora. Meu Deus! É a cor do uniforme reserva da Seleção Brasileira. Foi com ele que conquistamos nossa primeira Copa do Mundo. Será?

De repente, irrompe lá de trás, a figura de um garoto negro, alto, driblando os outros meninos na maior segurança… é Domingos da Guia, o “Divino Mestre”. Ele então se livra de todos e quando sai da área, entrega para um companheiro, que recebe o passe na maior categoria e começa a descer pela esquerda, atravessando o meio de campo.


– É Nilton Santos, o “Enciclopédia”!

– Ri, ri, ri… diverte-se de novo, meu amiguinho celestial.

– E aquele ali, negro e elegante, que recebeu a bola de cabeça erguida e fez um passe cheio de curvinhas é o Didi “Folha-Seca”.

– Ri, ri, ri… cada apelido gozado!

Nisso, noto que a bola vai parar no cantinho, para onde corre um garoto caboclinho, de perninhas tortas. Ele dribla para a direita e seus marcadores vão caindo sentados, um após o outro. Formam até uma pequena fila, antes de serem driblados.

– E esse doidinho, quem é? Ele é o que melhor dribla aqui; ainda bem que o chão de nuvens é fofo, senão a garotada ia se machucar, de tanto tombo que leva, com ele.

Pus a mão no ombro dele e respondi:

– Esse foi o maior driblador que o mundo já teve, querido. Chamava-se Garrincha e tinha os apelidos de “Anjo das Pernas Tortas” e de “Alegria do Povo”.


– Aqui ele é o que traz mais alegrias, mesmo… veja só como todo mundo se diverte, com os dribles dele.

Lancei um olhar mais apurado pela plateia e percebi que muitas meninas assistiam, também. O público mirim era variado: havia crianças loiras, morenas, negras, ruivas, amarelas, vermelhas, albinas…  parecia até uma amostragem de todos os povos, ali reunidos, igualzinho eu costumava ver, quando era “vivo”, nas Copas do Mundo.

Porém, ninguém estava lá para se exibir, nem portava aqueles insuportáveis celulares. Em campo, também não havia juiz, muito menos VAR, porque ali – segundo meu amigo – ninguém julgava ninguém. “Que Maravilha!” – pensei comigo.

Volto minha atenção para a equipe azul: percebo facilmente que o goleiro é Gylmar e que o garotinho que corre pela lateral direita, com pinta de capitão, só pode ser Carlos Alberto Torres.

De repente, um dos “brasileirinhos” carrega a bola pelo meio e se livra da marcação de um rival fortinho, de pernas grossas, que logo identifico como sendo Obdúlio Varela. Trata-se de um moreno miudinho, de estilo de jogo clássico. Acredito ser Zizinho. Quando ele levanta a pelota para a área de trivela, tenho convicção disso.

A redonda chega até um garoto negro, espremido entre Bobby Moore e Beckenbauer. Súbito, ele se joga para trás e golpeia a bola com o peito do pé direito.

– Gente, esse é o Leônidas! Tá dando uma bicicleta!

Meu parceiro me conta que dois novatos, que chegaram ainda hoje ao céu, vão entrar em campo, agorinha mesmo: um deles, bem baixinho, cabeludo, começa antes e na primeira bola, desembesta a correr e a driblar, dando trabalho para a zaga.

– Parece que se chama Dieguito: é tudo o que sei! – revela meu acompanhante.

– Só pode ser o Maradona!


Então, a jogada prossegue. A bola vem pelo alto na área e ele, não a alcançando com a cabeça, soca-a para dentro da meta. Mas faltou malícia, pois todo mundo vê e o gol acaba não valendo. Tive ali a certeza de que era o próprio e ri, balançando a cabeça.

– O que foi? – pergunta meu amigo.

– Nada! – desconverso e indago sobre o outro que iria entrar.

– É aquele da equipe azul, ali: dizem que se chama Dico.

Olho para o garotinho negro, magrinho e não acredito no que vejo:

– Pelé! Não pode ser… meu Deus!

– Ei, desse aí me lembro, lá na Terra. Também, quem não o conhecia? Era o melhor de todos; o “Rei”! – conclui meu amiguinho, agora entusiasmado.

Então “Dico” (apelido de Pelé na infância) apanha uma bola na intermediária e vai vencendo seus marcadores. Atravessa o meio-campo e aplica chapéus, rente às cabecinhas dos adversários que se interpõe. Invade a área e marca um “gol de placa”.

Foi um jogo simplesmente “divino” – na acepção da palavra – como vocês podem imaginar.  Ao final daquela inusitada pelada, todos nós da plateia nos levantamos e aplaudimos demoradamente.

Ninguém foi molestá-los, querendo tirar “selfie” para postar em alguma rede social, nem pedir a camisola azul de algum craque (sim, porque aqui no céu, todas as crianças usam uma espécie de camisola). Nada a ver com aqueles anjinhos barrocos, com asas e peladinhos, como nos acostumamos a apreciar, pintados em telas, aí na Terra.


Foi daí que, lembrando no nosso mundo, me fiz triste novamente, por relembrar de minha esposa, exatamente quando deixávamos o “estádio”, sabendo que amanhã haveria nova “pelada no céu”, com aqueles craques todos.

– Porque estás triste, se o Paraíso é lugar apenas para alegrias? – questiona meu amiguinho celestial.

– Porque não sei o que é felicidade longe do futebol e de minha companheira! Sem um ou outro, não tenho alegria plena.

Nisso, noto que uma criança se aproxima ao longe, trazendo outra pelas mãos, a qual chora muito. Porém, mesmo em prantos, ela traz consigo um andar suave, que a mim, soa familiar.

Quando se aproximam mais, quase desfaleço de tanta emoção: o jeitinho tímido, a pele morena, o cabelinho de índia, as canelinhas compridas, os dedinhos tortos dos pés, as mãozinhas delicadas, o rosto tão bonitinho, os olhinhos puxados.

– Juciara! É você, minha querida?

E ela, com as lágrimas escorrendo pelo rosto a lhe encharcar o largo sorriso, responde com voz baixinha e meiga, apenas, a frase que mais pronunciávamos nos últimos tempos, um para o outro, na Terra:

– Juntos, juntos, sempre juntos!

Abraçamo-nos com tamanha emoção, que até mesmo os que estavam à nossa volta, se emocionaram também. Por impulso, beijei muitas vezes a sua face e encerrei com um “selinho”. Foi daí que me arrependi, pensando que era pecado e que seria punido.

Mas meu amigo me tranquilizou, rindo e dizendo:

– Não se preocupe! Aqui somos todos, crianças: nossos gestos de carinho são sem maldade, sem malícia. Vivemos o amor mais puro, que vem do fundo dos nossos corações e se sofremos muito lá em baixo, aqui recebemos a dádiva da felicidade eterna. Agora sim, sois felizes para todo o sempre.

Lembrei-me das palavras de Jesus: “Vinde a mim as criancinhas, pois delas será o reino de Deus”. Era exatamente isso que estávamos vivendo, naquele lugar tão bom.

Despedimo-nos com a promessa de nos reencontrarmos no dia seguinte, no mesmo “estadiozinho celestial”. Meu amiguinho me pediu apenas, para que fosse mais cedo, pois queria conversar comigo, antes da partida.

Passei o restante daquele dia, muito feliz ao lado de minha amada. Colhi algumas flores (sim, elas florescem nas nuvens, aqui no céu) e com elas, lhe fiz uma coroa, para adornar sua cabeça.

Ela então me mostrou algo que trouxera consigo, do mundo: um indiozinho fantoche, chamado “Juço”, o qual, talvez por termos tratado como “filho” lá na Terra, havia – sei lá como – podido entrar também, a exemplo dos cães e gatos que algumas crianças carregavam, no céu. Muito interessante!

Outra passagem me veio à cabeça: a de Lázaro, quando questionado pelos outros – então espantados com sua ressurreição – sobre como era a tal vida em outro plano. Ele teria lhes respondido: “É engraçado… não notei muita diferença”.

Pois era mais ou menos assim que eu agora via as coisas, ali: uma espécie de mundo infantil, puro, sem maldade e no qual nossa missão, bem cumprida, resultara na felicidade eterna, sentindo Deus presente, o tempo todo.

Recostei-me ao pé de uma árvore e Juciara acomodou a cabeça em meu peito, sob a noite mais estrelada que já havíamos contemplado. Adormecemos.

Enfim, chegou o dia seguinte e me dirigi com minha Juci, até o “estadiozinho” mais cedo, conforme combinado. Ao descermos os degraus das arquibancadas, notei, entretanto, que os “torcedores” estavam no campo, ainda sem jogadores, pois a partida iria começar só mais tarde, um pouco.

Foi quando meu coleguinha, apontando para nós, levantou-se, dizendo para os demais, que permaneceram sentados:

– Eles chegaram! Aproximem-se amigos, estávamos vos aguardando, mesmo.

Quando terminamos de descer e cheguei ao seu lado, ele me apresentou a todas as outras crianças e disse:

– Este aqui conhece todos os jogadores que atuam em nossa liga celestial, como lhes falei. Por serem “deuses do futebol”, jamais perguntamos nada aos jogadores, por puro respeito. Gostaríamos que você nos contasse sobre cada um deles. Como jogavam lá na Terra, em que times atuaram, quais títulos ganharam, enfim; suas histórias, dentro e fora dos gramados… podeis fazer isso por nós, irmão?

E eu, vendo aquelas carinhas tão simpáticas, ávidas pelas incríveis histórias que só o futebol proporciona e já me sentindo literalmente “nos céus” com aquela situação, respondi a eles, com alegria infinita:

– Queridos! Vou lhes contar todas as histórias que sei e até que elas se esgotem, creio que deverão ter chegado aqui também, dois amiguinhos meus, que saberão lhes contar outras, ainda mais legais do que as minhas.

Foi quando meu amiguinho me perguntou, já ansioso:

– E quem são eles? Assim já nos avisam, quando chegarem às portas dos céus!

Respondi, com um sorriso de satisfação:

– Serginho Pugliese e PC Cajuzinho… esses sim, são “ferinhas” ! Vocês não perdem por esperar! Com eles aqui, poderemos ter algo que vocês vão adorar: o “Museu da Pelada dos céus”…

 

A JAQUEIRA DE FRIAÇA

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Bebi durante grande parte de minha vida, mas só entrei nesse vício após parar de jogar, talvez por saudade da vida maravilhosa dentro de campo, dos títulos, amizades, craques, Maracanã lotado, enfim o futebol é apaixonante. Mas imagino os que beberam por desgosto, por aquela bola decisiva na trave, pelo detalhe, o descuido fatal. A injustiça dói, destroça.

Estou lendo “Dossiê 50”, do saudoso Geneton Moraes Neto, jornalista raro, desses que desapareceram das redações. Ele ouviu o carrasco uruguaio Ghiggia e todos os brasileiros de 50.

Os atletas da seleção atual deveriam ser obrigados a ler esse livro para perceberem a colossal diferença de comportamento entre as gerações. É o que sempre tento, em vão, explicar aqui. Não falo sobre a qualidade do futebol, mas a forma de enxergá-lo.

Em um trecho, Danilo, o Príncipe, diz: “Parecia o presidente da república descendo do carro, vaiado. Mas era eu chegando em casa após a derrota”. Impossível não chorar. E desabafa Juvenal: “Perder aquele jogo para o Uruguai foi como perder uma guerra. Não pedíamos prêmio, nada, nem sabia quanto ganharíamos. Quem vai para a seleção tem que defender a pátria”.


Só nesses dois depoimentos ficam claríssimos dois pontos muito discutidos atualmente, o distanciamento entre o ídolo e a torcida, e a transformação do jogador em mercadoria. Me dói imaginar a dor do lendário Zizinho e comove ler o seu depoimento: “Meu sonho era assim: a gente ainda iria jogar contra o Uruguai. Aquilo que aconteceu era mentira”. E a de Bauer: “Vim para ser campeão. Voltei para São Paulo no chão do trem”.

Meu Deus, imaginam algum convocado de hoje vivendo essa tragédia? E a de Bigode, junto com Barbosa apontado como um dos culpados pelo gol uruguaio: “Tempos depois fui jantar em um restaurante com a minha esposa quando ouvi na mesa ao lado: olha ali o culpado pela derrota. Fui embora”.

A vitória era certíssima e os 200 mil torcedores não tinham a menor dúvida disso. E leio Barbosa dizendo: “Só três pessoas calaram o Maracanã, Gigghia, Frank Sinatra e eu”. Como adoraria me agarrar aos ponteiros do relógio e voltar atrás, recontar aquela história. Queria ser o vento para soprar aquela bola de Gigghia para longe. Ah, Deus, me transforme no feiticeiro do tempo, me dê poderes, seja lá o que for, mas não deixe esses homens sofrerem tanto. Esquece, PC, todos já partiram carregando esse peso!!


Fecho o livro, mas guardarei essa história eternamente comigo porque não posso admitir que a dor da derrota seja banalizada. Ou o futebol é paixão ou não é.

Hoje a frieza impera. Não comparo a qualidade dos jogadores de hoje com os de outrora, mas a relação que tinham com a torcida, do amor que sentiam pela camisa da seleção. A mudança de comportamento e de poder aquisitivo, a tecnologia, nada pode ser capaz de espanar esse sentimento bom e profundo.

O futebol é amor, drama, entrega, dor, vitórias e injustiças. A pureza fazia o nosso futebol mais leve e plástico. Já fomos bailarinos, hoje somos robôs. Precisamos de mais doçura, como a refletida na frase de Friaça após a derrota de 50: “O trauma foi enorme. Quando dei por mim, estava embaixo de uma jaqueira”.  

CHUVEIRINHO COM O CANO QUEBRADO

por Victor Kingma


No final dos anos 60, o Atlético-MG, treinado por Yustrich, tinha uma jogada mortal: os cruzamentos precisos do ponteiro esquerdo Tião para as cabeçadas de Dario. A jogada, inicialmente batizada de “cavadinha” e que acabou sendo eternizada como“chuveirinho”,  consagrou o grande Dadá Maravilha, recém chegado ao Galo, vindo do Campo Grande, do Rio.  Foi responsável por muitos de seus gols.

Certa vez, no último coletivo antes de um clássico contra o Cruzeiro, o grande rival, Yustrich, estranhamente, passou boa parte do treino ensaiando lances pela direita.

Tião, isolado na ponta esquerda, logo questionou o treinador:

–  Me desculpe, professor, mas nosso ponto forte é o “chuveirinho!” E eu estou o tempo todo aqui sem receber a bola.


Ai o “Homão”, como também era conhecido o truculento treinador, em tom paternal, o acalma:

– Meu filho, já esqueceu de quem vai te marcar domingo? É o Pedro Paulo (vigoroso lateral cruzeirense, que batia até na própria sombra). No segundo ou terceiro cruzamento que você der em cima dele ele vai estourar o cano do seu “chuveirinho” e ai nossa jogada vai por água abaixo.

Por isso tenho que treinar alternativas com o Buião, pela ponta direita.

 

Victor Kingma

 

 

 

OS DEZ CARRASCOS

por Israel Cayo Campos


Eu admito! Sou fã de listas! E quanto mais bizarras, mas me chamam atenção e me divertem! Pensando nisso, resolvi fazer uma nova lista. Dessa vez envolvendo os 10 maiores carrascos do futebol brasileiro.

Mas ao contrário do quadro do Fred do Canal Desimpedidos, prefiro me aprofundar nessa lista com um pouco mais de história naquilo que construo. Evitando somente falar dos jogadores e clubes que surgiram juntamente com as televisões de plasma!

Vejamos a lista, e depois fiquem à vontade para concordar, discordar ou colocarem outros membros no lugar dos citados aqui…

10° Lugar: Ernest Wilimowski – Polônia 5 x 6 Brasil.


Pouca gente lembra, mas na primeira Copa do Mundo em que o Brasil se destacou, no ano de 1938 na França, a Seleção enfrentou em sua estreia a Polônia em Strasbourg.

Apesar da vitória brasileira, essa Copa nos mostrou nosso primeiro carrasco, um polonês de nome bastante complicado, Wilimowski! Nessa partida, o polonês marcou quatro dos cinco gols de sua seleção contra o Brasil! Se não fosse pela atuação de Leônidas da Silva, ele seria a primeira lembrança de um carrasco em Copas do Mundo!

Três tentos foram marcados no tempo normal, todos no segundo tempo! Sendo o gol de empate que levou o jogo para prorrogação (4 a 4), marcado por ele aos 44 minutos da etapa final!

Segundo João Saldanha, a falta de conhecimento da regra contribuiu com os gols de Wilimowski. Domingos da Guia que não sabia bater um tiro de meta chutava a bola de maneira fraca, essa era rapidamente interceptada pelo atacante polonês, que a mandava para as redes brasileiras!

A versão do goleiro brasileiro naquela partida é um pouco contraditória a de Saldanha. Batatais alegou que nesse jogo, que fora o mais disputado daquela Copa e até hoje um dos mais emocionantes da história dos mundiais da FIFA, Domingos da Guia, o “Divino Mestre”, teria entrado em campo com muita febre praticamente obrigado pelo técnico Ademar Pimenta.

Esse problema de saúde teria facilitado a vida do polonês. Batatais ainda afirmara com certa soberba que se Domingos estivesse bem de saúde, Wilimowski não passaria por ele! Mas como o “se” não joga…

Wilimowski é até hoje o único jogador a ter marcado quatro gols na Seleção brasileira em um mesmo jogo! Um feito que só não é mais lembrado do que de fato merece devido ao resultado da partida.

Como saímos vencedores da dura peleja, seguimos para o jogo contra a Tchecoslováquia,e Wilimowski ficou para os brasileiros apenas nos almanaques que contam a história dessa partida!

E só por não ter saído vitorioso, o polonês não ficou em uma posição mais à frente em meu ranking. Pois marcar quatro gols contra uma Seleção Brasileira, seja em qualquer época, com ou sem a febre de Domingos da Guia, não é para qualquer um!

9º lugar: Tore André Flo – Noruega.


Uma das raras seleções que o Brasil nunca conseguiu vencer em seus mais de 100 anos de história é a Noruega. Foram quatro jogos, sendo três em Oslo, capital norueguesa e um pela Copa do Mundo de 1998 na França. Dois empates e duas derrotas canarinhas! Essas duas derrotas se devem basicamente a Tore Flo, atacante alto e desengonçado que causou problemas ao Brasil entre os anos de 1997 e 1998.

Em 1997 um amistoso. O Brasil vinha como franco favorito a Oslo com um time que contava com um quarteto de ataque de respeito: Djalminha, Leonardo, Romário e Ronaldo. Porém, o que se viu foi um passeio norueguês comandado por Flo. O atacante marcou dois e ainda deu o passe de cabeça para o quarto gol norueguês naquela partida! Em um final indigesto, o Brasil perdia por 4 a 2 diante dos escandinavos.

Em 1998 a chance do revide, Copa do Mundo da França, a Noruega caia como último adversário do Brasil no grupo “A” do torneio. A Seleção já estava classificada. Era a hora de enfim o Brasil encerrar esse jejum!

Depois de um primeiro tempo fraco tecnicamente, uma bela jogada de Denilson e gol de cabeça de Bebeto. Até que enfim a “zika” com cheiro de bacalhau iria sair! Mas foi aí que o nosso carrasco número 9 resolveu aparecer!

Com a Noruega precisando vencer para não cair logo na fase de grupos, a única maneira era atacar o Brasil, mesmo que isso lhe custasse uma derrota por maior número de gols! Tore Flo arrancou pela esquerda, deu um corte em Júnior Baiano e empatou o jogo para os noruegueses!

Mas o empate não servia para a Noruega, já que no outro jogo do grupo Marrocos goleava os escoceses. Foi então que novamente Tore André Flo apareceu. Dessa vez sofrendo pênalti de Júnior Baiano, que estava em uma de suas noites mais infelizes como zagueiro. Rekdal bateu, converteu, virou o jogo, manteve o tabu e classificou a Noruega para as oitavas de final! Mas o herói da noite, nosso carrasco, tinha sido Tore André Flo novamente.

Embora tenha sido em um jogo amistoso, e em outro que já não valia nada numa Copa do Mundo. Se hoje a Noruega pode se vangloriar de ser uma das raras seleções que nunca perderam uma partida para pentacampeã do mundo Brasil, devem esse orgulho diretamente aos 3 gols, uma assistência e um pênalti sofrido por Tore André Flo em seus dois únicos jogos contra o “país do futebol”.

8º lugar: Ángel Romano – Uruguai 6 x 0 Brasil.


Antes do fatídico e inesquecível 7 a 1 sofrido pelo Brasil na semifinal da Copa de 2014 em casa diante da Alemanha, a maior goleada que a Seleção verde amarela havia sofrido para outra nação (levando em consideração a diferença de gols!) fora um seis a zero para o Uruguai no Torneio Sul-americano de 1920 disputado no Chile.

Nessa partida disputada na cidade de Viñadel Mar, os brasileiros sofreram dois gols de Ángel Romano, atacante do Nacional de Montevidéu. Que contribuíram para o vexame brasileiro.

Três anos antes, no Sul-americano de 1917 disputado no Uruguai, nova vitória da seleção do Rio da Prata fácil! Um 4 a 0 com direito a mais dois gols de Ángel Romano. 

Em 1921, dessa vez no Sul-americano da Argentina, Romano novamente balançou as redes brasileiras duas vezes. Dessa vez numa vitória apertada por 2 a 1. Contribuindo para mais um fracasso brasileiro no torneio continental dos anos 1920.

Totalizando, o Uruguaio marcou seis gols contra a Seleção brasileira em três jogos, todos eles em campeonatos Sul-americanos. Provavelmente, Romano foi o pesadelo dos jovens torcedores do futebol brasileiro do início do século XX, e até hoje é o segundo jogador que mais balançou as redes de nossa Seleção!

O nosso carrasco de torneios continentais entre seleções. Que protagonizou a maior derrota da história do futebol brasileiro até o ano de 2014, merece estar nessa lista!

7º lugar: Nwankwo Kanu – Nigéria 4 x 3.


Era o único título que o Brasil não tinha! Depois de dois Vice-campeonatos olímpicos nos anos 1980 e uma decepcionante desclassificação no pré-olímpico de 1992, a Seleção brasileira, campeã do mundo em 1994 chegava como grande favorita a então sonhada medalha de ouro olímpica.

Jogadores como Dida, Aldair, Roberto Carlos, Bebeto, Juninho, Rivaldo, Luizão e Ronaldo (todos campeões do mundo!) faziam parte do elenco brasileiro! Nosso grande adversário naquele torneio era a Argentina, que também possuía uma boa geração com Ayala, Chamot, Crespo, Gallardo, Claudio López, Ortega, Simeone, Sensini e Zanetti. Nenhum se tornou campeão do mundo!

Na fase de grupos, após um susto contra o Japão, duas vitórias sendo uma sobre a Nigéria com gol solitário de Ronaldo… Mal imaginávamos que era essa Nigéria que iria acabar nos complicando!

Após uma goleada nas quartas de final sobre Gana, estávamos de novo de frente com a Nigéria. Era o último passo para a final olímpica, e quando Flávio Conceição abriu o placar no primeiro minuto de jogo, parecia que aquele jogo seria um novo passeio contra uma seleção africana!

Mas logo aos 20 minutos, em bela jogada de Babayaro, Roberto Carlos acabou fazendo gol contra! Porém, a tensão logo se desfez quando em duas belas jogadas Bebeto e novamente Flávio Conceição colocaram o Brasil na frente com dois gols de vantagem ainda no primeiro tempo!

Na segunda etapa o Brasil cansava de perder gols! Alguns como em lance de Ronaldo sem o goleiro! Até que o juiz marcava um pênalti para os africanos! Jay-Jay Okocha bateu e Dida começava sua fama de pegador de pênaltis! Tudo conspirava para a classificação brasileira!

Porém, quando faltavam 12 minutos para o fim do jogo, o barraco começou a desabar! Ikpeba aproveitando roubada de bola de Rivaldo descontou para a Nigéria.E já com o tempo regulamentar terminando (faltando 20 segundos), apareceu o nosso carrasco para empatar uma partida que já estava no papo!

O jogo ia para a prorrogação ainda no estilo “Golden Goal”, e a Nigéria veio para cima… Não durou nem quatro minutos e novamente Kanu em bela jogada individual driblou a defesa brasileira e fuzilou o goleiro Dida. A Nigéria seguia para final e o sonho olímpico brasileiro era mais uma vez adiado!

A tão conhecida sorte do técnico Mário Jorge Lobo Zagallo o abandonava curiosamente em um dia 31 de julho. 31 = 13 ao contrário! Essa era a desculpa mais usada pelo Velho Lobo! Mas a verdade é que se não existisse o carrasco Kanu em campo, poderíamos estar hoje comemorando o bicampeonato olímpico!

6° lugar: Eusébio – Portugal 3 x 1 Brasil.


O ano era 1966. O mundial voltava a Europa para ser disputado na casa dos inventores do futebol, os Ingleses! E o Brasil chegava como atual bicampeão do mundo, e favorito a conquista do tricampeonato!

Com uma estreia vitoriosa sobre a Bulgária por dois a zero com dois gols de falta. Um de Pelé e um de Mané (última partida que a maior dupla de todos os tempos realizou junta com a camisa da Seleção) o Brasil começava com o pé direito rumo a mais um título.

No segundo jogo, uma derrota para a Hungria por 3 a 1, outra seleção que até pouco tempo nunca havíamos vencido em nossa história. Agora era obrigação vencer Portugal na terceira rodada. Uma seleção que apesar de ter como base o grande Benfica bicampeão europeu do início dos anos 1960, era estreante em mundiais!

Pelé que não jogara contra os húngaros machucado voltava a equipe. Era tudo ou nada! O Brasil não era eliminado numa fase de grupos de um Mundial desde o primeiro em 1930. Além da reentrada de Pelé, outras oito caras novas! A honra do atual bicampeão do mundo contra um mero estreante estava em jogo!

Logo aos 15 minutos, Eusébio, atacante do Benfica dá um belo drible em Brito, cruza na área e conta com o rebote “mão de alface” do goleiro Manga, que solta a bola na cabeça de Simões! Um a zero Portugal.

Aos 27 minutos, aproveitando bola escorada após falta cobrada por Coluna, Eusébio apareceu de cabeça para ampliar o placar! Para desespero de Vicente Feola, técnico campeão do mundo na Suécia pela Seleção brasileira, antes da primeira meia hora de jogo, o Brasil já perdia por 2 a 0.

Aos 15 da segunda etapa, Rildo marcava para o Brasil pondo fogo no jogo! Mas era só fogo de palha! Faltando cinco minutos para o fim do “match”, aproveitando uma bola escorada por Torres, o nosso carrasco lusitano nascido em Moçambique acertou um petardo sem chances para o goleiro Manga! Eusébio 3, Brasil 1. Estávamos eliminados do mundial da Inglaterra!

É bem verdade que nessa partida Pelé fora caçado em campo! Tomou chutes que o fizeram atuar até o final apenas para fazer número. Entretanto, a noite era de Eusébio, que fez o que quis com o Brasil e garantiu uma humilhante eliminação na fase de grupos. Por acabar com uma seleção que vinha de dois títulos mundiais seguidos, o carrasco Eusébio merece estar com louvor nessa lista!

5° lugar: Emilio Baldonedo – Argentina.


Desse jogador a geração recente sequer tem memória! Me arriscaria dizer que até boa parte da geração anterior a atual sequer sabe de quem escrevo. Mas se o uruguaio Ángel Romano está nessa lista como o segundo jogador a marcar mais gols na Seleção brasileira, o argentino Emilio Baldonedo não pode ser esquecido! Afinal, esse é o Museu da Pelada.

Nascido no dia 23 de junho de 1916, mesmo data a qual nasceu o polonês Wilimowski já citado nessa lista (esse deve ser o dia dos carrascos!), o atacante argentino é até hoje o jogador que mais marcou gols contra a Seleção brasileira! No total, sete tentos!

Se Romano foi nosso carrasco nos primórdios da atual Copa América, Baldonedo foi o nosso destruidor nos torneios conhecidos como “Copa Roca”, atual Superclássico das Américas. Um torneio disputado entre Brasil e Argentina desde a segunda década do século XX, até a década atual (com longos intervalos cronológicos entre um torneio e outro!).

A primeira disputa de Baldonedo contra o Brasil nesse torneio se deu em 1939, quando a Copa Roca foi disputada em terras tupiniquins. Nos dois primeiros jogos em São Januário, Baldonedo não jogou. E mesmo assim os argentinos aplicaram uma goleada por 5 a 1 no primeiro jogo.

Na segunda e decisiva partida, uma vitória brasileira por 3 a 2, com direito a um pênalti pra lá de suspeito marcado pelo juiz brasileiro Carlos de Oliveira Monteiro, vulgo “Carlos Tijolo”. Tal marcação fez com que todo o time argentino se retirasse de campo revoltado. Com a vida facilitada, Perácio converteu a penalidade com o gol vazio.

Como naquela época não havia saldo de gols, uma nova partida fora marcada dessa vez para o Palestra Itália. O torneio que ainda valia por 1939 já avançava para fevereiro de 1940, e o técnico argentino Guillermo Stabille (artilheiro da primeira Copa do Mundo em 1930), resolve lançar no time o jovem Baldonedo, ainda prestes a completar 24 anos!

Na difícil partida, Leônidas da Silva garantia a vitória na prorrogação para os brasileiros, até que faltando quatro minutos para o final, Baldonedo empatou! Era o primeiro gol dele contra a nossa Seleção. Como não haviam disputa de pênaltis e o jogo novamente terminara empatado, uma nova partida deveria ser realizada.

Sete dias depois no mesmo estádio, as duas Seleções entravam para o quarto embate na disputa pelo título. Dessa vez a Argentina venceu fácil, e Baldonedo novamente marcou, abrindo o placar para os “Hermanos” em um jogo que terminou 3 a 0. A Copa Roca de 1939 ficava com a Argentina e esse era o segundo gol de nosso carrasco! Não perca as contas!

Duas semanas depois uma nova Copa Roca. Dessa vez oficialmente pelo ano de 1940! Agora os jogos seriam realizados na Argentina, e no primeiro disputado no estádio do San Lorenzo uma goleada portenha! Seis a um, com direito ao quinto gol ser marcado por Baldonedo. Na segunda partida os brasileiros reagiram, vitória por 3 a 2. Mas nosso carrasco marcara os dois gols de honra da Argentina, o que novamente forçava a disputa do troféu a um terceiro jogo.

Dessa vez no estádio do Independiente, no dia 17 de março de 1940, outro passeio argentino! 5 a 1 nos brasileiros com direito a mais dois gols de Baldonedo, o primeiro e o quarto gol da seleção albiceleste na partida! Era o bicampeonato da Copa Roca para os argentinos, graças aos sete gols de Baldonedo!

Vale ressaltar que os sete gols que dão a Baldonedo o título de maior artilheiro em partidas contra a Seleção se deu em cinco jogos disputados pelos arquirrivais entre os dias 18 de fevereiro e 17 de março de 1940. Ou seja, em menos de um mês apenas! Um carrasco rápido e letal! Que contribuiu para a retirada de dois títulos na época muito importantes contra os nossos maiores rivais até os dias de hoje!

4° lugar: Alcides Gigghia – Brasil 1 x 2 Uruguai.


Tudo bem, esse só marcou um gol sobre o Brasil em sua brilhante carreira de jogador profissional. Mas fora o gol mais dolorido até hoje sofrido pela Seleção canarinho, que a época jogava de branco!

Era o último jogo do quadrangular final do mundial de 1950. O Brasil só precisava de um empate para o título. E era exatamente o resultado que ocorria na segunda etapa. Gigghia já participara do primeiro gol uruguaio. Recebendo uma bola de Obdúlio Varela, partiu pela ponta direita de ataque, deixou o lateral Bigode no chão, entrou a área e cruzou, Schiaffino como um bom centroavante colocava nas redes brasileiras!

Ainda servia para o Brasil, um 1 a 1 salvador! Redentor! Abençoado pelo Cristo! Até que desgraça nos abateu…

 Aos 38 minutos do segundo tempo, Julio Pérez e Gigghia tabelam novamente na frente de Bigode. Gigghia corre para ponta e os demais atacantes uruguaios vão para área. O uruguaio entra sozinho na grande área brasileira. O goleiro Barbosa antevê o lance que dera o gol de empate uruguaio e dá um passinho para a direita. Ghiggia chuta, a bola passa no pequeno espaço entre o goleiro e a trave! É o gol da virada uruguaia!

Mais de 200 mil pessoas caladas! Mais de 50 milhões de brasileiros (população da época) em profunda desolação! Um jogo que causou várias mortes! Sejam elas por enfartos ou até suicídios de torcedores, é até hoje lembrada pelo público brasileiro como uma tragédia!

Como diria anos depois o “Seu Alcides”, só três homens haviam conseguido calar o Maracanã… O Papa João Paulo II, Frank Sinatra e ele…, Mas com certeza, só ele conseguira tal façanha pelo sentimento de tristeza fúnebre dos presentes!

Mesmo depois de 68 anos e duas cinco Copas do Mundo vencidas, Alcides Gigghia ainda é lembrado como o carrasco imortal daquele dia 16 de julho de 1950 para o povo brasileiro. Por quem vale salientar, Gigghia possuía muito respeito! Se negando a falar sobre aquela final para veículos brasileiros em respeito ao povo de nosso país!

Curiosamente ou não, em um mesmo 16 de julho, só que de 2015, o “Seu Alcides”, (que assim como Jairzinho em 1970, marcou gol em todos os jogos de sua Seleção no mundial de 50!), veio a falecer. Era o último remanescente daquele triste dia na história do futebol brasileiro. Obviamente, um dos mais felizes da história da gloriosa “Celeste Olímpica”. O carrasco de apenas um gol, mas um dos gols mais doloridos da história de um país gigante, que começava a ganhar sua identidade nacional naquele período!

3º lugar: Clube Atlético Boca Juniors – Contra times brasileiros em competições Sul-americanas.


Para quem pensou que só iria falar de carrascos em pessoa física, lembramos de nosso maior carrasco em pessoa jurídica. Poucos times de massa do Brasil não tiveram um momento de pesar contra o gigante clube argentino.

Só na Libertadores da América, os “xeneizes” iniciaram sua tradição em 1977 contra o então atual campeão Cruzeiro. Vencendo nos pênaltis a final por 5 a 4. No ano seguinte, o arquirrival da raposa, o Atlético Mineiro, foi a vítima do Boca nas semifinais do torneio.

Dando um salto para o ano de 1991, ainda na Libertadores, as vítimas foram as duas maiores torcidas do país. Nas oitavas o Corinthians e nas quartas o Flamengo. Ambos eliminados no placar agregado de 4 a 2.

Mas foi nos anos 2000 que a fama de papão contra os brasileiros se alastrou! Na final do torneio daquele mesmo ano uma vitória nos pênaltis sobre o atual campeão Palmeiras. Em 2001 uma eliminação do Vasco nas quartas e novamente do Palmeiras nas semifinais. Em 2003 caíram Paysandu nas oitavas e o Santos na final. E em 2004 o emergente São Caetano também não resistiu ao time azul e amarelo do bairro de La Boca nas quartas de final. Em 2007, o Grêmio de Mano Menezes caiu na final. E em 2008, novamente o Cruzeiro foi a vítima, dessa vez nas oitavas do torneio!

Na segunda década do novo milênio, o Boca já não assustava como anteriormente! Entretanto, ainda conseguiu eliminar o Fluminense nas quartas de final do torneio de 2012, e o Corinthians nas oitavas de final de 2013 (em um jogo bastante suspeito!).

Nos torneios secundários da América do Sul, tais como a Copa Mercosul e a Copa Sul-americana, o Boca eliminou ainda na primeira fase o Corinthians no ano 2000 da Mercosul e o Internacional em 2004 nas semifinais e em 2005 nas quartas da Sul-Americana.

Na Recopa, torneio disputado entre os vencedores dos dois principais torneios da América do Sul, foi a vez do São Paulo perder em 2006 para os argentinos. Fora Supercopas e Copas CONMEBOL que não deu para contabilizar, O Boca é de longe o time que mais eliminou brasileiros nos certames internacionais!

Levando-se em consideração que o Brasil tem 12 grandes clubes (quatro de São Paulo, Quatro do Rio, dois de Minas e dois do Rio Grande do Sul). O Boca só não tem o Botafogo como vítima em torneios oficiais. Muito pelo fato do clube de General Severiano não conseguir enfrentar o Boca nesses torneios! Sendo justo e não ofensivo com os alvinegros, raramente o Botafogo se classifica para os mesmos!

Já os demais clubes, foram ao menos uma vez, ou até mais vezes vítimas do carrasco Boca Juniors.

2° Lugar: Zinedine Zidane – França.   


Em 1998, recém completados 26 anos, Zinedine Zidane era um ilustre desconhecido para o futebol brasileiro! Até então naquela Copa em casa só havia aparecido pelo “coice” dado em um jogador da Arábia Saudita que lhe custou um gancho de dois jogos no mundial. Mas “Zizou” era muito mais que um jogador temperamental. E iria mostrar justamente na final contra a Seleção Brasileira.

Antes daquela final em Paris, o único jogo de Zidane contra o Brasil tinha sido no empate do Torneio da França por 1 a 1 em jogado em Lyon um ano antes. Nesse jogo o filho de argelinos teve uma atuação discreta, mais preocupado com a marcação do forte ataque brasileiro.

No entanto, na final do Mundial de 1998, primeiro uma jogada espetacular que deixou Guivarc’h na cara do gol. Para sorte brasileira o péssimo atacante francês perdeu a chance. Mas logo duas cobranças de escanteios em posições inversas do campo. Duas cabeçadas certeiras do “carequinha”! Dois a zero para a seleção da França.

Nos acréscimos do jogo, Petit selou o primeiro título mundial francês em casa! Mas aquela era a final de Zinedine Zidane. A partir daquele jogo, a sua vida mudou! Ele se tornara uma estrela mundial. Alcançava o status de craque da bola!

No centenário da FIFA no ano de 2004, Zidane voltou a enfrentar o Brasil. Dessa vez não marcou gols, mas novamente presenteou os espectadores do “Stadede France” com lindas jogadas para cima da atual campeã do mundo. Ao final daquele jogo sofrido, o então lateral brasileiro Roberto Carlos afirmara: “O Brasil não perde mais para a França”.

Dois anos depois, no mundial da Alemanha, Zidane em suas últimas apresentações com a camisa dos “Bleus” novamente enfrentava o Brasil. Era o jogo de quartas de final entre uma Seleção que até então tinha chegado lá aos trancos e barrancos, contra a seleção mais estrelada do planeta. Com o quadrado mágico formado por Kaká, Ronaldinho, Adriano e Ronaldo.

O estrelado time do técnico Parreira mal viu a cor da bola naquele primeiro de julho de 2006. Em um lance inicial, Zidane humilhou Zé Roberto, Juninho Pernambucano e Gilberto Silva em uma só jogada. Em seguida, um “balãozinho” para cima de Kaká. E antes que o primeiro tempo encerrasse, dois dribles secos que deixaram no chão o zagueiro Lúcio e o volante Gilberto Silva. Isso sem contar os passes certeiros e objetivos do capitão da Seleção Francesa.

No segundo tempo mais show. Dois chapéus em Gilberto Silva e Ronaldo. E aos 13 do segundo tempo uma bola “açucarada” no pé de Thierry Henry. Era o gol da França que nos eliminava mais uma vez de uma Copa do Mundo. Curioso ou não, a bola foi exatamente na zona do lateral Roberto Carlos, que afirmara que o Brasil não iria mais perder para os franceses!

Antes do fim do jogo. O pobre Gilberto Silva novamente fora humilhado com um drible de giro a lá Zinedine Zidane! O juiz apitou e curiosamente todos os jogadores brasileiros que atuavam no Real Madrid, caso de Ronaldo, Cicinho, Robinho e Roberto Carlos, foram abraçar Zizou como se reconhecessem uma das maiores atuações de um jogador de futebol numa Copa do Mundo.

O famoso narrador Luciano do Valle dizia em seus comentários finais que desde Maradona em 1986, não via uma atuação tão espetacular de um jogador em uma partida de Copa do Mundo! A França seguiu rumo a final contra a Itália e o Brasil novamente ficou pelo caminho.

Zidane fica com a medalha de prata entre os carrascos da história do futebol brasileiro por todos os motivos citados anteriormente. Mas o principal é que conseguir eliminar o Brasil em uma Copa muitos conseguiram, mas eliminar em duas. Sendo o protagonista em ambas as partidas! Só Zinedine Zidane conseguiu!

1° Lugar: Paulo Rossi – Itália 3 x 2 Brasil.


1982. Estádio Sarriá em Barcelona. Futebol Arte. Melhor Seleção brasileira desde a geração tricampeã de 1970… Espetáculos nos primeiros quatro jogos, com direito a um humilhante 3 a 1 sobra a maior rival Argentina. Esse era o Brasil de Telê Santana. Do zagueiro Oscar. Dos laterais Leandro e Júnior. Dos meias Falcão, Cerezo, Sócrates e Zico. Dos atacantes Éder e Serginho. O Brasil jogava o melhor futebol e era o favorito ao tetra!

A Itália era o oposto, vinha com um futebol feio. Empatando suas três partidas na fase inicial do torneio e só se classificando no critério gols feitos! Na segunda fase uma vitória a base de muito suor e marcação sobre os mesmos argentinos por 2 a 1. O jogo que valeria vaga nas semifinais daquele torneio memorável ia ser entre brasileiros e italianos. Com o direito do empate para a Seleção canarinho!

Logo começou aquele jogo em 05 de julho e o nosso maior vilão, que havia saído de uma suspensão do futebol apenas um ano antes, entrava em ação. Cinco minutos de jogo, cruzamento de Cabrini e gol de Paulo Rossi sozinho de cabeça.

Não era a primeira vez naquele mundial que o Brasil tinha começado atrás no marcador. Era questão de tempo para haver o empate. Serginho ficou cara a cara com Zoff, mas chutou mascado para fora! Ia fazer falta…, no entanto, aos 12 minutos, o “Galinho” achou Sócrates em lance espetacular e o “Doutor” colocou tudo no seu lugar. Brasil 1 x 1 Itália.

Aos 25 minutos o lance que todo jogador de futebol faz em todas as partidas. Mas todos só lembram de Cerezo fazendo! Ao receber a bola de Leandro, o meia brasileiro passou a pelota cruzada pela área. Paulo Rossi que nada tinha a ver com a desatenção da zaga brasileira roubou a bola e como um foguete avançou até a entrada da área para balançar as redes do goleiro Waldir Peres. Itália 2 a 1. E assim terminava o primeiro tempo para assombro do mundo.

Segundo tempo. Pênaltis para ambos os lados não marcados. E o jogo seguia com pressão brasileira. Aos 23 minutos Júnior achou Falcão, o jogador da Roma fingiu o passe para Cerezo e cortou para o meio da área. Era gol! Era o grito emblemático do “Rei de Roma” tirando uma montanha das costas brasileiras. O Brasil iria as semifinais!

Hoje é fácil dizer: O Telê deveria ter fechado o jogo. Segurado o empate. Mas aquela seleção tinha um DNA ofensivo, e por esse ímpeto pagou caro. Há quase 30 minutos do segundo tempo escanteio para a Itália. Cobrança na área e no bate e rebate Paulo Rossi novamente estava lá para desviar o chute de Tardelli. A Itália mais uma vez passava a frente. Dessa vez de maneira definitiva.

Era o final de uma geração de ouro. Desde 1950 a população brasileira não chorava tanto por uma derrota no futebol. Era mais do que uma derrota. Era a substituição do futebol arte pelo futebol força onde deveria se priorizar a marcação.

Esse estilo de futebol os clubes e seleções que vieram nas gerações posteriores. Antes de pensar em vencer, era necessário não perder!

A Itália prosseguiu no mundial. Rossi fez mais três gols e saiu como o artilheiro do torneio. Foi bola de Ouro daquele ano! Para um jogador de nível mediano, foi um ano de muita sorte! Tanta sorte quanto marcar três gols sobre aquela maravilhosa geração brasileira! 

Dentre os dez selecionados como maiores carrascos da história do futebol brasileiro, tecnicamente Paulo Rossi não é o melhor! Longe disso. Mas com certeza, foi o que causou mais estragos não só ao futebol do nosso país, bem como ao futebol enquanto esporte! Por isso a medalha de ouro entre os maiores carrascos do futebol brasileiro é do “Il Bambino d’Oro” Paulo Rossi.

​​​​​​​EM ALGUM LUGAR DO PASSADO

por Walter Duarte


Uma data distante: 21/02/1979, uma vaga lembrança, um gol indesejado. Grandes momentos que instintivamente revisitamos em nossas memórias. Nas minhas pesquisas das campanhas do Goytacaz nos campeonatos estaduais lembrei-me de jogo muito marcante contra o Flamengo. 

Foi um jogo de expectativas para mim que evidentemente tinha esperança de uma vitória do Goytacaz, “OSSO DURO DE ROER” em seus domínios, em boa fase naquele ano, tendo vencido inclusive o Vasco de 3×2 em um jogo eletrizante. Apesar da insistência, não fui liberado desta vez pelos meus pais para ir ao jogo com os amigos, na maioria garotos com idade da faixa dos 12 anos, motivo de grande decepção para mim.

Restava então a companhia do velho e bom radinho de pilha e torcer imaginando estar ali, à beira do gramado. Confesso também que a presença de grandes craques na partida como: Zico, Adílio, Cláudio Adão, Carpegiani e cia. era um motivador a mais e uma certeza de muitas emoções e jogo bonito.

O Flamengo defendia uma invencibilidade de 25 jogos e encaminhava uma trajetória vitoriosa de títulos, porém sabia das dificuldades do jogo. Logo cedo, já se percebia grande aglomeração nos bairros centrais da Cidade e nos arredores do estádio Arizão. Uma festa bonita das torcidas se iniciava, com suas bandeiras sendo agitadas, um espetáculo à parte com grande cobertura da imprensa local e da Capital.


Revista Placar (Editora Abril)

Muitos torcedores vinham de cidades vizinhas e até de outros estados para presenciar estes jogos. Podia imaginar toda aquela atmosfera do estádio e o colorido das torcidas. Os times entram em campo aquele barulho ensurdecedor dos fogos e os gritos ensandecidos dos torcedores são fielmente reproduzidos.

Lembro-me de um jogo muito disputado no primeiro tempo com um certo domínio do Flamengo, porém sem encaixar uma jogada efetiva de gol. O Goytacaz defendia-se bem e arriscava-se perigosamente nos contra-ataques e aquela tensão tomava conta de mim esperando o locutor soltar aquele grito de gol.

Na defesa do Goyta jogava um zagueiro chamado Orlando Fumaça que tinha fama de violento, e chegou a ter uma passagem pelo Vasco no início da década de 80. O jogo segue no seu segundo tempo e, logo aos 7 minutos, Zico (sempre ele) faz o gol único da partida. Aguardava confiante uma reação do Goyta, quem sabe com um gol salvador do nosso artilheiro, o saudoso Zé Neto, porém nada mais ocorreu. Querendo absorver o resultado vou para a rua “arrastando” as correntes da frustração e reclamando mais do que um “cachorro atropelado”.


Revista Placar (Editora Abril)

Pois bem, tomado pela curiosidade dos detalhes desta partida surge um fato novo para mim. Este gol do Zico não foi mais um da sua gloriosa carreira. Naquele instante após uma “TRAMA DIABÓLICA” com Claudio Adão e Adílio o Galinho fez seu gol 245 na carreira vencendo a cidadela do goleiro Augusto, suplantando o seu ídolo Dida, tornando-se assim o maior artilheiro da história do Flamengo. Detalhes de uma época de ouro do Campeonato Carioca, e das artimanhas do destino.

Sem saber, estava acompanhando um jogo histórico que teve cobertura diferenciada da mídia, inclusive reportagem especial da Revista Placar. Um jogo que parecia ser mais um nas nossas vidas e que tempos depois se tornou diferente para mim, mesmo sem o desfecho desejado.


Revista Placar (Editora Abril)

Sigo procurando trazer à tona minhas recordações e este saudosismo insistente, exorcizando meus “fantasmas” futebolísticos. Certamente outras lembranças surgirão do nosso alegre futebol e ficarei feliz em contá-las para vocês. Eventos particulares de grandes jogos e personagens que ficaram adormecidos em algum lugar do passado.

Súmula do jogo

Goytacaz 0 x 1 Flamengo

-Local: Estádio Ary de Oliveira e Souza – Campos RJ

Juiz: Moacir Miguel dos Santos (RJ);

Renda: Cr$ 522.620,00;

Público (PAGANTE): 13.066;

– Gol: Zico aos 7 min do segundo tempo;

Cartão Amarelo: Zé Neto e Marquinho (Goyta), e Cláudio Adão (FLA);

– Goytacaz: Augusto, Totonho, Fumaça, Eurico Souza e Serginho. Marquinho, Manuel “Português” e Ronaldo, Piscina, Zé Neto e Zé Roberto.

– Flamengo: Cantarele, Toninho, Rondineli, Manguito e Júnior. PC Carpegiani, Adílio e Zico, Reinaldo, Cláudio Adão e Júlio Cesar “Uri Gueller”.