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SONHOS RENOVADOS

por Marcos Vinicius Cabral


Dessa vez não fui despertado pelo celular que fica embaixo do meu travesseiro (graças a ele eu não perco a hora das peladas nos domingos).

Nele, marcava 4h57 da manhã da última quinta-feira, 27 de dezembro e ao olhar pela janela, uma escuridão tomava conta do céu.

O silêncio lá fora contrastava com o daqui de dentro do meu quarto, já que na ponta dos pés – como um bailarino ensaísta – dei os habituais vinte passos até o banheiro preocupado em não acordar Raquel minha esposa e Mel nossa cachorrinha da raça Shit-zu, que dormiam um sono angelical.

No regresso ao quarto, tentei dormir novamente e não reencontrei o sono.

Sem motivo algum comecei a pensar no Museu da Pelada, espaço virtual que resgata histórias de quem jogou bola e quem não jogou, de quem foi profissional ou de quem foi perna de pau nas peladas da vida e de quem marcou gols antológicos sendo aplaudido de pé e de quem perdeu outros feitos tendo na figura materna alvo de xingamentos.

Na verdade eu não estava pensando e sim sonhando com os olhos abertos, acreditem!

Já passava das 5h da manhã, deitado com olhos fixados no ventilador de teto, sonhei com o dia que conheci Sérgio Pugliese, pelos idos dos anos 90, quando visitei a redação do O Globo, na Rua Irineu Marinho, 35 – Centro – Rio de Janeiro.

Na ocasião, à procura de trabalho como ilustrador, o máximo que consegui aos 20 anos de idade foi conhecer Chico Caruso, segundo maior chargista desse país – ninguém supera o semovente Ique que se reinventa a cada ano.


Passados 23 anos, o reencontro na sede da Approach em Botafogo, Zona Sul da cidade, naquele segundo semestre de 2016.

Eu como estudante do quinto período de jornalismo e ele como Diretor.

Não falamos sobre outro assunto que não fosse os caminhos da Assessoria de Imprensa no século XXI, em que o dono da “canhota mais habilidosa do Albertão” foi sabatinado por minha colega de grupo Raquel Miranda.

Sonhei com minha adoração ao futebol do ex-camisa 2 rubro-negro e seleção brasileira Leandro, quando escrevi uma experiência vivida no “Enquanto todos queriam ser o Źico eu preferia o Leandro”, que foi minha primeira matéria para o Museu da Pelada.

Naquela ocasião, me senti como um garoto recém saído dos juniores e que treina bem durante a semana aguardando o momento de entrar na partida.

– Sensacional amigo, ela vai ser postada! – disse Serginho, como se fosse meu treinador e me chamasse para ser incorporado ao time do Museu.

E convenhamos, fazer parte de um grupo talentosíssimo como este e que tem Paulo César Caju, é um privilégio para poucos!

E foi assim que vi a publicação tendo curtidas, compartilhamentos e comentários, porém, após ser incorporado, a titularidade ainda estava longe.

O jogo estava só começando!

Comecei a escrever, escrever, escrever, pois era o mesmo que treinar, treinar e treinar.

Com isso, fui ganhando forma, assim como Rivellino na Copa do México em 1970, em que colocou uma “pulga” atrás da orelha do treinador Zagallo, que teve que arrumar uma vaga para o craque da camisa 10 do Corinthians e Fluminense, naquele time.

Aos poucos, fui me tornando uma grata surpresa, para Serginho e André – seu auxiliar técnico – assim como foi Josimar, lateral botafoguense que foi à Copa de 1986 – Leandro não estava no voo para o México – e fez história com dois golaços contra Argélia e Polônia respectivamente.

Oba, agora eu vestia o manto – não o rubro-negro – mas do Museu da Pelada!

O ano começou e com ele os sonhos foram renovados.

Que possamos escrever histórias cada vez mais bacanas de quem tem muito o que nos contar!

Feliz ano novo a todos!

Natal Duplo

NATAL DUPLO

entrevista: Sergio Pugliese e Marcelo Soares | fotos e vídeo: Daniel Planel 

Em clima de Natal, a equipe do Museu da Pelada abasteceu mais duas escolinhas carentes no último fim de semana, no Rio de Janeiro e em Campinas! Com a colaboração dos amigos para complementar o dinheiro da venda das nossas camisas e financiar os materiais esportivos, fizemos a alegria da criançada mais uma vez.

A convite do parceiro Netto Argento, subimos Santa Teresa, bairro da Zona Central do Rio de Janeiro e, com a doação de bolas, coletes e um par de redes novinho em folha, participamos da festa de fim de ano do projeto que existe desde 2013 e reúne aproximadamente 130 alunos.

Se o material esportivo já não fosse o bastante, também levamos uma dupla de respeito: Yunes Santos e Glayds Fagundes. Enquanto o primeiro é o rei do Street Soccer e cansou de dar canetas nas crianças do projeto, ela é a rainha do Freestyle.

– Você é melhor que o Ronaldinho, tio? – perguntou um deles.

– Parece que ela passou cola na bola! – disparou outro, hipnotizado.

Na hora da distribuição do novo material, Netto botou ordem na casa e alinhou seus alunos. Segundo ele, a garotada, ansiosa, perguntava diariamente quando seria a visita do Museu.

– Não recebo nenhuma ajuda do Estado, só dos amigos como vocês! A minha missão aqui na Terra é ajudar essas crianças! Só tenho a agradecer a vocês de coração!

Após vestirem os coletes, em forma de agradecimento, a garotada soltou o grito:

– Um, dois, três: Museu da Pelada!!! – e partiram em disparada para a quadra estrear o material.

Para a nossa surpresa, o craque e parceiro Moreno, ídolo do América-RJ, também marcou presença e alegrou ainda mais o nosso dia:

– É sempre bom estar com vocês! O Museu já é uma realidade e faço questão de parabenizá-los novamente!

Ao mesmo tempo, em Campinas, o parceiro Marcelo Soares armou todo o esquema para fazer a doação ao Projeto Despertar Para o Futuro, da Ibacamp. Se no Rio os malabaristas foram a cereja do bolo, no bairro do São Quirino quem abrilhantou a festa foi o artilheiro Dadá Maravilha, um grande exemplo de superação:

– Minha infância foi difícil! Fui bandido, roubei, mas entrei para o exército e depois danei a fazer gols!

O projeto conta com a ajuda de muitas famílias e amigos que colaboram como podem e tem como um de seus idealizadores Genivaldo, mais conhecido por lá como Prates.

Conversamos com a criançada, batemos um papo com o Prates e levamos além de coletes, chuteiras e bolas, muita alegria e diversão.

Que 2019 traga ainda mais doações e esperança para essa garotada!

Valeu, rapaziada!
 

 

ACREDITE EM ALGO

por Idel Halfen


Quando chega o final do ano, além das tradicionais festas e encontros de congraçamento, costumam também ocorrer algumas premiações que têm como base as escolhas de quem foi o melhor em algo. A melhor empresa, o melhor profissional, o melhor atleta, o melhor produto e por aí vai. 

Confesso não levar muito a sério tais escolhas, pois há nelas envolvidos muitos aspectos subjetivos, o que faz com que as chances de injustiça sejam grandes. Todavia, reconheço serem eventos importantes pois, mesmo que o melhor não vença ou efetivamente não exista, motiva os envolvidos a almejarem tais prêmios e trabalharem com mais afinco para tal. 

Nessa linha, vamos falar sobre a Nike que foi eleita pela AD AGE a anunciante do ano em 2018. 

A campanha que lhe rendeu a premiação posicionava a marca a favor do jogador de futebol americano Colin Kaepernick, que em 2016 iniciou um movimento de protesto contra as desigualdades raciais, se ajoelhando no momento em que o hino do país era tocado antes das partidas. 

Acusado por alguns de antipatriota e visto por outros como herói, sua atitude provocou um amplo debate que foi aproveitado pela Nike em um anúncio com a imagem de Kaepernick e a mensagem: “Believe in something. Even it means sacrifying everything” – Acredite em algo, mesmo que isso signifique sacrificar tudo. 


Assim como o gesto, a campanha foi bastante comentada, o que deu ainda mais destaque à empresa de material esportivo. 

É válida a discussão sobre a iniciativa da empresa explorar um aspecto social – e polêmico – numa campanha, valendo salientar que a mesma teve um bom índice de aprovação entre os mais jovens e trouxe reflexos positivos nas receitas. 

Há que se destacar também a solidariedade da empresa ao ficar publicamente do lado do atleta, afastado das competições desde o início dos protestos.

Contudo, é importante refletir sobre até que ponto uma marca pode ir quando se trata de temas que dividam a sociedade, mesmo porque, ainda que a motivação para o gesto do atleta seja nobre, o ato de protesto a um símbolo da pátria ofende aos mais “patriotas”. 

Não seria mais efetivo escolher causas importantes como a encampada, mas de uma forma que não desagradasse a uma gama tão grande de pessoas?


Independentemente do questionamento acima, creio que sair do lugar comum das campanhas venha a se tornar uma tendência de mercado, onde cada vez mais empresas se dão conta da necessidade de encontrar propósitos e por em práticas atitudes para satisfazê-los. 

Da mesma forma, desejo que este Natal ilumine a todos e que a tendência preconizada acima saia do âmbito corporativo e atinja a todos os setores e pessoas. 

No mais, seguem meus votos para que esse seja o melhor Natal da vida de vocês, mesmo que a expressão “melhor” seja subjetiva, o que nos concede margem para “acreditar em algo”, inclusive que os próximos serão ainda melhores.

UM REI MAIOR QUE O MENINO NEY

por Paulo Escobar


Reinaldo, mineiro de nascimento, nunca foi quieto. Desde muito cedo já mostrava quem seria, driblador, bom de bola e fazedor de gols. Chegou ao Galo com 14 anos depois do técnico do juvenil, Barbatana, ouvir falar do jovem craque.

Além do seu talento, também chamava a atenção seu estilo desenvolvido de maneira esplêndida desde muito pequeno. No time principal do Galo, ainda nos treinos, teve que começar a lidar com as pancadas que levava, o que viria a ser um problema na sua vida.

Há atacantes trombadores, oportunistas ou que passam sem deixar saudades tanto dentro como fora de campo. Existem aqueles que são grandes em campo, geniais e sem graça do lado de fora (vide Neymar), mas existem os Reinaldos, aqueles que são geniais dentro de campo e colocam um tempero à vida do lado de fora.

O maior artilheiro da história do Atlético-MG foi chamado de Rei pelos atleticanos, pois para estes o seu monarca era Reinaldo. Cada um tem seu Rei, cada torcida tem seus ídolos, em tempos do ainda reinado de Pelé, em Minas quem imperava era Reinaldo.


Quantos atacantes do futebol nacional você consegue lembrar que tenham feitos 28 gols num Brasileirão, ou possuem uma média de 1,56 por jogo? Não entendo por que o Rei não tem um lugar de destaque maior daquilo que lhe foi dado?

Ídolos não deveriam ser propriedade de uma única torcida, ainda mais quando tiverem feitos como os de Reinaldo, pessoas grandes fora dos campos que conseguem se movimentar de alguma forma a favor dos mais sofridos deveriam ser mais lembradas. Mas também entendo que no jeito que este mundo está estruturado, ídolos bons de pés e isentos de pensamentos merecem mais destaque.

O Rei devia driblar os seus adversários e as pancadas que levava, deveria driblar o silêncio imposto pela ditadura militar através das palavras de Geisel, que na despedida da Seleção para a Copa de 1978 lhe diz:

– Vai jogar bola, garoto. Deixa que política a gente faz!

Não obedece a censura imposta e, no seu gol contra a Suécia, Reinaldo comemora com seu braço erguido e punho fechado, gesto dos panteras negras, pois o atacante tomou lado nas épocas de torturas e desaparecimento.


Amigo de gays sem se importar como os preconceitos que, na época, eram fortes também, ainda mais no futebol, um meio bastante homofóbico, pode ter sido um dos fatores que também sofreu as consequências do lado de fora. Participou da campanha que levara o Brasil à Copa de 1982, mas, discriminado pelas suas posições, acabou não sendo convocado.

As dores das contusões e as dores internas o levam a procurar formas de aliviar as mesmas, as drogas são o episódio lembrado e taxado, não escondeu o uso, não se isentou sobre o tema. Mas cada um sabe as dores que carrega e o que faz para aliviá-las, o Rei foi grande na sua sinceridade e humanidade.

Qual é a diferença dentro de campo na habilidade e na sede de gols de Reinaldo e Neymar? O Rei teve a carreira abreviada devido as pancadas, claro que não teve o mesmo marketing e não foi um eterno menino bajulado e blindado pela mídia. Mas dentro de campo Reinaldo foi diferenciado, só não esteve na Copa de 82 e nos grandes centros pelas suas posições fora de campo. Poderia ter se silenciado e seguido os passos de Neymar.


Reinaldo teve que driblar as pancadas e a opressão, teve que jogar em épocas difíceis e não se isentou. Não foi menino em suas posições e se a seleção lhe fechou as portas pelo que pensava, azar da seleção.

Num mundo ao contrário, que valoriza os lucros e destina ao ostracismo o lado humano, que coloca como vencedores aqueles que dançam conforme a música, ídolos como Reinaldo devem ser apagados das histórias. Mas estes ídolos são resistentes ao esquecimento e subvertem até o ostracismo a que se procuram destiná-los. Me arrisco a provocá-los e sem nenhum medo lhe digo que tanto dentro como fora de campo:

Reinaldo é maior que Neymar!

NOS TEMPO DO ONÇA

por Victor Kingma 


Nos anos 60, os campeonatos estaduais viviam o seu auge e os estádios estavam sempre lotados. No Rio, o Flamengo, que na primeira metade tinha sido campeão em 1963 e 1965, passou todo restante da década sem conquistar um título sequer.

O jejum de conquistas começou em 1966, ao perder por 3 x 0 a célebre decisão contra o Bangu, jogo que acabou em pancadaria, protagonizada pelo lendário Almir, o pernambuquinho.

Nos anos de 1967 e 1968, sua torcida teve que conviver com a impressionante hegemonia do Botafogo, que montou um dos maiores times de sua história, com quase todos os jogadores oriundos da sua base.  Realmente era difícil conter o ataque formado por Rogério, Gerson, Roberto, Jairzinho e Paulo César, comandados pelo novato técnico Zagalo, ainda com um “L” só no nome. Nesses dois anos o Flamengo sequer chegou à decisão, vencidas pelo alvinegro contra Bangu (2 x 1) e Vasco (4 x 0).

Em 1969 a seca de títulos continuou, quando os rubro-negros perderam por 3 x 2 a decisão para o Fluminense, cujo grande destaque era o centroavante gaúcho Flávio, o Minuano, o artilheiro do campeonato.

Naqueles sombrios anos sem conquistas para o futebol rubro-negro, as alegrias vinham de esporádicas e emocionantes vitórias.


A torcida vivia à procura de um ídolo, quando, no início de 1968, vindo da Bahia, aportou na Gávea um raçudo quarto zagueiro,  de nome Onça, que, vencida a desconfiança inicial pelo estranho apelido, logo foi alçado a essa condição.

E o bravo Onça, teve mesmo os seus dias de glória:

Numa partida contra o arquirrival Vasco, invicto há 10 partidas, pelo segundo turno do campeonato de 1968, o Flamengo perdia por 1 x 0 quando o zagueiro marcou um golaço de falta, da intermediária, empatando a partida e caindo de vez nas graças da torcida. Até porque, Dionísio, “o Bode Atômico”, e ainda, de letra, marcaria o gol da sensacional vitória, comemorada com euforia pelos rubro-negros, em tempos de vacas magras.  Isso diante de 134.185 mil pagantes, recorde nacional de público naquele ano.

As manchetes dos jornais do dia seguinte deram grande destaque, não só à vitória rubro-negra mas ao golaço de falta marcado pelo novo xodó da torcida.

Sem ser um craque consagrado, como tantos que vestiram a camisa rubro-negra, Onça era daqueles jogadores respeitados pela torcida do Flamengo, pela raça com que defendia as cores do clube.


Além do Flamengo, onde jogou 164 partidas e marcou 7 gols, de 1968 até 1971,  atuou ainda pelo Fluminense-BA, Sport de Recife, Bahia e Sergipe, onde encerrou a carreira, em 1978.

Mario Filipe Pedreira, o Onça, nasceu em 13 de julho de 1943, na cidade de Santaluz, Bahia, e faleceu em 7 de setembro de 2017, em Salvador, aos 74 anos de idade.

Sua raça e determinação o fez entrar para a história do clube e nas resenhas diárias com os amigos se vangloriava muito disso, antes de ser acometido pelo mal de Alzheimer, nos últimos anos de vida.