RICO NAS FINANÇAS E POBRE NO FUTEBOL E NA ALMA
por Paulo Escobar
Assistindo aos jogos do Flamengo de uns anos pra cá, me pergunto: o que será que Rondinelli pensa quando vê o Flamengo jogar? O que será que Zico diz quando vê esse time? O que será Adriano sente quando olha um jogo do Flamengo? O que será que passa pela cabeça de Adílio quando vê esses atacantes desse time? O será que os ídolos Rubro-Negros sofrem quando olham esse time?
O time de maior torcida do Brasil e do mundo talvez, que em meio aos seus torcedores possui uma imensa maioria de gente pobre e que mora em meio a Favelas e sertões, que acordam cedo e se sacrificam a cada dia para tentar sobreviver, são os que continuam sofrendo com os jogos do time que poderia lhes dar um mínimo de alegria diante dos sofrimentos diários.
Muitos jogadores desse time não têm a dimensão do que é o Flamengo, de quem é sua torcida, o que é vestir a camisa rubro-negra. São atletas temporários que não criaram identificação mínima com o time e com aquilo que o Flamengo representa na vida de milhões de pessoas. São apáticos diante da derrota e possuem justificativa pra todos os fracassos e já deixando preparada a torcida para o fracasso seguinte.
O Flamengo de hoje é um time sem raça e sem alma, reflexo de uma diretoria que está mais preocupada em tornar o rubro-negro num time rico que jogue para as elites. É só olhar a preocupação constante no orçamento e preço dos ingressos, que é um dos muitos sinais de que a diretoria e seu presidente querem um Flamengo “moderno” que seja um time longe daqueles que são o povo que sofre pelo time.
Bandeira de Mello é o papai que mima seus jogadores e que criou um time de meninos mimados, blindados das críticas e distantes da realidade do torcedor rubro-negro. Muitos destes torcedores deixados de fora por essa própria diretoria que tenta mudar a cara de um clube que tem história e uma relação poderosa com as camadas mais pobres deste país.
O Flamengo das finanças é um time que procura saldar as dívidas, mas que possui uma dívida que parece não haver muito interesse em ser saldada, que é no futebol jogado dentro de campo.
Sinceramente muitos desses jogadores não têm noção da camisa que vestem e o que ela significa, eles não têm dimensão do que é sofrer com o Flamengo nas favelas e não sabem o que é o cara se lascar a semana inteira e esperar ter um momento de alegria com a paixão que o move. Talvez o jogador que hoje pareça entender isso, pelo que se vê dentro de campo, é o Cuellar que mesmo vindo da Colômbia parece ter mais noção do que é o Flamengo.
Esses caras não têm o cheirinho da raça do Rondinelli, não possuem o cheiro do artilheiro que foi Gaúcho ou Nunes, não possuem o cheiro do comprometimento do Pet e pior ainda é que não possuem identificação com a história ou cheiro das glórias do Flamengo. Grande parte desses jogadores mesmo pisando no Maracanã não têm noção da dimensão que é um jogo de domingo no Maracanã. Eles não sabem o que é aquele moleque na Rocinha ou no sertão que com sua camisa surrada espera chegar a hora do jogo.
O futebol apresentando pelo Flamengo é uma coisa dura de se ver, não dá gosto é um verdadeiro sacrifício ver a dificuldade que esses caras têm, parecem que jogam com chumbo dentro das chuteiras. É um desânimo terrível, diante da adversidade parecem se entregar e não possuem quase nenhuma reação diante da derrota, é só observar que do jeito que o Flamengo entra, ele sai de campo. É o desânimo já no túnel de entrada.
Às vezes penso que o que esses ídolos que entenderam o que é a camisa rubro-negra devem sentir é vergonha, de ver o que se passa dentro de campo quando o Flamengo joga hoje. Imagina o que o Adriano cercado de flamenguistas na Vila Cruzeiro deve sentir vendo esses atacantes com medo de fazer gols. Imagina os caras de 1992 que viram aquelas pessoas caindo da arquibancada do Maracanã lotado devem pensar, ao verem esse time moderno mais preocupado em ser rico e frequentado por ricos que não entendem a real dimensão do que é ser Flamengo.
O maior roubo que essa diretoria e parte dos jogadores faz é nos tirar o futebol vistoso e bem jogado que vimos o rubro-negro praticar no passado, nos roubar a raça que esse time possuía, querem nos roubar a possibilidade de estar nas arquibancadas e acima de tudo querem nos enfiar goela abaixo que o Flamengo é esse time conformado com os fracassos.
Na semifinal de quarta, ao tomar o segundo gol, fui dormir, pois sabia que esse time sem reação de jogadores sem identificação com o time e sua história nada fariam. E diante de tudo isso vemos que Bandeira de Mello e sua trupe querem transformar o Flamengo num time rico de grana, mas pobre de alma sem nenhuma identificação com a história e com o povo por trás do rubro-negro.
Sorato
artilheiro da colina
entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | vídeo: Daniel Perpetuo
Se a torcida do Vasco não esquece o dia 16 de dezembro de 1989, Sorato tampouco. Foi dele o gol que garantiu o título brasileiro daquele ano, contra o São Paulo, em pleno Morumbi, e colocou o artilheiro na galeria de xodós da torcida.
Em um bate-papo descontraído, o goleador relembrou o início da sua trajetória na Colina, os times que passou e, claro, o histórico gol aos 20 anos de idade.
– O Vasco tinha um timaço na época. Sei a escalação de cabeça até hoje: Acássio, Luiz Carlos Winck, Marco Aurelio, Quiñonez e Mazinho; Zé do Carmo, Boiadeiro, Bismarck e William; eu e Bebeto na frente.
O curioso é que, na altura daquela decisão, o menino Sorato estava há pouco mais de um ano entre os profissionais e não se intimidou no meio de tantos craques. De acordo com ele, o elenco estrelado dava uma estrutura para os jovens se sentirem à vontade dentro de campo.
Na sua estreia, inclusive, teve a missão de substituir Romário, machucado, em uma final contra o Flamengo.
– Fui promovido em 88 e na minha estreia, contra o Flamengo, marquei os dois gols da decisão!
É claro que a façanha lhe rendeu o carinho da torcida vascaína, que aumentou ainda mais após cabeçada certeira que venceu o goleiro Gilmar Rinaldi e garantiu o bicampeonato brasileiro.
O lance ainda está fresquinho na memória de Sorato, como se pode ver com a descrição perfeita da jogada:
– Nos recuperamos a bola e fizemos ela rodar da esquerda para a direita. Quando caiu no pé do Luiz Carlos Winck, o Bebeto puxou a marcação no primeiro pau e eu apareci sozinho no segundo cabeceando para baixo.
A comemoração do garoto de 20 anos tornou o gol ainda mais emblemático.
– Eu nem sabia o que estava acontecendo direito. Eu fiquei louco! – revelou!
Após entrar para a história do clube, deixou o Vasco em 92 para vestir a camisa do Palmeiras, onde voltou a ser campeão brasileiro, em 93.
Rodou por alguns clubes como Juventude e Santa Cruz, mas a saudade falou mais alto e, como ele próprio diz, “voltou para casa”.
– Até hoje quando chego a São Januário sinto essa sensação. O atleta que é formado na base tem esse vínculo.
Assim como na primeira passagem, mas não de forma tão direta, levantou a taça do Campeonato Brasileiro em 97 e no ano seguinte ainda conquistou a América com aquele elenco fabuloso.
Se alguém ainda duvida que o artilheiro faz parte da história do Vasco, a diretoria do clube instalou grandes painéis nos arredores de São Januário com a imagem dos grandes ídolos e Sorato aparecia ao lado de ninguém menos que Roberto Dinamite, seu maior ídolo.
– Eu morava em São Januário e assistia aos treinos. Buscava me espelhar nele!
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Aniversário do Horta
PRESIDENTE DAS LARANJEIRAS
entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | vídeo: Daniel Planel
Foi com muita felicidade que recebemos o convite para prestigiar o aniversário de Francisco Horta, um dos maiores dirigentes da história do futebol brasileiro e hoje presidente da Santa Casa da Misericórdia, local da festa. Sem pensar duas vezes, partimos cedo para a instituição no Centro e participamos de uma bela confraternização.
Se hoje os clássicos são marcados, na maioria das vezes, por confusão entre as torcidas, houve um tempo em que a paz reinava nos estádios e o futebol arte prevalecia. Francisco Horta é, sem dúvidas, um dos grandes responsáveis pelos anos gloriosos do futebol carioca. Além de ter montado a lendária Máquina Tricolor na década de 70, o dirigente também ficou famoso por reinventar o troca-troca entre os clubes, incendiando os clássicos.
– Isso nunca mais vai acontecer. As torcidas ficavam misturadas na arquibancada e não tinha uma briga! – lembrou Fernando Bicudo, do Teatro Municipal.
– Sabe por quê? Porque naquela época existia a Geral! – disparou Horta.
O presidente foi recebido sob aplausos pelos convidados e, enquanto caminhava para o Salão Nobre cumprimentando um por um, foi ao delírio quando o o pianista tocou o hino do Fluminense:
– Emocionante! É o meu presente de 84 anos. É um hino que faz parte do meu coração!
Já no fim da festa, Márcio Braga, ex-presidente do Flamengo apareceu de surpresa, e colou ao lado de Horta para relembrar os tempos áureos do futebol carioca. Antes de entrar no assunto, no entanto, o ex-dirigente tricolor deu uma leve cutucada no rubro-negro:
– Ele roubava todas as minhas namoradas! – disparou.
Hoje em dia, Horta vem fazendo uma excelente gestão para recuperar a Santa Casa da Misericórdia, um patrimônio histórico da cidade. Mas para quem conhece o passado do dirigente, trata-se apenas de mais um êxito no seu vitorioso currículo.
– Foi o maior dirigente esportivo de todos os tempos, um dos maiores juízes que tivemos no judiciário brasileiro e é um homem que tem amor no coração e na palavra. Assumiu a Santa Casa em condições precárias e está conseguindo recuperá-la! – disse o desembargador Siro Darlan.
Vida longa ao Horta!
UM ÍDOLO É MUITO MAIS QUE CRAQUE
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
A ausência de Lionel Messi e Cristiano Ronaldo na entrega da Bola de Ouro escancara definitivamente a infantilidade dessa geração, um comportamento que a garotada define como Nutella e mimimi. São craques e isso não se discute, mas são mimados ao extremo, vaidosos, personagens de contos de fadas.
Messi já disse que não jogaria mais pela seleção argentina, fez biquinho, mas acabou voltando. Cristiano chorou porque foi expulso. Choram e reclamam por motivos fúteis. Para mim, não são referências.
Se você decide faltar a um evento dessa relevância, que faça como o ator Marlon Brandon, que, em 1973, recusou a estatueta do Oscar e mandou em seu lugar uma ativista indígena para mostrar seu repúdio à forma como os nativos eram tratados nos Estados Unidos. Dessa forma, se constrói um ídolo.
Para mim o ídolo tem que ter atitude, postura, iniciativa. A mesma que Afonsinho teve quando criou a Lei do Passe e trocou de clube por não aceitar cortar o cabelo. Os cabelos grandes, em nossa época, não eram uma modinha, mas uma forma de se manifestar. Que os piercings, brincos e tatuagens de hoje também sejam um grito contra o preconceito.
Na década de 60, conheci a socióloga americana Angela Davis e passamos a usar o futebol como uma ferramenta contra a discriminação racial. Mas em 1996 já existia o tal mimimi e a seleção olímpica, dirigida por Zagallo, também se negou a subir ao pódio para receber o bronze. Lembram-se disso? Pura birra.
Os atletas precisam entender que a derrota dói, mas deve ser encarada com dignidade, não com desleixo e deboche, como fez Ronaldinho Gaúcho, que usou o celular, no pódio, durante a entrega do bronze, em 2008.
Estive com Rogério Bailarino há alguns dias. Ele até hoje lamenta ter se contundido e cortado às vésperas da Copa de 70. Foi buscar na Igreja Messiânica explicação para isso. Dirceu Lopes até hoje chora por não ter ido ao México, assim como Ado, do Bangu, lamenta o gol de pênalti perdido na final do Brasileiro. Me culpo até hoje por um gol perdido contra a Holanda, assim como Zico deve sofrer até hoje pela falta de um Copa em seu currículo.
Hoje a derrota é banalizada. Não que a dor precise ser eternizada. Mas Felipão, por exemplo, continua se achando o último biscoito do pacote mesmo após o 10×1 (sete da Alemanha e três da Holanda). Vamos ver agora com mais essa desclassificação.
Os discursos mudaram. Hoje o futebol está infestado de palestrantes, do veterano Tite ao jovem Barbieri, que ficou tentando nos convencer até o último minuto que esse time sem molho do Flamengo é bom.
O melhor dessa bagunça toda é quando o “professor” se vê em maus lençóis e precisa furar um bloqueio, mudar o rumo do jogo. Ele olha para o banco e vê um Pedrinho, do Corinthians. Por sinal, esse garoto no banco é o retrato do futebol covarde praticado hoje. “Aquece, Pedrinho!”. Talvez ele não pratique boxe como Sassá e Felipe Melo, mas quando a porca torce o rabo, graças aos céus, é a arte do menino magrelo e bom de bola que ainda prevalece.