DISTRIBUIÇÃO OU DESCONHECIMENTO?
por Idel Halfen
A cada mudança de fornecedor de material esportivo ocorrida nos clubes de futebol costuma-se escutar os mesmos discursos exaltando o novo e “espetando” os antigos.
Ainda que ignoremos os aspectos éticos que são desprezados quando as críticas públicas atingem alguma relação do passado, não podemos ficar cegos quanto à fragilidade de tais discursos no que tange ao embasamento sobre o assunto.
Dentre as “frases prontas e sem nexo” que recheiam tais falas está a que promete uma distribuição de produtos melhor que a realizada outrora.
Ao prometerem tal façanha certamente acreditam que o fornecimento de material esportivo é similar ao de bens de consumo com giro rápido e prazos de validade curtos, onde a logística é essencial para que o produto chegue aos canais de vendas através de melhores rotas, de veículos com as capacidades adequadas e pontos de armazenagem estrategicamente bem localizados e dimensionados. Devem crer ainda que o varejo só não tem o produto em sua área de vendas porque o fornecedor não entregou.
Como já foi escrito outras vezes, as marcas esportivas baseiam sua produção nos pedidos que são feitos previamente pelos varejistas, além das estimativas dos gestores de suas lojas e e-commerce próprios, portanto, eventuais rupturas têm como causa principal o aspecto comercial e, se fôssemos elencar uma causa secundária poderíamos citar o lead time (período que compreende o tempo decorrido do pedido de um cliente até a efetiva chegada), o que nesse caso tem muito mais a ver com o tempo da produção. Para ficar mais claro usaremos o case do Fluminense, que acaba de anunciar a Umbro como sua nova fornecedora de material esportivo, acontecimento que criou uma enorme expectativa quanto a uma maior disponibilidade de produtos em comparação ao que era no passado. Esse anseio pode até fazer algum sentido em função de a Umbro possuir operação fabril, ao contrário das marcas anteriores que terceirizavam essa etapa, o que, consequentemente, proporciona em tese capacidade superior para produzir mais rapidamente os pedidos extras – aqueles que “corrigirão” as estimativas de demanda pessimistas feitas na ocasião da pré-venda.
Todavia, essa suposta vantagem não garante que as rupturas não acontecerão, até porque a expectativa do varejo é ainda a principal variável para se deixar o produto disponível ao consumidor, ou seja, se esse canal for muito conservador na gestão do seu capital de giro, as chances de ruptura continuarão a existir, e por favor não responsabilizem a Umbro por isso, mesmo porque a marca não possui lojas próprias. O ponto negativo que vejo na parceria diz respeito ao fato de a marca inglesa ter um portfólio restrito basicamente ao futebol, o que pode vir a ser um fator de fragilidade nas negociações com as key accounts.
Por outro lado, é de se esperar que haja uma maior flexibilidade em relação ao desenho dos materiais. No cômputo geral achei a decisão excelente, principalmente diante da atual conjuntura desse mercado.
Com esse parceiro, o único clube brasileiro detentor da Taça Olímpica continua a ter como fornecedor uma marca de relevado reconhecimento e importância, assim como são Adidas e Under Armour, o que fortalece o conceito de co-branding e dá visibilidade ao clube.
ESQUECERAM DE MIM
por Zé Roberto Padilha
Desde que vim a campo quando inventaram o futebol, tenho vivido entre tapas e beijos dos homens que disputam a minha posse. Seja no Aterro do Flamengo ou no Morumbi. E não são poucos. São 22. Alguns me cercam de carinho, dormem comigo desde a adolescência e conhecem meu ponto G. De gol. Como Nelinho, Marcelinho, Rivelino, Fred, Gabigol e Otero.
Outros, apenas nos tem agredido, arremessado nosso corpo inerte e indefeso com violência e sem qualquer direção. Digão e Manoel são alguns dos que, recentemente, conheceram meu ponto C. De chutão. E abusam dele.
Aos carinhosos, retribuo dormindo alinhada nas redes adversárias. Aos violentos, denuncio maus tratos, e recebem cartões amarelos. Se insistirem, aciono a Maria da Penha. E ficam sem pisar o gramado por alguns jogos.
Sou poderosa, sei disso. Pois o Vasco pode trocar Luxemburgo por Abel, o Dudu vestir a camisa do Flamengo, aposentarem o Mano e o Felipão e até decidirem se vai ser jogo de torcida única que a partida acontece. Só não acontece se eu faltar. Não há como ter futebol sem a presença de uma bola. Mesmo assim me subestimam.
Por ser discreta, não dar entrevista nem mudar o penteado, estão esquecendo de mim. Seguem o jogo pelos rumos que tomo, dos pés que me conduzem, mas apenas falam de quem me conduz. E ignoram a importância de quem é conduzida.
Não tem mais a narração do simpático “Ripa na chulipa e pimba na gorduchinha”, o questionável “Bola pro mato que o jogo é de campeonato”, a reverência de Waldir Amaral “Desce com a bola o Rei Pelé”. Mesmo de plástico sintético, cara toda vida e bem leve, é como fosse invisível. Como não mais existisse.
“Segue o jogo!”, como se ele pudesse seguir sem mim. “Sabe de quem?”, sabemos, Luiz Roberto, que nunca serei eu.
Apenas filmam minha entrada em campo pelas mãos do juiz, não como uma saudação e respeito, mas para mostrar a logomarca do patrocinador que carrego no peito.
Consultei meu sindicato. E os mais velhos, de meia, couro e até os que foram de plástico, os Dentes-de-leite, dizem que está mesmo na hora de fazer greve. Pois se os caminheiros que transportam alimentos vão parar, porque eu, que transporto paixões, provoco emoções e decido quem vai trabalhar feliz dia seguinte no país do futebol, não posso cruzar os passes?
Me aguardem pela minha ausência. Quero ver jogar futebol sem mim.
MANUAL PRÁTICO DO “QUEM NÃO FAZ TOMA”
por Luis Filipe Chateaubriand
No domingo de 12 de Abril de 1987, Fluminense e Vasco da Gama se enfrentavam pelo primeiro turno do Campeonato Carioca, a Taça Guanabara, já em uma de suas últimas rodadas, com este sujeito nas arquibancadas.
O favorito Vasco da Gama, invicto até então, tinha uma linha de frente poderosa: Mauricinho, Geovani, Roberto Dinamite, Tita e Romário. Poderia, se vencesse o jogo, sagrar-se campeão do turno com três rodadas de antecedência.
O Fluminense, sem o maestro Delei, tinha, no entanto, um time que não podia ser desprezado, com o craque paraguaio Romerito e o “Casal 20”, Assis e Washington, entre outros bons jogadores, como o lateral Branco e o jovem João Santos.
O jogo começa com o Vasco pressionando bastante. Liderado pelo cracaço Geovani, o Pequeno Príncipe, o time domina o jogo e perde gols.
Até que, por volta de metade do primeiro tempo, a zaga vascaína corta uma bola para o lado esquerdo de ataque da grande área e Assis desfere um chute cruzado, indefensável para o bom goleiro Acácio.
Fluminense 1 x 0 Vasco.
O Vasco volta a dominar, Geovani liderando as ações. Chances de gol se sucedendo, ou chutadas para fora, ou defendidas pelo excelente goleiro tricolor Paulo Víctor. O gol não sai e, assim, termina o primeiro tempo.
O segundo tempo começa com o Vasco mais em cima ainda. Liderados pelo genial Geovani, o Pequeno Príncipe, os vascaínos seguem dominando o jogo… e seguem perdendo gols.
Por volta de dez minutos da segunda etapa, Washington e João Santos saem tabelando desde o meio do campo, sem que sejam alcançados pelos defensores cruz maltinos e, na entrada da área, João Santos chuta rasteiro, sem chances para Acácio.
Fluminense 2 x 0 Vasco.
E, após tomar novo gol, o Vasco parte para cima de novo. Liderados pelo divino Geovani, o Pequeno Príncipe, os alvi negros vão em busca do gol novamente.
Até que, para desespero da torcida vascaína, o então técnico iniciante Joel Santana – que ainda não era o Papai Joel – resolve sacar do time… Geovani! Os gritos de “burro” da torcida cruz maltina, predominante no estádio, são incessantes.
Mesmo sem o cérebro do time, o Vasco domina o jogo. Mas, em descuido da defesa, e já no final do jogo, Washington aparece na entrada da área, para fazer mais um gol tricolor.
Fluminense 3 x 0 Vasco.
E assim termina o cotejo.
Ao final do jogo, se constata que o Vasco deu uma aula de como dominar uma partida, e o Fluminense deu uma aula de como vencer uma partida. O time que teve mais a bola, mais chances de gol, mais visibilidade em campo, foi goleado pelo colosso de objetividade e clarividência.
“Quem não faz, toma” não é mito, é parte bem visível deste esporte apaixonante, chamado futebol.
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há mais de 40 anos e é autor de vários livros sobre o calendário do futebol brasileiro.
Loco Abreu
O REI DA CAVADINHA
por Paulo Escobar
Em Minas, uma pequena cidade do Uruguai , nasce Washington Sebastián Abreu Gallo, que viria a ser conhecido no mundo do Futebol como Loco Abreu.
Podemos dizer que o Loco é um daqueles jogadores que mesmo em curto tempo nos clubes por onde passou deixou sua marca, e não foram poucos os times defendidos: no total 28 até agora. Mesmo sendo este nômade do futebol deixou marcas profundas em alguns clubes.
Além da Seleção Uruguaia, Nacional, San Lorenzo, River, La Coruña e Botafogo devem ter sido os lugares onde o centroavante talvez tenha deixado a sua marca. Mas não podemos esquecer que são títulos e artilharias que ele carrega no seu extenso currículo também.
Homem de área, de presença e que sabia aguentar a pressão como poucos atacantes, frio e decisivo em muitos momentos. Abreu não é um daqueles loucos sem noção ou idiotas na sua forma de ser, mas a inteligência e as posições firmes do lado de fora dos gramados também são suas marcas.
Formado em Jornalismo, lembramos bem da sua passagem pelo Botafogo, onde foi um terror daqueles que muitas vezes se escondem por trás dos microfones para emitir opiniões sem conteúdos ou desconexos de contextos.
A química gerada entre Abreu e Botafogo é sem dúvidas umas das paixões que até hoje a torcida da estrela solitária sente saudades. Impossível esquecer aquelas tardes de Maracanã nas quais o camisa 13 fazia as redes balançarem e levava os torcedores do Bota, carentes de ídolos e títulos às lagrimas. Vale lembrar que a fera honrou o Glorioso até na sua comemoração do título da Copa América de 2011, quando levantou a bandeira do Botafogo em campo.
Uma das lições mais bem aprendidas pelo Loco sem duvida foi a famosa cavadinha nas cobranças de pênaltis, como ele mesmo gosta de apontar que aprendeu olhando Djalminha fazê-las. E é justamente talvez aí que habite um dos gestos que deve ter causado mais de um pré infarto por aí.
Mesmo com poucos minutos jogados na Copa de 2010, talvez daqui a dez anos você ainda se lembre daquele pênalti do jogo Gana x Uruguai. E, claro, toda história que envolveu talvez um dos jogos mais emocionante da história das Copas.
Abreu jogou 15 minutos daquela Mundial, mas, como costuma apontar Lugano, que sofreu muito com as cavadinhas do Loco, procurou o seu momento de glória propositalmente. Buscou entrar para a história das Copas e foi atrás do momento que fosse único.
O Loco não vinha sendo colocado nos jogos daquele torneio, mas por uma daquelas paradas do destino foi escalado para entrar em campo naquele mítico jogo. Pela ordem de batedores do maestro Tabárez, o Loco seria o terceiro batedor daquela série, mas ele olha para o técnico e pede para ser o ultimo batedor, num olhar do maestro de alguns segundos que devem ter parecido uma eternidade concede o desejo de Abreu.
Lugano, que já sabia que o Loco faria a Cavadinha, pede por favor para não fazer naquele jogo, mas Abreu segue firme na sua decisão para fazer história. Naquele quinto pênalti decisivo, el Loco manda aquela cavadinha infartante, colocando em risco um capítulo histórico e a volta do Uruguai ao cenário mundial.
Vale lembrar que meses antes, numa final contra o Flamengo, converteria também um pênalti da mesma forma, inclusive com a bola batendo no travessão e entrando. Num momento também em que o Botafogo vinha de três finais perdidas contra o Flamengo, Abreu saca uma dessas que deve ter feito desmaiar mais de um torcedor botafoguense.
Para um louco de coletivas acaloradas com os jornalistas, que não tinha meias palavras, errar uma cavada daquelas seria sem dúvidas um motivo para ser massacrado. Mas a frieza e convicção de Abreu faz um momento que durou alguns segundos parece uma eternidade.
Ao entrar no Museu do Futebol no Uruguai, há uns anos atrás no Estádio Centenário de Montevideo, vi numa redoma de vidro a chuteira com a qual o Loco bateu aquele pênalti. Durante muitos anos ainda a torcida do Glorioso também lembrará da camisa 13, a chuteira e, claro, das glórias de um loco que passou como uma estrela fugaz.
Naquele ano de 2010 o Uruguai teve a melhor defesa da Copa, o melhor jogador e um time inesquecível, mas tudo isso passou a ser um detalhe, pois o que muitos com certeza irão contar a seus netos é a cavadinha de Abreu.
TIRA A CAMISINHA, TIRA TREINADOR!
por Zé Roberto Padilha
São tantos os profissionais à disposição de uma Comissão Técnica, e tantos computadores em busca de novos dados sobre uma partida de futebol, que precisam preencher os quinze minutos do Show do Intervalo, que começaram a tomar conta dos passes certos e errados das equipes.
E este número se tornou, na análise dos Casagrandes, tão importante quanto a posse de bola. E se mostrou completamente inútil para definir o vencedor de uma partida.
Mas se alguém tinha dúvidas sobre sua inutilidade sobre o resultado final, somada a irritação de assistir aquela troca de passes sem sentido entre os zagueiros, que viram para as laterais, e estes devolvem e ficam ali praticando sexo seguro sem ousar um drible ou uma penetração em direção ao gol, o anúncio de qual o time foi o mais eficiente neste quesito coloca um ponto final nesta questão.
Foi o Fluminense que alcançou o melhor índice de passe certos nas três das quatro competições que disputou este ano.
No Campeonato Carioca, chegou em quarto, atrás de Flamengo, Vasco e do Bangu. Na Copa do Brasil foi eliminado cedo e no Campeonato Brasileiro chegou em 14º lugar.
Muito flerte de longe, muito namoro pela intermediária, mas pegar a bola e convidá-la para afogar o Ganso e seduzir o Nenê a alcançar o fundos das redes que é bom…
Que Odair Hellmann chegue e retire logo a camisinha deste time. E ouse alcançar um prazer melhor na vida de cada torcedor tricolor. Como eu.