92 ANOS DA LENDA VIVA
por Elso Venâncio

Ao ser reconhecido enquanto caminhava na praia ou nas ruas de Ipanema, a lenda viva Evaristo de Macedo conversava com todos. Bem humorado, sempre gostou de relembrar a sua carreira de jogador, além das seleções e dos clubes que dirigiu mundo afora. Dentro das quatro linhas, foi o primeiro brasileiro a atuar e ser ídolo nos dois gigantes espanhóis, protagonistas de uma rivalidade que transcende o futebol. O Real Madrid representa a realeza, enquanto o Barcelona é um símbolo do povo catalão e do seu desejo de independência. “Sou bem tratado nos dois e sempre convidado para suas festas”, afirma Dom Evaristo.
Revelado pelo Madureira, Evaristo de Macedo fez sucesso com a camisa do Flamengo. Após se destacar no segundo tricampeonato carioca do clube, em 1953, 1954 e 1955, o craque decidiu deixar a Gávea para jogar no Barcelona. “O passe era meu e negociei direto com os espanhóis”, conta Evaristo, que ostentava o fato de ser o camisa 10 da Seleção Brasileira. Na época, a antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD) só convocava quem atuava no Brasil. “Pelé só surgiu na Copa da Suécia porque eu fui para a Europa”, garante, com sua habitual irreverência.
A ida para o futebol espanhol rendeu bons frutos. Evaristo é tetracampeão da centenária La Liga, com dois títulos pelo Barcelona e dois com o Real Madrid. Após pendurar as chuteiras, teve uma vitoriosa carreira de técnico. Passou por dezenas de clubes, sobressaindo-se principalmente no Flamengo, no Santa Cruz e no Bahia, onde dá nome ao centro de treinamento. Entre outros trabalhos, levou o Catar a duas Olimpíadas. Também dirigiu a Seleção Brasileira, em 1985, e no ano seguinte a do Iraque, na Copa do Mundo disputada no México.
Evaristo de Macedo era o ídolo de Washington Rodrigues. Nas três vezes em que dirigiu o Flamengo (1993, 1998-1999 e 2002-2003), teve indicações do inesquecível Apolinho. Uma das passagens ficou marcada pelo encontro com o astro Romário, que tinha poderes e regalias que nenhum outro jogador teve na história rubro-negra. Às vezes, nos intervalos dos jogos, Romário fazia duras afirmações: “O Maracanã está cheio por minha causa. Vocês não jogam porra nenhuma”. Certa vez, o Flamengo perdia por 1 a 0 para o Atlético Mineiro, e Romário estava furioso. Decidido, Evaristo partiu para cima do Baixinho:
— Acabou? Foi a última vez que você grita no vestiário! Aqui, quem manda e fala sou eu!
No segundo tempo, Romário empatou o jogo e foi comemorar no banco, descontraído, apontando para o treinador: “E aí? Já fez gol assim?”. Em jogada individual, marcou de novo e virou para 2 a 1, motivo para nova provocação: “Meu técnico, gostou?”, perguntou o artilheiro, rindo, abraçado com os companheiros.
Romário gostava de escalar os times. Cercado de amigos, pedia a algum deles para conversar com os treinadores. Com Evaristo, nem pensar! Os dois acabaram se entendendo e ficaram próximos. Antes dos treinos, Evaristo contava histórias e completava no final: “Eu joguei mais que o Baixola. Muito mais”. Romário ria como criança.
Nascido no Engenho Novo, o carioca Evaristo de Macedo tem vários feitos históricos. Um deles é o de, até hoje, ser o único atleta a marcar cinco gols num mesmo jogo pela Seleção Brasileira. Foi na goleada por 9 a 0 sobre a Colômbia, em 1957, pelo Campeonato Sul-Americano. Morador de Ipanema, Dom Evaristo completará 92 anos no próximo domingo, dia 22, sendo uma das maiores lendas vivas do esporte mais popular do mundo.
MARACANÃ – O TEMPLO DOS DEUSES
por Ricardo Alves (Rico)

Ah, meu caro, quem viveu o Maraca nos anos dourados sabe que ali não era apenas cimento e arquibancada, era paixão pura! Hoje, esse colosso do futebol mundial apaga 75 velinhas — e cada uma delas é uma lembrança que faz o coração bater mais forte.
Quantos craques desfilaram por ali: Pelé, o Rei e seu milésimo gol; Garrincha, o anjo das pernas tortas; Nilton Santos, a enciclopédia do futebol; Beckenbauer, o Kaiser; Zico, seu maior artilheiro; até Lionel Messi deu o ar da graça. Foi ali, meu amigo, que a bola chorou e sorriu, que a galera vibrou como nunca.
Quem esquece aquele 16 de julho de 1950? Brasil e Uruguai na final da Copa. O estádio fervia como caldeirão de feijoada. Todo mundo de radinho na mão, terno engomado e charuto na boca. A bola rolou, o gol de Friaça, o grito entalado na garganta… e de repente, um silêncio mortal. O Maracanã virou trauma nacional.
Mas o tempo não para, dizia o poeta. Em 2016, o ouro olímpico — tão esperado, tão sonhado — foi carimbado no peito do Maraca. Uma nova geração chorou, mas de alegria.
Quantos gols de placa não saíram dali? Quantos gritos de “goooool” ecoaram por aquelas arquibancadas de concreto? Até a música se rendeu ao Maraca: Sinatra cantou e encantou o público, Paul McCartney fez marmanjo chorar de emoção.
O tempo passou, vieram as reformas, a geral virou saudade, mas o Maracanã continua lá: imponente, altivo, de braços abertos como o Cristo Redentor. O concreto pode ter mudado, mas o coração da bola continua batendo forte.
Parabéns, Maracanã! Parabéns a todo torcedor que já vibrou ali, que chorou, que riu, que abraçou o vizinho de cadeira. Porque ali, meu amigo, é o verdadeiro TEMPLO DOS DEUSES!
O FUTEBOL ERA CHATO, ATÉ SURGIR GARRINCHA
por Zé Roberto Padilha

O cinema mudou com Charles Chaplin. Até Carlitos, muitas guerras, dramas e paixões dominavam as telonas. Até ele começar a fazer graça. E sorrir, ser feliz, deixou de ser apenas privilégios alcançados nas peças teatrais
Se em Hollywood surgiram os Três Patetas, no Brasil, Mazzaropi seguia o modelo, levando aos cinemas engraçadas situações do nosso cotidiano, carregados de humor bem singelo. Que alcançou as telinhas com os Trapalhões e resistiu até o Zorra Total.
Aí o que era graça se tornou bullying.
No futebol era assim também, onze contra onze. Castilho, Pindaro e Pinheiro viraram lendas por segurar Ademir, o Queixada, do Vasco. Existiam disputas, craques como Leônidas da Silva e Heleno, mas não tinha muita graça.
Até que um morador de Pau Grande, distrito de Magé, chamado Mané Garrincha, foi realizar um teste no Botafogo. Para seu azar, como ponta-direita, quem iria marcá-lo era o ídolo do time, Nilton Santos. E, logo na primeira jogada, ele enfiou a bola por entre as pernas de Nilton Santos.
Tal ousadia levantou murmúrios nas arquibancadas, cujos sócios assistiam apreensivos. Qual seria a reação do capitão do time? Acabado o treino, Nilton Santos se dirigiu à diretoria e ordenou:
– Contrata. Não quero esse cara jogando contra mim. Melhor que fique do nosso lado!
Campeão pelo Botafogo, titular na Copa de 58 e protagonista do bicampeonato mundial, conquistado pelo país, em 1962, no Chile, Garrincha se tornou o mais completo dos bailarinos/jogadores que não levavam apenas seus marcadores à loucura, como também concederam ao futebol brasileiro o status de criadores do futebol-arte..
Garrincha driblava, bailava e encantava. Em meio a mesmice de hoje, a retranca dos treinadores temerosos em perder o cargo, fora Vinicius Jr, Soltedo, o Ferreirinha, quem ousa arriscar o próprio drible?
Sua candura era tamanha, que pouco se ligava nos anseios e temores da sua gente. Soltava papagaio de dia e à noite fazia filhas. E quando entrou em campo, na Suécia, contra a Inglaterra, enquanto uns tremiam, alguns de frio outros pela importância da partida, ele confidenciava ao pé do ouvido do Didi:
– Oba, hoje é contra o São Cristóvão. Nosso freguês!
*na foto, Recebido na sede do Entrerriense FC, Garrincha conversa com meu pai, que também jogou muita bola, ao lado do Dr. Nena, Moacir Sanseverino Jr.e Betinho Barbosa.
MARCAS DA INGRATIDÃO
por Zé Roberto Padilha

A primeira foi cometida com o Fluminense. Tantos anos preparado com carinho, quatro refeições, profissionais qualificados à sua disposição em prol de sua formação, em Xerém, nunca ouvi dele um “Muito obrigado, Fluminense!”.
Agora, no Flamengo, que acaba de reajustar seus rendimentos por reconhecimento, não obrigado por contrato, algo pouco comum em qualquer profissão, Gerson está pensando em deixar o clube e partir para a Rússia.
A segunda ingratidão, pois vai ficar um pouco mais rico de dinheiro, e um pouco mais pobre como cidadão.
A terceira e última ingratidão, ele comete consigo mesmo. Quem, em sã consciência, deixa um clube que vai disputar o Mundial de Clubes, dar sequência à Libertadores para desaparecer do cenário esportivo um ano antes de uma Copa do Mundo?
Será que ele não lembra do Nino? Convocado para a seleção, trocou no Fluminense pelo…se eu não lembro, nem o Mercado Livre ou a CBF descobriu o clube e o país que atua, como receberia uma encomenda ou uma convocação?
Tudo bem que no Rio acontecem barricadas na Linha Vermelha, tiros diariamente trocados na Avenida Brasil. Porém, a ficar sujeito às bombas arremessadas pelos drones da Ucrânia já não se trata de ingratidão.
Mas de falta de informação.
ÍDOLO RAIZ
por Elso Venâncio

Um dos maiores zagueiros do futebol brasileiro e espanhol, Luís Pereira comemora 76 anos de idade no próximo dia 21. Na época em que o central jogava fixo, o eterno camisa 3 do Palmeiras inovou ao atacar e fazer gols, totalizando 36 marcados pelo clube paulista, que defendeu em duas passagens: de 1968 a 1975 e de 1981 a 1984. O ídolo raiz impressionava pela força física e facilidade em sair com a bola dominada, tabelando e passando do meio-campo, mesmo com suas pernas tortas e seus 1,81m.
Os grandes times da história do Palmeiras são chamados de “Academias do Futebol”, pela qualidade e pelos títulos conquistados em sequência. Luís Pereira fez parte da Segunda Academia, que começou a ser formada em 1969, com o título brasileiro, tendo Dudu e Ademir da Guia, remanescentes da Primeira, e durou até 1980. Um dos esquadrões desse período era formado por Leão; Eurico, Luís Pereira, Alfredo e Zeca; Dudu e Ademir da Guia; Edu, Leivinha, César Maluco e Nei.

Tricampeão brasileiro, Luís Pereira também conquistou três edições do Campeonato Paulista — uma delas invicta. Sua galeria também conta com três títulos do famoso Torneio Ramón de Carranza, com destaque para o de 1975, em que o Real Madrid foi o adversário na final. Os grandes clubes brasileiros participavam dos famosos torneios de Verão, como Paris, Ramón de Carranza, Teresa Herrera, entre outros. Além de serem atração ao lado dos gigantes europeus, eram também papões de títulos. Muitas dessas competições foram extintas, enquanto outras perderam força, pois os clubes do Velho Continente passaram a excursionar na Ásia, na Oceania e na América do Norte em busca de dinheiro. O fim da era Pelé e desse intercâmbio internacional influiu para arrefecer a hegemonia do futebol brasileiro no planeta.
Bicampeão brasileiro em 1972 e 1973, o Palmeiras cedeu seis jogadores para a Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1974. Mantido como técnico após o tricampeonato mundial no México, Zagallo chamou Leão, Luís Pereira, Alfredo, Ademir da Guia, Leivinha e César Maluco. Pelé, que tinha se despedido da Seleção em 1971, não chegou a um acordo para jogar a Copa na Alemanha, mesmo ainda atuando pelo Santos. Num Mundial, a FIFA coloca grana alta na mesa para ter os grandes Ídolos e faturar com os patrocinadores. Vinte anos depois, Maradona recebeu cachê milionário para entrar em campo na Copa dos Estados Unidos, mesmo estando fora de forma. O craque argentino nunca perdoou a FIFA pelo descumprimento do acordo de não sorteá-lo para o anti-doping.
Luís Eduardo Pereira nasceu em Juazeiro/BA, terra do músico João Gilberto, criador da Bossa Nova. Reside atualmente em Madri, sendo dirigente e descobridor de valores do Club Atlético de Madrid, onde também jogou, fez história e se tornou uma lenda viva no futebol espanhol.