PARA NÃO CAMINHAR SOZINHO
por Claudio Lovato
Existe uma piada sobre o Eurotúnel segundo a qual a obra, do ponto de vista dos europeus do continente, foi feita para ligar a Inglaterra à Europa, mas que, na ótica dos ingleses, teria sido realizada para ligar o resto da Europa à Inglaterra. O chiste me veio à cabeça nestes dias de Chelsea e Arsenal na final da Liga Europa e de Tottenham e Liverpool decidindo a Liga dos Campeões.
O futebol inglês evoluiu porque se globalizou. Mais que isso: porque se universalizou. Estão lá jogadores latino-americanos, africanos, asiáticos, além de europeus de numerosos países. Treinadores estrangeiros? Sejam bem-vindos também. Mas o processo foi mais profundo: o futebol inglês avançou porque soube olhar para dentro da própria Inglaterra. Como argutamente observou Paulo Cezar Caju em recente artigo, basta olhar para as fotos da seleção inglesa das últimas décadas para ver como a quantidade de negros aumentou. Bingo, PC.
Uma das lembranças que carrego em lugar mais especial da memória e do coração é da minha ida ao velho Wembley em maio de 1994 para assistir à final da Copa da Inglaterra daquele ano entre Manchester United e Chelsea. Eu estava na Inglaterra a trabalho, e, por uma dessas conspirações do universo em nosso favor, ganhei um ingresso especial para ver a partida e, antes disso, para participar de um almoço em que o cicerone era Ray Clemence, goleiro da seleção inglesa entre 1972 e 1984. Eric Cantona acabou com o jogo, marcando duas vezes na goleada de 4 x 0 em cima do time londrino. Ryan Giggs, seu companheiro de ataque, tinha 19 anos.
Aquele 1994 ainda fazia parte de um período de transição do futebol inglês, que, depois de 70, no México, só retornaria à Copa do Mundo em 1982, na Espanha, disputaria as Copas de 86, no México, e 90, na Itália, e voltaria a ficar de fora da edição de 94, nos Estados Unidos. O English Team tratava de abandonar definitivamente os dogmas da ligação direta entre defesa e ataque e do chuveirinho na área e adotava a saída de jogo com a bola no pé, a tabela para chegar ao gol, o toque de bola.
Em paralelo ao que fazia dentro das quatro linhas, a Inglaterra modernizava seus estádios, os clubes reformulavam seu sistema de gestão e o país atraía investimentos estrangeiros. Deu no que deu. A presença de quatro times da Inglaterra na decisão dos dois maiores torneiros do Velho Continente em 2019 não é obra do acaso.
Embora eu continue convicto de que nunca houve, não há e nunca haverá uma competição com mais alma que a Libertadores da América, e que nós, sul-americanos, sempre seremos exemplo de gente que tem amor verdadeiro por seus clubes, acho que se engana quem pensa que todas essas mudanças no futebol inglês fizeram diminuir a paixão de seus torcedores. O fanatismo continua. A ligação com o escudo permanece firme e forte. Os cantos seguem sendo entoados a plenos pulmões, entre eles o “You’ll never walk alone”, do Liverpool, canção que pode ser entendida hoje com um sentido a mais.
Parabéns ao futebol inglês. Parabéns aos ingleses. A nação que inventou o esporte que tanto amamos soube reinventá-lo para si própria.
PRESENTE INESQUECÍVEL
por Rodrigo Remedios
Amigos do Museu,
Escrevo para dizer que recebi minha foto autografada do grande craque Paulo Cézar Caju.
Minha ideia era mandar enquadrar essa relíquia e enviar uma foto já na moldura, mostrando meu cuidado e carinho com essa preciosidade. Mas, ao abrir o pacote, fui surpreendido mais uma vez! Recebi meu autógrafo já num quadro personalizado do Museu da Pelada.
Sendo assim, só me resta agradecer ao Museu e especialmente ao amigo Sérgio Pugliese que, segundo consta, foi quem atendeu o meu inusitado e insistente pedido.
Sérgio, muito obrigado, de coração. Sua gentileza e generosidade fizeram feliz um apaixonado pelo nosso futebol. Agora posso olhar para o meu quadro e me sentir um pouquinho mais próximo dessa lenda do nosso futebol (O cara jogou na maior seleção que já existiu!!!). Por favor, quando tiver a oportunidade, agradeça ao Sr. Paulo Cézar. Diga que adorei meu autógrafo (vibrei como em um gol) e que sou grato a ele por isso.
Um grande abraço, do amigo Rodrigo Remedios.
Paulinho Ladrão de Bola
UM CRAQUE NÃO TÃO ESQUECIDO
entrevista: Sergio Pugliese e Ygor Lioi | texto: Ygor Lioi | fotos e vídeo: Daniel Planel
Hoje o Museu da Pelada tem a honra de homenagear e registrar um dos maiores jogadores da década de 50, cria do Madureira jogando com Nayr, Nelsinho e fazendo dupla de ataque com seu amigo Evaristo de Macedo no início dos anos 50. Em 53, especificamente, foi a revelação do Campeonato Carioca de futebol, chamando atenção de clubes grandes como Santos, Vasco e Botafogo.
Pelas atuações de gala contra o alvinegro de General Severiano naquele ano e por ser um amor de infância, acabou optando por levar seus talentos ao Clube da Estrela Solitária, com a missão de substituir ninguém menos que Geninho, o cara do time, o responsável por ter desbancado o Expresso da Vitória em 1948. O Botafogo desembolsou o maior ordenado por um jogador de futebol até aquele momento de sua história, 400 mil cruzeiros. Paulinho valia tudo isso? Valia, e muito mais que isso!
Para se ter uma ideia, o valor pago só foi superado com a compra do inesquecível Didi, que custou aos cofres alvinegros cerca de 1 milhão de cruzeiros.
Desfilou seus talentos durante 3 anos em General Severiano, chegando à quase ser vendido para Juventus em 1955. Não quis ficar na Europa por causa da família, e na ocasião Dino e Vinícius acabaram sendo os sortudos da vez. Na época, alguns jornais diziam que Paulinho e um outro garoto chamado Garrincha haviam se revelado nos gramados europeus. Mas, quis o destino que o então técnico do Botafogo Zezé Moreira o deixasse de fora se uma excursão e com o fim de seu contrato, rumou à Pernambuco para jogar pelo Náutico.
Um ano depois, já em 58 voltou ao Rio de Janeiro para jogar pelo Canto do Rio. Lá, pelo atraso de pagamentos, conquistou o passe livre em 1959, sendo um dos primeiros jogadores do futebol brasileiro a conseguir tal proeza. Já com 26 anos, pensando em se aposentar e sem clube, o meia então recebeu um convite de ninguém menos que Zezé Moreira para ir jogar no Fluminense.
Chegou ao tricolor no posto de reserva e logo foi alçado ao time titular. O “Timinho”, como ficou conhecido aquela escrete, levantou o carioca de 59, foi vice em 1960, eliminado nas semifinais da Taça Brasil de 60 pelo Palmeiras com um gol feito na bacia das almas em pleno Maracanã. Além, é claro, do título do Rio São Paulo de 1960.
Durante os quase 4 anos de Laranjeiras, Paulinho colecionou inúmeros gols e muitas atuações elogiadas por torcedores e jornalistas. Ganhou pela crônica futebolística especificamente pelo saudoso Luís Mendes, o apelido de Ladrão de Bola, pela facilidade que tinha de roubar bola de seus adversários. Saiu em 1963 para jogar no Bonsucesso ao lado de seu amigo Pinheiro e de Sabará.
Em 1966 encerrou a carreira e continuou sendo funcionário público da Marinha. De lá para cá, muitos esqueceram de Paulinho, que foi esse homem que na época era conhecido como Ladrão de bola. Aquele que tinha como virtudes ser canhoto, ser rápido, onde ajudava a defesa e apoiava o ataque. Roubava a bola, dava passes e fazia gols. Uma grande disposição e a habilidade incontestável, onde adorava colocar a bola “por baixo” das canetas dos adversários.
Esse personagem do futebol brasileiro ficou “esquecido” até 2018, quando seu neto, Ygor Lioi, rodou o seu primeiro documentário chamado “Um Craque Esquecido”, através de um projeto social da Portela, o Por Telas. Hoje Paulinho tem 87 anos, ainda reside em Marechal Hermes e tem Alzheimer. Não era lembrado pela torcida, dirigentes, clubes e pela mídia. E ele mesmo não se lembra mais das coisas.
O célebre Paulo Roberto Falcão uma vez disse que o jogador de futebol tinha duas mortes: A primeira quando para de jogar bola e a segunda a morte física. Não seria a segunda o esquecimento? Como um jogador que esteve lado a lado com Garrincha, Geninho, Juvenal, Danilo Alvim, Pinheiro, Castilho, Escurinho, Gérson, Telê, Waldo, Jair Marinho, Jair Francisco, Maurinho, Clóvis, Edmilson, Arlindo, Altair e entre outros pode ter sido esquecido?
Hoje Paulinho não é mais esquecido, depois de seu curta passar no Cinefoot de 2018, agora está eternizado no Museu da Pelada. Que o primeiro Ladrão de Bola do futebol brasileiro tenha vida longa, viva Paulinho o nosso “Crack” do dia.”
CINCO ANOS SEM MARINHO CHAGAS
por Rubens Lemos
Marinho Chagas nasceu para o futebol em 1970. Ajudou, com o Rei Alberi, o ABC de Natal a quebrar um jejum de três anos para iniciar a jornada do grande tetracampeonato. Marinho nasceu para ser cometa da bola e no ano seguinte, no Náutico, tornou-se o melhor de sua posição para sempre em Pernambuco.
Surgia a nova e definitiva versão de Nilton Santos, o lateral jogando para o ataque, subvertendo as ordens táticas, reescrevendo a história no campo, que transformou em floresta para as suas elegantes passadas de gazela.
Do Náutico ao Botafogo em 1972. Primeiro ano, primeira Bola de Prata da Revista Placar, menino de sorriso remanescente das peladas de terra batida, ao lado de craques consagrados como Figueroa, Piazza, Ademir da Guia, Paulo Cézar Caju e Alberi, o seu igual em grandeza e exclusividade dos vesperais potiguares.
Francisco das Chagas Marinho foi para a Copa do Mundo em 1974 e brilhou feito um holandês de carrossel vestindo a camisa da retrancada e fracassada seleção do quarto lugar na Alemanha. O mundo o considerou o melhor, em sua posição. Júnior, do Flamengo, declarou e declara que gostava de imitá-lo.
O esporte em Natal é dividido em antes e depois de Marinho. Sempre afirmei com ele vivo, confirmo agora e não discuto mais. Do Botafogo, a estrela loira do Ex-Maracanã, a “bruxa” alegre, tornou-se obsessão do cartola tricolor Francisco Horta, da famosa Máquina do Fluminense que deu ao alvinegro três craques de seleção só pra ficar com Marinho: Rodrigues Neto, Gil e Paulo Cézar Caju.
Quando Pelé seguiu para o Cosmos de Nova Iorque, para ensinar futebol a ianque apaixonado por basquete e beisebol, 150 entre 100 boleiros sonhavam vestir a camisa branca do clube mais rico do planeta. Depois de Pelé, por lá desfilaram Cruijff, Carlos Alberto Torres,Beckenbauer, Chinaglia e Marinho.
Entre 1981 e 1982, Marinho conquistou sua terceira Bola de Prata e o Campeonato Paulista pelo São Paulo de Oscar, Dario Pereyra, Everton, Renato, Mário Sérgio, Serginho e Zé Sergio.
Já estava na fase do prazer. Suas incursões pelo meio-campo rendiam passes precisos, arrancadas em direção ao gol e patadas que sacudiam o Morumbi inteiro. A biografia de Marinho é universal. Ele é adorado pelo mundo afora.
Nos dias finais, estava ainda mais criança e feliz, pelas proximidades da Copa do Mundo de 2014. Se dizia embaixador de uma função que não lhe rendia um mísero centavo.
Natal, péssima mãe, adorável madrasta. Marinho participava de eventos bem menos condizentes com sua história. Lançava camisas, frequentava troca de figurinhas onde era o centro das discussões e apresentava uma lucidez luminosa.
O destino, meia-armador malandro, levou Marinho para João Pessoa. Cercado de carinho paraibano, teve uma crise, sangrou e morreu. Seu organismo de touro já não resistia. Enquanto agonizava, abutres da internet bizarra enviavam comentários desclassificantes contra sua honra.
Há pessoas incompatíveis com caixões. Marinho é desse time. Não fui vê-lo morto. Nem ouvir os discursos compungidos e hipócritas de quem se aproveitou do luto.
Marinho, incorporou Clara Nunes e Paulo Gracindo em Brasileiro, Profissão, Esperança, espetáculo baseado em crônicas de Antônio Maria e canções compostas com Dolores Duran. Marinho, brasileiro, profissão e esperança(perdida). “Dorme, Menino Grande”, é o poema de Antônio Maria ao descanso e paz de Marinho Chagas.
*08/02/1952
+01/06/2014
Neto
NETO, O XODÓ DA FIEL
por Marcelo Soares
Como na maioria dos momentos mais marcantes da sua carreira, no encontro com o Museu da Pelada ele “chegou chegando”.
Natural de Santo Antônio de Posse, cidade do interior de SP, ao chegar no Guarani de Campinas, um dos clubes mais tradicionais do futebol brasileiro, logo conquistou fãs com seu futebol e sua personalidade.
Taxado como rebelde em algumas situações e em outras um tanto quanto polêmico. Há quem critique-o e diga até mesmo que não desejaria ver jamais ele vestindo as cores do time do coração. Porém o que não se pode negar é o talento dentro das quatro linhas e principalmente como era decisivo nas jogadas de bolas paradas.
Vice-campeão paulista em 1988 pelo Guarani marcando um gol antológico contra o Corinthians, clube que viria a marcar mais uma pintura de bicicleta. Desta vez em cima da equipe campineira. Medalha de prata nos jogos olímpicos de Seul em 1988 com uma seleção recheada de craques.
No melhor momento de sua carreira, ficou de fora do escrete da seleção brasileira que foi a Copa do Mundo em 1990. Deixando muitas pessoas sem entender a escolha do técnico Lazaroni.
Campeão brasileiro em 1990 pelo Corinthians dando ao clube seu primeiro título da competição nacional e marcando seu nome na história com atuações que estão eternizadas na memória dos torcedores. Bola de prata da revista Placar em 1991, jogou nos quatro grandes clubes de São Paulo e recebeu o apelido de xodó da fiel pela torcida do Corinthians.
Hoje, como apresentador do programa Os Donos da Bola, por onde anda nos corredores da Bandeirantes, fala com todos e o carinho é notório. Aquela agitação que mostra durante a apresentação dos seus programas dá espaço a uma conversa tranquila.
Sincero desde o primeiro contato e firme nas respostas, nos contou um pouco mais sobre sua infância, histórias como jogador e sobre a carreira de apresentador.
Confira mais uma resenha para o Museu da Pelada com um dos maiores jogadores da história do Corinthians. Como dizia Oscar Ulisses, “Láááá vem Neto! ”.