AS CONSEQUÊNCIAS ANTROPOLÓGICAS DO 7 x 1
por Teixeira Mendes
Culturalmente, o 7 x 1 foi a melhor coisa que aconteceu ao Brasil.
“O brasileiro não está preparado para ser o maior do mundo em coisa nenhuma. Ser o maior do mundo em qualquer coisa, mesmo em cuspe à distância, implica uma grave, pesada e sufocante responsabilidade.”.
(Nelson Rodrigues)
Começo com uma citação amarga, triste, hiperbólica e, ao mesmo tempo, realista. Nelson Rodrigues, o maior cronista da história do futebol brasileiro, foi o primeiro a perceber a relação entre o futebol e a cultura nacional. É dele a tradução do maior dos fatos silenciosos, do silêncio ensurdecedor, do Maracanazo. A hipérbole é a mãe dos gênios, dos Profetas e dos Santos. É um equívoco linguístico que Maria se chame Maria.
Fazendo uma de suas profecias retrospectivas e hiperbólicas, o Anjo Pornográfico traduziu a condição antropológica de nosso povo, a alma do brasileiro comum, via futebol. Recuperando a triste e leprosa recordação de 1950, ele diagnosticou o complexo de vira-latas! Eis a sentença:
“Eis a verdade, amigos: — desde 50 que o nosso futebol tem pudor de acreditar em si mesmo. A derrota frente aos uruguaios, na última batalha, ainda faz sofrer, na cara e na alma, qualquer brasileiro. Foi uma humilhação nacional que nada, absolutamente nada, pode curar.”
(…)
Por “complexo de vira-latas” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. Isto em todos os setores e, sobretudo, no futebol. Dizer que nós nos julgamos “os maiores” é uma cínica inverdade. Em Wembley, por que perdemos? Por que, diante do quadro inglês, louro e sardento, a equipe brasileira ganiu de humildade. Jamais foi tão evidente e, eu diria mesmo, espetacular o nosso vira-latismo. Na já citada vergonha de 50, éramos superiores aos adversários. Além disso, levávamos a vantagem do empate. Pois bem: — e perdemos da maneira mais abjeta. Por um motivo muito simples: — porque Obdulio nos tratou a pontapés, como se vira-latas fôssemos.”
(Nelson Rodrigues)
A falta de ambição, o sentimento de inferioridade, a resignação diante do mundo é transcendental aos brasileiros. Nosso sujeito transcendental é a imagem de um cão desnutrido, um circo de pulgas em quatro patas – nossa verdade demográfica é a SUIPA! Eis o imperativo: não ouse! E, assim, a privação da ambição, da ousadia e da coragem é um decreto para a maioria dos brasileiros. A consciência universal da norma, me parece inata.
Com o Bicampeonato Mundial em 1958 e 1962, o futebol contrariou a norma. Garrincha e Pelé pareciam ter fundado nos brasileiros uma autoestima sólida, perene, inquebrantável. Pelé era como um Fídias, Garrincha, por sua vez, era como um Antônio Francisco Lisboa. De repente, com as probabilidades negativas de um milagre, na miscigenação do Clássico com o Barroco Mineiro, a dupla de gênios esculpia a imagem do orgulho inabalável. Um Fídias, um Aleijadinho: a alma brasileira estava pronta!
Eis a verdade, amigos: o verdadeiro brasileiro não gosta de futebol. Desde Pelé e Garrincha, o futebol obrigava o brasileiro a ser melhor que os europeus, a ser melhor numa coisa que os americanos nem sonham em ser.
O futebol exigia dos retirantes de Portinari, que tivessem ombros largos para suportar a Glória. O futebol ousou tirar o brasileiro da indigência psicológica. O futebol obrigava o Brasil a ser grande, a ser uma potência, o melhor do mundo em alguma coisa.
Já viram o túmulo do Garrincha? Um indigente tem mais cortesias para os seus restos mortais. Já viram como o Pelé é tratado pela imprensa nacional? Parece que ele fez algum mal ao Brasil. Com o 7 x 1, o brasileiro está livre da responsabilidade de ser o melhor em alguma coisa. Já podemos passear pela SUIPA continental. Já podemos exibir sem pudor, sem medo e sem vergonha, o estandarte pálido de nossa anêmica autoestima, toda a nossa a anorexia psicológica.
O silêncio ensurdecedor durou oito anos, mas com o peso de oito séculos; o 7 x 1, por outro lado, deve durar pelas próximas sete eternidades. A derrota de 2014 transformou – novamente – o Brasil naquilo que ele é – uma SUIPA continental!
FINAL DO PAULISTA PREMIA FUTEBOL SEM GRAÇA
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Nesse “novo normal” do futebol resolvi ser mais do contra do que sou normalmente. Não tem dado muito certo, mas preciso fazer a minha parte. Se é para ser novo que seja mesmo, então tenho torcido para que novos nomes surjam entre os campeões estaduais. No Paulista, minha reza falhou, mas não é preciso ser definido o campeão paulista para cravarmos que nenhuma boa novidade surgirá a partir disso. Os dois times são fracos e no Brasileiro, se nenhuma contratação for feita, serão apenas mais dois times cumprindo tabela. Venho destacando Vanderlei Luxemburgo e Tiago Nunes há algum tempo, mas corre o risco de não surpreenderem mais.
Na verdade, Luxemburgo está completando 40 anos de carreira e já demonstrou sua qualidade diversas vezes, no próprio Palmeiras, em décadas passadas, no Cruzeiro, Santos e Bragantino, em 90, quando foi campeão paulista. Não acompanhei a carreira de Tiago Nunes, mas dava gosto ver o Athletico Paranaense jogar sob seu comando. Apurei que foi campeão pelo Luverdense, de Mato Grosso, Rio Branco, do Acre, e em diversas categorias de base, ou seja, percorreu o caminho certo. Mas é Luxemburgo quem está apostando mais na garotada, como Gabriel Menino e Patrick. Luxemburgo tem isso de bom, não fica cheio de dedos para lançar jovens talentos, mesmo que para isso seja preciso barrar Bruno Henrique, Lucas Lima e Scarpa. Mas a verdade é que os dois times não apresentaram absolutamente nada de novo, futebol sem graça e gols achados.
Tiago Nunes sempre foi acadêmico em suas declarações e fala do jogo como se fosse um engenheiro explicando uma obra. Luxemburgo não era assim, mas nas últimas entrevistas tem entrado para o time dos explicadinhos e só fala “marcação no primeiro terço do campo”. É Luxa tentando se enquadrar no “novo normal”. Em busca dessas novidades, tenho apostado minhas fichas nos times do interior e, por isso, torci para o Novo Hamburgo contra o Grêmio. Fugir do óbvio é isso! No Paraná, fui vencido e se classificaram Athletico x Coritiba. Em Minas, ainda pode dar Tombense, onde está trabalhando meu amigo Edinho, que fez história na zaga tricolor.
Na Bahia, o Atlético, de Magno Alves, vai disputar com o Bahia, de Roger, para quem torço muito. Roger, mil perdões, mas ser um “novo normal” é cravar no Atlético. Em Pernambuco, minha mandinga funcionou e deu Santa Cruz x Salgueiro, assim como no catarinense, que ficará entre Juventus, Chapecoense, Brusque e Criciúma, com Figueirense e Avaí de fora. Essa vida de se transformar em “novo normal” não é fácil, não. O secador precisa ser de última geração! E para quem pensava em secar o português, esquece, o Flamengo, malandro, o trocou por um espanhol. Por fim, aproveitando a onda, os comentaristas bem que poderiam aderir novos jargões, deixando de lado “jogador de beirinha”, “atacante agudo” e por aí vai!
PITA, O MENINO-MAESTRO, FAZ 62 ANOS
Centro de Memória do Santos
“Que gol fez o garoto!”, exclamou o jornalista Jéthero Cardoso, do Jornal da Tarde, na tribuna de imprensa do Morumbi. Lá no gramado o zagueiro Tecão ainda estava caído depois do drible seco do armador Pita, canhoto de 20 anos e muita habilidade, que corria em direção à pista de atletismo para comemorar o gol de virada contra o São Paulo, na primeira partida da decisão do título paulista de 1978.
Menino pobre nascido em Nilópolis, no Rio, em um 4 de agosto como hoje, Edivaldo de Oliveira Chaves veio com um ano de idade para Cubabão e passou a maior parte da infância jogando futebol e vendendo siris às margens da rodovia Anchieta.
Meia habilidoso, que não só lançava e chutava bem, mas também driblava como um atacante, Pita teve grandes momentos no futebol. Chegou até à Seleção Brasileira, pela qual fez 12 partidas, mas nada se compara com a explosão de sentimentos causada por aquele seu gol contra o São Paulo, aos nove minutos do segundo tempo, na noite de 20 de junho de 1979.
Do Casqueiro ao Santos em dois anos
Tudo estava acontecendo muito rápido na vida do menino que aos 13 anos foi defender o Casqueiro em um torneio de praia e acabou convidado para jogar na Portuguesa Santista. Dois anos depois já estava na Vila Belmiro, treinando ao lado de companheiros que, devido à eterna falta de dinheiro do clube, seriam promovidos ao time principal em 1978.
Pita passava tardes vendo os treinos de Edu, seu ídolo, e prestava atenção nos dribles do ponta para treiná-los depois. Ele acha que por isso se tornou um meia ofensivo, que se sentia à vontade perto da área adversária, a ponto de marcar gols como aquele contra o São Paulo.
Com ele e Ailton Lira lançando os rápidos Nilton Batata, Juary e João Paulo, o Santos infernizava os adversários. Após o título paulista de 1978, conquistado em meados de 1979, aquele Santos ainda venceu o primeiro turno do paulista de 1980, mas acabou derrotado na decisão com o São Paulo.
O título mais importante poderia ter vindo no Brasileiro de 1983, mas aí, além do bom futebol do adversário na final, Pita acredita que já estava tudo armado para Zico ter o seu último título antes de ir para a Itália:
– Em São Paulo ganhamos só de 2 a 1, mas era para fazermos mais dois ou três gols. No Rio, tomamos um gol logo de cara, mas estávamos equilibrando o jogo quando não deram um pênalti inacreditável em mim (o zagueiro Marinho atropela Pita na área e o árbitro Arnaldo César Coelho dá obstrução, cobrada em dois toques. Um absurdo).
– A gente já estava percebendo coisas estranhas em campo. Depois daquele pênalti não dado eu olhei para o Serginho e disse que já estava tudo armado, a gente não iria sair campeão dali de jeito nenhum.
Tímido? Nem tanto
O único defeito que os cronistas da época apontavam em Pita era a timidez. Às vezes parecia sumir do jogo. Isso também o atrapalhava fora de campo, principalmente no ambiente carnavalesco da Seleção Brasileira, dominado pelos espalhafatosos e super protegidos jogadores cariocas.
Na verdade, o futebol de Pita falava por si, não era preciso contar lorotas. Tanto, que no primeiro jogo depois de uma longa suspensão, Ailton Lira recusou a camisa 10 que o técnico Formiga lhe estendia, no vestiário. Apontou para Pita e disse: “Dê para o garoto, ele merece”.
Pita também tinha fama de bonzinho, mas também aprontava. Ele se lembra de uma noite em que colocou um siri embaixo do travesseiro de Serginho Chulapa, justamente o jogador mais temperamental do time.
– Ele estava fora. Pus o siri e antes que ele voltasse fui para o meu quarto e tranquei a porta. Eu sabia que o Serginho iria ficar furioso quando visse o bicho lá.
Realmente. Serginho viu o travesseiro se mexendo, foi checar e viu o siri enorme. Quase quebrou a porta de Pita. Hoje o meia ri, diz que gosta muito do centroavante e que o sentimento é recíproco.
Mesmo muito querido pela torcida, em 1984 Pita foi para o São Paulo, trocado pelos passes do ponta-esquerda Zé Sérgio e o volante Humberto (ambos campeões paulistas pelo Santos em 1984). No Morumbi, Pita foi duas vezes campeão paulista e uma vez brasileiro.
Em 1988 seguiu para o Racing Strasburg, da França, negociado por um milhão de dólares. Antes de encerrar a carreira de jogador e iniciar a de técnico de base, o meia que o técnico Cilinho chamou de “o último romântico do futebol” atuou pelo Guarani de Campinas e no futebol japonês.
Jogador que pouco se machucava, ele é o décimo sétimo jogador com mais atuações pelo Alvinegro Praiano. Foram 408 jogos e 55 gols marcados com a camisa do Santos, alguns deles belíssimos, que deixaram muitos zagueiros sentados, e a torcida de pé.
PRESIDENTE FLEUMÁTICO
por Valdir Appel
Joguei em vários clubes brasileiros, e tive a oportunidade de conhecer presidentes que fizeram história à frente deles. Alguns folclóricos, outros déspotas; alguns maquiavélicos, outros tirânicos; alguns autoritários…
Quando cheguei ao Vasco da Gama, o presidente era João da Silva ou simplesmente seu João, como os jogadores o chamavam, e seu vice era Antônio Soares Calçada.
Seu João era um dos donos da Carrocerias Metropolitana, instalada na Avenida Brasil. Chamava a atenção pelos hábitos elegantes e conduta de um lorde inglês, algo incomum para um homem que começou a vida como comerciante, dono de uma banca de jornais.
Gostava de circular com o seu chapéu de feltro, fumando cachimbo com um fumo aromático importado. De fleumático tinha algo: era categórico, imperturbável e decidido. Cordial e de fala mansa, transpirava credibilidade e confiança. Gostava e falava com orgulho das qualidades de sua Mercedes Benz conversível:
– Ninguém abre o motor de uma Mercedes antes de 15 anos de uso!
Observando-o, tornei-me um fumante de cachimbo e usuário de um chapéu idêntico ao dele, que comprei em Lisboa. Meus papos com o presidente, nas concentrações, eram sempre sobre cachimbos. As melhores marcas, tamanhos, filtros e formas. Tabacos, tipos de tabacos. Como encher o cachimbo, como acender, como mantê-lo aceso.
Por último, falávamos sobre a limpeza do cachimbo com escovilhões cônicos e a necessidade, por vezes, de usar alguma bebida com alto teor alcoólico para fazer uma limpeza mais profunda. Virei colecionador, cheguei a ter 27 cachimbos: inglês, italiano, americano e até japonês.
Em 1970, seu João era o vice-presidente do senhor Agarthino Gomes. Seu João participava ativamente de todas as atividades do clube e, nas preleções do técnico Tim, sentava-se no meio dos jogadores, absorto, enquanto o mestre estrategista mexia os seus botões, posicionando a sua equipe e revelando os segredos do adversário.
Na terceira rodada do campeonato carioca, Tim fazia sua preleção e, ao definir a lateral esquerda com Batista (que vinha atuando bem), João Silva o interrompeu. Tirou o cachimbo da boca e indagou:
– Tim! Batista?
E Tim respondeu:
– Batista, não. Eberval!
Nos olhares trocados entre os jogadores, a pergunta: seu João estaria escalando o time?
Com a ajuda do presidente ou não, o Vasco foi campeão carioca naquele ano.
COPA DE 78: O MAIOR ROUBO DE TODOS OS TEMPOS
por André Luiz Pereira Nunes
Já se passaram mais de 40 anos e a goleada da Argentina sobre o Peru, válida pela Copa do Mundo de 1978, segue polêmica. Os anfitriões precisavam vencer a partida por pelo menos quatro gols de diferença para ir à final, caso contrário, o finalista seria o Brasil. Porém, fizeram sem muito esforço 6 a 0, levantando sérias suspeitas de que aquele Mundial foi totalmente manipulado em meio ao auge de uma sangrenta ditadura no país.
O Brasil retornaria com o honroso terceiro lugar, invicto e com a qualificação, aliás muito justa, de campeão moral. De acordo com o escritor argentino Edgardo Martolio, autor de “A Glória Roubada”, em todo esse lamentável episódio esteve presente a mão da ditadura argentina, além da complacência total da FIFA, então dirigida pelo brasileiro João Havelange. A versão é totalmente corroborada pelo atacante Gil, integrante do selecionado brasileiro, em depoimento ao MUSEU DA PELADA. Ele qualifica aquele torneio como a “Copa do roubo”. Segundo Búfalo Gil, os atletas brasileiros ao serem recepcionados no aeroporto por Havelange, teriam ouvido do dirigente que agradecia a todos pelo empenho, mas que desejava que o Brasil não fosse campeão, fato este que causou tremendo estranhamento e constrangimento por parte dos jogadores. Ele ainda recorda que na estreia contra a Suécia, o juiz anulou um gol legítimo de Zico ao final da partida, alegando que o tempo regulamentar havia terminado. Eram prenuncios de que algo não estaria legal.
Uma das maiores suspeitas de que houve realmente armação por parte dos generais argentinos com o total beneplácito de Havelange decorre que, em cima da hora e desrespeitando totalmente o regulamento, a FIFA arbitrariamente mudou o horário da primeira partida da semifinal, fazendo com que o Brasil tivesse que enfrentar a Polônia três horas antes do jogo da Argentina contra o Peru. Os selecionados se igualavam em pontos. Caso ambos triunfassem, a classificação se daria por saldo de gols. Como o Brasil atuaria antes, os argentinos saberiam exatamente quantos gols precisariam fazer no Peru para chegar à decisão contra a Holanda.
Vale ressaltar que a CBF, sentindo-se prejudicada, apresentou protesto junto à comissão organizadora, mas o mesmo foi imediatamente rejeitado. O Brasil, portanto, bateria os poloneses por 3 a 1, esticando em três gols a vantagem sobre a Argentina. Esta teria que vencer o Peru, já desclassificado, por mais de três gols. Só que durante o torneio os argentinos não haviam batido nenhum adversário por essa diferença. O placar de 4 a 0 seria suficiente, mas e se o Peru fizesse um gol? Afinal de contas, aquela era uma geração composta por grandes jogadores como Oblitas e Cubillas.
Em seu livro “Como eles roubaram o jogo”, o jornalista britânico David Anthony Yallop relata que o general Jorge Videla chamou o capitão da Marinha argentina Carlos Alberto Lacoste e lhe deu uma ordem taxativa: “garanta o resultado contra o Peru!” Lacoste, que teria em torno de duas horas para cumprir a sua missão, contatou três oficiais que acompanhavam a seleção peruana e ofereceu entre 30 e 50 milhões de grãos de toneladas de trigo da ótima colheita que a Argentina fizera naquele ano. Coincidentemente, o Peru também vivia sob uma ditadura comandada por Francisco Morales Bermúdez. Isso foi fundamental para o acerto imediato. Para o mandatário peruano o trigo era muito mais importante do que um jogo no qual a sua seleção já estava desclassificada. O resultado, portanto, não mudaria em nada o destino dos peruanos na Copa do Mundo. Lacoste então informou a Videla que tudo estava concluído. É importante frisar que os jogadores argentinos não tomaram parte da combinação, já que de todo modo teriam mesmo que fazer a maior quantidade possível de gols.
Segundo Edgardo Martolio, Videla também fez algo que nunca fizera antes de algum jogo. Visitou na companhia do secretário de estado americano, Henry Kissinger, o vestiário da equipe peruana antes do cotejo. Era a senha de que tudo estava realmente acertado em altas esferas. Conta-se que o próprio presidente da nação andina também teria feito telefonemas para o vestiário de seus atletas para dar “algumas orientações”. No livro “Fuimos campeones”, o jornalista portenho Ricardo Gotta escreveu que um craque peruano teria dito, referindo-se aos militares de seu país: “turma de merda. Pelo menos distribuam o dinheiro entre nós, jogadores.”
Em março de 2018, em entrevista ao jornal peruano “Trome”, José Velásquez, ex-jogador da seleção peruana, declarou que seis companheiros “se venderam” naquela partida. Um dos acusados foi o goleiro Ramón Quiroga, coincidentemente argentino de nascimento e naturalizado peruano.
– Seis de nós nos reunimos um dia antes com o treinador, Calderón, para pedir que Quiroga não jogasse por ser argentino. Ele aceitou. Mas no dia seguinte mudou de ideia. O que eu devo pensar, que se vendeu ou não? – questionou.
Coube ao Brasil decidir a terceira colocação da Copa do Mundo contra a Itália, sua futura carrasca no mundial posterior, na Espanha. Os comandados de Cláudio Coutinho venceram por 2 a 1, com gols de Nelinho e Dirceu, e voltaram para casa com o honroso título de campeão moral invicto.