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DESMISTIFICANDO TELÊ SANTANA

por Luis Filipe Chateaubriand


Não cabe aqui questionar a excelência do trabalho de Telê Santana como grande treinador que foi. Isso é líquido, cristalino e inquestionável. Sempre foi um técnico que buscou imprimir em seus times a marca do futebol bem jogado, técnico, artístico.

Alguns imaginam que isso começou quando assumiu o cargo de técnico da Seleção Brasileira, em 1980. Falso. Seu trabalho anterior no Palmeiras, por exemplo, mostra que armou um time que “jogava por música”, mesmo com jogadores de técnica não lá muito desenvolvida. Seu Palmeiras de 1979, especialmente no Campeonato Paulista, foi um time de futebol bastante apreciável, embora tenha sido eliminado nas semifinais pelo rival Corinthians, que seria o campeão.

Contudo, alguns resolveram alçar Telê à condição de mito. Aí, parece ser um pouco demais.

Vejamos alguns vícios do treinador Telê Santana em relação à Seleção Brasileira que disputou a Copa do Mundo de 1982, decantada em prosa e verso como a melhor do pós 1970:

  • Telê, desde que assumiu a Seleção até a Copa, nunca convocou Emerson Leão, o melhor goleiro do país. Preferia jogar, na zaga, com o técnico, porém lento, Luisinho, ao invés do dinâmico Edinho. Tendo Roberto Dinamite à disposição, preferia escalar Serginho Chulapa. Não via que Dirceu era um ponta com função tática muito mais útil que Éder. Não percebia que Batista poderia dar mais solidez ao sistema defensivo. Teimosia pura.

  • Telê se negou a enxergar que o Flamengo de 1981 era um time incrível – seja tecnicamente, seja taticamente, seja em termos de conjunto – e, assim, perdeu a oportunidade de fazer essa espetacular equipe seu time base para 1982. Não o fez porque isso seria “encher a bola” de Cláudio Coutinho, que armou aquele brilhante escrete. Vaidade pura.

  • Telê não convocou o craque, o gênio, o espetacular Reinaldo para a Copa porque este mantinha relacionamentos de amizade com homossexuais e tinha visão política distinta da dele. Preconceito puro.

  • Telê, diante da negativa de Tita em continuar na Seleção jogando de ponta direita, o excluiu definitivamente das convocações, ao invés de, através da conversa, tentar convencê-lo a atuar daquele lado do campo, brilhante que era. O lado direito do time ficou torto. Inflexibilidade pura.

  • Telê, não dispondo de Tita, treinou meses Paulo Isidoro na ponta direita… para depois praticamente não utilizá-lo em toda a Copa. Incoerência pura.


Em função destes fatos, se está dizendo que Telê era mau técnico? De forma alguma. Mas havia falhas notáveis em seu trabalho, como, por exemplo, levar pouco em consideração concepções táticas ao armar seus times. Alguns dizem que o “barato” dele era botar os melhores em campo e que eles treinassem coletivos e se entendessem. Não era bem assim, mas que a concepção tática ficava em segundo plano, parece ser real.

Transformar um profissional com méritos, mas também com deficiências, em mito, parece não ser apropriado. É hora de desmitificar.

Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há 40 anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email: luisfilipechateaubriand@gmail.com.

COMPETIR É IMPORTANTE

por Idel Halfen


A desproporcional concentração de renda nas mãos de alguns clubes no futebol brasileiro tem tudo para redundar em uma gradativa perda na atratividade da modalidade. A citada “concentração” teve início na distribuição das receitas relativas ao direito de se transmitir os jogos quando, baseado em pesquisas sobre o tamanho das torcidas, alguns clubes começaram a receber muito mais do que outros, o que por sua vez tende a amplificar o desequilíbrio em função das maiores receitas com patrocínios e prêmios oriundas de prováveis melhores desempenhos. 

Diante desse quadro não é nenhum absurdo considerar que muitos dos fãs do futebol direcionarão sua atenção para modalidades onde os “escolhidos” para receberem sua torcida tenham maiores chances de triunfo. 

Isso não significa que deixarão de torcer por seus clubes, apenas não serão mais tão assíduos, o que se reflete no menor consumo de produtos, audiência e presença no estádio. Sendo que não pode ser descartado um cenário no longo prazo em que toda a cadeia sofra os efeitos do “esvaziamento” de atenção, o que inclui as emissoras que transmitem os jogos e os próprios clubes com maiores receitas, visto que um ambiente sem emoção é um dos maiores ofensores da atratividade no esporte. 


Não é incomum, muito pelo contrário, ver pessoas preferindo assistir a um jogo de uma equipe estrangeira, mesmo que de outras modalidades, do que seu time. 

Aqui fica mais uma vez evidente um dos maiores erros que se comete em marketing: o não mapeamento da concorrência. 

Exemplificando, é possível preferir um refrigerante a outro, porém o consumo efetivo ser de água ou de qualquer outro tipo de bebida, isso sem entrar no mérito de distribuição, precificação e divulgação dos produtos em questão. O mesmo ocorre no futebol, o sujeito continuará preferindo sempre seu time a qualquer outro, porém as chances de assistir a jogos internacionais e/ou de outras modalidades são bem maiores do que outrora, até porque o escolhido naquele momento tem mais chances de vitórias e, consequentemente, será capaz de atrair sua atenção/emoção. Isso sem contar que no dia seguinte não encontrará com torcedores da equipe adversária para incomodá-lo em caso de derrota. 


Não creio que nessa altura haja ainda espaço e tempo para se discutir sobre os critérios, ou mesmo sobre a fidedignidade das pesquisas. Eu sempre os questionei – que se registre -, mas mesmo que estejam corretos sob algum prisma, eles certamente não contemplam uma visão de longo prazo, tampouco estratégica. Portanto, urge que sejam tomadas medidas para que as rivalidades sadias sejam restabelecidas e a indústria do futebol no Brasil não venha a ser dilapidada por interesses egoístas e míopes. 

Assim como preconizava o Barão de Coubertin com a frase “o importante é competir”, podemos analogamente afirmar que “competir é importante”, o que, aliás, pode ser atestado pelo sucesso das principais ligas norte-americanas.

QUEM É GRANDE?

por Idel Halfen


Uma tese do jornalista Rodrigo Capelo causou enorme polêmica junto aos torcedores dos clubes de futebol. O ponto central de sua afirmativa era a de que o futebol brasileiro tem atualmente no máximo cinco clubes grandes, baseando essa segmentação na capacidade competitiva das equipes, a qual, por sua vez, é influenciada pelo faturamento dos clubes.

Antes de prosseguir com o debate, convém esclarecer que considero o jornalista em questão como um dos mais, se não o mais preparado do setor, sendo um dos poucos que estuda, pesquisa e que não fica preso a paradigmas ou preocupados em ter espaço na mídia popular, na maioria das vezes sensacionalista e ignorante acerca de temas ligados à gestão. 

Esse reconhecimento não significa que eu esteja de acordo com sua tese, aliás, nesse caso sou radicalmente contrário, devendo ficar claro que a minha contestação não tem relação com o fato de o meu clube ter ficado de fora da relação dos “grandes”, mesmo tendo se sagrado duas vezes campeão brasileiro  nos últimos 9 anos. A propósito neste período apenas quatro clubes conquistaram o citado título.

O que questiono é a definição do que é ser grande, visto existirem milhares de atributos de avaliação em qualquer segmento. Um sujeito grande pode ter essa qualificação em função da altura, do peso, do caráter e de uma série de características que assim o adjetivem. Uma empresa tem essa avaliação devido ao faturamento, número de colaboradores, abrangência regional, etc., contudo, todos esses indicadores necessitam de alguma parametrização.   Exemplificando, um cachorro da raça dog alemão é enorme até ser comparado com um elefante.

Entendo a alusão feita à competitividade, mas se seguirmos nessa linha poderemos concluir que não há nenhum time grande no Brasil, pois nenhum deles tem tido projeção reconhecida em campeonatos intercontinentais. 

Já a variável “faturamento” é coerente, sem dúvida, mas de que adianta faturar se o dinheiro não for bem aplicado? Avaliar o EBTIDA, o nível de endividamento e demais indicadores também ajudariam a entender esse mercado, mas não isoladamente. 

Outro fator importante é o tamanho da torcida, desde que, é claro, as pesquisas a respeito utilizem metodologias e amostragens confiáveis.

Como podemos ver, existe uma infinidade de possibilidades e critérios a serem adotados, valendo salientar que o próprio Capelo deixou claro que sua tese era fruto dos critérios que ele considerava pertinentes, ou seja, não se considerou o “dono da verdade” em sua conclusão.

Todavia, penso que em vista dessa gama de variáveis seria necessária a elaboração de uma modelagem que permitisse ponderar cada um dos indicadores e ainda assim surgiriam questionamentos, isso sem falar no tempo que levaria para se testar os modelos. 

Algo bastante complexo para se aplicar numa discussão que, no meu modo de ver, é pouco pragmática.

Dessa forma, minha sugestão é que não se despenda energia tentando segmentar instituições fortemente atreladas à paixão e que os resultados esportivos se encarreguem de proporcionar as devidas classificações aos clubes.

Para concluir, reforço a fala do Capelo acerca do perigo que corre a indústria do futebol com a crescente concentração de receitas, essa sim, digna de preocupação e carente de estudos que mostrem os indubitáveis grandes riscos envolvidos.

NÃO SUPORTO COVARDES

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Ainda estou me refazendo do susto de ontem, do efeito devastador do temporal que me obrigou a atravessar o Jardim Botânico com água no peito. Eu e centenas de pessoas se viraram como puderam para chegar em casa, enfrentaram água suja, fios desencapados, bueiros abertos e o risco de serem eletrocutadas.

Por falar nisso, não ouvi mais ninguém falar do acordo entre o Flamengo e os familiares das vítimas do CT. Não merecemos esse desleixo. Para piorar, o clube acaba de assinar um novo contrato milionário, junto com o Fluminense, pelo Maracanã. Quer dizer que o estádio é mais importante do que as vítimas? Somos um povo destemido, que não se acovarda. Por isso, não suporto os covardes.

É inevitável não trazer essa comparação para o futebol, afinal resolvi enfrentar a força da chuva logo após assistir Corinthians x Santos, uma aula de covardia de Carille. E depois ainda me questionam quando elogio Sampaoli e seu futebol ofensivo. Ontem, mesmo após fazer o gol, o jovem time de Rodrigol, Pituca & Cia continuou em busca do segundo para evitar os pênaltis enquanto a turma de Carille estava nas cordas, acuada, contando os segundos para a partida encerrar. Por favor, não chamem isso de estratégia, mas de futebol de quinta categoria. Pobre dos jogadores, como Pedrinho, que pegaram Carille como treinador.


Técnicos assim são cemitérios de talentos. Ainda bem que Cuca também superou seu temporal particular e voltou ao mercado. E eliminado Felipão o que é melhor ainda! Esses técnicos poderiam se juntar e lançar um manual chamado “Vença sendo Covarde”.

O Palmeiras é outro caso de cemitério de bons jogadores. Certamente Dudu renderia bem mais na mão de outro professor. O Bruno Henrique vinha fazendo gols, mas foi recuado porque em time de Felipão fazer mais de um gol é pecado. O meio-campo não é valorizado. O zagueiro bica para frente, um cabeçudo faz o gol e depois inicia-se a aula de covardia.

Por falar em covardia por que o valentão Felipe Melo não foi selecionado para bater pênalti? Vou torcer muito para o São Paulo porque o Cuca coloca o time para jogar, aposta na garotada. Carille vencendo continuaremos na mesmice, no retrocesso.

Já viram o Fortaleza, de Rogério Ceni jogar? Então, vejam! Tomara que ele continue seguindo a filosofia do futebol ofensivo e bom de se ver. Atacantes rápidos, que lembram os velhos pontas! Contra o Vitória, pela Copa do Nordeste, fez quatro, mas podiam ser dez!

Viram Barcelona x Atlético de Madrid? Simeone segue o manual dos covardes, mas a dupla Suarez e Messi são os palhaços que o circo do futebol precisa. Necessitamos cada vez mais de malabaristas, entortadores, magos e artistas. Nosso dia a dia já é muito turbulento para assistirmos espetáculos dirigidos por maestros que não deixam sua orquestra tocar. 

PELO SAGRADO DIREITO DE ERRAR

por Zé Roberto Padilha


Às vezes, confesso, tenho que tirar o meu chapéu para a FIFA. Reconhecer sua insuperável capacidade de retirar do futebol o que ele carrega de mais surpreendente, inesperado e irreverente. E que levava a diversidade de quem mais ousava praticá-lo, com arte e improvisações, a alcançar a hegemonia mundial.

Depois que Rivaldo, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho, três bolas de ouro da entidade, levantaram nosso quinto título mundial, ela se aliou a Sony. E juntas decidiram, pela tecnologia, que todos os países deveriam jogar por igual em cada campo e telinha desse mundo. Ou dariam um jeito de tirar o Brasil da jogada porque não teria mais a menor graça. Mas com um mercado deste tamanho? Com uma paixão como a nossa? E começaram a igualar sua prática pelos estádios. Todos os torcedores tinham que se comportar nas cadeiras, nada mais de Arquibaldos, que carregavam isopores, Geraldinos, que expressavam de perto seus amores. Viraram Arenas frias, aqui e na Grécia, na Turquia e no Uzbequistão.

Lançaram videogames tão reais que muitos garotos deixaram nossos campinhos de pelada, onde inventaram uma arte única, lançaram dribles, construíram artimanhas, para se trancarem nos quartos e trocar passes laterais no lugar de arriscarem uma arrancada para o gol. Mesmo alcançando seu objetivo, nos levando a perder seguidos mundiais e passar a atuar tão previsíveis quanto a Croácia, e a ser eliminada por último pela mais comedidas das Bélgicas, resolveram nos punir ainda mais. E acabaram de nos roubar até o sagrado direito de errar. E criaram a praga do VAR.


Inventado pelos ingleses, rigorosos com o tempo, e administrados pelos suíços, precisos como seus relógios, jamais entenderão a paradinha que o nosso Rei Pelé criou para atrasar o tempo de bater uma penalidade máxima. E enganar o arqueiro adversário.

Quando, em 1995, Renato Gaúcho meteu a barriga, os braços e os testículos naquele cruzamento do Aílton, e tirou da Gávea o título estadual no ano do seu cinquentenário, aos 44 minutos do segundo tempo, não existia nem um VAR a julgar. Era o juiz, e seus bandeirinhas, com liberdade de escolha, de reflexos, para validar ou não, no ato da criação, no exato instante da comoção, a razão maior do futebol que é o seu grito de gol.


Agora, nem gritar o artilheiro pode, o torcedor comemorar, quem se habilita se há olhares e monitores a constranger a seguir quem ousou por ele vibrar? Se no pôquer não puder mais blefar, uma camisa discretamente na área não puder mais segurar, ao adversário nem uma artimanha empregar, o futebol deixará de ser um jogo emocionante, surpreendente e digno das paixões que carrega.

Se continuar a passarem corpo e alma a limpo a cada ato de sua criação, não será necessário mais ser jogado no Maracanã. Bastará levar a final para o confessionário do Mosteiro de São Bento. Sem as polêmicas que levamos para casa, que varam as madrugadas abastecendo nossas resenhas esportivas, e que carregam torcedores a discutir os lances horas depois nas mesinhas dos bares, que graça terá mesmo o futebol quando alcançar por aqui a sua mais completa e absoluta razão?