ADÍLIO
por Serginho 5Bocas
Adílio foi um dos meus ídolos da infância. Jogava de meia-direita e muitas vezes de falso ponta caindo pela extrema esquerda.
Jogava muita bola, apesar do chute não ser tão bom. Não batia com precisão em direção ao gol, mas seu passe era sensacional e seus dribles uma arma desconcertante e imprescindível para aquele time do Flamengo. Zico que o diga, quantas assistências do neguinho da cruzada, o galinho converteu em gol.
Adílio parecia flutuar em campo tal era a leveza de suas passadas elegantes, tinha futebol de craque e se impunha pela habilidade. A bola quando conduzida por Adílio parecia não ter peso, nunca vi ninguém tirá-la de seus pés, como protegia a redonda, aliás, uma das principais armas do Flamengo quando a vitória estava apertada era mandar a bola para ele gastar o tempo, sem contar os gols e passes em jogos altamente decisivos. Além de tudo, fazia gols em jogos importas como na final do Brasileiro de 1983 e na final do mundial interclubes em Tóquio. No total, ele fez 129 gols em sua carreira, quase todos pelo Flamengo,
Tanto talento e intimidade com a bola não foram suficientes para se firmar na seleção e jogar uma Copa do Mundo. Adílio jogou com a amarelinha apenas duas partidas: uma pela seleção de novos em 1979 e outra pela seleção principal quando vivia sua melhor fase. Ironia do destino foi justamente quando estávamos próximos da Copa de 1982 que aconteceu o jogo de sua vida. A dois meses da Copa, teve sua grande e última (única) chance: enfrentaria a Alemanha Ocidental no Maracanã.
Naquele dia ele fez uma partida memorável, comandando as ações do meio de campo e dando um passe primoroso e suave para Junior marcar o único gol daquele jogaço contra os campeões europeus de 1980 e vice mundial da Copa que estava por vir. Se alguém tivesse visto aquela partida e depois soubesse que ele não foi convocado para a Copa da Espanha, teria dificuldades para entender o porquê dele não estar na relação final dos convocados. Fico me perguntando até hoje, por que o Telê fez aquilo com o Adílio e com a Copa, será que nem entre os reservas ele poderia ser chamado?
Adílio, ainda jovem, jogava como um veterano, mandava na cancha, gastava a bola. Apesar da alegria de menino no olhar e no bailar, era futebol de gente grande mesmo, coisa de craque, futebol de encher os olhos.
Adílio nunca foi a uma Copa do Mundo, uma pena!
Pena para Adílio, para a Copa, para nós que amamos a bola e para o futebol.
Na época não entendi nada e hoje muito menos.
Alguém poderia me explicar?
PROJETO INTER CAMPUS
Foi com muita felicidade que recebemos do parceiro Anderson Jedai a notícia de que um novo projeto social havia acabado de começar na Favela Kelson´s. Trata-se do Inter Campus, um projeto social sem fins lucrativos fundado e administrado pela Inter de Milão desde 1997.
Com a ajuda de programas de futebol juvenil desenvolvidos e mantidos dentro das comunidades, o principal objetivo é fornecer assistência às crianças necessitadas.
No campo de terra da Kelson´s, onde o Museu já esteve presente no fim de 2017, 60 crianças de 7 a 15 anos são atendidas diariamente. Vale ressaltar que, além do esporte, a leitura também é incentivada pelo professor Anderson Jedai. Enquanto Hildebrando Gonçalves Rodrigues comanda o projeto no Brasil, Fábio Pinheiro coordena no Rio de Janeiro!
Mais um golaço de placa na Kelson’s!
PELA VOLTA DO FUTEBOL AO POVO
por Paulo Escobar
Um futebol distante das pessoas pobres é de certa forma reprimir a paixão daqueles que sofrem todos os dias, a partir disso que começamos a pensar em como poderíamos reaproximar de novo o futebol ao povão.
O que nos aproximou do Museu da Pelada foi a ideia de preservar a memória do futebol, percebemos na página também que muitos dos excluídos do futebol voltaram a ter acesso às histórias de seus ídolos, e de certa forma muitos lembravam seus momentos de estádio quando este era acessível ainda.
Foi assim que começamos a caminhada para o projeto que leva por nome “Museu, Maloca e Boteco”. Para entender a lógica do programa, o Museu vem justamente em homenagem à página visando manter a ideia de preservação da memória do futebol, Maloca para que nós que estamos tocando este projeto não esqueçamos das nossas origens e o lugar a partir de onde enxergamos a realidade e o Boteco por ser o lugar onde rolam as resenhas sobre futebol, o espaço acessível às discussões onde na cerveja e prosa todos são técnicos.
No programa de estreia na quinta, dia 14, estivemos sentados na mesa de bar e recebemos Juliana Cabral, capitã histórica da seleção feminina, Roseli, que fez muito gol e jogava muita bola e com certeza não ficou devendo a ninguém no futebol jogado, Basílio, pé de anjo que fez talvez o gol que transformaria a história do Corinthians, Helvidio Matos, que nos seus anos de jornalismo buscou mostrar o lado humano do futebol, Mauro Beting, comentarista histórico e que o povão o tem na memória, Vitor Guedes, que contribuiu muito naquela mesa com suas ideias, Lu Castro, que é uma lutadora do futebol feminino que resiste e reivindica melhorias.
Foi emocionante ver as pessoas do bar Repanchos na Mooca baixa, que muitas vezes observam seus ídolos somente pela TV, estarem próximos e poder abraçar cada um deles. Ver pessoas que moram nas ruas e não têm acesso ao estádio poder sentir aqueles que vivem do futebol ao lado deles.
Os meios de comunicação muitas vezes se tornam inacessíveis às pessoas que assistem, e de certa forma contribuem no distanciamento. O que vemos sobre futebol é mais do mesmo e comentários feitos a partir de uma realidade que muitas vezes não é a do torcedor.
Se as arenas excluem, muitos meios também, então o que nos resta é tentar o caminho inverso, o da aproximação. De sair do outro lado da tela e ir até onde o povão que vive o futebol e sua paixão se encontra. É isso que estamos procurando, e lá na Mooca baixa que estamos procurando levar os ídolos e pessoas ligadas ao esporte a estarem com o povo, que escutem o que eles têm a dizer e que sintam o que eles sentem e vivem.
Quebrar a bolha do distanciamento, e voltar aqueles que não estão mais nos estádios ou não tem canais fechados, para os quais o futebol não tem sido pensado de décadas pra cá.
Não estamos inventando a roda, mas queremos ser resistência às coisas do jeito que estão sendo postas, é pensar as coisas de baixo, trazer a visão dos que o futebol tem excluído. Que os Geraldinos sejam vistos de novo e que aqueles que comemoram os gols nos seus barracos possam ter a felicidade de abraçar seus ídolos de novo.
Foi o primeiro programa, esperamos que venham muitos mais, quinzenalmente nos reuniremos no boteco e ali conversaremos sobre futebol. O boteco será nossa geral e ali as pessoas poderão ter de novo o prazer de se sentirem pertencentes ao esporte que alegria e lágrimas lhes dá.
Dia 28 de março partiremos para o segundo programa e contamos com vocês para fazer com que esta ideia chegue a outras pessoas e que assim sejamos resistência à ideia excludente que paira no nosso futebol.
Luiz Ricas, Marcelo Mendez e eu continuaremos pensando e tramando o futebol com os pés no barro. E sem esquecer do nosso amigo Sérgio Pugliese por acreditar nestes loucos sonhadores que insistem em viver a utopia já.
Não posso esquecer de agradecer ao manos do bar, Germano, Jeferson, Júnior e a tia que nos receberam muito bem, do Wladimir, Nicanor e Veio Henrique que ajudaram o Ricas na parte do áudio e vídeo, da Maris e Led que nos ajudaram a montar o cenário. Aos manos e manas do Corote Molotov que estavam tomando sua cerveja e trêmulos de emoção e nervosos por estarem diante dos seus ídolos tiravam fotos e pediam autógrafos.
Em especial quero deixar meu abraço e meu amor ao meu filho André que se alegra em cada notícia que lhe dou, e que vibrou de felicidade quando me viu pela página naquela resenha. Que além de tudo me faz viver e caminhar e seu amor é tão importante para mim, meu melhor amigo que sempre acredita em mim, te amo, cabelo, e te carrego dentro de mim.
Levar o futebol ao povão nos dias que vivemos é um ato de resistência.
Dia 27 tem mais…
QUEM É CRAQUE SEMPRE SERÁ CRAQUE
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Depois de ligação direta, lado de campo e jogador agudo, a nova criação do jornalismo esportivo é dizer que determinado time tem a digital do treinador. E basta um falar para todos os outros seguirem a cartilha. Tinha uma canção antiga do João da Praia que se encaixa bem nesse momento: “aonde a vaca vai, o boi vai atrás…”.
Se você zapear e parar um pouquinho em cada uma das mesas redondas entenderá que nossos comentaristas também estão engessados, grande parte, pelo menos. “O Palmeiras tem a digital de Felipão”, atestou um deles. Na verdade, “aonde a vaca vai, o boi vai atrás” tem tudo a ver com a escola de nossos treinadores. E justamente Felipão lidera essa lista, afinal é o mais velho, foi campeão do mundo jogando na retranca e continua em atividade. É seguido por Tite e todos os outros que vocês já conhecem.
Aí quando surge um Sampaoli, o “analista da bancada” diz que o seu time joga de forma previsível. Pior, ainda, quando surge um artilheiro, artigo raríssimo no futebol atual, e a comentarista diz que “Gustagol não faz bem ao Corinthians porque o time é obrigado a jogar em função dele…”. Ué, vai jogar na função de quem não sabe fazer gol? Outro dia uma falou que não aprovava a contratação de Cuevas porque o Santos já estava cheio de jogadores baixos. Eu escalo um time só com jogadores baixos e que dificilmente perderia.
Saindo do Brasil, o Atletico de Madrid tem a digital de Simeone. Se não tivesse, o craque Griezmann não seria tão subaproveitado. Os comentaristas atuais amam Carille, Felipão e cia, e torcem o nariz para quem tenta resgatar nossa essência, como Fernando Diniz e Sampaoli.
Atualmente moro em Floripa e é duro ver o Figueirense, de Hemerson Maria, e o Avaí, de Geninho, jogarem. Entram para não perder e ponto. Alberto Valentim usou um time de reservas contra o Cabofriense e perdeu. Qual outra competição importante o Vasco joga para agir assim? No Flamengo, o jogador mais caro da história do clube briga para ser titular!!!!
Com Vitinho não é diferente. Essa não vou entender nunca! A grande verdade é que o torcedor atual também enxerga o futebol de outra forma. Nas redes sociais, um jovem disse outro dia que aquela série de dribles de Clodoaldo contra a Itália, na Copa de 70, não aconteceria hoje porque a marcação era fraca. Aí eu pergunto, por que com a marcação forte de hoje Iniesta faz a mesma coisa? Jairzinho não sobreviveria, dizem outros. Então por que Messi, acima dos 30 anos, continua deixando seus marcadores para trás?
Como não sei desenhar tentarei explicar mais uma vez. Quem é craque sempre será craque e quem é brucutu sempre será brucutu. O problema de hoje é que os treinadores valorizam mais os brucutus, ainda mais se eles tiverem barbonas enormes, fizerem cara de mau e derem socos no ar após cada carrinho. Sou nostálgico mesmo, do tempo em que digital era só na carteira de trabalho, as vacas que puxavam a fila eram premiadas e os bois não se deixavam domar facilmente.
O DEUS, O GÊNIO E O TÍTULO
por Luis Filipe Chateaubriand
O Campeonato Carioca de 1978 teve seu primeiro turno vencido pelo Flamengo. Assim, o rubro negro assegurava vaga na final, contra o vencedor do segundo turno, mas seria campeão, sem final, caso também vencesse o segundo turno.
Ao longo do segundo turno, Flamengo e Vasco da Gama fizeram campanhas notáveis. Quis o destino que os dois grandes clubes se enfrentassem na última rodada do segundo turno.
O Vasco da Gama tinha um ponto a mais no segundo que o Flamengo, ao se chegar na derradeira rodada. Então, a situação era clara: uma vitória vascaína, ou empate, no “Clássico dos Milhões”, garantia o título do segundo turno ao cruz maltino, que jogaria a final contra o Flamengo, campeão do primeiro turno; uma vitória rubro negra no “Clássico dos Milhões” daria o título do segundo turno ao “Mais Querido” e, como este foi campeão do primeiro turno, o título do Campeonato Carioca.
Como o Flamengo precisava vencer para garantir o título do turno, e do campeonato, começou a atacar com intensidade. As oportunidades de gol do time foram se sucedendo. Mas o gol não saía…
Como principal obstáculo, uma “muralha” vascaína: o goleiro Émerson Leão, titular da Seleção Brasileira, o maior goleiro brasileiro que este que vos escreve viu em ação. Zico, Adílio, Tita, Carpegiani e companhia tentavam, tentavam e tentavam, mas as oportunidades eram desperdiçadas mediante defesas do grande arqueiro.
Com o passar do tempo, o Flamengo foi saindo para o jogo cada vez mais, oferecendo espaços ao time vascaíno. E, no contra-ataque, preciosa oportunidade foi perdido, já por volta dos 30 minutos do segundo tempo, pelo atacante cruz maltino Paulinho Piracicaba, que, sozinho e de frente para o gol com o goleiro Cantarele, chutou bisonhamente alto e sem direção.
O jogo estava quase acabando, e o 0 x 0 garantia o título do turno ao “Gigante da Colina”. Então, o lateral rubro negro Júnior alçou uma bola na área e o lateral esquerdo vascaíno Marco Antônio, sem a mínima necessidade, a jogou pela linha de fundo.
Zico, o craque do time, foi bater o escanteio, pelo lado direito. Eram 43 minutos do segundo tempo. Ninguém entendeu nada… Não era para o craque do time estar na área, buscando o gol, ao invés de bater o corner?
Pouquíssimo tempo depois, todos entenderiam…
Zico, ao se dirigir à bola para bater o escanteio, fez um gesto com as mãos. Era a senha para o zagueiro Rondinelli ir para a área. Foi o que Rondinelli fez, se posicionando na entrada da grande área, no meio desta.
No corner cobrado por Zico, a bola veio alta, mas, descaindo, passou pelo zagueiro vascaíno Abel, que não subiu e… encontrou Rondinelli que, em esfuziante corrida, tinha saído do limite da grande área para o limite da pequena área.
Rondinelli chegou na bola a partir de uma inacreditável impulsão, cabeceou com força e com vontade e, desta vez, Emerson Leão não conseguiu chegar. Flamengo 1 x 0.
Depois do épico gol, havia pouco tempo para uma reação dos pretos e brancos. O Flamengo vencia o jogo, o turno e o título!
Após o cotejo, Rondinelli, que era conhecido como um jogador viril e que se entregava ao time, foi promovido, pela torcida, a uma designação divina: era, doravante, o Deus da Raça!
Mas a alma do título, que mudou a História do rubro negro, foi Zico: quando foi bater aquele escanteio, já sabia que era para Rondinelli que lançaria – o chamou para a área -, já sabia como alçaria a bola, onde Rondinelli chegaria, de que forma Rondinelli concluiria a jogada. Zico arquitetou o gol, a vitória, o título. Gênio!
Nosso bravo Leão não merecia a derrota, mas o técnico vascaíno, o “titio” Orlando Fantoni, sim. Afinal, como diz o adágio popular, “o medo de perder tira a vontade de ganhar”.
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há 40anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email:luisfilipechateaubriand@gmail.com.