PENSATA BOLEIRA
por André Felipe de Lima
O Flamengo tem o melhor time do país. Isso, ninguém em sã consciência discute. Nem mesmo lorpas ou pascácios, como diria Nelson Rodrigues. Mas não se pode comparar — e isso é sacrilégio — o time atual rubro-negro com a extraordinária máquina preta e vermelha de jogar bola do começo dos anos de 1980. Isso não pode.
A estrela Bruno Henrique, o melhor que o Flamengo tem atualmente, jamais será um sopro momentâneo do que foi Zico. Arrascaeta está anos luz de um Adílio ou Tita e Gabriel precisa comer um pouco mais de feijão com arroz para se igualar ao outrora cabeludo Nunes. Legal, o Filipe Luis é melhor que o Junior. Falem sério.
Outro fato a considerarmos: A “turma” — e aí recorro ao pertinaz jargão turfístico — do atual Flamengo é “fraca”. O “páreo” é “mole” demais para o clube da Gávea papar o campeonato brasileiro e a Libertadores. O que há no Brasil? O inconstante Santos? O Palmeiras em franca decadência? Talvez apenas o Grêmio possa ser a “pedra no sapato”, mesmo assim somente na Libertadores, porque os tricolores gaúchos desistiram do nacional.
Não incluo na lista das possíveis conquistas de fim de ano do Flamengo o Mundial Interclubes por um simples motivo:o Liverpool de hoje, embora (por incrível que pareça) não seja tão forte como o de 1981, que Zico e Cia. despacharam em Tóquio, é fortíssimo. Mas em futebol, sabemos, tudo pode acontecer, e como diz meu amigo Mário Moreira, o que vale é “bola na rede”.
No mais, a torcida do Flamengo leva a sério o velho lema “deixou chegar…”. Realmente, os caras estão “chegando”, mas (cuidado!) não caíam na esparrela ao comparar 2019 com 1981, e como canta o contumaz rubro-negro Jorge Ben Jor: “Olha aí meu bem / Prudência e dinheiro no bolso / Canja de galinha / Não faz mal a ninguém/ Cuidado pra não cair da bicicleta, cuidado pra não esquecer o guarda chuva”.
FELIPÃO ESCAPOU DE MAIS UM 7 A 1
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Já viram como fica um passarinho em liberdade após anos preso em uma gaiola? Se colocado em uma árvore ficará pulando de galho em galho exatamente como fazia em seu cativeiro. É mais ou menos como se comportam os times retranqueiros após tomarem o gol. Precisam partir para dentro, fazer gols, mas não sabem porque foram treinados para se defender. E só se defender.
São jogadores sem asas, despreparados, engessados, sem um plano B, uma carta na manga. Um exemplo primoroso disso aconteceu no Flamengo x Palmeiras. E no duelo da ousadia contra a covardia prevaleceu o futebol ofensivo.
Olha, sem qualquer exagero, Felipão escapou de levar mais um 7×1 em sua saideira, o que seria merecidíssimo, afinal escalou brucutus e deixou Gustavo Scarpa no banco! Felipão pagou o pato, mas para mim o maior culpado é o gerente de futebol.
Jesus nem precisou fazer milagres, apenas colocou Gerson em sua real posição, meia direita. Na base do Fluminense, atuava nessa posição e, por isso, está completamente à vontade. Mas os “professores” adoram inventar e colocam esses bons jogadores fora de posição, como Carile faz com Pedrinho e Cuca com Antony. E os comentaristas chamam o Gerson de segundo volante. Gerson não é volante, esqueçam isso!
Continuo torcendo fervorosamente por Sampaoli, Roger, que venceu mais uma, e todos que jogam para a frente respeitando a torcida. Duro demais ver o Corinthians vencendo com um gol dado pelo goleiro do Atlético Mineiro e, depois, ouvir as explicações de Carile, o discípulo mais aplicado de Tite.
Rogério Ceni vai dando um jeito no Cruzeiro e Luxemburgo precisa urgentemente treinar fundamentos com a garotada do ataque, assim como Sampaoli. O que o Santos perde de gols é assustador!
O Fluminense vendeu Pedro para pagar dívidas e o time que se viu ontem contra o Avaí foi abaixo da crítica. Não dá para entender um valor tão abaixo de Vinícius Jr e Paquetá.
Por falar em centroavante a diretoria rubro-negra quer ficar em definitivo com Gabigol. Tomara que tenha o mesmo empenho para pagar as indenizações dos meninos mortos no CT porque dinheiro não falta. E exemplo de uma boa administração não é apenas gastar com jogadores vivos.
Mas esse país é muito doido mesmo! Aqui o jogador é convocado para a seleção brasileira mesmo sem estar jogando há tempos e os comentaristas esportivos viraram garotos-propaganda. Mas não anunciam mais aqueles produtos baratinhos nas rádios, como antigamente. Evoluíram, estão no horário nobre das tevês.
Já sei, por exemplo, para onde ligar quando quiser pedir comida em casa, ir a algum supermercado ou até comprar pneus, Kkkk!!!
Pode isso, Arnaldo? E Tim Maia responde: “vale, vale tudo!!!”.
DESAMOR À JATO
por Zé Roberto Padilha
Craques o Fluminense também fazia em casa. Xerém foi o primeiro ninho a criar em série este orgulho nacional. Tão fértil foram suas safras, que de seus laboratórios saíram Thiago Silva, Carlos Alberto, Diego Souza, Roger, Marcelo, entre tantos. Porém, antes de se tornarem obras raras de exportação, retribuíam em campo, com entregas e títulos, o amor à sua agremiação.
Quem os treinou tinha história para repassar, como Assis, Gilson Gênio, Edvaldo, Rubens Galaxe, Marinho, Carlinhos, crias da casa que repassavam as glórias de um clube tantas vezes campeão. Quando embarcaram, tinham o Fluminense no peito, na ponta da chuteira e prometiam voltar a defendê-lo um dia por gratidão.
Há algum tempo, substituíram por lá os ex atletas que desde Píndaro, Altair, Telê, Peri e Pinheiro abasteciam corações com histórias vividas de quem defendeu uma camisa que fascinava por sua disciplina. Em seus lugares, assumiram trogloditas de plantão, que vivem a insuflar músculos, bíceps e tríceps em máquinas Apolos a gerar atletas, não mais jogadores de futebol, movidos a Whey Protein.
E muito cedo, sem sequer serem batizados pelo pó de arroz, embarcam em contêineres frios para a Fiorentina sem dar uma só volta olímpica. Logo do clube que detém a Taça Olímpica de 1952.
Neste projeto Desamor à Jato, promessas são vendidas e mercadorias com prazos vencidas acolhidas. Como Digão, Airton, Bruno Silva e Nenê. Que são desorientados por Oliveiras, não mais comandados por quem, como Abel, aprendeu a amar as Laranjeiras.
No Desamor à Jato , mensagens do Intercept capturaram ligações afirmando que João Pedro será negociado. E que o Fred estará desembarcando de volta.
Melhor, então, Xerém trocar sua função social. Deixar de ser um ninho, que acolhe os recém nascidos, e se tornar a versão esportiva da Casa dos Artistas. Com todo o respeito, amparados e cuidados para suportar a solidão de serem visitados por seus torcedores apenas às terças e sextas.
Com público reduzido e em cômodos onde se apresentam, para arquibancadas e corações vazios, os clubes da segunda divisão.
QUIABO, QUANDO O INSTINTO FALA MAIS ALTO
por Jonas Santana
(Foto: Reprodução)
Quiabo!! Nome esquisito para um goleiro. Por que não Manga, Cantarelli, Taffarel (famoso pelas defesas milagrosas, pelo bordão de certo comentarista e pela conquista da Copa de 1994) ou mesmo Tafa-Rai (alcunha atribuída pelos colegas da academia de futebol que ele freqüentava)? Mas a galera insistia no apelido, uma forma reduzida, mas nada carinhosa de elogiar o arqueiro, para não chamá-lo de Mão-de-Quiabo.
Na tradição da pelada o escolhido para defender a meta era sempre aquele que não sabia jogar “na linha” mas no caso de Quiabo era diferente, era uma verdadeira paixão pelo arco. Embora fosse talentoso com os pés, ele não abria mão de mostrar suas habilidades debaixo das traves, o que fazia com bastante maestria desde que a bola não estivesse molhada. Nestas horas ele fazia jus ao apelido gritado em coro pelos torcedores, às vezes pró, às vezes contra, dos diversos times que nosso herói das traves defendia. E quando fazia uma defesa mais portentosa nosso goleiro sempre dava um berro de vitória, por ter mais uma vez neutralizado um ataque do adversário.
Ser goleiro era algo que ninguém queria e invariavelmente significava ficar de fora da diversão, por isso quando alguém era escalado para o gol, o fazia com certa relutância aceitando a ingrata missão de defender sua cidadela, desde que “tomou um gol ou o time fez gol o goleiro vai pra linha”. Muitas vezes a regra era quebrada e culminava em confusão porque ninguém queria sair do campo de batalha para ficar “embaixo das traves” tomando boladas. Mas também havia aqueles que faziam questão de “ir para o gol” seja por vocação ou por imposição, havendo ainda aqueles que abraçavam o ofício pela falta de concorrência (ninguém queria estar no gol no momento dos chutes de Dirran, de Zé Rosca ou do próprio Vevé).
“Pra ser goleiro tem que ter coragem”, dizia sempre Quiabo, quando alguém perguntava o porquê de tal função. Era no gol que ele se realizava. Principalmente quando ia jogar no interior, sentindo o calor da torcida naqueles campinhos apertados, com todo mundo em volta ou no estádio da cidade, E nosso amigo, magrelo e comprido, sempre com a camisa vermelha e a calça preta fazia suas artes no campo.
Nem de longe se incomodava quando lhe faziam apupos após uma defesa. Para Quiabo cada jogo era uma batalha e cada defesa era uma realização pessoal. E num desses jogos de fim de semana que aflorou uma situação um tanto quanto atípica nas hostes futebolísticas
Dir-se-ia que o jogo estava a mil, com os ânimos mais acirrados que decisão de campeonato de várzea na disputa por pênaltis. A bola parecia uma abelha ziguezagueando por todo o campo, não parando no pé de nenhum dos dois elencos e sequer chegando à meta do nosso arqueiro. Eis que de repente surge um escanteio e, almejando transpor a meta adversária, Quiabo dispara em louca corrida para a área esperando o lançamento para, quem sabe, alçar o tiro ou cabeçada fatal e decretar a vitória.
Assim disse o narrador: “corre Zé Rosca para a bola, solta-lhe o petardo e ela vem girando feito um pião para a meta e vem em direção a Quiabo que… Incrível defesa de Quiabo!!! Incrível, senhores!!”!
Quiabo, o grande arqueiro que tinha saído de sua meta para cabecear não resistiu àquela bola descendo em sua direção e, obedecendo ao seu instinto de goleiro, literalmente voou na pelota, realizando uma estupenda defesa. Só que do lado contrário, o que lhe valeu um cartão amarelo e vários dias sem poder freqüentar as ruas do bairro por conta da alegria de seus confrades que por conta dele perderam o jogo.
Mas ele não se deu por vencido e ainda desfilou seu talento por longos anos até se aposentar depois de escorregar num prato de caruru e ficar seriamente machucado.
Dizem que ele até hoje ele não come o referido legume.
Jonas Santana Filho, Escritor, professor, servidor publico, gestor esportivo e apaixonado por futebol. Jonassan40@gmail.com, jonassan50 –skype/instagrarm.
O EXPRESSO DO CATAR
por Zé Roberto Padilha
Certo dia, vi o Flamengo ser derrotado no domingo e alguns jogadores, como Everton, Paulinho, Pará e Marcelo Cirino aparecem dia seguinte, na Internet, felizes toda vida num churrasco. E tendo às mãos, como troféus, cervejas Stella Artois.
Estavam sorridentes e pareciam comemorar a própria derrocada. Não do clube, que é imortal, mas das suas próprias carreiras. Pareciam desconhecer o tamanho da camisa que vestiam e o que ela representava na vida de tanta gente. Fiz uma crônica, Renato Maurício Prado a reproduziu em sua coluna, em O Globo, e o grupo ficou conhecido como O Bonde da Stellinha.
Lembrava, na ocasião, que saía da concentração do Itanhangá, em 1976, para jogar o Fla-Flu do troca-troca no Maracanã e, na minha cabeça, só havia lembranças e gratidão pelo Fluminense. Como enfrentaria o clube que me acolheu, aos 16 anos, e nos formou até os 23 anos como atleta e cidadão?
Foi quando estávamos próximo de atravessar o Túnel Dois Irmãos e tinha um ponto de ônibus da Rocinha. Tomei um baita susto, parecia que todas as precárias condições que o estado lhes ofereciam, como saúde, segurança e educação, seriam atenuadas por uma vitória do seu time. Se aglomeravam, e pulavam, e sacudiam suas bandeiras rumo ao estádio como se buscassem por lá a dignidade perdida. E entrei em campo, e como suei a camisa, não mais pelo meu coração, algo pessoal, amador, mas para devolver profissionalmente, nem que seja por 90 minutos, o respeito que eles mereciam.
O bálsamo contra a injustiça social tinha um nome, um resultado: a vitória do Flamengo. Não dava mesmo para brincar de jogar futebol com aquela camisa. O Bonde da Stellinha não alcançou isto. E se perdeu defendendo equipes menores país afora.
Parece que nesta segunda-feira vai ser elevado o nosso PIB, o desemprego será diminuído e a chuva vai cair para amenizar toda as queimadas. Porque o Brasil vai acordar e levantar da cama para produzir mais porque a maioria da sua gente, mesmo tomando o mais simples dos cafés da manhã, vai sair de casa toda orgulhosa ostentando seu manto sagrado.
Ontem, não foi o Palmeiras que perdeu. Porque o Palestra Itália, com os euros, dólares e o patrimônio dos senhores do café que tem, vai enfrentar com tranquilidade o protesto de meia dúzia de torcedores bem aposentados. Felipão, mantido no cargo, vai trocar o William pelo Scarpa, o Bruno Henrique pelo Rafael, fora o Ramires que ainda não estreou. E tocar sua nobreza porque a vida continua bela e melhor redistribuída por lá.
Já pelas bandas de cá, as máquinas das fábricas irão rodar mais rápidas, as confecções produzirão mais peças porque quem foi a campo lutar por eles os representou com talento, respeito e consideração à sua história.
Gabigol, Arão, Éverton Ribeiro, Arrascaeta e seus companheiros entenderam que ao dormir cedo, cuidar do corpo, da família, treinar com dedicação e não se deixar levar pelos efêmeros prazeres da Cidade Maravilhosa, irão substituir o Bonde da Stellinha, que envergonhou uma nação, pelo Expresso do Catar, que irá perpetuá-los na galeria do clube mais querido do Brasil.
Quem viver, poderá brindar. Com uma Stellinha não mãos, por que não?