CAMISA 10
por Marcos Vinicius Cabral
Seja nas águas cristalinas de rios esverdeados, por onde passeiam em mansidão fúnebre e enlutada, ou em qualquer outro quilômetro sem fim, a camisa 10 nunca morre!
Nas folhas das árvores ou nas sementes das frutas comidas pelos pássaros que caem do alto e fazem companhia à corrente d’agua, ela se agiganta e demonstra sua grandiosidade.
É mais pura que a emoção do primeiro choro em vida do filho que chegou ao mundo, pois ela exorta qualquer resultado contrário à seus magnanimidade.
Selada em quatro linhas e traçadas na maternidade, ela não é nem de longe inocente e requer cuidado numa aproximação que seja.
Ah, o que dizer, da mística da camisa 10?
Talvez, diriam os insanos por futebol, como cachorro raivoso, que são ídolos mortais.
Não, definitivamente não são!
O torcedor, aquele que conhece os preâmbulos deste esporte, destina um intervalo de seu precioso tempo, e ao subir no palco, em prosa e verso, transformando em cenas inesquecíveis de uma jogada.
Se o gol arranca aplausos, o que dizer de uma jogada com um happy end no descortinar dos atos?
A mística da Camisa 10 e suas glórias resgatam uma lição poética, histórica, trazem à luz uma paixão antiga e uma infinita magia.
Uma pena que ela seja extinta cada vez mais em solo verde e inóspito por tantos pernas de pau que a vestem.
Estes merecem o pior castigo do mundo e que me desculpem os que têm compaixão deles.
Mas aos jogadores que vestiram esse número em seus clubes, cravaram seus nomes em letras folheadas a ouro que nem o tempo será capaz de apagar minha referência e ovação.
No máximo, um empoeiramento será notado, mas nada que uma pano úmido do avivamento seja utilizado.
Os torcedores que enchiam os estádios, com bandeiras, bandeirolas, diria o locutor fanático, que estremeciam as ondas sonoras do rádio com sua voz tresloucadamente de um apaixonado torcedor.
Talvez, um dia tenhamos a curiosidade de saber como é difícil ser um José Carlos Araújo ou um Luiz Penido ou um Washington Rodrigues, na ocultação dessas emoções ao microfone.
O camisa 10 repousa antes, vê o mestre aproximar-se distante, o templo (estádio) tem o sopro do dragão e a expressão de milhões de curiosos.
Zico, Platini, Maradona, Roberto Dinamite, Zidane, Rivelino, Ronaldinho e outros tantos têm um lugar especial ao lado do trono do Rei Pelé.
Portanto, o que dizer da soma de valores, em que a fama – osso do ofício – se torna ínfima para olhos que registram tanto encantamento e saúda em prosa, o artista da bola que ele é em verso?
Ali, dentro de campo, a largos passos românticos, o lance que encanta, levanta, tem brilho próprio, nota-se a marca do artilheiro, preso a um visgo, ao místico de vestir a camisa que se identifica com ele.
É a 10 sem dúvida!
Um presente aos mestres, craques e deuses do futebol arte!
Viva o futebol e seus camisas 10!
ENTRE VELHOS LOBOS E SÁBIAS RAPOSAS DA BOLA
por Zé Roberto Padilha
Todas as vitoriosas gerações do nosso futebol tiveram o privilégio de contar com uma velha raposa à beira do gramado. Usando a expressão da época, em que não haviam delimitado as cercanias do burródromo à frente do banco de reservas, “na boca do túnel”. De que valeria Mario Jorge Lobo Zagallo disputar várias copas do mundo, tantos estaduais e brasileiros pelo Botafogo, se não repassasse à frente todo o seu aprendizado? Certa vez, nos vestiários, ele nos chamou a atenção pela maneira pela qual amarrava o cadarço da chuteira. “Desse jeito, no lado interno, você vai machucar seus pés. Faça o nó do lado externo porque as trivelas são raras. Os chutes com o peito do pé são maioria”.
Parece simples, mas são dicas que vão se juntando ao contexto da sua obra, e só podem ser repassadas por quem calçou chuteiras. Teve calos e criou, pelo lado esquerdo, as funções de um ponta moderno, que armava as jogadas, fechava os meio e possibilitava, por seus deslocamentos, a subia de um Nilton Santos para abrir a contagem em 1958 contra a Áustria.
Quem sabe, o primeiro gol de um lateral esquerdo, que antes só marcava, na história das Copas? Depois de Pinheiro, Telê e Zagallo, tive como treinadores Didi, Evaristo de Macedo, Jouber Meira, Jair da Rosa Pinto, Paulo Henrique e outros monstros da arte de bater na bola. Cada um deles nos deu uma dica. Somadas, ajudaram várias gerações a jogar e se posicionar melhor.
Recordei tudo isto pensando nos jogadores do Flamengo. Que dica poderia dar o Barbieri aos seus comandados? Foi treinado por quem? Chupou gelo com quem? Quando Carlos Alberto Parreira foi técnico da seleção, colocou o Zagallo como seu auxiliar. E no Flamengo, as coisas ainda pioram quando o auxiliar se aproxima do ouvido do Barbieri. Ele veio do Futsal, e tão novo não teve tempo de conhecer nenhuma dica para auxiliar o Lucas Paquetá. Por onde esconderam o Jaime? E porque sumiram com o Adílio e o Andrade? E com que motivos dispensaram o Mozer?
No Santos, Serginho Chulapa está no banco transmitindo “vestiários”. No São Paulo tem o Raí e o Ricardo Rocha. E o Vasco tem o Waldir para dar conselhos aos garotos que sobem. É preciso que o Flamengo convoque suas lendas, como Rondinelli e o Julio César, porque não há ninguém ali por perto a marcar território. E mostrar aos que chegam o tamanho da sua glória. É preciso um desses seus heróis na comissão técnica, como Nunes, que a tenho vivido e o manto sagrado, não aprendido nas apostilas das Universidades.
Mesmo porque fechar e abrir os livros você o faz pelos dois lados. Livros não têm cadarços e não dão calos. Mas para você treinar o Flamengo é preciso conhecer, e repassar, os dois lados da sua grande história.
PÁGINA EM BRANCO
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
(Foto: Nana Moraes)
Os torcedores, como sabemos, perdem o amigo, mas não a piada. Um grupo assistia ao Flamengo x Vasco em uma mesa ao lado da minha. “A cada passe errado o Roni vai pagar um chope!”, sugeriu Porquinho. Se Roni aceitasse teria que pedir um empréstimo para não ficar com fama de caloteiro.
O vascaíno Porquinho se lembrava dos tempos de Romário, Edmundo, Mauro Galvão e quase chorava. Roni nem citava Zico. Se contentava com Obina e Brocador: “Pelo menos sabiam fazer gol”.
O jogo estava tão ruim, mas tão ruim que volta e meia Porquinho dava uma saída do bar para refrescar a cuca. Em uma das vezes, quando voltou, viu os jogadores empurrando a ambulância e perguntou: “Para aonde estão levando a bola?”. Os amigos morreram de rir, mas a verdade é que a bola tem apanhado demais. E para piorar leio que os clubes estão deixando de investir na base para comprarem “jogadores prontos”.
Lembro de uma propaganda que perguntava ‘‘Tostines é fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho?”. Peraí, como teremos jogadores prontos sem investir na base? É impossível!!! Basta os estatísticos de plantão contabilizarem o número de passes errados a cada partida. O número de faltas, de chutes longe do gol. Quantos gols de falta foram marcados no Brasileiro? Quantos gols de cabeça? Quantos gols nasceram após uma tabelinha bem construída? Quem é o melhor 10 do campeonato?
Essa tecla já está mais do que batida e fica até chato ficar repetindo, mas essa notícia foi publicada ontem, anteontem, sei lá. O número de faltas deve ter quadruplicado porque hoje cada time quer ter seu Felipe Melo de estimação. Se for falar das reclamações com o árbitro e simulações aí esse número dobra. Está chato, só isso, chato.
Me diga o que podemos esperar de um clássico Palmeiras x Cruzeiro, com Mano de um lado e Felipão do outro? Absolutamente nada. Mas os dois se acham os maiores estrategistas do planeta. Colocam 50 na zaga, um poste na frente e pronto. O time do poste com mais sorte vai ganhar o jogo. E assim caminha o nosso futebol.
Hoje cada time tem pelo menos cinco jogadores chilenos, venezuelanos, equatorianos. O Vasco trouxe um centroavante argentino de quase 40 anos. Quem é o centroavante da base do Vasco? Não saberemos nunca. São emprestados para “pegar experiência” e nunca mais retornam. Se esses sul americanos pelo menos fossem bons de bola, seria maravilhoso, mas, sinceramente, não tem sido o caso. Apoio o intercâmbio.
Só uma boa base nos salvará! Mas não me venham colocar professores de Educação Física para formar essas bases porque o resultado já sabemos: novos robozinhos. A escolinha do Fluminense se chama Guerreirinhos, não é preciso dizer mais nada. Essa filosofia de Hulks, Gladiadores, Ceifadores e He-Mans precisa acabar.
Necessitamos de super-heróis com outra mentalidade, que saibam, pintar, cantar, bailar. Precisamos de campos, não de arenas. O saudoso Armando Nogueira misturava futebol e poesia em suas crônicas. Hoje somos uma página em branco.
Paulo Almeida
capitão do peixe
por Paulo Oliveira
Fominha é o adjetivo que melhor define o meia Paulo Almeida, campeão brasileiro e capitão do Santos, em 2002, que possui carreira meteórica tanto para o estrelato quanto para o declínio. O mais importante para este esportista de Itarantim, cidade do sul-baiano a 631 km de Salvador, cuja economia está fundamentada na agropecuária e na produção de cachaça, é estar em campo.
Para quem não o conhece, chega a ser estranho vê-lo aos 37 anos, na função de técnico e jogador do Água Vermelha, time amador eliminado nos pênaltis pelo rival Bob Kennedy, nas quartas de final da competição municipal deste ano. Ou se esforçando para fazer um milagre: classificar a fraca seleção de Macarani, terra natal da mãe dele, para a fase seguinte do Campeonato Baiano Intermunicipal de Futebol, disputado por seleções de 64 municípios.
O estranhamento tem a ver com a face vitoriosa da trajetória de Paulo no futebol profissional, que o levou à Europa para defender o Benfica com apenas 23 anos.
Sua fome de bola é tanta que quando a carreira entrou em crise aceitou propostas para jogar em mercados desvalorizados do Centro-Oeste e Norte do país e passou a peregrinar pelo União de Rondonópolis, Goianésia, Rio Branco (AC), Itumbiara e Mixto. O que importava era estar em ação, mesmo que contusões atrapalhassem o rendimento.
Para não ficar longe da bola, Paulo aceita inclusive ser ‘cartola’. Hoje é o combativo presidente da Liga Itarantiense de Futebol, com mandato até 2021. Como represália às críticas que fez à política municipal de esporte não obteve verba para inscrever a seleção da cidade no Intermunicipal.
A história de Paulo, recheada de fatos curiosos – deu cartão amarelo a um juiz, dormiu o troféu de campeão Brasileiro, abandonou um grande clube para disputar um campeonato de futebol de salão no interior da Bahia, entrou em choque com poderoso empresário português e os poucos gols (quatro, se tanto) que fez na carreira – você vai conhecer agora através da parceria Meus Sertões/Museu da Pelada. Nosso repórter foi até a antiga Diadema de Pedra, hoje Itarantim, onde conversou por duas horas com um dos expoentes dos “Meninos da Vila”.
ESCOLINHA
Sem sequer sonhar que passaria por 14 times de futebol profissional, Paulo Almeida corria atrás da bola “em tudo quanto era buraco” de Itarantim para desgosto do pai. Matava aula e passava o dia inteiro batendo babas (termo baiano para pelada). Com o passar do tempo, ouvindo os amigos falarem que o filho levava jeito de jogador, seu Everaldo foi deixando de pegar no pé do garoto.
Não se opôs quando o guri passou a frequentar a escolinha de futsal Craques do Futuro, do professor Severo, do professor Sivaldo e de muitos outros que a mantém funcionando até hoje. Aos 14 anos, atuava entre os adultos. Chegou à seleção do município e foi campeão regional na mesma época em que foi levado para fazer um teste no Cruzeiro.
Seu padrinho foi Luciano Matos, dono da empresa que até hoje faz translado de equipes de fora que enfrentam o Bahia e o Vitória, em Salvador. Paulo soube por um amigo que o empresário tinha feito a ponte com o clube mineiro e convenceu os pais dele a autorizar a viagem. A tarefa não foi difícil porque o irmão mais velho, Edson, o Nem Leão, tinha sido atleta do Serrano e do Fluminense de Feira de Santana e a família, que sabia como tudo funcionava, se tranquilizou.
“Só não foi tranquilo para mim, né. Nunca tinha saído de uma cidadezinha deste tamanho para fazer teste em uma cidade grande. Chorei a semana toda. Antes só pensava em fazer parte de um grande clube. Quando eu cheguei lá, vi que não queria ficar” – conta Paulo, que permaneceu sete meses no clube, foi visitar a família no Natal e não retornou.
O jogador revela o motivo pelo qual decidiu ficar em Itarantim:
“Quando cheguei, estava tendo uma competição regional de futsal. Aí fiquei jogando, jogando e não quis voltar”.
SANTOS F.C
A oportunidade de defender o Santos surgiu da mesma forma que o primeiro teste em BH. Foi através de um contato de Luciano Matos. Quando Paulo chegou na Vila, o treinador do juvenil era Coutinho, o mesmo que formou o ataque mais famoso do mundo ao lado de Dorval, Mengálvio, Pelé e Pepe.
O time estava praticamente pronto. Faltava apenas um zagueiro. Mesmo sendo volante, Paulo se apresentou para a função e foi aprovado. Disputava o campeonato juvenil de 1998 quando foi promovido para a categoria junior. Tinha 17 anos e era o mais novo do grupo.
Foi o acaso que o fez voltar à posição original no meio-campo. Um jogador faltou a um jogo e Coutinho o reconduziu ao meio-campo.
Nada mudou até o ano 2000. O ano começou com Carlos Alberto Silva como treinador. Pouco depois, foi substituído por Giba, técnico da base que levou seus pupilos para a equipe principal e foi o responsável pela estreia de Paulo Almeida entre os profissionais. Foram cinco minutos de uma partida contra o Guarani.
No ano seguinte, as coisas não andaram bem para o Peixe. Sem nenhum grande resultado, os jogadores entraram de férias e se reapresentaram em janeiro de 2002. Nove equipes paulistas tinham desistido de participar do campeonato estadual para priorizar o Torneio Rio-São Paulo. Eliminado, os jogadores entraram novamente em férias.
“O clube enfrentava dificuldades financeiras. Os salários estavam atrasados A diretoria achou por bem liberar todo mundo. Como o Brasileirão ia começar em agosto, achávamos que só nos reapresentaríamos em junho. Mas o presidente contratou o professor Émerson Leão e voltamos a treinar no começo de maio” – recorda o meio-campista.
Sem dinheiro para contratações, o jeito foi apostar nos meninos da base. Paulo contou que no início do Brasileirão, o clima era tipo “esses são os jogadores que temos, vamos brigar para não cair”
“Deus abençoou, a gente se uniu e fomos campeões” – resume o volante.
Dito desta forma, parece que foi fácil. Longe disso. O Santos de Fábio Costa, Maurinho, Alex, André Luís e Léo; Paulo Almeida, Renato e Elano; Diego, Robinho e Alberto sofreu para conquistar a oitava e última vaga da fase final do último campeonato que antecedeu o modelo de pontos corridos.
Primeiro, Leão teve que jogar duro para não ser enrolado internamente. O pessoal da base escondia jogadores, um deles Alex (zagueiro que teve passagem pelo Paris Saint Germain, Milan e seleção brasileira), para que este priorizasse o campeonato de juniores em vez do time principal. A primeira medida foi proibir os atletas que estava avaliando de jogar em outra categoria. Alex estreou contra o Fluminense, no Maracanã, em um jogo que terminou 1 a 1.
Depois, foi preciso um resultado inesperado para o clube terminar a fase inicial em 8º lugar. Nos últimos sete jogos, os santistas acumularam cinco derrotas, um empate e uma vitória. Resultado surpreendente como a goleada do rebaixado Gama sobre o Coritiba por 4×0 ajudou os santistas a se classificar pelo saldo de gols.
O que fez os Meninos da Vila ficarem tão perto da desclassificação?
“Acho que faltou experiência. Tinha muito garoto e sempre tem alguém que quer aparecer demais. Às vezes sobe para a cabeça, desfoca um pouco. A gente pode ter pensado assim: o objetivo de não cair já foi alcançado. Também tinha a pressão da torcida, que não ganhava um título nacional desde 1968 e um campeonato paulista há quase 20 anos (o último tinha sido em 1984)” – avalia Paulo Almeida
Com a classificação, começou um outro campeonato. Era hora de fazer história no mata-mata.
O primeiro adversário foi o São Paulo, time de melhor campanha, o primeirão. Melhor em tudo – mais vitórias, melhor saldo de gols. Rogério Ceni, Kaká, Ricardinho, Luís Fabiano e Reinaldo eram os principais atletas. O tricolor tinha a vantagem de jogar por dois resultados iguais. Na Vila, 3×1 Santos. No jogo de volta, precisando fazer dois a zero para se classificar, o time da capital abriu o placar aos quatro minutos do primeiro tempo. No entanto, levou a virada na segunda etapa.
Paulo Almeida credita boa parte da vitória ao técnico Leão e ao fato dele ter acalmado a equipe no intervalo, lembrando que o Santos ainda estava com vantagem, apesar de o placar ser adverso.
“Com esta visão, ficamos mais calmos e ganhamos” – diz Paulo.
O adversário seguinte, o Grêmio, era outra pedreira. Os gaúchos tinham um dos artilheiros do campeonato, Rodrigo Fabri (19 gols). Também eram fortes na marcação. Porém,nada disso adiantou na Vila Belmiro. Os gaúchos perderam de 3×0, em dia de gala de Robinho. No Sul, o tricolor venceu por 1×0, resultado insuficiente para classificá-lo. O Santos estava na final com o Corinthians.
Paulo Almeida acredita até hoje que o rival ficou com medo de jogar em Santos. Alega que o Timão ficou preocupado diante das derrotas do São Paulo e Grêmio, na Vila, por três gols. Por isso, fez pressão para que os jogos decisivos fossem no Morumbi.
Na primeira partida, vitória santista por 2×0, gols de Alberto e Renato.
CAMPEÃO
Deixamos Paulo Almeida contar com suas próprias palavras como foi a conquista do título mais importante de sua carreira:
“O Diego lesionou logo no começo do jogo. Na realidade, ele já estava lesionado. A gente passou uma semana na concentração e ele ficou tratando a lesão. Não fez nenhum treino.A gente já sabia que ele estava machucado e que talvez não poderíamos contar com ele. Com cinco minutos de jogo, ele sentiu, saiu. Graças a Deus o Robert entrou muito bem.
Saímos na frente 1 a 0. As famosas pedaladas do Robinho.
Tomamos o gol de empate, tomamos a virada. Aí veio aquele momento de discussão, de desespero. Nada dava certo. Passa pela cabeça dos jogadores e dos torcedores.: “Será de novo?”. Com o Santos era sempre dessa forma. Chegava na final, tava indo, tomava um gol. Vinte anos nessa espera (Nota da redação: os últimos títulos do Santos tinham sido, o Brasileiro de 1968, o paulista de 1984, o Rio-São Paulo de 1997 e a Conmebol de 1998).
Naquela tarde Robinho estava bem demais. Ele fez mais uma grande jogada e o Elano empatou. No final (47’02” do segundo tempo), em outra jogada do Robinho, que passa a bola para o Léo… Essa eu vi bem porque eu estava ao lado do Léo. Era a última jogada. Assim que o Léo faz o gol, o Simon (árbitro) encerrou a partida. Foi o gol da virada.”
Além de contar os detalhes marcantes da partida, Paulo também lembrou de uma atitude importante dos jovens jogadores antes do primeiro jogo contra o São Paulo: o técnico Leão deixou o campo e os jogadores se reuniram para discutir o que estava dando errado nos últimos jogos. A conversa, segundo o capitão do time, deu resultado.
O capitão se recorda do que disse na reunião:
“Nós ali atrás vamos segurar para vocês resolverem o jogo. Vamos dar o sangue”
Depois do título, a equipe voltou para Santos e circulou pela cidade em carro de Bombeiros. A euforia foi tanta que a taças do campeonato e a que foi entregue pelo patrocinador ficaram esquecidos. Paulo relata que pegou o troféu principal e levou para casa:
“Ninguém sabia que ela estava comigo. Ela dormiu do meu lado. O Fábio Costa levou a do patrocinador. Não sei se alguém ficou procurando por elas. Só lembro que no dia da reapresentação, eu o Fábio devolvemos os troféus”
O ANO DO VICE
No ano seguinte, a bola bateu na trave para o Santos em diversas competições. No Brasileirão, o Santos ficou em 2º lugar, após perder os dois importantes jogos para o Cruzeiro no primeiro e no segundo turno. A equipe mineira foi campeã de todas as competições que disputou no ano, conseguindo a “tríplice coroa”. Paulo ficou de fora nos dois confrontos. No primeiro estava suspenso por ter tomado o terceiro amarelo. No segundo, foi barrado por causa de uma lesão na parte posterior da coxa.
Já na final da Libertadores, o algoz foi o Boca Junior, que conquistou três títulos da competição entre 2000 e 2003. Os argentinos tinham um plantel fabuloso: Riquelme, Tevez, Battaglia, Ibarra e Abbondanzieri. Foram duas derrotas (2×0 e 3×1) e um episódio que marcou a carreira de Paulo Almeida.
No segundo jogo, a partida já estava no final. Fábio Costa derrubou um jogador argentino e o árbitro Jorge Larrionda tirou o cartão amarelo do bolso para mostrar ao goleiro. Na versão de Paulo, Fabiano tirou o objeto da mão do juiz e lhe entregou. Por sua vez, o capitão santista mostrou o cartão como se tivesse repreendendo o árbitro.
“Ele podia ter me expulsado, mas levou na esportiva. Deu um tapinha no meu rosto e começou a sorrir. Acho que pensou que não ia fazer diferença me expulsar. O Boca já era campeão mesmo.”
Paulo encerraria o ano com mais um vice-campeonato na coleção: o da Copa Ouro. Realizado pela Concacaf (Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe), a 7ª edição do torneio tinha o Brasil e a Colômbia como convidados.
O volante baiano era o titular da seleção sub-23, formada pelo técnico Ricardo Gomes. Jogava ao lado de Robinho, Diego e Alex, companheiros no Santos. Na decisão o selecionado brasileiro perdeu para o México, no segundo tempo da prorrogação. O centroavante Borgetti marcou o “gol de ouro”, também conhecido como “morte súbita”.
“A partida foi na cidade do México, ao meio-dia. Altitude, calor, tu é (sic) louco de jogar nessas condições!” – comenta.
Além da Copa Ouro, Paulo diz ter jogado amistosos contra equipes paulistas e participado do pré-olímpico no Chile, classificatório para as Olimpíadas na Grécia. No último jogo, bastava o empate, mas o Brasil perdeu para o Paraguai (1×0). A explicação para a eliminação dada pelo meio-campista é que os convocados levaram para o selecionado a rivalidade entre os times em que jogavam.
“Não posso citar o nome desses atletas, alguns ainda estão em atividade” – justifica.
Para o pré-olímpico, Ricardo Gomes contou com nove campeões brasileiros. Quatro jogadores do Cruzeiro (2003) e cinco do Santos (2002).
OS ENCARNADOS
Na Libertadores do ano seguinte, 2004, o Peixe foi eliminado pelo campeão Once Caldas, da Colômbia, nas quartas de final. No Brasileiro, porém, caminhava para mais um título. Após a décima rodada, Paulo Almeida foi negociado com o Benfica.
Com a negociação comprou as duas fazendas que mantém até hoje na região centro-sul da Bahia, uma delas com área para realização de vaquejadas. Aficionado por cavalos de raça, passou a investir também em gado leiteiro e de corte.
Foi difícil conter a euforia dos itarantienses. A carreira de Paulo decolava como a de nenhum outro jogador da cidade. Até então, Zezito Tavares de Souza, o Tarantini, campeão brasileiro pelo Bahia, em 1988, era o atleta de Itarantim que mais se destacava.
Paulo, porém, sempre foi muito querido na cidade. Desde o tempo do Santos, segundo amigos próximos, ele distribuía um caminhão com presentes para as crianças de Itarantim, na época do Natal, e gostava de presentear os parceiros com garrafas de cachaça de excelente qualidade. Tal como Papai Noel, passaria a usar uniforme vermelho.
Torcedores resumem assim, a passagem do volante baiano pela “Catedral”, como também é conhecido o Estádio da Luz, em Lisboa:
“Começou como titular, foi para o banco. Foi para o Benfica B e foi para o banco do Benfica B.”
A equipe lisboeta amargava 10 anos sem título na Primeira Liga quando contratou Paulo Almeida. O técnico era o italiano Giovanni Trapattoni, com passagem vitoriosa pela Juventus, Internazionale (ITA), Bayern de Munique (ALE) e seleção irlandesa. Na versão de Paulo, tudo ia bem até a direção guindar o empresário Antônio José da Silva Veiga, conhecido como José Veiga, ao cargo de diretor-geral de futebol.
Veiga chegou a ter 24 jogadores do elenco encarnado. E, de acordo com Paulo, “se não fosse jogador dele não jogava”:
“Comecei a questionar isso e passei o resto da temporada fora do time. Treinava para não quebrar contrato. O Trapattoni, quando acabou o campeonato pegou o boné e foi embora. Ele falou que ia tirar um tempo de descanso. Não passou um mês, acertou com o Stuttgart, da Alemanha, aí fui entender o porquê das coisas. Ele não conseguia trabalhar, era muita interferência” – conta.
O Benfica foi campeão da temporada 2004-2005 e Veiga ganhou força. Em 2006, no entanto, deixou o clube, acusado de irregularidades financeiras na compra de ações de um banco luxemburguês. Dono de empresas em países africanos e no Brasil (Aspebras), Veiga foi detido em 2016, acusado de corrupção, fraude fiscal e lavagem de dinheiro na venda do Novo Banco de Cabo Verde.
Hoje, Paulo se arrepende de ter rescindido o contrato que tinha, segundo ele, até 200
8. Diz que era novo e queria retornar ao Brasil, mas se fosse hoje, com mais experiência, teria esperado o dirigente sair.
Oficialmente, ele foi relacionado em 27 partidas pelo Benfica. Em onze (13,25%) começou como titular; em quatro (4,8%) estava no banco, mas foi aproveitado; e em 12 (14,46%) ficou no banco. Nesta temporada, o time lusitano fez 83 jogos, segundo o site transfermarket.pt. Ou seja, o brasileiro só ficou disponível em 32,5% dos confrontos.
Paulo também se contundiu em um jogo na Bélgica. Era a primeira vez que entrava em campo com temperatura negativa e não se aqueceu direito. Sentiu uma fisgada e passou um tempo em tratamento. A única alegria que teve foi fazer parte da foto do elenco campeão da temporada 2004/2005, embora não tenha tido participação constante na temporada.
CORINTHIANS
Com o dinheiro obtido na passagem por Portugal, Paulo também adquiriu um apartamento em São Paulo, estado para o qual retornou em 2006, contratado pelo Corinthians. Outra experiência difícil. Primeiro, a relação entre o clube e a MSI (Media Sports Investments), um fundo de investimentos sediado em Londres, começou a ruir.
O empresário iraniano Kia Joorabchian, representante da MSI no Brasil, e o presidente do Corinthians Alberto Dualib foram acusados de lavagem de dinheiro, evasão de divisas, sonegação e formação de quadrilha. O ambiente ficou tumultuado. Em campo, Paulo conta que sofreu uma lesão no ligamento colateral medial, que vai da tíbia ao fêmur.
“Aí as coisas desandaram um pouco” – admite
Em 2007, ao se recusar a ficar no banco, foi afastado pelo técnico Leão. Além disso, a contusão o deixou um bom tempo fora de ação. Foi neste momento que apelou para um artifício usado em momentos críticos: se refugiou em Itarantim.
Ao retornar para o Corinthians, encontrou tudo mudado. Havia um novo técnico, Paulo César Carpegiani, que fizera várias alterações. Resolveu encerrar o contrato com o alvinegro do Parque São Jorge.
PÉRIPLO
A partir daí, passou por um punhado de clubes. Nessa época, circularam histórias de que foi dispensado pelo Coritiba, ABC e Náutico por deficiência técnica, o que nega categoricamente.
“Nunca joguei no Coritiba. Quando estava no Corinthians cheguei a negociar com eles, mas não fui por causa da lesão no joelho. Também nunca joguei no ABC. No Náutico a conversa é outra. Tenho uma ação na Justiça contra o clube há dez anos por falta de pagamento. Esse foi o motivo de minha saída. Entrei na justiça e ganhei em todas instâncias. O único recurso que cabe ao Náutico é me pagar” – conta.
De Pernambuco, Paulo Almeida passou sete meses no Irã, defendendo o Saba Qom Football Club. Ficou impressionado com a beleza do país, com o clima de tranquilidade nas ruas e com o desenvolvimento do futebol. Só estranhou o período do Ramadan, mês em que os muçulmanos jejuam durante o dia e só se alimentam à noite e de madrugada.
Registrou que também atuou pelo Asteras de Trípoli em período inferior a três meses. Reclamou que “o combinado não foi cumprido”.
Da paradisíaca Grécia, seguiu para um périplo por times de menor expressão. Passou pelo União de Rondonópolis (MT), Goianésia (GO), Rio Branco (AC), Itumbiara (GO), Mixto (MT) e Uberlândia (MG). Nesse período, foi campeão pelo União, em 2010, no único título conquistado na história do clube, e pelo Rio Branco (2011).
Perguntado porque optou por centros de menor tradição no futebol e se a escolha teria sido por falta de opção, Paulo pensou um pouco antes de responder:
“Nunca quis voltar para o Santos, já tinha feito história lá. Podia ter ido para algum clube de São Paulo, até mesmo os intermediários como Santo André e São Caetano. Eu acho que a minha escolha pode até ter sido errada, mas foi por causa de meu amor pelo futebol” – diz.
CONQUISTA
Paulo Almeida encerrou a carreira no Esporte Clube Primeiro Passo, nome oficial da agremiação que é mais conhecida pela cidade onde está localizada: Vitória da Conquista, a 180 km de Itarantim.
Quando assinou com o clube, os jornais paulistas publicaram matérias dizendo que o ex-capitão do Santos ia ganhar R$ 15 mil mensais, “salário da molecada” dos grandes times de São Paulo.
Em 2015, o ECPP (Vitória da Conquista)formou um time que mesclava jogadores experientes, como Paulo e o goleiro colombiano Viáfara, com jovens promissores. A fórmula o levou a decidir o campeonato com o Bahia.
No primeiro jogo da decisão, em casa, o alviverde derrotou o adversário por 3×0. No jogo da volta, em Salvador, o Tricolor goleou (6×0) e foi campeão.
Paulo não se abateu. No quarto de cerca de 20 metros quadrados, na casa da mãe, em Itarantim, onde guarda camisas, medalhas, troféus, fotos e pôsteres, ele guardou mais uma peça para a sua coleção: a bola da decisão do Baianão.
VITÓRIA TRANQUILA DO PALMEIRAS E O ABSURDO QUE NÃO HOUVE
por Marcelo Mendez
Eis que tivemos mais uma partida de Libertadores da América.
Todavia, de tudo que se esperava dela, pouco aconteceu. Vejamos:
Depois do que rolou na noite anterior na Bombonera, quando o Cruzeiro foi garfado pelo VAR, ao longo do dia o que mais se falou foi a mordaz eminência de um complô sul-americano de todas as outras Nações contra nós, Brasileiros, bronzeados e belos.
Muito se falou.
Que havia um esquema na Conmebol, que a culpa de tudo era do Coronel traíra, que enganou todo mundo na eleição da FIFA, enfim; Que o Palmeiras estava lascado!
Mas não foi o que houve.
O árbitro do jogo teve uma atuação irretocável. Nada daquele velha e bucólica Libertadores, donde havia Ladrões homéricos no apito, figuras rotundas como Ramón Barreto, emérito safado, não… O árbitro foi obviamente correto.
Também não teve pressão, guerra, nem nada disso, imaginem.
Só faltou vinho e empanadas para receber o Palmeiras em Santiago. Ao pé da Cordilheira, o que mais imperou foi a cordialidade. E sem nada disso para se ocupar, resta, portanto, falar do jogo.
Ufa! O jogo…
O Palmeiras teve um começo dos sonhos. Foi para o ataque, pressionou e conseguiu seu gol antes dos três minutos de jogo. Foi arrebatador, contumaz e tinha tudo para resolver sua classificação nos primeiros 45 minutos. Mas falando em obviedades, o time voltou para o segundo tempo, cumprindo bem essa premissa ululante.
Como manda a regra desse atual futebol, o Palmeiras recuou para ficar acuado, sem muita criatividade, trocando poucos passes, bola batendo e voltando a todo tempo, escolhendo o sufoco, ante à tranqulidade. Mas o adversário não ajudou.
O Colo Colo, lento, envelhecido, vivendo de brilharecos de Valdivia, até tentou criar algo. Mas a sua limitação técnica o condenou e Willian, num contra ataque, arrancou, acertou a trave e no rebote, Dudu empurrou para o fundo das redes.
Foi o 2×0 que definiu a partida. O Palmeiras encaminhou a sua classificação para as semifinais da sonhada Libertadores sem maiores sustos. Aliás, sustos mesmos, só aqueles que o Palmeiras quis tomar, coisa que seria melhor evitar.
A pressão arterial do torcedor Palmeirense agradece.