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O AUTÓGRAFO

por Paulo Cesar Martins


Costumo brincar que não sei qual foi motivo que levou esse povo a me cercar para pedir autógrafo. Inclusive o camarada vestido com macacão esportivo. A foto e o fato não foram registrados, em 1966, pelas páginas da Fatos & Fotos, mas pela Manchete, então a mais prestigiada revista brasileira.

A minha cidade, Lambari, no Sul de Minas e estação hidromineral, foi uma das escolhidas para a fase de preparação da seleção brasileira para a Copa de 66. Foram dias mágicos para a criançada. A gente cercava os jogadores caçando autógrafos e se exibindo num campinho de pelada ao lado do Hotel da Seleção.

Alguns jogadores desciam para ver “os grandes craques em ação”. Lembro-me do Dino Sani e do Zito comentando uma jogada que eu fiz. Prefiro pensar que estavam me elogiando.

Era uma turma enorme – quase 50 jogadores – e todos muito atenciosos. O coitado do Rei não podia sair muito porque não tinha sossego. Mas eles desciam para beber água mineral no Parque, ao lado da minha casa, no Centro da cidade; ou seja, se integraram à paisagem.


Tanto que uma noite alguns foram ver uma “tourada” no antigo campo do Águas Virtuosas. O campo novo, com as medidas do Maraca, estava reservado para os treinos da seleção na grama que eu e dezenas de crianças plantamos. A “tourada” era uma vaca muito brava que o “toureiro” tentava vencer. A festa acabou quando o Garrincha pulou o alambrado para ele virar o toureiro. A direção da então CBD recolheu todos para o hotel.

A seleção foi um fiasco, não por culpa de Lambari, vou logo avisando. Os anos voaram nas asas da Panair e virei jornalista, com longo tempo nos esportes.

Reencontrei o Pelé – o cara de macacão dessa foto – poucas vezes, para a minha tristeza. Numa delas em O Globo, quando a redação parou numa visita dele, quase perguntei se queria um segundo autógrafo meu. Mas achei melhor ficar quieto. Teria que atender também os meus colegas.

Ele agora completou 80 anos. É uma pena que a gente ainda não descobriu um jeito de parar o relógio!

Sua benção, Majestade! Longa vida ao Rei!

‘REI 80’: O MUNDO AGRADECE A GENIALIDADE DE PELÉ

por André Luiz Pereira Nunes (Especial para o Museu da Pelada)


Lamento profundamente não ter visto Pelé em sua época áurea de jogador. Felizmente ainda tive o privilégio de acompanhar a geração seguinte composta por grandes nomes como Zico, Reinaldo, Sócrates, Leandro, Roberto Dinamite e Falcão. Por ser nascido em 1976, o máximo onde pude chegar foi vê-lo em ação durante a Copa batizada em seu nome e organizada por Luciano do Valle, em 1987. Naquela oportunidade fora criado o Mundialito de Sêniores, composto por astros veteranos das principais seleções do mundo. Pelé só atuaria na estreia contra a Itália. Me recordo que foi uma exibição discreta, sem brilho, no entanto bastante esperada. 

Uma outra vez foi durante um amistoso comemorativo da Seleção Brasileira contra o Resto do Mundo. O Rei jogou algum tempo, dando depois lugar a Neto, esse mesmo que hoje é comentarista da Rede Bandeirantes. Me recordo de um episódio bastante interessante. Pelo Brasil atuava um obscuro ponta, de talento muito discutível, chamado Rinaldo, que na época pertencia ao Fluminense. Em dado momento, esse jogador tinha a bola no ataque e havia a opção de tocar para o Rei, que estava livre de marcação para fazer o gol. O atleta tricolor, entretanto, deu vazão à sua total falta de qualidade. Não tocou para Pelé, não fez o gol e ainda se embolou completamente no lance. Perdeu talvez a chance de contar para os filhos e netos o que seria a apoteose de sua carreira. Preferiu se render ao individualismo e à mediocridade que, por sinal, permearam a sua trajetória. 

Obviamente não vi Pelé jogar em seu tempo de atleta, já o disse e repito, mas tive acesso a seus vídeos. Possuía uma fita VHS contendo seus principais lances e gols. Através do YouTube também tive a oportunidade de conferir tudo a respeito. Trata-se realmente de algo sobrenatural. Falar sobre o Atleta de Todos os Séculos é como falar sobre Deus. As arrancadas, os dribles, a impulsão, os lançamentos e os arremates são mesmo algo de uma outra dimensão.

Confesso que mesmo não tendo visto o Rei ao vivo, não sinto aquela sensação ufanista de que o seu talento pertence somente à Nação Brasileira. Como cidadão do mundo, tenho a percepção de que vivemos em um planeta sem fronteiras. As linhas que demarcam países, estados ou cidades são imaginárias. Vale ainda ressaltar que paixão futebolística não tem idade, sexo, país ou raça. Os astros pertencem a todos. Pelé não é brasileiro. É universal! Tanto que foi capaz de interromper uma guerra na África quando o Santos por lá excursionava. 


Evidentemente, Pelé era Deus em campo, mas humano fora dele. Causou muita tristeza o fato dele não ter reconhecido uma filha concebida fora do casamento. A moça faleceu de uma doença grave clamando em vão pelo contato paterno, mas o Rei não moveu uma palha. Diversos companheiros, como Rivellino, ficaram profundamente entristecidos. Sim, não há dúvida. Fora de campo o Rei era como todos somos: humanos!

Possivelmente jamais haverá um outro semelhante ou melhor. De tempos em tempos a imprensa esportiva tenta igualar algum craque ao nível de Pelé. Vejo isso como algo natural, pois os mitos precisam ser fabricados para que haja vendas e promoções. Já fizeram comparações inúteis com Maradona e, mais recentemente, com Messi e até Neymar. Além do talento inigualável, o Rei detém uma marca impressionante. Além do bicampeonato mundial conquistado com o Santos, ainda se sagrou tricampeão pela Seleção Brasileira. Maradona só ganhou uma Copa. Neymar e Messi tampouco. 

Talvez o único que tenha chegado perto seja Garrincha. Esse também era uma criatura sobrenatural, possivelmente outra divindade. Vencido pelo álcool, acabou pobre, mas não esquecido. Enquanto os dois jogaram juntos, o Brasil parecia realmente invencível. É por isso que não dá para compararmos uma Seleção Brasileira contendo esses dois astros com a de 82, por exemplo. Não existe comparação que resista a uma análise mais apurada.

Portanto, falar de Pelé é talvez falar sobre a perfeição. De alguém que foi feito para jogar futebol. Um modelo. Detentor de um futebol alegre, ofensivo, bonito. Não o frio, moderno, medíocre, esforçado, pragmático e de resultados. Pelé e sua geração representam a pura alegria. A irresponsabilidade. A irreverência. A pureza e a essência do desporto espontâneo e de amor à camisa.

SERÁ O FIM DA SINA DE PIOR TIME DO MUNDO?

por André Luiz Pereira Nunes


Um fato deveras inusitado chamou a atenção da imprensa e das redes sociais no domingo, 18 de outubro. Na estreia do Íbis, pela Série A2 do Campeonato Pernambucano, ocorreu uma grande surpresa. A equipe rubro-negra, notabilizada por ser a pior do mundo, goleou a Cabense, de Cabo de Santo Agostinho, pelo placar de 4 a 0. Romarinho, duas vezes, e Diego assinalaram. Para fechar a goleada, com chave de ouro, o outro tento foi contra. Porém, o que deveria ser um motivo de júbilo para qualquer time, diretoria e torcida, na verdade provocou uma verdadeira ira muito bem-humorada, se é que assim podemos dizer, nas redes sociais. 

 “Fim de jogo. Cabense 0x4 Íbis. Péssima estreia!”, publicou a conta oficial do clube pernambucano no Twitter.

Contudo, Diego e Romarinho, astros da partida, prometeram contrariar as esperadas tradição e expectativas nessa temporada.

– A torcida vai ter raiva da gente esse ano porque vamos rumo ao título! – declarou um exultante Diego ao portal de notícias UOL. Já o companheiro Romarinho não deixa por menos.

– A galera tem que deixar de ver esse time como o pior do mundo, pois quem faz o Íbis somos nós e estamos em busca da primeira divisão! – afirmou em entrevista ao mesmo veículo.

Fundada a 15 de novembro de 1938, a agremiação rubro-negra chegou a entrar para o Guinness, o Livro dos Recordes, por ter registrada a incrível marca de três anos e onze meses sem uma única vitória. Foram nove derrotas seguidas e um desempenho pífio de 23 partidas sem triunfos. Ao bater o Ferroviário por 1 a 0, em 20 de julho de 1980, o Pássaro Preto só voltaria a ganhar novamente em 17 de junho de 1984, quando bateu o Santo Amaro por 3 a 1. Vale ressaltar que superara assim o próprio recorde, ocorrido entre 1978 e 1979, quando permaneceria 19 jogos sem vencer. Ou seja, não há o que contestar. O time é muito ruim mesmo!

Na época, os jornalistas passaram a fazer inúmeras brincadeiras a partir da fama do Íbis, definindo-o então como o “Pior de todos os tempos”. Não tardaria para a onda se espalhar. Mas a alcunha, que para muitos seria depreciativa, foi na verdade utilizada como uma espécie de trunfo de marketing. A equipe acabaria se tornando mundialmente conhecida devido à irreverência contida na sua história.

Em 2017, o Íbis fôra mais longe do que o previsto na disputa da Série A2 do Campeonato Pernambucano. Na primeira fase do estadual, conquistou o feito histórico de permanecer seis jogos sem derrotas, com o retrospecto de quatro vitórias e dois empates, só caindo no mata-mata. Em tom jocoso, seus torcedores iniciaram protestos por conta da sequência invicta e, de forma bem descontraída, alegaram que só voltariam a apoiar o clube quando fossem feitas as “pazes com a derrota”, o que duraria 390 dias.

Na mesma ocasião, na tentativa de angariar recursos, os dirigentes lançaram uma campanha completamente inusitada tendo como garoto-propaganda o ex-ídolo Mauro Shampoo. Provavelmente se tratava da mensalidade mais barata da história do futebol brasileiro, pois bastavam apenas R$ 2 por mês para se tornar um sócio-torcedor da agremiação.

“Ajude com apenas 2 reais o nosso time a perder” era o mote da iniciativa. Os novos sócios ainda concorriam a kits contendo camisa, calção e meião, além de desconto na compra dos ingressos dos jogos.

O advento e a popularização das redes sociais amplificariam ainda mais a fama do Íbis, que passaria então a “cornetar” e até desafiar equipes internacionais. Algumas mensagens no Twitter exploram esses cômicos momentos:

“O treino de hoje foi tenso. Nossos atletas estão na expectativa de uma possível convocação para a Copa do Mundo. Teve até jogador fazendo corpo mole, tirando o pé em certas jogadas. A maioria com medo de uma possível lesão. Seja justo, Tite!”

— Íbis Sport Club (@ibismania), em 14 de maio de 2018.


“O PSG foi campeão vencendo por 7 a 1 o segundo colocado do francesão. Competição de altíssimo nível. Lembra muito o campeonato que jogamos, a 2ª divisão do Pernambucano. Parabéns!” — Íbis Sport Club (@ibismania), em 15 de abril de 2018.

“Muita gente perguntando se vamos fazer um amistoso contra o @sportrecife hoje. Entendemos que o time está sem jogar e se preparando para o Brasileirão. Mas não vamos jogar. Preferimos enfrentar um time mais forte. Parem de espalhar boatos. Obrigado!”— Íbis Sport Club (@ibismania), em 11 de abril de 2018.

O time foi concebido como um meio de entretenimento para os trabalhadores da Tecelagem de Seda e Algodão de Pernambuco (TSAP). A princípio, apenas funcionários da empresa jogavam e, mesmo assim, em partidas amistosas. Posteriormente, com o crescimento, a equipe se profissionalizou, tornando-se inclusive uma das fundadoras da Federação Pernambucana de Futebol. Com o passar do tempo, as dificuldades foram surgindo, culminando no abandono por parte da companhia. Daí, a Família Ramos abraçou a iniciativa e a mantém até hoje. O símbolo é um pássaro mitológico: a íbis sagrada do Egito antigo. Já a cor rubro-negra é uma referência ao escudo da TSAP.

Resta saber se o “Pior time do mundo” engrenará uma sequência histórica de vitórias, contrariando, desse modo, a sua peculiar e irreverente trajetória de insucessos nas quatro linhas. Não seria a primeira vez. Em 1999, a escrita foi quebrada. O Íbis se sagrou vice-campeão estadual da segunda divisão. 

O DIA EM QUE TOCAMOS O TOPO DO MUNDO

por Serginho 5Bocas


Sem dúvida nenhuma, 1981 havia sido um ano e tanto para a galera rubro-negra, vencemos torneios na Itália, uma disputada e sofrida Copa Libertadores, o Carioca que foi uma verdadeira guerra, e que ao conquista-lo, homenageamos o falecido Cláudio Coutinho, que teve grande participação na montagem do esquadrão. Enfim, estávamos quase de alma lavada, mas faltava uma “coisinha”, um título que mudaria nossas vidas e que nós queríamos muito, ser campeões do mundo.

O Flamengo montou seu esquadrão e se preparou como nunca para vencer, tinhamos que ganhar de qualquer maneira em Tóquio. Aqui no Rio não se falava em outra coisa nos bares e esquinas. Nosso time era fantástico e fomos encarar os ingleses do Liverpool, campeões europeus em cima do Real Madrid, os diabos vermelhos. No time deles jogavam dois craques da seleção escocesa, o atacante Kenny Dalglish e o meia Sounness.

Enfim chegou o grande dia, o jogo foi 13 de dezembro à meia noite de Brasília. Todo mundo acordado só para ver aquele time, e ele não decepcionou, pois em apenas 45 minutos fez 3×0 com Adílio e Nunes duas vezes. Pronto, o jogo já tinha um vencedor. No segundo tempo só tocamos a bola, num jogo em que Zico esteve inspirado e além de ter feito uma bela partida, deu os dois passes para Nunes e bateu a falta que gerou o rebote do gol de Adílio. No fim, foi coroado como o melhor em campo, dividindo o prêmio com o artilheiro Nunes, cada um levando um carro Toyota para casa. 


Para se ter ideia daquele feito, até aquele momento, somente o Santos de Pelé nos anos de 1961 e 1962, havia conquistado aquela glória. Palmeiras com sua academia não chegou, o Botafogo de Garrincha e da turma de 68 não conseguiu, o Cruzeiro até fez uma final, mas parou no Bayern de Munique. Daí toda a importância da conquista. 

Ali foi um divisor de águas, pois os clubes brasileiros passaram a dar mais importância e a se preparar para vencê-la, pois logo em seguida o Grêmio também venceu e no início da década de 90 o São Paulo de Telê ganhou outras duas. Lá pelos anos 2000 conseguimos vencer em mais quatro ocasiões com o Corinthians (duas), Inter e São Paulo novamente. Hoje o Brasil tem dez conquistas e só perde para a Espanha que detém onze, muito por conta dos clubes milionários que deixaram a competição desequilibrada, mas isso é historia para outra crônica.

Levamos incríveis 38 anos para retornar aquele lugar, a participar novamente de uma final de mundial de clubes e perdemos para o Liverpool, numa grande ironia do destino, pois acredito que tenha sido a única vez que a final se repetiu. Apesar do orgulho de chegar ali depois de tanto tempo e de perder em um jogo muito igual, foi frustrante ser vice mesmo sabendo do tamanho de cada clube naquele momento.  

Por isso e mais do que nunca, devemos sempre reverenciar aquela turma “feita em casa” de 1981, pois não foi só uma vitória, foi a vitória da qualidade sobre a arrogância inglesa, do futebol brasileiro se impondo e nos colocando no nosso devido lugar.


Nunca mais tivemos um Flamengo de sonhos como aquele e não era preciso, pois no fundo de cada antigo coração rubro-negro, todos sabíamos que aquele time marcaria uma época, uma geração que se acostumou a vencer tudo, e que naquele dia tocou o topo do mundo.

Parabéns, Raul, Leandro, Marinho, Mozer, Junior, Andrade, Adílio, Zico, Tita, Nunes, Lico, Cantarele, Nei Dias, Figueiredo, Vitor, Baroninho, Anselmo, Carpegiane, Domingos Bosco e é claro a magnética… 

Forte abraço

Serginho5Bocas

A ERA DOS ESFORÇADOS

por Washington Fazolato


O genial Tostão, craque como jogador e como comentarista, certa vez escreveu sobre a diferença entre talento e técnica no futebol.

A técnica pode ser aprendida e essa é a proposta das escolinhas e categorias de base.

Dominar a bola, cabecear, posicionamento em campo, arrematar são fundamentos que podem ser aprendidos.

O talentoso já nasceu sabendo tudo isso.

Ele citou Romário e sua aversão a treinos.

Afinal, se já sabia tudo aquilo, pra que treinar?

Para aprimorar o quê? Faz sentido.

Chegando finalmente ao tema do texto, vivemos hoje no futebol a era de mais uma categoria de jogadores.

Não prevalece nem a técnica, nem o talento, mas o esforço.

Comecei acompanhar futebol em meados da década de 70, indo frequentemente ao Maracanã (o verdadeiro, o antigo).

Garoto, me impressionava as demonstrações de habilidade ao dominar uma bola no alto, um passe de curva de lateral a lateral, com o lado externo do pé, o domínio no peito de um chute de tiro de meta e por aí vai.

E pasmem, isso era executado por jogadores sem destaque, pelos coadjuvantes dos times.

Os craques? Esses nos brindavam com jogadas que até hoje são exibidas como diamantes.

A tabelinha entre Falcão e Escurinho no gol contra o Atlético-MG; o elástico de Rivellino em Alcir; o gol de Zico contra a Rússia e por aí vai.

Tudo mudou.

Por motivos já listados – desaparecimento dos campos de futebol nós subúrbios, visão míope dos treinadores de base, excessiva ênfase na parte física e outras – nosso futebol entrou numa descendente na qual sobraram os esforçados.

De forma alguma quero estigmatizar o esforçado.

O esforço, a persistência, a perseverança são ações nobres, reveladoras de caráter.

Mas – no caso do futebol – devem vir acompanhadas de técnica ou talento.

Quem acompanha, como eu, até jogos da série C, sabe que nossos times estão povoados de jogadores meramente esforçados. E só.

Para piorar, alguns nem tão esforçados são.

E aí temos o pior dos mundos para o fã de futebol.

E assim, o Brasil caminha talvez para sua quinta Copa sem título.