Afonsinho e Gil
MEIO DE CAMPO
entrevista: Sergio Pugliese e Mauro Sta. Cecília | texto: Mauro Sta. Cecília | fotos: Marcelo Tabach | vídeo: Daniel Planel e Guillermo Planel
Dois mestres da música e da bola. Dois craques. Dois poetas. Foi com a maior alegria que recebi o convite para entrevistá-los para o Museu da Pelada.
Um faz parte da trilha musical da minha vida. Lembro que ouvi o disco “Refavela”, aos 15 anos, até furar (na época a mídia era o bom e velho LP). Um artista que se reinventa sempre. Torce pelo Fluminense e pelo Bahia, em sua terra natal.
O outro é um ídolo do meu Botafogo. Foi um meio-campo talentoso, criativo, desses que a gente não costuma mais ver tanto jogando no Brasil… E contestador. Foi no próprio Botafogo que ele se notabilizou não só pela técnica como também por ter se recusado, nos anos 70, em plena ditadura, a cortar barba e cabelo por “ordens” do então treinador Zagallo. Tornou-se um pioneiro na luta pela extinção da Lei do Passe, que modificou a relação abusiva entre clubes e atletas.
Enfim, mesmo eu não sendo um repórter de ofício, e sim um letrista e poeta louco por futebol, não tinha como recusar um convite desses.
A entrevista foi um emocionante reencontro de dois amigos.
Com vocês, Gilberto Gil e Afonsinho.
João Paulo
O PONTA ENSABOADO DO BUGRE
por Marcelo Soares
João Paulo nasceu Sérgio Luis Donizetti. Em Campinas, interior de SP, vindo de família humilde, ajudava na colheita do café na fazenda.
Chegou no Guarani aos 16 anos de idade, apelidado de João Paulo por um colega das categorias de base, acabou adotando o nome e fazendo-o conhecido no mundo todo pelo que fazia na ponta esquerda.
As pontas, hoje em extinção, em outros tempos ostentavam uma lista de craques que por elas desfilavam seu futebol. João Paulo era um deles. Logo criaram uma história de amor.
Vice-campeão paulista e brasileiro pelo Bugre na década de 80 chamando atenção dos grandes clubes, convocado para seleção participando da Copa América em 87 e dos jogos olímpicos de Seul em 88, não demorou muito para viajar rumo ao velho continente. Na época em que os craques atuavam na terra da bota, foi defender o Bari da Itália e se juntou a Maradona e outros craques no Calcio.
A história de amor entre João Paulo e a ponta esquerda ia muito bem. Boas partidas, prêmios individuais e convocações para seleção iam se acumulando. Foi eleito o melhor jogador estrangeiro do campeonato italiano, entrou na seleção da competição e disputou a Copa América de 91. Salvou o Bari do rebaixamento marcando dois gols contra o Milan e levou a torcida ao delírio, se tornando ídolo do time. Até que num confronto contra a Sampdoria, o zagueiro Marco Lanna colocou um ponto final na linda história de amor que João Paulo vivia. Uma fratura na perna o afastou da ponta esquerda e um erro médico em apressar a cirurgia acabou fazendo com que ele nunca mais pudesse reatar essa relação da maneira como era antes. João Paulo em pouco tempo encantou as pontas dos gramados do Brasil e do mundo. Poderia ter sido tetracampeão do mundo em 1994 com a seleção e ter conquistados muitos títulos pelos clubes que passou. A ponta esquerda poderia ter sido feliz por muito mais tempo com ele desfilando por ela. Confira agora essa resenha no Museu da Pelada.
SERIEDADE NO FUTEBOL TEM SINÔNIMO: ZÉ MÁRIO
por André Felipe de Lima
O saudoso treinador Paulo Emílio tinha um talismã: o volante Zé Mário. Na Máquina Tricolor, em 1975, Emílio entrou no lugar do técnico Didi e o efetivou como titular. Quando Emílio foi contratado pelo Vasco, no ano seguinte, não pensou duas vezes: “Quero o Zé Mário aqui”. Porém nenhum outro personagem do futebol carioca daquela saudosa década de 1970 desenhou melhor Zé Mário que o companheiro de meia cancha Zanata, com quem Zé jogou no Flamengo e no Vasco: “O Zé tem um ótimo toque de bola e um fôlego fora do comum. Isto lhe dá uma enorme capacidade de auxiliar a defesa e o ataque, o tempo todo sem cansar. No final que está no bagaço é o adversário.”
Zé Mário e Zanata se entendiam maravilhosamente bem no meio de campo. O primeiro foi um dos melhores volantes de sua geração; o segundo, um meia estupendo, capaz de lançamentos de longa distância que deixavam todos os centroavantes e ponteiros na cara do gol, como aquela bola que parou na frente do Freitas, que fez o segundo gol do Vasco na vitória de 4 a 2 sobre o Flamengo, no campeonato nacional de 1975. Zé Mário ainda não estava em São Januário, mas quando lá chegou formou com Zanata uma das melhores duplas de meias do Rio e que este humilde jornalista viu [graças a Deus] jogar. Em 1977, os dois craques foram decisivos para que o Vasco fosse campeão carioca, diante do mesmo Flamengo, de Zico e Júnior, que também estiveram naquele memorável “4 a 2” de 75.
Aquele título de 77 foi especial na carreira do Zé Mário. Se a meia cancha já contava com o talento dele e o do Zanata, ficou ainda melhor com a entrada do magnífico Dirceu. Recorrendo ao jargão do turfe, o Vasco “sobrou na turma”, e o Zé Mário foi o pulmão daquele timaço. Jogou tanta bola que acabou eleito o craque da competição. Justíssimo. O “Dustin Hoffman” vascaíno estava demais. E a comparação é também justa. Zé Mário seria facilmente confundido com o grande ator americano caso desfilasse pelas ruas de Hollywood. É o popular “cara e crachá” ou o não menos famoso “separados ao nascer”. Pode parecer piada pronta, mas parecidíssimos. Mas deixemos o astro americano em seu canto cinematográfico. É do grande Zé de quem falamos, de quem recordamos os bons tempos de craque das tardes ensolaradas do Maracanã.
“Zé Mário é o comando do time dentro de campo, tem autoridade até mesmo para modificar o modo de jogar da equipe. E não se trata de uma função baixada por algum decreto: Zé Mário tem ascendência natural sobre seus companheiros, é um homem de comando. Com ele em campo, fico tranquilo”. Palavras do “Titio” Fantoni, técnico daquele Vasco campeão de 77.
Zanata tornou-se recluso e se afastou do mundo do futebol; Fantoni não está mais entre nós; mas Zé Mário continua atuante, inclusive como treinador. Foi um jogador que comprava o barulho dos companheiros. Um líder nato. Exemplo disso aconteceu com Wilsinho, ponta brilhante, que acabara de ser regularizado no Vasco, em 77. “Ô, Wilsinho, já anotaram o PIS na sua carteira profissional?”, perguntou Zé Mário. “Não, Zé, acho que ainda não”, respondeu o inocente Wilsinho. “Então vai lá em cima, apanha a carteira e entrega pra Marlene. Ela anota e fica tudo regularizado”, orientou o zeloso Zé Mário.
Nenhum outro no Vasco era tão preocupado com os companheiros. Zé Mário era a referência de denodo e comprometimento profissional. Era o capitão do time. Não saía da sala do departamento de futebol do Vasco, onde trabalhava a Marlene. Zé era um líder espontâneo, que defendia os direitos dos companheiros de time. O “Narigueta”, o “Pinóquio” — apelidos que ele sempre aceitou numa boa — não deixava ninguém na mão. Ele não pedia. Exigia. Dirigente de futebol tem de respeitar o jogador profissional. Por isso Zé Mário nunca deu margem para que o criticassem. Se havia regras, as cumpria. Era exemplar, mas quase desistiu de lutar pelos direitos dos colegas de profissão após uma eleição da Fugap (Fundação Garantia do Atleta Profissional), em 1975. Nem 30 jogadores apareceram para votar. Um descaso que o fez pensar se valeria a pena cuidar somente de si. Mas Zé Mário não é assim. Ele é um todo. Um coletivo. Um craque dentro e fora dos gramados, cujo modelo tanta falta faz hoje em dia. E pensar que a década de 1970 a ditadura militar estava no auge, amedrontando o país. Mas — pelo menos no futebol — havia um Zé Mário, um Afonsinho (ícone da luta pelo passe livre), um Ubirajara Mota (maior goleiro da história do Bangu) para falar pelos jogadores. Ou seja, gente que sabia jogar bola de verdade, mas também tinha uma consciência real da situação do atleta profissional.
Zé Mário abomina deslealdade. Quando ainda jogava profissionalmente, recriminava companheiros que desciam a pua nos jogos. Podia ser até amigo dele. Não importava. Zé Mário não perdoava. Vacilou, dançou. Com Zé Mário não havia essa de sacanagem e violência em campo. Ele abria o verbo: “O Merica, do Flamengo, é um deles. Já falei com ele, mas não adiantou nada. Já havia batido no Zanata e depois pegou o Dirceu, quando o juiz já tinha até apitado. Assim não dá. Meu amigo Rodrigues Neto (com quem Zé jogou no Flamengo) também abusou outro dia, entrando pra quebrar no Orlando (Lelé). O Uchoa, do América, fez o mesmo com Dequinha, do Flamengo. Esses jogadores precisam entender que os adversários também vivem do futebol e que de perna quebrada eles não vão poder trabalhar, talvez para sempre.”
O amanhã para Zé Mário é o hoje. Ele sempre procurou mostrar aos companheiros que o futebol é eterno, porém as pernas são limitadas. Um dia a bola as deixa para trás sem um pingo de remorso. Ele trabalhava com afinco na Fugap e percebia que muito mais ex-jogadores de grandes clubes procuravam ajuda que os de pequenos. Em 1977, ele fez a seguinte reflexão: “As estrelas vivem sua época, dilapidam seu patrimônio, esquecem-se de estudar. Jogador de time grande só sabe jogar futebol. É incapaz de se adaptar a qualquer outra coisa. Com exceções, é claro. Jogador de time pequeno, por incrível que possa parecer, sempre acaba se arrumando.”
José Mário de Almeida Barros é carioca. Nasceu no dia 1º de fevereiro de 1949, completa hoje, portanto, 70 anos. Uma estrada longa no futebol, que começou com o incentivo do pai, que pedia apenas ao filho que conciliasse a bola com os livros e cadernos. No segundo semestre de 1967, o rapaz parou com o futebol para não se prejudicar na escola. O pai era louco por futebol e insistiu para que Zé não deixasse a bola de lado. “Ele trabalhou nas obras do Maracanã e, desde então, ficou ainda mais vidrado em futebol.”
Zé começou a jogar no time de futebol de salão da Associação Atlética Vila Isabel, do bairro de mesmo nome. O jogador que se tornaria famoso por conta do estilo arrojado e marcador foi antes um driblador dos bons nas quadras. E — creiam — goleador. Da bola pequena e pesada para a grande, dos gramados. Em seguida, Zé despontou no infanto-juvenil do Fluminense, em 66. Não se empolgou muito nas Laranjeiras. Preferia estudar. Adorava as aulas de Física e de Química do conservador Colégio São Bento.
Mas o pai o convenceu a permanecer no futebol. Do Tricolor, Zé foi parar no Bonsucesso. Treinava apenas uma vez por semana para, como de costume, não atrapalhar os estudos. Como a diretoria do clube suburbano atrasou o salário do rapaz, Zé decidiu requerer o passe livre na Justiça. Conseguiu-o e o ofereceu ao Flamengo. Foi de cara contratado: “O técnico, na época, era o Fleitas Solich, que não encontrava lugar para mim no time. Ele chegou a me experimentar na lateral-direita, depois na ponta-esquerda e, após umas poucas tentativas, desistiu de me aproveitar. Aí eu fiquei quatro meses treinando na pista com o preparador Tião Mendes, sem entrar no time nem mesmo para treinar. Com isso, acabei ganhando fôlego, porque do ponto de vista físico acabei fazendo um treinamento prolongado. Quando Zagallo assumiu a direção técnica do Flamengo, resolveu me aproveitar. Ganhei a posição de titular do meio-campo e, depois disso, me dei bem em todas.”
Foi ali o começo para valer do grande Zé Mário. Um dos mais emblemáticos craques do futebol carioca na década de 1970.
HOUSEMAN, O LOCO QUE NÃO NEGOU AS ORIGENS
por Paulo Escobar
As pessoas simples no mundo do futebol não alcançam o reconhecimento necessário, pois os que fazem o jogo e se colocam como verdadeiros produtos da fama são aqueles que mais ficam em evidência, essa evidência seletiva que visa os bons moços.
Um dos jogadores mais formidáveis tanto na simplicidade, como na habilidade, surgiu em um dos lugares mais esquecidos pelos governos argentinos, numa favela de Bajo Belgrano, ali apareceria René Houseman. El loco Houseman como seria conhecido, era um homem de povo, que começou na várzea em um time que levava por nome “los Intocables”, onde uma vez disse que ao jogar ali se sentia como jogando na seleção.
Antes de Adriano, Houseman já não conseguia largar a favela e os seus, jogador que fugia das concentrações, deixava de ir a eventos importantes para estar nos churrascos no Bajo Belgrano. Sua paixão era o time do Excursionista aonde viria a jogar, mas diante das poucas oportunidades foi parar no rival, o Defensores de Belgrano.
Menotti ao enxergar o talento deste ponta ambidestro, o leva para o “Globo” como é conhecido o time do Huracán (aonde foi campeão argentino em 1973), e foi lá que o Loco começou suas façanhas e gambetas que o colocam no radar da seleção argentina. Com um ano de primeira divisão, Houseman chega a seleção e viria a disputar as Copas de 1974 e 1978 sendo artilheiro da Argentina na Copa da Alemanha
Nos tempos em que somente quem jogava a partida recebia o valor integral por ter jogado, os reservas tinham direito a metade somente. Houseman, de coração solidário, fingia dores e se jogava ao chão perto do fim do jogo para que algum companheiro pudesse entrar e receber o valor integral também.
Um dos episódios mais lembrados na vida do Loco Houseman, foi num jogo Huracán x River. No dia anterior, tinha aniversário do seu filho. René pede para ir a festa e é liberado com a condição de chegar às 23h, mas não apareceu. Por conta do atraso na madrugada, os funcionários do clube foram buscar o Loco na festa do filho. René volta, mas inventa uma desculpa e retorna a festa chegando bêbado as 11h do outro dia, prometendo que dormindo um pouco estaria apto pro jogo.
Houseman dorme e na volta entra em campo, ainda bêbado, marca um gol contra o River e pede substituição alegando depois aos jornalistas que precisava descansar da farra da noite anterior.
O Loco não se envergonhou de seu meio e nem sofreu de amnésia, pois muitos jogadores sofrem desse mal, em relação ao lugar de sua origem. Inclusive declarou uma vez que se tivesse sido milionário compraria uma favela só pra ele. Na Copa do Mundo de 2014, aqui no Brasil, ao vir a convite de uma revista Argentina, não se hospedou em hotéis de luxo, mas foi aos morros cariocas estar com os seus iguais.
René foi o jogador que jogando pelo Huracán mais vestiu a camisa da Argentina, sendo campeão naquela Copa de 1978. De gambetas e de Boemia viveu o loco, e querido pelo restante dos jogadores, que viam nele talvez a simplicidade perdida ou então negada no mundo do futebol.
No ano passado Houseman deixou o mundo do futebol mais triste do que já tem sido de anos pra cá, viveu uma vida simples até o momento de sua morte e se divertiu jogando futebol. Quem dera muitos dos saídos das favelas não se envergonhassem e tivessem mais presente ao lado das pessoas maravilhosas que moram nos morros, quem dera tivessem a coragem e a beleza do Loco Houseman, quem sabe assim contribuiriam no fortalecimento destas comunidades.
Houseman declarou numa entrevista que quando morresse Deus o expulsaria a ponta pés do céu, pois a vida que levou na terra não o deixaria entrar naquele lugar. Não sei em que lugar do universo o loco deve estar, mas imagino que quem o recebeu deve ter sido outro gambeteiro, boêmio e driblador, numa cerveja e outra, numa pelada e outra deve estar por ai com o Mané pela eternidade e na simplicidade que ambos sabiam viver.
MESTRE ÊNIO
por Claudio Lovato
Era um cara simples, como geralmente são simples os caras realmente inteligentes.
Comunicava-se com os jogadores sem demagogia, sem condescendência, papo direto e reto entre uma baforada e outra do inseparável cigarro, sempre com respeito e com um humor que desarmava espíritos até na hora do esporro.
– Ô, negão, da próxima vez que tu fores tomar cerveja, me chama! – disse certa vez, quando era treinador do Cruzeiro, ao centroavante Dinei, depois de uma reprimenda histórica no jogador, que havia chegado para treinar em condições, digamos, precárias, e de um “castigo físico” que envolveu “cabeceios” numa medicine ball (mais detalhes em depoimento do próprio Dinei disponível no youtube).
Era camarada, compreensivo, solidário, mas também sabia ser mais malandro que o mais malandro dos malandros. Demonstrava seu apreço pelos que estavam com ele, mas ninguém o fazia de bobo.
Transportou com sabedoria a vivência e os aprendizados obtidos nos tempos de jogador para a atividade de treinador, iniciada em 1961, no Náutico. Genial dentro de campo e na casamata. Craque da meia-esquerda, campeão gaúcho pelo Renner em 1954, jogador da seleção brasileira campeã pan-americana no México em 56, e, depois, um estrategista capaz de mudar em instantes o jeito de um time jogar.
Gostava do futebol completo: imposição física, disciplina tática e valorização da habilidade individual.
Ênio Vargas de Andrade, nascido em Porto Alegre, completaria 90 anos de idade neste 31 de janeiro de 2019.
Ele está presente na minha memória de futebol desde sempre. Em 1975, na sua primeira passagem pelo meu Grêmio, eu tinha 10 anos, e então, no dia 23 de julho, aconteceu o Gre-Nal dos três gols do Zequinha, no Beira-Rio. Aquele jogo não foi importante para mim apenas na dimensão futebolística. Foi uma experiência de vida, para a vida toda.
Mas foi em 1981 que ele quase me matou do coração, e eu tinha só 16 anos. Foi quando o Grêmio conquistou seu primeiro Campeonato Brasileiro.
Bastava um empate com o São Paulo, no Morumbi. Havíamos vencido o primeiro jogo, no Olímpico, por dois a um. O segundo jogo avançava num zero a zero perigoso. Seu Ênio resolveu tirar o ponta-esquerda Odair e mandar para campo o meia-ponta-esquerda Renato Sá, aos 15 minutos do segundo tempo.
Esta quem me contou foi o próprio Renato numa resenha para o Museu da Pelada, em 2016, em Floripa:
– O Seu Ênio me chamou e disse: ‘Renato, vamos fazer uma correria ali no meio. É o único jeito’.
Cinco minutos depois de entrar em campo, vestindo a camisa 14, Renato Sá viu o lateral Paulo Roberto dominar a bola lá na direita, perto da linha divisória, e se posicionou para recebê-la dentro da grande área do São Paulo. Paulo Roberto lançou a bola daquele jeito que mais gostava: com altura e força. A bola viajou, com Renato Sá acompanhando sua trajetória, muito atento, muito ligado no lance, muito a fim de aprontar alguma coisa, e ela veio, aterrissando na entrada da grande área, e Renato Sá subiu no tempo certinho e cabeceou para trás, mandou a bola no peito de Baltazar, o Artilheiro de Deus, que sem deixá-la tocar o chão mandou um balaço no ângulo esquerdo de Waldir Peres, e isto foi quando eu, na casa de um mano velho, na Avenida Protásio Alves, em Porto Alegre, achei que fosse ter um treco e deixar este mundo na escassa idade de 16 anos.
Um outro Renato, de sobrenome Portaluppi, foi integrado aos profissionais do Grêmio por Ênio Andrade, em 1982. E quantas coisas aprendidas com Seu Ênio ele coloca em prática hoje no comando do Grêmio. É ou não é, Renato?
Ênio Andrade nos deixou em 22 de janeiro de 1997. Faleceu em Porto Alegre.
Obrigado, Seu Ênio.
Todos nós, e não apenas os torcedores do meu Grêmio, ou do meu arquirrival colorado, ou do Coxa, clubes que conduziste em campanhas nacionais vitoriosas, mas todos nós, que fazemos do futebol algo tão importante em nossas vidas, algo tão essencial, vamos celebrar para sempre os teus feitos, o teu legado.