O FUTEBOL AGONIZA, MAS NÃO MORRE
por Marcelo Soares
Meu pai, parceiro de arquibancada, cresceu com o futebol das décadas de 70 e 80. Hoje já não tem mais vontade de ir aos jogos.
Será que naquela época eram muito bons mesmo ou hoje são muito ruins? Acredito que as duas opções estejam certas.
Anteontem, toda essa festa antes da final da Copa do Brasil mostrou como as coisas estão mudando no futebol brasileiro. Após a bola rolar acabou a festa. Cartões para todos os lados e os onze jogadores atrás da linha bola.
Certamente não é essa a mudança que queremos.
VAR… Não me lembro de ouvir do meu pai e do meu avô reclamações sobre arbitragem. Esqueceram o futebol nas décadas passadas e buscam sempre um vilão. Árbitros, jogadores. Talvez o problema não estejam neles. Sabemos que não estão dentro de campo.
Categorias de base em situações precárias, dívidas bilionárias…
Aquele que é considerado o melhor time do país apresenta um futebol fraquíssimo. Vence pois os adversários são piores ainda. O famoso “extracampo” está cada vez mais sendo decisivo.
Apesar de tentarem e muito acabar com ele, o verdadeiro futebol agoniza, mas não morre. Como diria Nelson Sargento.
O que fez e faz meu pai perder a vontade? Times sem padrão de jogo? Escassez de craques? Ingressos caros? Ou toda essa palhaçada que estão fazendo fora de campo?
Anteontem, infelizmente não fomos ao estádio.
Para o Corinthians, nunca foi fácil. Mas está cada vez mais difícil. Difícil comemorar um gol, uma boa partida.
Talvez o mais difícil será convencer a próxima geração a ser meu parceiro de arquibancada.
As próximas gerações podem olhar para o futebol e dizer:
Que jogo mais chato, VAR pra PQP.
CENTENÁRIO DO LEÃO
por Rafael Santana
Fundado em 18 de outubro de 1918, o Fortaleza Esporte Clube comemora hoje seu centenário. Líder da série B, com chances altíssimas de subir, o clima lá no Pici está ótimo, mas agora vamos falar da história gloriosa de um dos maiores times do nordeste brasileiro.
O estado do Ceará inaugurou seu principal estádio, o “Castelão”, em novembro de 1973 com um publico de 70 mil pessoas ou mais, já que até hoje não se sabe quantas pessoas estiveram dentro do Castelão para assistir à partida entre Ceará x Fortaleza, válida pelo Campeonato Brasileiro de 73. Volta e meia os torcedores mais velhos falam desse grande evento, dizem que teve gente pulando muro, outros com ingresso na mão que não conseguiram entrar. Enfim, um mar de gente, além da transmissão nas televisões do Brasil inteiro.
O jogo foi um empate sem gols com destaque para os goleiros. Apesar de Hélio Show e Lulinha terem “estragado” a festa de inauguração com defesas de cinema, o estádio estava finalmente inaugurado e o ano de 1974 reservou surpresas muito agradáveis para o torcedor do Leão.
Naquele mesmo ano, houve uma troca de treinadores e o Fortaleza passou a ser comandado por Moésio Gomes. De família tricolor, o técnico conhecia os bastidores do Fortaleza como ninguém, e, além disso, era o criador de uma escolinha de futebol que revelou inúmeros craques cearenses, como Luciano Oliveira, Pedro Basílio, Facó, Zé Augusto, Mano, Hamilton Rocha, Zé Paulo, Neto, Izoni, Ronner, Cícero, Zé Meu, Wilkinson, Vanor e Louro.
No entanto, o time de 74 teve muitas baixas também. Hamilton Rocha, excelente jogador, deixou a equipe, assim como experiente lateral Bauer e o atacante Marciano, artilheiro do Campeonato Cearense em 73. Muitos dizem que foi uma reformulação necessária para a equipe, já que a chegada do zagueiro carioca Ozires, vindo do River do Piauí, e a consolidação do grande lateral Ronner, oriundo da escolinha de futebol de Moésio, deram um novo gás para o Tricolor.
O novo time fez um Campeonato Brasileiro regular em 1974, terminando em 16° lugar. Mas foi no Campeonato Cearense que o time se imortalizou. Confiante após as vitórias expressiva no nacional, o time formado por Lulinha, Pedro Basilio, Ozires, Ronner, Zé Carlos, Louro, Haroldo, Amilton Melo, Lucinho, Chinesinho e Geraldino Saravá deitou e rolou no Estadual.
Não é por acaso que esse time é considerado um dos melhores da história do Fortaleza. O brilhantismo de Lucinho e Amilton Melo, a habilidade de Haroldo e o faro de gols de Geraldino foram as marcas especiais dessa equipe.
Estudante de futebol como era, Moésio Gomes viu a tremenda qualidade no meio de campo do time e resolveu implantar uma forma de atacar e de se organizar em campo em forma de quadrado! Com Chinesinho, Zé Carlos, o maestro Lucinho e o craque Amilton Melo, foi formado o famoso quadrado de ouro, que deu muito trabalho aos adversários.
O jornalista Tom Barros do Diário do Nordeste exemplificou bem o que era o quadrado de ouro jogando: “Os quatro davam equilíbrio à equipe e assim podiam sacrificar um jogador na frente, deixando dois na parte ofensiva. Os dois da frente eram Haroldo e Geraldino que, abertos nas pontas, afunilavam para receber os lançamentos. Quando não fazia o contra-ataque e vinha tocando a bola, o Fortaleza jogava com seus dois pontas avançando pelo meio e abria o Zé Carlos pela direita e o Lucinho pela esquerda com o Amilton pelo meio na cobertura para reparar qualquer erro, na armação estava o Chinesinho e a sua agilidade. Esta segunda manobra ofensiva, abrindo seus meias para jogarem com os laterais, foi uma criação do então técnico do Fortaleza Moésio Gomes. Esta variação tática fazia o Leão jogar de forma diferente do quadrado mágico do Santa Cruz que também ficou famoso neste tempo.”
Esse time foi campeão cearense de 74 sem dar chance ao Ceará, seu maior rival. Decidido numa melhor de três, o título foi conquistado pelo Leão, que venceu as três partidas (4×0, 1×0 e 3×1) e fez a festa com o primeiro título dentro do Castelão.
Para completar a farra, o lateral Louro foi bola de prata pela Revista Placar, e considerado o melhor lateral direito do Brasil. Seu vigor físico e inteligência em campo são lembrados até os dias de hoje no Fortaleza.
Nesta data tão importante, podemos dizer que o Fortaleza de 74 marcou época no Brasil por um futebol muito bem jogado e por ser a primeira equipe a levantar um titulo no Estádio Governador Plácido Castelo, o Castelão.
À PROCURA DE ERIC
por Paulo Escobar
Em Marselha nasceu aquele que talvez no futebol mundial não aceitou ser domado nem por interesses e nem por treinadores que tentavam a todo custo domesticar Eric. Desde seus primeiros passos no futebol francês teve problemas já no seu primeiro clube, o Auxerre, e para termos uma noção, já em 1991 Cantona pensou em se aposentar após chutar a bola contra o juiz e pegar um gancho de dois meses.
Cansado da França, decide retomar o futebol na Inglaterra e fecha com Leeds Clube pelo qual foi campeão em 1991, e finalmente em 1993 chega ao clube que seria sua casa e onde viria a se tornar uma religião, o Manchester United.
No meio dos diabos vermelhos, Eric foi idolatrado e com gols e belas atuações foi aumentando o amor que a torcida de Manchester tinha por ele. Balançando a rede de formas memoráveis, como na partida contra o Sunderland em 1996, que talvez seja o que traduz o que era Eric: aqueles dribles do meio de campo, uma tabela, e da entrada da área mete uma cobertura maravilhosa. Na comemoração faz aquele olhar típico como quem olha não acreditando e com uma marra abre os braços e da uma volta no mesmo lugar olhando a torcida e companheiros de time.
Cantona nunca teve medo de expor suas posições e dentro de campo foi um demônio das finalizações, teve seu nome cantado e gritado. Na sala de imprensa do Old Trafford tem uma foto que embaixo leva escrito uma fala de Ferguson, que agradece os cinco anos maravilhosos que teve com o francês. Eric era fervoroso dentro de campo e a cada partida das jogadas e atitudes imprevisíveis era uma delícia ver esse cara dentro e fora das quatro linhas.
Era o anti-herói e anti-bom mocismo que o futebol que vivemos hoje da moral e dos bons costumes não suporta, de meião abaixo da canela e gola levantada não pagava simpatia pra ninguém. De entrevistas que com um posicionamento politico e falas que fugiam da mesmice das coletivas de imprensa.
O mesmo Eric já reconheceu que uma das melhores jogadas da sua vida não foi dentro de campo, mas sim ao ser expulso contra o Crystal Palace (1996). Na saída de campo, aquela voadora num nazista que o xingava de maneira xenófoba e preconceituosa. Cantona pega 9 meses de gancho e uma das supostas punições também deve ter sido a não convocação a Copa de 1998, que azar da Copa não ter tido ele lá. Sempre imaginei as falas em meio a esse evento tão dos bons costumes que seria essa Copa com Eric. Seriam momentos de tensão nos organizadores.
Nos dias de hoje, tão cheios de preconceitos, de uma xenofobia, de racismo, de homofobia e de ideias fascistas que vemos aumentando e tomando formas das mais cruéis possíveis, que falta fazem jogadores como ele. Cantona não compactuaria jamais com o que vemos sendo gritado em algumas arquibancadas e com certeza nos dias de hoje estaria em mais voadoras e discussões com o que vemos crescendo.
Eric, o do futebol bem jogado, o definidor nato e bom de cabeça e das ideias foi o mesmo que na crise dos refugiados na Europa abriu as portas da sua casa para recebê-los. Continua sendo o mesmo que recentemente criticou a seleção brasileira pelo amistoso contra Arábia Saudita, país com um regime no qual as pessoas desaparecem por motivos políticos (regime que bate as nossas portas também).
Nós, os órfãos de bons jogadores e que ainda por cima pensem e se posicionem, continuamos a procura de Eric.
DE JÚLIO BARROSO PARA O PALMEIRAS COM AMOR, OU QUASE
por Marcelo Mendez
Era um ano legal na minha vida.
Naqueles 1984, eu já estava, como diria os outros, um mocinho. Seguindo a premissa dessa tenra e adolescente idade, agora aos 14 anos, eu tinha um walkman, um punhado de fitas cassetes que ganhava dos meus primos mais velhos e meus primeiros discos.
No começo daquele ano, minha prima Mirian me deu de presente o primeiro disco da Gang 90 e foi através desse disco que conheci Julio Barroso, o cantor, compositor, letrista e tudo da Gang. Pirei.
Com o Julio, descobri os caminhos para poesia beat, as primeiras informações sobre a coisa, os primeiros nomes do que viriam a ser influências de tudo, referências de uma vida toda; Kerouac, Ginsbergh. Mas isso é uma outra história…
Aqui no Museu a lembrança que vale é das coisas do futebol. E para o menino Palmeirense, não podia estar melhor…
O camisa 11 do Verde
O Palmeiras voava no Campeonato Paulista.
Dirigido por Fedato, naquele ano, tínhamos um baita time de bola. Leão, Diogo, Luis Pereira, Vagner Bacharel e Paulo Roberto. No meio campo, tinha Marcio, Osias, Carlos Alberto Borges e na frente, Jorginho, Reinaldo Xavier e ele, o mágico, o craque o genial Mário Sérgio.
O canhoto craque de bola, dono de uma classe e uma elegância inexorável, jogava futebol da mesma forma que Paul Desmond tocava sax para o Dave Brubeck Quartert. Os passes que saíam de seu pé esquerdo, tal e qual as pinceladas saíam da paleta de Renoir, ou Ticiano. Ver Mário Sérgio jogar era uma experiência única.
Ele em campo me redimia de tudo que ameaça-se o encanto em minha vida. Ele era quem me protegia da tristeza e de todas as outras durezas. Craque, meu herói. E ele não fazia feio.
Naquele ano, num campeonato de pontos corridos, o Palmeiras era líder e dava show. A reta de chegada estava perto, mas no meio do caminho havia um clássico por jogar. Um clássico que sem a gente saber, entraria para história…
O Clássico da briga e os perdidos na selva do barato…
O São Paulo já era o time da moda.
Havia contratado o ótimo Cilinho como técnico, começava ali uma renovação e tinha um time poderoso. Careca, Casagrande, Pita, Sidney, bons laterais como Paulo Roberto e Nelsinho, um timaço. O Palmeiras enfrentaria esse time e precisava vencer para meter a mão na taça. E dessa vez, eu, o Pai e meu Tio Bida fomos felizes para o Morumbi.
O meu lugar na numerada inferior não estava parecendo tão melancólico, a esperança de que naquele ano tudo seria diferente era muito grande. Mas tínhamos que vencer o São Paulo e vencemos.
Após levar o primeiro, com um gol de Sidney, o Palmeiras foi para cima e virou com duas cabeçadas, uma de Reinaldo Xavier no primeiro gol e outra de Diogo. No final do jogo, Vagner Bacharel deu uma banda em Pita do São Paulo e o pau comeu. Bem ali, na minha frente, vi voadoras, porradas, chutes mas num tava nem aí, rimos.
Naquele dia saímos do Morumbi tão felizes, mas tão felizes, que meu tio Bida não aguentou:
– Marcelo, cadê aquelas tuas fita doidas?
– Tá aqui, Tio. Por quê?
– Dá uma delas aí, vamos ouvindo!
– Bida, acho melhor, não! – precaveu meu Pai.
– Vai, Mauro! Vamos festejar, esse ano o Verdão vai ser campeão! Me dê aí, Marcelo…
Dei.
E do banco de trás do Opala Vermelho Cor de Sangue, dele, fomos os três, cantando a plenos pulmões “Eu e minha gata rolando na relva/rolava de tudo/covil de piratas pirados/Perdidos na Selva…”
Era dia de festa, tudo parecia que ia dar certo. Mas daí, em 1984 descobri que para a alegria ser plena, precisa de muita força.
Descobri o Tapetão….
Anfetamina Blue..
Doping.
Mais umas das novas palavras da minha vida. Naquela semana só se falava disso. Um tal de exame antidoping disse que Mário Sérgio havia tomado uma coisa estranha, de nome anfetamina e que isso, não podia.
Sem entender nada. Fiquei sabendo que o Palmeiras seria julgado por isso e se punido fosse, a pena previa perda de cinco pontos. Isso arrebentaria com o time, o Palmeiras perderia a primeira posição e mais algumas. Dito e feito.
O tal tapetão, tirou os cinco pontos de fato. Mário recebeu punição por parte da organização do campeonato e o time nunca mais foi o mesmo. Com os nervos em frangalhos, o Palmeiras despencou pra quarta posição e de lá não saiu.
Da poltrona de casa, numa tristeza danada, vi o Santos vencer o Corinthians e sagrar-se campeão de um campeonato que era pra ser meu, era pra ser do Palmeiras. Não foi.
Vi pela tv a festa em Santos e a única coisa que pensava era num dia, quem sabe em breve, eu também num saio pra rua e participo de uma dessas.
Não foi dessa vez…
CRAQUES INESQUECÍVEIS
#01- Romário
por Mateus Ribeiro
Romário de Souza Faria, mas pode chamar apenas de Romário. Um dos maiores atacantes de todos os tempos.
O Baixinho fez (muitos) gols por onde passou. E olha que ele passou em muitos lugares mundo afora. E nem foram só os gols que chamaram a atenção durante sua vitoriosa carreira. Romário era autêntico, não fazia média para agradar ninguém, tampouco vivia um personagem, algo tão comum para jogador de futebol atualmente.
Romário não tinha medo de nada, não tinha medo de ninguém.
Romário era um carrasco da grande área. Talvez, o jogador mais letal que eu já tenha visto na vida. Imagino que também tenha sido o motivo da insônia de muitos zagueiros que o marcaram (foram muitos, e dos bons).
Não contente em ser marcante nos clubes por onde passou, Romário marcou seu lugar na Seleção Brasileira. A camisa amarela com o número 11 foi, é, e será eternamente sinônimo de Romário. A azul também. Afinal, alguém se esquece daquele domingo que o baixinho, depois de muita birra de Parreira, voltou em cima da hora e simplesmente DESTRUIU o Uruguai? Talvez essa tenha sido a primeira grande exibição individual que eu tenha visto na vida.
Depois daquele dia, Romário poderia se aposentar da Seleção, que todos lembrariam da sua exibição de gala no Maracanã. Mas faltava completar a obra. E ele, na companhia de muita gente boa (e muita gente contestada também), terminou o quadro nos Estados Unidos. Alguns consideram essa obra, denominada Copa de 1994, um tanto pragmática. Outros, se pudessem, a deixariam para ser contemplada nos maiores museus do planeta.
Não importa, obras são obras, e Romário pintou cada detalhe ali da melhor forma possível: com o bico da chuteira, crescendo no meio dos gigantes suecos, saltando contra a Holanda, recebendo declaração de amor de Bebeto (e do resto do Brasil), batendo pênalti chorado, ajudando seu fiel parceiro de ataque a embalar Mattheus .E tudo isso sob um sol escaldante.
Romário jogava pela sombra. Não era muito chegado aos treinamentos. Talvez fosse pra mostrar que era humano, afinal, sem treinar como os demais, era um monstro, imagina se treinasse?
Romário foi vencedor. Ganhou taças por onde passou. Desde Teresa Herrera até Copa do Mundo, passando por Campeonato Carioca e Copa da Holanda. Sempre fazendo gols.
Romário é rei. Seja no Rio, na Catalunha, em Eindhoven.
Romário é inesquecível. Inesquecível para amantes do futebol. Inesquecível para torcedores de vários clubes do Brasil e do mundo. Ah, é inesquecível para o Amaral também. E para muitos outros que já tiveram o (des)prazer de ter que marcar um dos maiores atacantes da historia do futebol mundial.
Por ser tudo isso, e muito mais, Romário abre a mais nova série do Museu da Pelada: Craques Inesquecíveis!
Divirtam se com os lances dessa lenda!