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EU PERDI, ELE GANHOU

por Zé Roberto Padilha

Quando era técnico do Sub-20 do Fluminense, tentava jogar com dois pontas abertos. Nada desmonta a defesa adversária mais do que aquele pontinha habilidoso que alcança a linha de fundo e coloca bola de frente para seu centroavante.

No estadual, quando fazíamos as preliminares em jogos nas Laranjeiras, Neném, na ponta-direita, era a maior atração. Um show à parte. Um ano depois vim comandar o time da minha cidade, o Entrerriense FC, e o classificamos para a primeira divisão, em 1995.

O Fluminense nos emprestou seis dos atletas que formei. Pedi o Neném e me recusaram.O sub-20 tinha disputado a Copinha e, segundo o supervisor, Paulo Alvarenga, Neném tinha aprontado na competição. Nunca fiquei sabendo do motivo.

Certa noite, me ligou, de um orelhão em Copacabana. Em litígio com o Flu e sem perspectiva.

– Me leva pra Três Rios, professor. Estou precisando muito!

Ai me coloquei no seu lugar. O que ele faria no Rio sem jogar, aos 19 anos, sem clube e sem futuro? Tentei muitas vezes e Paulo Alvarenga recusava liberar o empréstimo.

– Vai atrapalhar seu trabalho! – insistia.

Por mais que alcançasse nosso objetivo, vencendo a divisão intermediária e indo para a primeira divisão, aquele telefonema, de um garoto humilde implorando um acolhimento para ter abrigo, futuro e desenvolver sua arte, roubara meu sono.

Nem sei como conseguiu, mas o destino assumiu, a partir daí, as rédeas de sua vida. Foi jogar na praia e se tornou o maior de todos. O Rei. Campeão Mundial, melhor jogador de Futebol de Areia do Mundo, maior artilheiro do Brasil, com 337 gols marcados pela seleção brasileira.

Nunca mais nos vimos. E la se vão 30 anos que lhe entreguei a camisa 7 e ele nos concedia um espetáculo à parte. Ontem, porém, me ligou. Vem a Três Rios, sábado, nos visitar. Treinador da seleção do Catar de Beach Soccer, Neném vai nos conceder esse prazer.

Uma pena que não seja para defender a camisa 7 do Entrerriense FC. Que caberia como uma luva, mas certamente o impediria de ter o mundo aos seus pés descalços, dribles insinuantes a alcançar um improvável e vitorioso reinado.

OBRIGADO, PROFESSOR

por Zé Roberto Padilha

Professores são mesmo assim. Deixam lições definitivas na vida da gente. Mas quando são do futebol, e giram, são nômades em razão dos resultados, não os encontramos para agradecer “a professorinha” que permaneceu fincada na escola do interior.

A esse da foto, Paulo Nascimento, que nos treinou no Americano FC, não o vejo há 41 anos. Mas suas lições foram definitivas. Como as do Parreira, Sebastião Araújo, do Pinheiro. E como eu gostaria que esse texto chegasse até ele. Pois nunca pude dizer o meu muito obrigado.

Disputava o estadual da primeira divisão com a camisa 10. Sergio Pedro corria por mim o que corri por Gerson, Zico e Rivellino. No Americano descobri, mesmo com três cirurgias no joelho esquerdo, tornozelos fraturados e uma hérnia inguinal rompida, que sabia jogar bola direitinho.

Ao me ver treinando, sofrendo os impactos dos gramados duros em nossa preparação, retirou-me do campo e me apresentou a um vício que nunca mais me livrei: a natação.

No começo, os jogadores reclamavam e tal “privilégio” debaixo do sol de Campos. Eles de chuteiras, eu de sunga. Mas no domingo, voava. E daí sossegavam. Graças a natação, puder jogar mais três anos e nos manter em cena, saudável até a quarta cirurgia. A da aposentadoria.

Ainda hoje, nado quase todos os dias. E pude manter um hábito saudável, a prática esportiva, ao adotar um esporte que não traz mais impacto às articulações comprometidas.

Obrigado, Professor Paulo Nascimento. Você nem imagina a importância das suas lições na minha vida

FUTEBOL SEM EDUCAÇÃO

por Marinho Picorelli

Seria muito interessante se as “mesas redondas”, para muito além das criticas contundentes aos erros dos árbitros, profissionalização da arbitragem passassem a discutir, bem a fundo, a falta de profissionalismo e educação dos jogadores e treinadores no Brasil.

Essa cultura de ter que ganhar os jogos no grito e não na bola, está tornando o futebol brasileiro insuportável. E não eximo os árbitros de culpa nessa falta de profissionalismo e educação, e, muito menos a imprensa que passa pano para esses jogadores e treinadores.

É dedo na cara de árbitro, é jogador segurando mão de árbitro para não retirar o cartão do bolso, é jogador berrando na cara do auxiliar, mesmo ficando claro que foi ele quem colocou a bola para fora.

O dia que os árbitros começarem a distribuir cartões por essas atitudes insanas, isso vai acabar. Mas tem que ser TODOS OS ÁRBITROS! Não pode ser uma meia dúzia e outros permanecerem frouxos.

É insuportável ver a cada contato – coisa inerente ao esporte – jogador que perde a bola cair no chão e ficar dando soquinhos e esperneando que nem criança fazendo birrinha; jogador que leva um empurrão no peito se jogar com as mãos no rosto como se tivesse levado um tiro.

A pra piorar, os dirigentes vão aos microfones acusar os árbitros (na maioria das vezes com razão), mas não educam os jogadores a quem eles pagam fortunas, por ele ter tirado a camisa após um gol levar cartão, cartão esse que pode até ser o segundo, que geraria um vermelho. Isso sem falar que esconde o patrocínio que paga seu salário.

A imprensa fala muito na parte técnica da arbitragem, mas não vejo UM SÓ abrir a boca para falar dos descalabros cometidos pelos jogadores e placidamente aceito pelos árbitros.

Assistir a um jogo europeu na parte da manhã e assistir um jogo brasileiro à tarde é um suplício. Aficionado que sou por futebol, por inúmeras vezes larguei uma transmissão no meio por não aguentar mais assistir a bizarrice que se transformou esse esporte (?) que se pratica no Brasil, e que teimam em chamar de futebol.

97 ANOS DE DIDI

por Elso Venâncio

Homenagem ao jornalista e escritor Péris Ribeiro, que, com crônicas de um verdadeiro craque, sempre lembrava o aniversário do eterno ídolo por ele biografado.

Waldir Pereira, o inesquecível Didi, marcou o primeiro gol da história do Maracanã. Foi em uma cobrança de falta num amistoso entre as seleções de novos do Rio e de São Paulo, minutos após o presidente Dutra cortar a fita inaugural do estádio e a uma semana do início da Copa do Mundo de 1950. Ainda não seria aquela cobrança que o tornaria famoso. O estilo de chutar a bola foi aprimorado com o tempo, resultando na famosa e inigualável Folha Seca, que tanto atordoou goleiros mundo afora. 

Eleito o melhor jogador da Copa do Mundo de 1958, Didi se tornou o primeiro negro a atuar no Real Madrid. O visionário dirigente Santiago Bernabéu, que transformou o clube merengue na marca mais valiosa do futebol do planeta, se encantou com o craque no Mundial da Suécia e decidiu contratá-lo para o time, que já contava com o argentino Di Stéfano e o húngaro Puskas. A estreia de Didi aconteceu em agosto de 1959, com 30 anos, no tradicional Troféu Ramón de Carranza, em Cádiz. Para variar, o Real Madrid sagrou-se campeão, com Didi sendo o maestro do maior time europeu da história. Marcou três gols na estreia, contra o Milan, e deu uma assistência para Puskás na final, contra o Barcelona, o que teria incomodado Di Stéfano.

Biógrafo de Didi, o jornalista e escritor Péris Ribeiro nunca concordou que Di Stéfano tenha boicotado o brasileiro. “Didi me disse que era normal o dono do terreiro, que chegou em 1953, ser o astro daquele esquadrão”, afirmava Péris, completando: “Todos o respeitavam, e não sofreu racismo, como alguns afirmam”.

Muito antes de chegar ao Real Madrid, Didi iniciou a carreira aos 16 anos, no Americano de Campos, sua terra natal. Dirigentes do Madureira viajaram à cidade para levar o atacante Dodô, mas se surpreenderam com uma inesperada resposta: “Só vou se meu irmão Didi, que joga muita bola, for contratado”.

Dali em diante, o desenrolar da história foi uma carreira de enorme sucesso. Depois do Madureira, Didi defendeu o Fluminense, onde foi campeão carioca em 1951. De lá seguiu para o Botafogo, clube do seu coração, conquistando o Carioca de 1957. No Real Madrid, fez parte da conquista da Liga dos Campeões da Europa de 1959. Voltaria ao Botafogo após o período na Espanha, desta vez celebrando os Cariocas de 1961 e 1962, além do Torneio Rio-São Paulo de 62. Também defendeu o Sporting Cristal, do Peru, e o Veracruz, do México, encerrando a trajetória de atleta no São Paulo. Pela Seleção Brasileira, sagrou-se bicampeão mundial, em 1958 e 1962, entre outros títulos.

Como técnico, Didi treinou vários times e seleções pelo mundo. No comando da Seleção Peruana, impediu que a Argentina disputasse a Copa do Mundo de 1970. Os hermanos precisavam vencer e acabaram empatando por 2 a 2, dentro da Bombonera, no jogo decisivo pelas Eliminatórias. O Mestre Didi não realizou o sonho de treinar a Seleção Brasileira. Lamentava ter mais reconhecimento no exterior, sendo chamado pela imprensa europeia de Mr. Football — Senhor Futebol.

Neste dia 8 de outubro, Mestre Didi completaria  97 anos. Faleceu em 12 de maio de 2001, com problemas intestinais e complicações de uma pneumonia, no Hospital Pedro Ernesto, em Vila Isabel (Rio de Janeiro).

SIMPLESMENTE CHATO

por Fabio Lacerda

Edição: Marcos Vinicius Cabral

Chato. É a melhor definição que encontrei para dar título ao artigo que decidi escrever.

Chato, enfadonho, maçante, tedioso e sacal (termo este que o carioca inventou para caracterizar todos os adjetivos citados acima). Saudades do tempo que não vivi!

Não bastasse a zorra generalizada que é o futebol brasileiro, cujos erros, muitas vezes soam como propositais, seja nas gestões, na Comissão de Arbitragem, elaboração do calendário, nas mazelas que assombram o jogo jogado e as empresas de apostas on-line).

Há anos que os jornalistas estão podados de utilizar a criatividade nos textos para impressos e sites, nas narrativas para as emissoras de rádio, nas imagens para televisão e redes sociais.

Entediados conteúdos são protagonistas de um período que somente técnicos ou diretor de futebol se dirigem às salas de imprensa para a entrevista coletiva que vem ficando caracterizada como “fala muito e não diz nada”.

Desde que os jogadores, os artistas dos espetáculos nos palcos de barbáries Brasil afora foram colocados para escanteio nas entrevistas pós-jogo, o conteúdo jornalístico vem sofrendo contínuos ataques.

Nas salas de imprensa, vimos as mídias tradicionais sendo engolidas pelas mídias propostas pelas redes sociais. Vimos jornalistas fazendo ensejos longos antes das duas perguntas travestidas de uma. E a cereja do bolo é que todo técnico tem as respostas na ponta da língua.

Quero estar vivo para vir o dia que um técnico tiver a humildade de dizer que não sabe responder ou que não havia pensado naquele questionamento, será o primeiro passo para uma relação mais informativa entre jornalismo, clubes e leitores.

Tenho saudades do tempo que não vivi. Tempo esse que remete ao passado que sequer meu pai e minha mãe pensaram em filhos. Saudades, por exemplo, de Didi, já bicampeão mundial, abrir a porta de casa para receber jornalistas e pedir à esposa com o mesmo carinho que tratava a bola para servir um cafezinho. Saudades de quando o jornalista não era cerceado e cercado como um boi no pasto e poderia entrevistar quem ele quisesse sem ordem expressa autoritária dos departamentos de Comunicação e Marketing. Sem falar naquela liberação de 15 minutos para a imprensa televisiva capturar imagens de “petecada” na bola, peteleco nas orelhas e uma seleção de besteiras promovidas pelos pop stars do esporte brasileiro.

É tempo de resgatar este saudosismo e liberar por tempo determinado os jornalistas de abordarem os atletas, dirigentes ou qualquer agente envolvido com o futebol. A imprensa esportiva brasileira está de mãos atadas. Seja para pegar na caneta, seja para apertar o botão de gravação dos dispositivos eletrônicos e tecnológicos, e até mesmo para agendar uma entrevista. A exclusiva virou artigo de luxo. O futebol sobrevive, mas o que o norteia já morreu há tempos!