PALMEIRAS 1993/1994
por Marcelo Mendez
Domingo, 19h15min da noite, Vale do Anhangabaú, numa boca da noite de 1992. Triste.
De rosto colado na janela de um velho ônibus da Cmtc caindo aos pedaços, eu ouvia o silêncio. Talvez o único barulho que pudesse ser escutado ali era nosso orgulho alviverde despencando por mais um ano de fila. Eu voltava do Morumbi após mais uma derrota.
Havia sido um ano duro.
O Brasil passava por transformações, a pátria verde amarela acabara de sofrer um impeachement, um governo caiu de podre e de tudo mais. A nossa moeda chamava cruzado novo, viraria uma outra coisa que a gente não sabia o nome, os amores eram de plástico e o time, meu Palmeiras… Ahhhh o Palmeiras…
Naquele domingo, o Palmeiras tinha acabado de levar um passeio do São Paulo que voltava do Japão campeão do mundo, para fazer a festa em cima da gente. Perdiamos a decisão do Campeonato Paulista e mais um ano de fila havia sido somado à nossa conta. Já eram 17 ao todo. Tava doendo.
Ali, naquele bar do vale, eu afogava minha dor num balde de Dreher com cacau, ouvindo músicas suspeitas e vendo rostos pouco receptivos à minha pessoa. Não sabia o que podia acontecer, o que viria pela frente, a sensação era que aquela dor jamais ia acabar. Mas eis que chega 1993 e pra nossa alegria, as coisas mudariam por conta desse time que falaremos hoje.
ESQUADRÕES DO FUTEBOL BRASILEIRO traz a vocês a máquina verde do Palmeiras 1993/1994
FUTEBOL E FÁBRICA DE LEITE?
Ninguém sabia muito bem que diabo era aquele troço, “Parmalat”.
Sabíamos que vendiam leite e tal, mas no futebol? O que queriam? Nos falaram de uma nova concepção de gestão esportiva, uma melhora na administração do futebol do clube e tudo mais, todavia, os primeiros indícios foram estranhos.
Começa pela mudança na camisa do Palmeiras, que deixou de verde da cor do mar de Amalfi, para ser uma camisa riscadinha, verde clara, meio triste, estranha. Depois os jogadores, tudo bem, Jean Carlo, Maurilio, Carlinhos, Edinho, bons jogadores, mas caramba, era isso que queriam que acreditássemos?
Pois bem. 1992 acabou com um honroso segundo lugar no Paulista, mas precisávamos de mais. Sendo assim 1993 veio para o patrocinador abrir o bolso. Chegam no Parque Antartica, Roberto Carlos, lateral esquerdo vindo do União São João de Araras, Antonio Carlos voltando da Espanha, Edmundo do Vasco, Edilson do Guarani, para se juntar a Mazinho, Sampaio, Zinho. O time encorpava e o resultado não podia ser diferente…
ACABOU A MISÉRIA
A final do Paulista 1993 foi o titulo para lavar a alma.
A fila acabava com o Palmeiras voando para cima do Corinthians, foi um 4×0 inapelável. Dessa forma, o time cria casca e com os reservas, vence o Corinthians novamente no Rio-São Paulo e entra com tudo no Brasileirão.
Campeão em cima do Vitória, nadando de braçada. Acabava a miséria; O Palmeiras voltava a ser campeão.
1994, A MÁQUINA VERDE!
Fernandez, Claudio, Antonio Carlos, Cleber e Roberto Carlos. Cesar Sampaio, Mazinho, Rincon e Zinho. Edmundo e Evair.
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Esse time do Palmeiras de 1994 no primeiro semestre daquele ano, foi um espetáculo.
Passearam em cima de todo mundo, venceu o Campeonato Paulista, amassou o Boca Juniors na Libertadores e mesmo após a débâcle após a Copa, seguiu firme e venceu o Campeonato Brasileiro daquele ano, conquistando um bi com sobra, com elegância, com força.
Passou por todas as fases jogando um futebol com excelência, venceu o Corinthians na decisão e marcou o seu lugar na história com 5 títulos conquistados em 18 meses. Passa a fazer parte do seleto grupo de grandes times do Palmeiras e aqui nesse humilde espaço também.
Esquadrões do Futebol Brasileiro saúda aqui o Palmeiras de 1993/94
O TIC TAC TAMBÉM É FILHO DE XERÉM
por Zé Roberto Padilha
Sei, como jornalista e estudante de História, o trabalho que dá pesquisar rastros e pegadas sobre qualquer ação humana realizada no passado. Os arqueólogos que o digam. Pior, só mesmo quando você é quem construiu a Pirâmide e está vivo observando a memória frágil do futebol encobrindo-a. E entre deixar que cada vez mais a nossa construção tática se afunde, e sejamos taxados de vaidosos, até prepotentes, ou retirar cada pó que encobre nosso trabalho tático, o 55 Reversível, optei em lutar, três décadas após sua concepção, por sua autoria. O Pep Guardiola que nos perdoe e não durma esta noite sob o fog londrino. E o Fernando Diniz que se orgulhe de ter criado depois um sistema parecido. O que importa é mostrar a vocês que o Tic Tac, bem como Pedro e o João Pedro, é também filho de Xerém.
Ao começar nossa carreira de treinador por lá, em 1987, sentimos que nossos atletas, 80% deles vindos do Futsal das Laranjeiras, tomavam um susto com as dimensões do seu novo campo de ocupação. Hábeis, talentosos e acostumados a atuarem próximos uns dos outros, levavam um enorme tempo para se adaptar. E o campeonato carioca infantil estava chegando e começaria o julgamento do nosso trabalho. Então, criamos três quadras de futsal dentro do campo demarcadas por duas linhas intermediárias. E treinamos sua ocupação ordenada à exaustão. Na quadra do meio, era obrigatório dar dois toques na bola.
Deu tão certo que levantamos os títulos infantis, em 87, o juvenil, 89, e editamos um fascículo naquele ano denominado “Tríplice Ocupação com Dupla Função”. Segundo nossos atletas, “era uma toqueira danada para cima dos adversários não tão compactados.” Em 90, com o apoio da Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, apoiado pelo professor Ivan Cavalcanti Proença, editamos o livro “55 Reversível”, sistema tático de futebol. E o lançamos em uma palestra no Salão Nobre do Fluminense FC.
E quando esta talentosa geração alcançou os juniores, e encantava Telê Santana nos treinamentos coletivos com sua posse de bola, um diretor do clube, o ex-árbitro Walquir Pimentel, pagou do próprio bolso o salário do mês dos funcionários e atletas. Numa sociedade cada vez mais capitalista, se tornou um semideus nas Laranjeiras e passou a receber de volta passes dos atletas. Surgira ali o diretor empresário no lugar do diretor amor à camisa e….o sonho terminou. Fui dispensado e poucos jogadores foram aproveitados. Era melhor trazer o Bobô, do Bahia. E Juninho e Macula, do Bangú. Estavam há algum tempo no mercado, dava para negociar. Quanto aos meninos e seu treinador, melhor esperar ou dispensar.
Hoje, quando o time do Fluminense realiza no Maracanã o que sepultaram lá atrás, em Xerém, Paulo Alexandre, nosso ponta que se tornou professor e escritor, Cadú e Leonardo, que foram campeões em 95, nos ligam e postam sua indignação. “Professor, nós fazíamos isto lá atrás!” E eu, antes tarde do que nunca, que já lutei pelas Anistia, Diretas Já e saio às ruas por Lula Livre!, resolvi lutar pela autoria da própria obra. Que, acima do nosso amor pelo clube, é tricolor. O Tic Tac, acreditem, também é um filho talentoso e esquecido de Xerém.
Bismarck
pérola da colina
entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Felipe de Lima | fotos e vídeo: Daniel Planel
O menino Bismarck Barreto Faria chegou a São Januário aos oito anos de idade. Desde pequeno, foi uma referência no futebol de salão e em todas as divisões de base por que passou no Vasco da Gama.
A rigidez dos preceitos religiosos da família ajudava a moldá-lo – e porque não? – protegê-lo desde cedo em um ambiente tão competitivo como o futebol. “Comecei a frequentar a Igreja Católica. aos dez anos. Minha irmã entrou para a Igreja Batista e me chamou.”
Essa foi a receita para que o menino-prodígio vascaíno, famoso também pelo indefectível aparelho de correção dentária que ostentava, desse certo no futebol.
Entre as décadas de 1980 e 1990, Bismarck foi um dos maiores ídolos da torcida cruz-maltina e um dos jogadores mais brilhantes já formados nas bases do clube, que sonhara ser como Roberto Dinamite ou Zico, ídolos de infância.
Mas nem tudo foram flores na relação do ídolo com a diretoria do clube. Em 1990, o já consagrado meio-campo Bismarck, que esteve com a Seleção Brasileira na Copa do Mundo da Itália, ficou cinco meses sem contrato e teve rejeitadas pelos cartolas vascaínos duas propostas de contratos milionários com o clube alemão Bayer Leverkusen. Roberto Dinamite foi peremptório após vê-lo brilhar entre os profissionais, em 1988: “O Vasco da Gama já tem meu sucessor natural. Chama-se Bismarck.”
Filho de Jacynir, um subtenente reformado da Polícia Militar, e da dona de casa Izaema, Bismarck cresceu nos bairros do Rocha e do Galo Branco, em São Gonçalo, cidade fluminense onde nasceu no dia 11 de setembro de 1969. É o filho caçula do casal, que também teve Aída e James. Foi aluno do Externato Pericá e do Instituto de Educação de São Gonçalo.
Os primeiros passos com a bola foram no quintal da residência dos pais e na sala da própria casa, na qual o pai fazia das cadeiras a baliza e treinava Bismarck. Dali, com oito anos, testaram o garoto no futebol de salão do Clube Embaixadores, no bairro Camarão, também em São Gonçalo, e na famosa escola de futebol de salão comandada por Casemiro Correia Araújo, o “Miroca”, também descobridor – anos depois de lançar Bismarck – de craques como Edmundo e Ibson.
Não tardaria para que o pai, um comovente vascaíno – ao contrário do filho, torcedor do Flamengo que aprenderia a amar o Vasco da Gama —, levasse-o, meses depois, durante a Copa do Mundo de 1978, para o cruz-maltino, inscrevendo-o no futebol de salão do clube.
O gramado é, contudo, sonho de pelo menos nove entre dez meninos. E assim Bismarck, já com 13 anos, trocou a pequena bola pesada da quadra pela bola de campo. Imaginava como seria defender um time no gramado do Maracanã, uma emoção indescritível que cabe no sonho de qualquer menino.
Bismarck nunca esquecera aquela tarde de 2 de julho de 1978, quando, pela primeira vez, o pai o levou ao Maracanã para assistir a um clássico entre Flamengo e Botafogo. O jogo terminou 1 a 1 e o garoto não viu o ídolo Zico em campo, pois o craque servia à Seleção Brasileira na Copa do Mundo, na Argentina. Bismarck imaginava-se o Zico, ídolo do seu time de coração. Mas este mesmo coração atenderia a outro apelo… outras cores, o preto e o branco. OVasco da Gama perderia, por pouco tempo, sua joia rara.
Em 1981, o jovem craque deixou São Januário. Queria muito jogar futebol de campo. No ano seguinte, foi ao Botafogo, fez um treino espantoso, jogou uma barbaridade, mas, sabe-se lá o porquê, não retornou ao Alvinegro. Procurou o Flamengo, talvez ainda pela pequena centelha clubística acesa em seu coração. Mas o porteiro do clube da Gávea veio com um papo de que ele deveria pagar uma taxa e mensalidade para jogar. Em dezembro, o Vasco da Gama concedeu uma oportunidade no time B infantil.
Com o passar dos anos, Bismarck foi virando casaca, para a felicidade do pai. Sua estrela brilhava intensamente nas divisões de base do clube de São Januário. Para reforçar a capacidade técnica, o pai o incentivava com uma mesada mais gorda, caso batesse mais com a canhota. Deu certo.
Em 1983, pelo time infantil, o garoto ambidestro marcou nove gols em 17 jogos. No ano seguinte, também pelo infantil, fez 27 em 41 pelejas. Em 1985, foram 36 em 53 jogos, agora pelo time juvenil. Em 1986, foi campeão carioca da categoria e artilheiro da competição, balançando a rede 16 vezes em 26 partidas. No ano seguinte, seu único como júnior, assinalou 20 gols em 33 jogos.
Com toda esta projeção nas bases vascaínas, Bismarck foi pinçado pelo técnico Antônio Lopes para o time profissional, em meados de 1987. Mas Bismarck quase teve a carreira prematuramente abreviada no ano anterior, exatamente no dia 13 de maio de 1986, quando, durante um jogo da Seleção Brasileira de infantis contra a Inglaterra, realizado na China, prendeu o pé em um buraco, rompendo os ligamentos do tornozelo direito e sofrendo uma fratura exposta do perônio logo após assinalar o gol da vitória de 2 a 1 do Escrete Nacional, que acabou campeão da Copa TDK.
Viajou três dias, de aeroporto em aeroporto, até ser submetido a uma cirurgia no Brasil, que o deixou seis meses de cama e com parafusos na perna. Como ainda era muito jovem e tinha uma saúde de ferro, a recuperação foi completa e Bismarck pôde continuar sua jornada feliz até chegar ao time principal em 1988, com a saudável definição de grande promessa de craque do futebol brasileiro.
Foi titular das seleções brasileiras de todas as categorias. Fez parte do time bicampeão carioca em 1988, quando ainda servia ao serviço militar e cursava o segundo período de educação física na FaculdadeAsoec, em São Gonçalo.
Mas a primeira emoção entre os profissionais foi a conquista da Taça Rio de Janeiro daquele ano. Em campo, Vasco da Gama e Fluminense disputaram um jogo acirrado, com Tato marcando para o Tricolor na primeira etapa, após um gol mal anulado do Vasco da Gama, assinalado pelo zagueiro Fernando em complemento a uma jogada magistral de Romário, que passou por meio time adversário.
Na segunda etapa, o Vasco da Gama partiu para cima do Flu, sempre com jogadas perigosas pela direita, com os certeiros cruzamentos do lateral Paulo Roberto. Mas faltava ao Vasco da Gama mais criação na meia-cancha. O treinador vascaíno Sebastião Lazaroni decidiu, aos 35 minutos, trocar o meia William pela jovem promessa de craque: Bismarck.
Dali em diante, o Vasco da Gama se acertou em campo, empatou o jogo com um gol de Vivinho e, aos 39 minutos, Bismarck tabelou com Romário e marcou o gol do título. “Acompanhei o lance desde o momento em que Romário partiu com a bola dominada. Para falar a verdade, quando a bola sobrou, chutei sem olhar.”
Após a memorável conquista, Bismarck foi direto para casa, em São Gonçalo, trancou-se no quarto e agradeceu a Deus por aquela que seria a primeira de grandes conquistas que teria ao longo da carreira. No dia seguinte ao título, participou de um churrasco no sítio Refúgio do Juriti, na Várzea das Moças, em Niterói, que reuniu outros jogadores do chamado movimento “Atletas de Cristo”.
Na festa – digamos – cristã do Vasco da Gama não havia espaço para rivalidades. No churrasco do Bismarck, lá estavam o lateral Jorginho (do Flamengo), Donato e Fernando (do Vasco da Gama) e Ronaldo (do Botafogo).
Dias depois, a vítima seria o Flamengo, o primeiro jogo da finalíssima do Campeonato Carioca, no dia 19 de junho de 1988. O Vasco da Gama começou atrás no placar, mas novamente Bismarck – agora com a camisa 10 do ídolo Roberto Dinamite – explodiu no segundo tempo. Recebeu um passe pelo lado esquerdo, foi bailando na defesa rubro-negra até cortar para o meio, deixar o zagueiro Edinho para trás e chutar no canto esquerdo do goleiro Zé Carlos. Um golaço! No final, vitória do Vasco da Gama pelo placar de 2 a 1. Estava aberto o caminho para o título vascaíno, que três dias depois derrotaria novamente o Flamengo, com o antológico e inesquecível gol do lateral Cocada.
Àquela altura, Bismarck já era ídolo… mas tão ídolo que o filho do porteiro José Marcos da Silva com Gesilda, ambos torcedores fanáticos do Vasco da Gama, acabou batizado como Bismarck da Silva. Dias depois, o craque conheceria a criança.
Os títulos da Taça Rio de Janeiro e de campeão carioca de 1988 eram apenas o começo do que Bismarck seria capaz. No semestre seguinte, com os campeonatos estaduais terminados, começara a Copa União, o Campeonato Brasileiro da época.
A primeira fase foi de pontos corridos e o Vasco da Gama literalmente sobrou na tabela. O time terminou com 54 pontos enquanto o Internacional, o segundo colocado geral, conquistou 46. Bismarck foi um dos protagonistas da grande campanha do elenco vascaíno que, lamentavelmente, acabou eliminado pelo Fluminense na fase seguinte. Nem mesmo o Bahia, campeão, obteve mais pontos que o Vasco da Gama após a tabela concluída. O time carioca terminou com 57, em quinto no geral, enquanto o campeão fechou com 56. Naquela campanha sensacional, Bismarck mostrou que o Vasco da Gama era mesmo o melhor time da competição. Em um jogo contra o Santos, marcou três gols na goleada vascaína de 4 a 0, no dia 19 de novembro, em São Januário.
Bismarck foi também ícone do esquadrão – com Bebeto, William e Luis Carlos Winck– campeão do segundo título brasileiro do Vasco da Gama, em 1989, ano em que também foi eleito o craque do Mundial de Juniores, em que o Brasil acabou em terceiro lugar.
Foi convocado por Sebastião Lazaroni, que o dirigiu no Vasco da Gama, para a Copa do Mundo de 1990, mas devido ao fracasso, nunca mais foi lembrado pelos treinadores da Seleção Brasileira.Disputou 24 jogos pelo Escrete nacional, marcou apenas um gol, mas participou da Seleção que conquistou a Copa América em 1989.
Em 1992, ainda ao lado de Bebeto, levou o Vasco da Gama a ser o time com o maior número de pontos do Campeonato Brasileiro, mas quem acabou campeão foi o Flamengo. De consolo, o titulo de campeão carioca no mesmo ano. O primeiro que levaria o clube ao seu primeiro tricampeonato estadual.
No dia 28 de junho de 1993, Bismarck trocou o Vasco da Gama pelo japonês YomiuriVerdy Kawasaki. Mas desejava mesmoera ir para o então badalado futebol espanhol. O Celta de Vigo até fez uma boa proposta, mas não tão boa quanto a do clube japonês, que ofereceu a Bismarck 25 mil dólares mensais e a possibilidade de que o jogador comprasse o próprio passe por 550 mil dólares, em janeiro do ano seguinte.
No Japão, tornou-se, depois de Zico, seu ídolo desde a infância, omaior nome do futebol local. O Galinho ficou, porém, muito aborrecido com o fã Bismarck, após um jogo final do YomiuriVerdycontra o KashimaAntlers, pelo título do primeiro campeonato japonês da história, realizado em 1993.
Zico reclamara de Bismarck (que decidira o jogo para o Verdy ao marcar um gol de pênalti), por ter dado uma cotovelada nas costelas e atingido a boca do jogador Honda. O Yomiuri acabou campeão, mas Zico não queria mais papo com o Bismarck, que marcou 15 gols e foi o grande nome da competição.
“Ele foi desleal e não quero mais falar com ele. Se me perguntarem sobre Bismarck jogador, direi que se saiu muito bem e que foi um dos responsáveis pela conquista do Youmiuri. Mas, como pessoa, ele morreu para mim. Não aceito um jogador que fala sempre de Deus e que joga deslealmente.”
Bismarck, que levara a mãe para morar com ele no Japão, seria novamente campeão nacional em 1994, com o mesmo Verdy.A vida no Japão era pacata. Só saía do apartamento para treinar e jogar. Quando se consentia um pouco de distração, saciava a saudade do Brasil e especialmente a fome na churrascaria “Bacana”, em Kawasaki.
Já ambientado ao estilo de vida japonês, Bismarck atuou pelo KashimaAntlers. A trajetória do outro lado do mundo foi longa e rendeu os títulos nacionais de 1993 e 94, pelo YomiuriVerdy, e de 1998 e 2000/01, pelo KashimaAntlers.
Em 1996, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), presidida na época pelo ex-governador do Estado, Sérgio Cabral Filho, concedeu ao craque a Medalha Tiradentes por seus grandes feitos no futebol nipônico.
Somente em 2002, por influência do treinador Oswaldo de Oliveira, regressou ao futebol brasileiro para defender o Fluminense. Insistiu no Goiás, ainda em 2002, e encerrou a carreira no japonês Vissel Kobe, em 2003. O craque que leva no nome a marca do famoso chanceler alemão, que unificou a Alemanha no final do Século XIX, tornou-se empresário de jogadores.
O DARWINISMO DA BOLA
por Zé Roberto Padilha
Passei meu curso primário, melhor, estudo fundamental, como treinador nas divisões de base do Fluminense FC, em Xerém. Durante cinco anos (1987-1992), realizei aquela ralada básica que toda profissão exige. Isto é, desde que você não tenha padrinhos e se apresente direto aos profissionais nas Laranjeiras.
Acordava 5h30, tomava café e minha esposa nos deixava de bicicleta na Rodoviária. Ela não tinha padrinhos nem madrinhas também. E o ônibus da Viação Salutaris nos deixava uma hora depois no posto policial de Xerém. Por ali ficava aguardando por horas a chegada, ou não, do Tubarão. Um carinhoso apelido concedido a um ônibus truculento e ultrapassado que saia todos os dias da rua Álvaro Chaves. E poucas vezes chegava ao seu destino.
Nossa missão não era apenas preparar uma equipe competitiva para os estaduais da base, era também selecionar, como a natureza, segundo Charles Darwin, quem sobreviveria na selva da profissão mais cobiçada do país. Mas que poucas espécies permanecem. “Aquela que estabelece os parentescos fisiológicos e a comunhão de origem de todos os seres vivos. Ou a transformação das espécies como consequência da seleção natural”.
Não há como ensinar alguém a jogar futebol. Se aprende a tocar piano, violão, dançar tango ou balé e falar inglês. Ou o dom, a vocação vem do berço, ou você esquece. Caso leve jeito, estávamos a postos para aprimorar os fundamentos com que exercerão aquela dádiva concedida pelos deuses do futebol.
Como passei meia década por lá e o tempo era curto, diante da numerosa fila que surgia em ônibus, carros, vans e alguns com cartões da aristocracia tricolor, nos bastavam cinco minutos para dar o veredito se o garoto ficava ou não. Mas para o pai de um adolescente mineiro, seu filho precisaria realizar, a todo custo, o seu sonho de atuar no Maracanã. Mesmo sendo mediano junto a um grupo acima da média que levantara os títulos estaduais 87, infantil, e 89, juvenil. Sendo assim, mediano, permaneceu por lá para ser melhor avaliado. Certo dia, ao convocarmos um grupo para um amistoso, o pai, vendo o filho fora da lista de convocados, atravessou o campo e foi tirar satisfações.
Foi bom conhecer a teoria darwiniana e não discutir com ele. Pelo contrário, convidei-o a sentar ao meu lado e suspendi o coletivo-apronto e liberei uma pelada. Onde ninguém admite perder para ninguém e ser sacaneado na volta do Tubarão. Dei os coletes verdes para o craque do time, Mário Alexandre, e os vermelhos para nosso capitão, o Magaldii. E disse para o pai: “Vou levar dezessete atletas a Muriaé. Se seu filho estiver entre os primeiros dezessete escolhidos entre os vinte e dois, ele vai com a gente”.
Veio a distribuição de coletes e ele só não foi o último porque tinha que ter um outro goleiro. E o pai se levantou do banco, bravo toda vida, disse que aquilo era mesmo uma panelinha e nunca mais retornou de Juiz de Fora com seu filho. Charles Miller, como sabemos, trouxe o futebol para o Brasil. E Charles Darwin já sabia, antes dele, que a habilidade, a técnica e a destreza só manteria em cena os que só o meio permitiria.
Soube depois que o garoto tentou o Vasco. E o Tupi, de Juiz de Fora. E que se tornou um engenheiro respeitado. Contra a natureza não há mesmo como lutar. E as tribunas de honra do Maracanã também é um lugar digno para se ocupar porque lá cabem todos os sonhos possíveis de um pai sonhar.
O DIA EM QUE “A SELEÇÃO” MORREU
por Rodrigo Ancillotti
(Atenção: esse texto pode ferir suscetibilidades!!)
Quando Abraham Klein, por volta das 19 horas daquele 5 de julho de 1982 ainda de sol forte em Barcelona, apitou o final de Brasil 2 x 3 Itália pela Segunda Fase da Copa do Mundo da Espanha, ele não apenas deu números finais num dos jogos mais dramáticos e surpreendentes (para os desavisados) da História das Copas, ou simplesmente confirmou a eliminação do Brasil naquela que seria conhecida como Tragédia de Sarriá (nome do antigo estádio do Espanyol). Ele assinou o atestado de óbito da Seleção Brasileira de Futebol.
Sim, senhores!! Naquele dia, “A Seleção” deu seu último suspiro e encerrou um ciclo de 24 anos de hegemonia, brilho e técnica que encantaram o mundo. Mais exatamente 24 anos e 20 dias após seu nascimento, no dia 15 de junho de 1958, quando Mané Garrincha, Pelé e Vavá assombraram o mundo no Estádio Nya Ullevi, Gotemburgo. Nesse dia, o Brasil venceu a temida União Soviética por 2×0, gols de Vavá, e jogou o que ficou conhecido como “os três minutos iniciais mais espetaculares da história do futebol”.
Poderia ter nascido antes, é verdade. Talvez em 1925, quando o Clube Atlético Paulistano de Arthur Friedenreich encantou a Europa na primeira excursão internacional de um time brasileiro, quando chegaram a ser apelidados de “Les Rois du Football” pela imprensa francesa.
Ou quem sabe em 1938, quando Leônidas da Silva bailou nos campos da mesma França e só não classificou o Brasil para sua primeira final de Copa por estar contundido e fora da semifinal contra a Itália, sem esquecer a arbitragem criminosa pró-europeus. Talvez em 1950, nada mais justo se tivéssemos vencido aquela final contra o Uruguai no Maracanazo.
Não, amigos. Foi mesmo naquela partida brilhante contra os soviéticos, ainda mais que foi a estreia em Copas da dupla mais sensacional já vista em qualquer campo gramado: Mané Garricha e Pelé, que nunca perderam quando juntos pela Seleção. A partir daquele jogo, e do subsequente título contra a Suécia, o Brasil deixava o famoso “complexo de vira-latas” de Nélson Rodrigues para trás e assumia o protagonismo mundial no futebol. Os títulos internacionais do Santos de Pelé, Coutinho e cia e do Botafogo de Garrincha, Didi, Zagallo, etc só abrilhantavam ainda mais nossa Fase de Ouro, assim como a Academia do Palmeiras, o Cruzeiro de Tostão e Piazza, dentre tantos outros.
Em 24 anos, em 6 Copas disputadas, levantamos 3 canecos e ficamos com a Taça Jules Rimet em definitivo (até ser derretida por ladrões em 1983, já na ressaca do Sarriá). Fomos bicampeões em 1962 coroando Mané Garricha como melhor do mundo e, se sucumbimos ao futebol-força em 1966 (fruto da preparação mal feita e da violência dos adversários), vencemos no México dando mais uma aula de futebol com o melhor time/seleção da história.
Mesmo após dois Mundiais complicados seguidos, quando perdemos ora para nosso próprio pragmatismo (em 1974), ora nos bastidores (em 1978), nunca deixamos de ser respeitados e temidos em Copas do Mundo, e a Copa da Espanha seria nossa consagração. Jogávamos o futebol mais bonito do mundo desde o ano anterior, e o Mundial seria só proforma: apesar de adversários fortes como Alemanha Ocidental, França, Polônia, Inglaterra e Argentina, a Taça estava no papo, como bem dizia o Pacheco a todo momento na TV.
Até que tudo ruiu numa tarde infeliz contra uma seleção desacreditada mas muito bem armada que, apesar dos resultados ruins na primeira fase (quando só se classificou pelos gols marcados), tinha tudo para deslanchar de acordo com Seo Zezé Moreira, observador da CBF.
E na tarde em que Paolo Rossi surgiria como nosso algoz com seus três gols, A Seleção morreu!! Nunca mais seríamos os mesmos, pois a eterna dúvida sempre martelaria: jogar feio e vencer ou jogar bonito e perder?? Pragmatismo ou beleza?? E mesmo nas duas Copas que vencemos desde 1982, apesar dos espasmos de bom futebol, o pragmatismo sempre levou vantagem: primeiro garantir lá atrás, pra só depois pensar em dar espetáculo. Continuamos entrando como favoritos em todas as competições, mas deixamos a fantasia pra trás.
O espetáculo nunca mais veio, meus amigos. A chama apagou naquele 5 de julho de 1982.