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FLUMINENSE 1983/1985

por Marcelo Mendez

O ano de 1984 na minha vida foi bem diferente daquele que o Orwell pintou em seu homônimo livro.

Ele até viria acertar depois, mas em 1984 as coisas ainda eram legais.

Eu tinha 14 anos, era o camisa 10 do Nacional do Parque Novo Oratório, que na nossa categoria, já havia vencido três títulos no ABC e no Estadual Infantil a gente estava passando por cima de todo mundo. No mundo dos amores, minha primeira paixão (ou algo parecido) já rolava e ela me ensinou a sacar que não era só o The Clash que era legal ouvir.

A Blitz com seus hits “Geme, Geme” e “A Dois Passos do Paraíso” embalavam a nossa vida de namorinhos de portão. No futebol, a coisa fervia em Santo André.

O time da cidade surpreendia e ia muito bem no Campeonato Brasileiro. Iria mais a frente talvez, se não encontrasse o time homenageado hoje aqui em Esquadrões do Futebol Brasileiro:

Nossa coluna rende, portanto, homenagem ao Fluminense de 1983/1985.

O CASAL 20 DE LARANJEIRAS E UM PUNHADO DE MENINOS

Nossa história poderia começar pela ultima glória do time tricolor quando desbancou o Flamengo na disputa do titulo carioca daquele ano. Seria legal até, porém, aquela foi a última conquista do Fluminense, antes dos anos de ouro do Flamengo de Zico.


A partir daí houve uma reformulação em Laranjeiras, o time manteve Delei, como remanescente de 1980, trouxe para o time de cima nomes como Jandir, Branco, Duílio, Aldo, o Paraguaio craque de bola Romerito e a grande atração daqueles anos:

Assis e Washington, o Casal 20.

Sim meus caros, antes de existir Netflix também existia seriados de televisão.

Nos EUA, uma série escrita pelo autor de Best Sellers Sidney Sheldon, estrelada por Robert Wagner e Stefanie Powers falava da vida perfeita de um casal que se dava muito bem em tudo. A alcunha caiu como uma luva para a dupla de atacantes que havia levado o Atlético Paranaense ao terceiro lugar em 1982 e que agora brilharia no tricolor.

Pronto:

Já havia a base sólida que viria a tomar conta do futebol no Brasil nos anos que se seguiriam…

UM CAMPEÃO BRASILEIRO EM SANTO ANDRÉ

Na noite em que meu pai estava preocupadíssimo com a votação das Diretas Já, eu só pensava em ir ao Brunão para ver o Santo André jogar.


O time da Cidade estava fazendo uma beleza de campeonato nacional, já havia vencido o Grêmio, então campeão mundial, em casa, e agora, na fase de grupos, precisava de uma combinação de resultados para se classificar para as quartas de final do Brasileirão. Dito e feito:

Um revés do Vasco e o outro da Portuguesa, associado ao gol de Esquerdinha para o Santo André, estava levando o Ramalhão para semifinal do campeonato e assim foi até os 37 do segundo tempo.

Após o escanteio batido, Delei pega o rebote da entrada da área e empata a partida para o já classificado Fluminense impedindo assim a primeira aventura do Santo André e marcando sua presença na minha vida de menino que amava futebol.

Surgia ali para mim, um timaço de bola…

O BRASIL É TRICOLOR

Depois de um baile de bola no Corinthians de Sócrates, o Fluminense foi à decisão contra o Vasco.


Em duas partidaças, primeiro venceu o Vasco por 1×0 no jogo de ida e na volta, com um volume de jogo impressionante, o time treinado pelo jovem Carlos Alberto Parreira amassou o time de São Januário que contou com grande atuação do goleiro Roberto Costa para evitar que algo pior acontece-se. Final de jogo 0x0 e festa tricolor no Maraca:

O time formado por Paulo Vítor, Aldo, Ricardo Gomes, Duílio Branco, Jandir, Delei, Romerito, Assis, Washington e Tato, sagrava-se campeão Brasileiro pela segunda vez e a torcida fez a festa naquele primeiro semestre de 1983. No segundo semestre, viria mais festa.

Como seria comum em todos os segundos semestres entre 1983 e 1985…

TRÊS VEZES FLU

Foram anos de glória!

O Fluminense que havia começado a década vendo o seu rival Flamengo conquistar o Brasil e o mundo resolveu mudar a sorte das coisas a partir de 1983.


Treinado primeiro pelo técnico Carbone, o Flu quebrou a hegemonia do Rubro-Negro em 1983 e repetiu a dose em 1984 e 1985 com festas de gala no Maracanã. Títulos que mudaram a cara do Fluminense em âmbito nacional. O time mandou para seleção metade de seus titulares e o lateral-esquerdo Branco foi para a Copa do Mundo do México em 1986 tendo por lá grande destaque.

Uma máquina de jogar bola.

Essa semana, ESQUADRÕES DO FUTEBOL BRASILEIRO vem para saudar essa camisa poderosa.

Fluminense de 1983/1985, um timaço de bola.

TAFFAREL: VAI QUE É TUA…

por Serginho 5Bocas


Me desculpe quem quiser discordar, mas Taffarel foi o melhor de todos. Melhor goleiro sempre é o cara que é o melhor porque é bom e ainda pode contar muito com a sorte, pois goleiro sem sorte, um abraço!

Surgiu para nós no Mundial sub-20 de 1985 conquistando o título (o bi mundial) e logo em seguida tornou-se titular do Internacional, de Porto Alegre.

Muito jovem e com uma qualidade impressionante, chegou à seleção principal e não saiu mais de lá, só que antes teve que arrebentar nas Olimpíadas de 1988, quando junto de Romário, Bebeto, Geovani e outros craques, conquistou a medalha de prata. Destes jogos olímpicos, lembro bem da disputa de pênaltis contra a Alemanha na semifinal em que pegou uma cobrança e começou a trilhar sua trajetória vitoriosa. Aliás, pênaltis tornou-se a especialidade da casa. Em vários momentos demonstrou frieza e qualidade para defendê-los.

Lembro-me da despedida do Zico em março de 1990, quando ele foi o grande destaque. Neste dia, ele não deixou Zico marcar em seu último jogo, foi uma atuação histórica com defesas espetaculares, os flamenguistas xingaram muito este rapaz, mas eu aumentava minha idolatria por ele, quanta categoria!

Outro momento marcante foi na Copa do Mundo de 1990 quando ele estava sem sofrer gols e foi vazado apenas uma vez contra a Argentina sendo eliminado, foi a sua primeira grande frustração.


Em outra ocasião, nas eliminatórias da Copa de 1994 contra a Bolívia lá na altitude, já no final da partida, ele defendeu um pênalti e parecia que seria um herói. O que ele não podia imaginar é que nos últimos 6 minutos da partida, ele levaria 2 gols, falhando, talvez, em um deles junto com Válber e sendo considerado pela Imprensa um dos grandes culpados de nossa primeira derrota em eliminatórias.

Teve que dar a volta por cima e deu. Tinha muita perseverança, talento e paciência para provar novamente seu valor. Parreira apostou nele e não se arrependeu de levá-lo a Copa dos Estados Unidos em 1994. Taffarel junto a Jorginho, Aldair, Bebeto e Romário, foram os grandes destaques do Brasil naquele mundial e na final pegou o pênalti de Massaro e viu Baresi e Baggio isolar sua última cobrança, tornando-se um dos grandes responsáveis pelo título.

Taffarel voltou a fazer das suas com pênaltis contra Holanda na Copa de 1998, classificando o Brasil para a Final, após pegar as cobranças de Cocu e Frank de Boer. Infelizmente não foram campeões, pois perderam para a França na final, mas ai já é uma outra história.

Ele tinha a frieza necessária para intimidar os atacantes, a excelente colocação que o permitia gastar menos energia para fazer as defesas, era elástico sem ser espalhafatoso, econômico nos saltos, sem palhaçadas e ainda possuía uma liderança nata, passava tranquilidade ao time, um monstro na posição.


Taffarel ainda teve fôlego e categoria para vencer na Itália e na Turquia, consagrando-se internacionalmente e quebrando um tabu de que nossos goleiros não eram tão bons na ótica dos europeus. Estava a frente de seu tempo e abriu caminhos para os outros goleiros brasileiros. Após ele, vários goleiros brasileiros passaram a interessar ao mercado europeu, ele foi um divisor de águas na posição.

Gostaria muito que ele tivesse jogado no meu clube, mas apesar de não ter tido esta felicidade, ele conseguiu me fazer ser seu fã mesmo sem ter o gostinho de vê-lo jogar tão de perto. Pra mim o melhor do Brasil de todos os tempos.

Zé Elias

ZÉ DA FIEL

entrevista e texto: Paulo Escobar | vídeo: Johnny Jamaica

Você já se imaginou entrando em um jogo no Mineirão com 16 anos de idade recém subido da base para encarar o Cruzeiro?

Bom é isso que aconteceu com Zé Elias quando Mario Sérgio o chamou para entrar e segurar aquele rojão. Mas Zé o encarou com raça e vontade, que sempre foram parte de seu traço dentro dos gramados.


É justamente esta raça que leva a ganhar o apelido ao qual a fiel cantava seu nome “Zé da Fiel”. Chamava a atenção a vontade e raça que colocava dentro de campo, como se um prato de comida estivesse em disputa. Pois a dura realidade na qual Zé cresceu deve ter levado ele a crer que era sua chance de não deixar faltar dentro de casa.

Mas sua capacidade não ficou restrita aos gramados brasileiros e ainda muito cedo foi aos campos da Alemanha, Itália ou Grécia antes de retornar ao Brasil.

Na Inter jogou do lado de Ronaldo, Zamorano e daquele que ele mesmo reconhece que ensinou muito, Simeone. Encarou aqueles clássicos pegados da Grécia, que não ficavam somente nas quatro linhas e cresceu do lado daquela geração casca grossa do Corinthians dos anos 90.


As dores que carregava o fizeram parar talvez muito cedo, mas mesmo assim, hoje como comentarista, não abandonou o futebol, trazendo suas análises e histórias dentro dos gramados a rádio e televisão.

Naquele dia que o encontramos no Pacaembu estava vestido como no seu dia a dia, cumprimentando as pessoas que passavam e o saudavam com uma humildade difícil de ver nos dias de hoje.

Podemos dizer que tivemos uma resenha daquelas que dá gosto de continuar o papo, e esticar mais daquelas histórias que o mesmo Zé conta com seu jeito único. A sua relação muito especial com Mario Sérgio, além das histórias dentro e fora das quatro linhas, a sua visão tática que muito nos chamou a atenção que fez com que a resenha ficasse rica em todos os sentidos.

Bom, sem alongar muito, deixamos vocês com essa pessoa gente boa demais e cheio de histórias. Zé da Fiel que continua fiel a suas ideias.
 

 

Lembranças de Vavá

LEMBRANÇAS DE VAVÁ

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Daniel Planel 

Ir em busca da poesia perdida do futebol é a nossa principal missão, mas nem sempre aqueles que fizeram arte com a bola nos pés permanecem entre nós. Por isso, sempre damos um jeito de homenageá-los, seja através de reprodução de vídeos, depoimentos de familiares ou encontros com amigos.


Vavá, em hipótese alguma, poderia ficar de fora do seleto grupo de craques que já passaram pelo Museu. Bicampeão mundial pela Seleção, marcando gol nas duas finais, o artilheiro foi reverenciado com uma resenha de primeira no Zeca Bar F.C, em Ipanema, onde reunimos craques como Carlos Roberto, Moreira, Nilson Dias, Gaúcho, o goleiro Nielsen e Vavá Filho, o herdeiro da lenda.

– Ele era aquele jogador impetuoso. Tinha técnica, mas deixava a técnica de lado e ia para o corpo a corpo. Os zagueiros respeitavam demais! – lembrou Carlos Roberto.

Centroavante de respeito, o artilheiro Nilson Dias revelou toda a sua admiração pelo saudoso craque:

– Vavá foi uma referência para todos que jogaram nessa posição. Eu tenho a felicidade de ser muito amigo do filho dele.

Apesar de não ter visto o pai jogar, Vavá Filho tem o privilégio de ouvir as histórias contadas pelos amigos do artilheiro e volta e meia assiste a alguns vídeos na internet.

– É uma pena que tenha poucas imagens! – lamentou.

Antes de construir sua história na Seleção, no entanto, o Peito de Aço fez chover com a camisa do Vasco da Gama entre 52 e 58, para a tristeza dos rivais.


Durante a resenha, Carlos Roberto reforçou a idolatria dos brasileiros por Vavá ao relembrar a transferência do bicampeão mundial para o Atlético de Madrid.

– Era impressionante o número de brasileiros que passaram a simpatizar com o clube espanhol!

Quando já estávamos pedindo a conta, Gaúcho fechou o encontro com chave de ouro, contando histórias divertidíssimas de Gentil Cardoso, folclórico treinador brasileiro.

Assistam ao vídeo e sintam o clima desse encontro inesquecível!
 

 

SEXO, DROGAS E TONI SCHUMACHER

por Paulo Escobar


Num dia 6 de março de 1954, na cidade de Duren (Alemanha), nascia um dos maiores porteiros da história do Futebol. Harald Anton Schumacher, que com o tempo viria a ser conhecido como Toni Schumacher, sendo o Toni em homenagem a seu ídolo, um outro goleiro, Toni Turek que foi o primeiro arqueiro da seleção da Alemanha.

Schumacher começou a jogar no time local da sua cidade, mas não era só de futebol que conseguia viver, até porque ele não vinha de uma boa condição. Alternava suas pontes nos gols com seu serviço de Ferreiro, inclusive chega na seleção Juvenil alemã sendo ferreiro também. Somente em 1972 chega ao Colônia, onde por muitos anos foi seu porteiro e neste período conquistou títulos e glórias.

Toni queria ser o melhor da história, ficava inquieto debaixo das traves, pois se sentia preso. Imponente e sério, não aceitava as derrotas e treinava demais em busca de entrar para a história.


Claro que você que está lendo e viu aquela Copa de 1982 vai dizer que Schumacher foi aquele que acabou com os dentes de Battiston da França naquela dividida. Lance que o mesmo Toni ficou como se nada tivesse acontecido, mas que anos depois revelou que carregava uma culpa por aquela entrada. O que muitos não lembram é que, anos depois, num jogo amistoso, os dois se encontram e trocam camisas nos vestiários, mas tiveram que realizar um encontro público com a mídia em cima para o mundo acreditar.

A Copa de 1986 foi a última deste mítico goleiro alemão, mas última por ter sido expulso da seleção por conta do livro que escreveu em 1987, que no espanhol leva o titulo de “Tarjeta Roja” que seria “Cartão Vermelho”. Ali Schumacher traz a luz os dopings no futebol e as orgias nas cidades onde os times passavam, traz à tona o problema dos patrocinadores e os horários estipulados pela televisão nos jogos.

Na própria Copa de 1986, após reclamação de Valdano e Maradona, Schumacher protesta contra os horários dos jogos no México ao meio dia em pleno sol. Devido à transmissão das TVs europeias, no entanto, não teve jeito. As marcas exigiam, creio que não é diferente hoje, que os atletas aparecessem e cumprissem seus contratos a qualquer custo.


Toni destampa a panela e conta os inúmeros casos de doping, inclusive assume seu uso com drogas anabolizantes e estimulantes, em prol do alto nível e para se manter ativo, cumprindo os contratos. Os casos de companheiros de seleção ou de times que pediam para um jogador de nome não divulgado de apelido “farmácia ambulante”, que tinha certo conhecimento em medicina, receitar e trazer as drogas.

Schumacher traz à tona aquilo que deve acontecer até hoje em nome do alto nível, coloca a luz nos problemas de ter que se manter num nível exigido em nome do espetáculo. Além da capacidade humana ou do talento, as marcas pedem que seus produtos estejam ativos mesmo em meio a contusões, acelerando os processos de melhoras ou então sacrificando a níveis extremos.

Na Eurocopa da Itália em 1980, Toni teve que jogar com um dos dedos arrebentados e a sua marca de luvas fabricou uma com um suporte de gesso para que ele jogasse. Comprimidos para jogar, comprimidos para viver, comprimidos para dormir e assim era a rotina de muitos jogadores, segundo Schumacher.

O que não pode ser deixado de lado é que Schumacher foi um grande goleiro, um exímio pegador de pênaltis e de uma segurança dentro da área impressionante. Que do lado de fora apontou para a relação do nacionalismo, a politica e o futebol e as interferências externas que muitas vezes determinam os resultados do lado de dentro.


Jamais condenarei Schumacher por ter falado o óbvio ou por ter dito aquilo que até hoje deve acontecer, pois em prol do espetáculo, da vitória a qualquer custo, dos patrocinadores e mídias imporem seus horários e rotinas, Toni não teve medo de falar e trazer à tona as mazelas do chamado alto nível.

O futebol, a exemplo do mundo e das pressões e opressões sofridas, leva ao uso de substâncias variadas para encarar e conseguir satisfazer os resultados esperados. Alguns se utilizam das chamadas drogas “ilícitas” e outros das chamadas “lícitas”, mas ambas nos excessos arrebentam qualquer ser humano.

Sem hipocrisia, há mais do que um gramado com 22 correndo atrás de uma bola, há muita coisa rolando em prol do chamado espetáculo e há a vida daqueles que jogam e a opressão que sofrem aqueles que falam e pensam o futebol além das quatro linhas. Há situações a serem conversadas de forma mais humana, e Toni não teve medo de trazer à tona problemas reais mesmo que isso lhe custasse a expulsão da seleção alemã.

Futebol não é só um jogo e se mistura com muitas coisas externas a ele, e querer moralizar a sociedade através do futebol continua sendo um erro. As drogas são uma realidade no mundo do esporte e por uma série de motivos. Schumacher trouxe alguns dos motivos, não está na hora de discutir esta realidade de uma outra forma?