PATROCÍNIO NÃO É SALVAÇÃO
por Idel Halfen
Os torcedores e a imprensa de forma geral costumam dedicar grande parte de suas expectativas na obtenção de patrocinadores máster para os clubes de futebol, isso costuma ocorrer principalmente nos momentos em que os times vão mal e há uma latente demanda por reforços.
É natural que assim se pense, afinal de contas estão vivos em suas mentes os times europeus que, além de terem no plantel inúmeros jogadores famosos e bons, ostentam nas camisas logos de marcas famosas.
Contudo, seria preciso entender que essa modalidade de patrocínio ainda não está madura o suficiente no Brasil, de forma que poucas empresas têm a real dimensão dos benefícios desta propriedade, ou quem sabe tenham e justamente por isso não invistam.
O que quero dizer com isso é o que sempre repito aqui: a simples exposição da marca é muito pouco para uma empresa que tenha objetivos bem traçados de marketing, mas isso é conversa para outro artigo.
Voltando aos valores envolvidos, com raríssimas exceções, esses não chegam a pagar nem três meses de folha salarial. Claro que já é melhor do que nada, ainda mais em um mercado sem grandes perspectivas de algo mais robusto, mas criar a expectativa de que a obtenção de um patrocinador fará do time uma potência e de que craques serão contratados é mais uma daquelas lendas urbanas que nos deparamos ao longo da vida. Há a hipótese também de as críticas serem parte de uma estratégia de discurso para se falar mal da gestão. Nem sei qual das opções é a mais obtusa…
O mais alarmante desse quadro é a falta de perspectivas de mudança no curto prazo, a não ser o surgimento de empresários que, por razões diversas, resolvam extrapolar a normalidade do mercado. Nesse caso, a torcida é para que esses empresários tenham uma permanência longa e que as áreas de planejamento dos clubes – se é que passarão a existir – elaborem planos contingenciais contemplando um eventual fim do patrocínio.
Acreditar na perenidade pode ser mais letal do que acreditar que patrocínios são as soluções para as gestões.
É importante também que se registre que, por mais que os defensores destes patrocínios que fogem à normalidade discorram sobre os retornos das iniciativas, as decisões na maioria das vezes não têm o amparo de um bom plano de marketing, o que também não significa dizer que não sejam viáveis.
De qualquer forma, dando retorno ou não, os investimentos feitos de forma pouco analítica não trazem a devida contribuição para a consolidação de uma cultura que entenda o patrocínio como um componente valioso de alguma estratégia de marketing.
Enquanto assim for, é melhor que os torcedores não criem grandes expectativas de bons resultados graças a algum patrocínio, e que a imprensa – ou parte dela -, ao invés de semear “falsas ilusões”, faça a sua parte não boicotando aparições e ativações de marcas.
PONTE PRETA 1977
por Marcelo Mendez
Havia muita coisa acontecendo no Brasil de 1977 e decerto em todas elas não estava incluída nossa bucólica vida na periferia de Santo André no ABC Paulista. Mas fato é que tínhamos nossa bucólica vida periférica naquele ano.
E essa vida muda consideravelmente quando do lado de nossa casa, muda o seu Montalvão. Um português gente ótima, que tinha uns comércios no Abc, uma Belina lindona, vermelha e toda chavosa e que gostava de bola tanto quanto a gente. Problema é que ele era Corinthiano e não demorou muito a fazer amizade e nos convidar para ir ao Pacaembu com ele ver o time dele jogar.
No meu caso, menino de 7 anos, fui feliz da vida com o passeio de carro até o Pacaembu com a festa toda envolvida. Meu pai foi porque o Portuga era gente ótima demais. Mas para nossa surpresa, o time de Preto e Branco vindo do interior do estado era um timaço.
Venceu o Corinthians por 2×1, deu um baile de bola nos caras e com a camisa 10 do time tinha um cidadão de nome Dicá, que me encheu os olhos com o tanto de bola que jogou naquele e em todos os outros dias em que jogou na vida. Mal sabia que um outro 2×1 faria parte da vida desse time. Hoje vamos contar a história dessa esquadra.
O ESQUADRÕES DO FUTEBOL BRASILEIRO chega para falar da Ponte Preta de 1977/1982.
A ESQUADRA
Nos anos 70, a Ponte Preta já dava indícios de que boas coisas viriam direto de Moisés Lucarelli.
Em 1970, após conseguir o acesso, a Ponte Preta fez um grande Campeonato Paulista dando trabalho para um gigante de então, o São Paulo, de Pedro Rocha, que acabou ficando com o título, mas o time do interior mostrou uma fornada de ótimos jogadores, dentre os quais, o maior deles, Dicá.
Mestre Dicá, o Maestro. Vi Dicá jogando na seleção de masters do Luciano do Vale nos anos 80 e ali, deu pra sacar o gigante que foi aquele camisa 10 no auge de sua carreira. Pela Ponte Preta, o Mestre jogou por música, sonho e verso. Sua classe, inteligência, categoria e elegância marcaram a história do futebol Paulista e após saídas para Santos e Portuguesa, foi o Mestre que conduziu a Ponte para fazer história.
Atrás dele, uma defesa poderosa com Oscar e Polozzi, dois ótimos laterais como Jair Picerni e Odirlei, mais o seguro goleiro Carlos. A seu lado no meio campo, um jogadoraço na volância, Vanderlei Paiva, acompanhado de Marco Aurélio na meia, responsáveis pela criação do time. No ataque, o rápido ponta Lúcio, os espertos Parraga e Rui Rei, se revezando com a 9 e com Tuta na ponta esquerda.
Esse esquadrão bateu na trave em 1977, perdendo a final para Corinthians de maneira épica. 0x1 no primeiro jogo, 2×1 no segundo e o gol de Basílio no 1×0 para marcar o final de um sofrimento enorme para o povo Corinthiano. Os dois times se enfrentariam de novo em 1979, com o Corinthians sendo campeão novamente. Em 1981, a Ponte perde a decisão para o São Paulo e daí sei que quem chegou até aqui, há de perguntar:
“Mas só perdeu! De onde vem essa grandeza toda?”
Explico de novo:
A real grandeza dessa coluna é dar luz a times que marcaram na mente de milhões de torcedores jogando o fino da bola, despertando paixões, formando legiões de torcedores e encantando quem gosta de bola.
Não precisa necessariamente de um troféu para conseguir isso.
Parabéns, Ponte.
SENSO E CONSENSO
por Eliezer Cunha
Não sou um crítico e muito menos um analista de futebol, mas, zelo pelo bom senso, consenso, beleza e a lisura no esporte.
Algumas decisões ou atitudes me incomodam dentro dos bastidores do vasto mundo do futebol, o que me leva a produzir minhas opiniões a partir deste canal de comunicação: “Museu da Pelada” com todo carinho e respeito.
Embora tenha convivido com esse tipo de esporte ao longo dos meus médios anos de vida, fui do tempo em que se dormia abraçado a uma bola, ou no mínimo trazia ela para debaixo da cama. Exemplo nítido de paixão pura por este esporte. Tive, graças ao meu irmão, o prazer de ir ao Maracanã quase todos os domingos e quartas-feiras. Assistia aos domingos os clássicos do Mengo e às quartas sempre um confronto com um time dito como pequeno, pelo Campeonato Carioca.
Sofria no apertado trem da central para assistir e admirar magicamente meus ídolos como: Carpegiani, Adílio e Zico. Não me lembro de ouvir da imprensa da época dizer: “O treinador vai poupar os titulares e entrar com um time reserva para uma partida”. Poupar de quê? De ganhar uma partida ou um título? De escrever o nome do time na história do futebol? De proporcionar um belo espetáculo para a sua grande torcida? Pra mim, ações como essa desprestigiam os times, jogadores, clubes, patrocinadores e o pior, o torcedor que paga o ingresso para assistir o confronto e a emoção de ganhar uma partida. Jogadores contundidos faziam testes às vésperas dos jogos nos vestiários do Maracanã, pouco antes das partidas, prova maior que o resultado do jogo era o mais importante.
O dia seguinte será e vai sempre existir e, nele está a concentração das lembranças marcadas pelos resultados, sendo eles favoráveis ou não. É a matéria prima que impulsionam para os debates e as realizações dos torcedores. São momentos de glória e vitórias para um cotidiano tão penoso.
Atletas de outros esportes se desgastam muito mais que nossos jogadores de futebol. Citando um bom exemplo, vamos para o Tênis de quadra ou basquete, onde horas são consumidas e os jogadores possuem um pequeno tempo para descansar, estão em movimento constante tanto no ataque quanto na defesa.
Pergunto então, como pagar pra ver um show de um artista se ele não está presente no palco? Desculpe-me os treinadores, mas, poupar jogadores, principalmente numa final de campeonato, é um desrespeito à tradição e a história dos times e principalmente aos seus torcedores.
E sinceramente: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.
Ado (Bangu)
O ETERNO ÍDOLO DO BANGU
entrevista: Sergio Pugliese | fotos e vídeo: Daniel Planel
“Eu sou apaixonado por esse clube e tenho uma dívida com os torcedores”. Um dos personagens mais solicitados pela galera que acompanha o Museu, Ado nos recebeu em Moça Bonita e abriu o jogo sobre o seu amor pelo clube e um pênalti que não sai da sua memória.
Na década de 80, o Brasil vivia seus tempos áureos dentro de campo, com craques para todo lado e futebol arte em seu estado mais puro. No Brasileiro de 1985, no entanto, foi o Bangu quem despontou como grande time e não tomou conhecimento dos adversários. Vasco, Internacional e Brasil de Pelotas, por exemplo, foram times que ficaram pelo caminho do time de Moça Bonita.
Na grande final, após duas vitórias convincentes contra o Brasil de Pelotas, o Bangu enfrentaria o Coritiba em jogo único, no Maracanã.
– A gente estava pensando no Atlético-MG e veio o Coritiba. Estávamos tão confiantes que chegamos ao estádio apenas 15 minutos antes do jogo. Acho que essa autoconfiança prejudicou um pouquinho! – confessou Ado.
Empurrado por mais de 90 mil pessoas no Maracanã, a equipe carioca saiu atrás do placar, mas conseguiu deixar tudo igual e levar a decisão para os pênaltis.
– Parecia que o mundo tinha acabado ali. Eu ainda não assimilei aquele momento e até hoje tenho dificuldades para dormir.
A dor em questão surgiu após a última cobrança do Bangu, quando Ado deslocou o goleiro com perfeição mas a bola passou rente à trave direita de Rafael, responsável por fechar o gol do Coritiba durante o tempo regulamentar. Gomes converteu para o Coxa e calou o Maracanã naquele 31 de julho de 1985.
– Embora muitos craques tenham perdido, eu não admito jogador desperdiçar um pênalti. As chances do goleiro são mínimas!
De fato, o craque ficou marcado por esse revés, mas não podemos deixar de lado tudo que ele fez e continua fazendo pelo Bangu. Sua identificação com o clube é coisa de cinema e depois de tantos gols e dribles, o ex-ponta hoje trabalha na comissão técnica do alvirrubro.
Seu maior sonho é levantar um caneco pelo Bangu para retribuir todo o carinho da torcida e, como ele mesmo diz, pagar essa dívida.
– Eu amo tanto esse clube que não quis jogar no Flamengo, no Fluminense, no Corinthians, no Santos. Não quis ganhar dinheiro! Trabalho aqui por amor. É o clube da minha vida e aqui estou em casa!
Que surjam mais Ados no futebol brasileiro!
O INSOFISMÁVEL CAMISA 6
por Marcos Vinicius Cabral
“Futebol é uma parte da minha vida que eu amo e sempre vou amar”. A frase é de Evandro, o eterno camisa 6).
Filho mais velho de seu João e de dona Ziléia, o sonho do pequeno Evandro era ter uma bola de futebol.
Nos meses de novembro (seu aniversário) e dezembro (Natal), os olhos do pequeno garoto buscavam nos quatro cantos da casa o tão desejado presente.
Com apenas seis anos de idade, sua intenção era se relacionar com a bola e viver essa paixão platônica.
Mas os pais não pensavam assim.
A mãe, uma dedicada dona do lar e o pai, caldeireiro do Estaleiro Mauá S/A em Niterói, zelavam tanto pelos estudos dele e do irmão Vander, a ponto de colocá-los no Centro de Ensino Sininho de Ouro, um dos mais tradicionais do bairro.
Mas nada o impediria de viver sua paixão.
– Jogávamos com nossos primos todas às tardes depois das aulas com um bola feita de meias em um terreno íngreme e baldio no Largo do Barradas, onde hoje funciona o Tio Sam Esporte Clube -, confidencia Evandro França de Oliveira de 53 anos.
Dois anos depois, morando no Boa Vista em São Gonçalo, como todo moleque, jogaria na rua no time chamado Galo de Ouro, no qual cada vitória valia um refrigerante.
– Bebi muito Mineirinho! – diz às gargalhadas.
Desde cedo, vencer seria um verbo conjugado sempre na primeira pessoa de Evandro.
Em 1978, com 13 anos e seu irmão com 11, recebiam a notícia que a cegonha estava trazendo um irmãozinho chamado Leandro.
Quando o menino chegou ao mundo no ano seguinte, o duro golpe: seus pais se divorciaram.
Enquanto dona Ziléia precisava trabalhar para cuidar dos três filhos, Evandro era obrigado a cuidar dos dois irmãos.
Sorte deles que ganharam um segundo pai e azar do Club de Regatas do Vasco da Gama, que perdeu um grande lateral-esquerdo.
– Não me arrependo de não ter ido treinar em São Januário para cuidar dos meus irmãos -, lembra visivelmente emocionado.
Se os “Deuses do Futebol” lhe tiraram a chance de ser jogador, o destino foi mais generoso e permitiu que se transformasse num dos maiores jogadores de várzeas.
Estreou em 1980 no bom time do Mequinha Futebol Clube em São Fidélis, conhecida como “Cidade Poema” devido às belezas naturais e ao seu grande número de poetas e foi verso e prosa naquele gramado contra a seleção local no primeiro quadro aos 15 anos.
– Meu tio Zé Maria me escalou, marquei o craque deles e comecei ali minha história no futebol – relembra.
Um outro tio de nome João, vulgo Joãozinho, o levaria no Campo do Vital Brasil em Itaúna, e naquele instante, sentiu algo diferente.
– Foi ali que verdadeiramente nasceu o desejo de jogar futebol. Aquilo foi crescendo, crescendo e crescendo em mim, contagiando… não sei explicar! – diz referindo-se ao futebol praticado pelas equipes do Magno, Pagão e Monte Verde.
Meses depois, no Campo do Mangueirinha, no Luiz Caçador, começou a escrever seu nome de grande jogador vestindo o verde e amarelo do Unidos da Amizade Futebol Clube.
Ganhador de vários campeonatos, a final contra o temido Tronco no Jockey foi inesquecível.
– Ganhamos de 1 a 0, gol de Vandinho, contra o time da casa e sua torcida, mas nosso time era muito equilibrado – conta.
De acordo que os títulos iam se amontoando, os joelhos começavam a dar sinais de desgate: era preciso recuar.
E foi remanejado à zaga, posição que sempre foi seu desejo.
Já como zagueiro, ganhou três dos três campeonatos que disputou com as camisas do Internacional e Unidos da Amizade no Recanto em Luiz Caçador.
– Me espelhava em Leandro – revela sem esconder a admiração pelo ídolo rubro-negro que teve a carreira abreviada pelos joelhos.
Em 1990, conquistou o Campeonato Gonçalense – que é o ápice na carreira de todo atleta amador – no centenário da cidade, jogando pelo Beira-Rio, no extinto 3° BI (Batalhão de Infantaria), na Venda da Cruz.
No Cinco de Julho, pelo Atlantic Peon, em cinco campeonatos chegou em todos na final, sendo vice em quatro deles e campeão em 2000.
– Uma pena que um cara como Evandro não tenha se tornado profissional. Além da dedicação dentro de campo, jogador de rara inteligência. Um boleiro como costumamos chamar – diz Felipe de 60 anos, seu treinador no Atlantic.
Em 2008, no Lira Futebol Clube e já veterano, foi campeão mais uma vez.
– Evandro era um jogador de muita técnica, boa marcação, além dos excelentes cruzamentos e viradas de jogo. Quando era deslocado pra jogar na zaga, colocava o atacante no bolso – diz Helinho de 47 anos que o enfrentou várias vezes.
Mas se dentro de campo não lhe faltou motivos para sorrir com as conquistas alcançadas, fora dele, algumas lágrimas passearam por seu rosto áspero com duas perdas irreparáveis.
– Meu irmão de consideração. Me ensinou a nunca chutar de bico. Trabalhamos juntos nos estaleiros da vida, no camelô e jogamos juntos várias vezes! – diz sobre o falecimento do compadre Lilico.
E completa:
– Minha mãe foi tudo para mim. Deus a levou ano passado no dia do meu aniversário – emociona-se.
Mas no fim, o reconhecimento se dá aos domingos no Campo do Mangueirinha, onde às 9h, o craque da eterna camisa 6 ensina futebol com a maior humildade, qualidade esta que é sua última e grande vitória.