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AS CORES DE UMA PAIXÃO

por Marco Antonio Rocha

Pelas mãos de um tricolor, uma parte da Rua Cachambi ganhou (e ainda ganha) cores. São escudos das mais diversas divisões do futebol carioca. Caprichado em cada detalhe, o trabalho começou a ser desenhado há três anos, logo após a pandemia. Primeiro foi a calçada, depois os postes e o muro da casa do artista – que, tímido, prefere o anonimato.

“Foi uma depressão pesada que me fez começar. Encontrei na arte e no futebol uma forma de driblar a doença”, conta ele, também apaixonado por pipas: “Por isso elas estão pintadas no alto da casa, mais perto do céu”.

Neste fim de semana, quando o Museu da Pelada passava por ali, o pintor dava forma ao escudo do Sport Club Rio de Janeiro, vice-campeão do Carioca de 1919 (perdeu o título para o Palmeiras Atlético Clube). Uma pequena parte do muro ainda reserva lugar para outros emblemas, mas nem o limitado espaço que sobrou é capaz de esmaecer o desejo de seguir:

“Se algum maluco quiser ceder um muro, faço os escudos de São Paulo…”.

OBRIGADO, PROFESSOR!

por Cláudio Lovato Filho

Ruy Carlos Ostermann (São Leopoldo, 25/09/1934 – Porto Alegre, 27/06/2025)

Quando, nos anos 70, adolescente, descobri e, depois, fui gradativamente entendendo o que ele fazia, fiquei fascinado. Os textos de Ruy Carlos Ostermann. A escrita sobre futebol feita com sofisticada técnica literária e repleta de filosofia, uma mistura que viria a se tornar parte muito importante da minha vida. Não por acaso, a qualidade dos textos dele era exaltada por cronistas do peso de Armando Nogueira.

Mas Ruy Carlos Ostermann, o Professor, ícone da crônica esportiva gaúcha, mestre da escrita, também brilhou nos microfones. Seus comentários pós-jogo nas rádios Guaíba e Gaúcha até hoje ecoam na minha memória. Eram análises acuradas, contextualizadas, verbalizadas com um vocabulário rico e uma dicção tão clara e precisa que dava a impressão de vermos os itálicos e negritos que ele colocava na fala quando assim o desejava.

O Professor Ruy Carlos Ostermann nos deixou na noite desta sexta-feira, 27 de junho, aos 90 anos. Ainda na sexta, à tarde, peguei um livro dele, “A Paixão do Futebol”, e o coloquei ao lado de outro livro dele, “O Nome do Jogo”, numa daquelas rápidas arrumações, um daqueles pequenos ajustes de prateleira. Mas só mexi no livro dele. Eu estava no computador, trabalhando; bati o olho no livro, levantei, troquei o livro de lugar, e logo voltei a escrever. Gosto de pensar que talvez tenha sido um recado dele: “Vai escrever, rapaz. E reescrever. Até ficar bom de verdade”.

Um recado do Professor. Quem sabe? Sabe-se que era uma pessoa que dava atenção a todos. Por exemplo, o respeito verdadeiro à opinião dos leitores e ouvintes era uma conhecida característica do estilo dele – traço extraordinário e bonito num meio profissional (digo isto por experiência própria) em que isso é coisa difícil de encontrar, dificílima, rara.

Obrigado, Professor, por tudo. Obrigado por proporcionar tantas leituras e audições prazerosas. Obrigado por mostrar que o futebol pode e deve ser merecedor das melhores escrituras.

“Escrever sobre futebol é um ofício de respeito. Escrever bem sobre futebol é uma graça que não se recusa. O Ruy nunca pediu desculpa pelo ofício e pelo assunto. Nunca o vi ser condescendente nem com os piores momentos do futebol. E se alguma vez pareceu se desencantar com tudo e nos convidou para esquecer a partida e falar sobre Miles Davis ou um prato de peixe isso nunca durou muito tempo. O futebol sempre volta”. (Luís Fernando Veríssimo)

ENTRE GÊNIIOS E RÓTULOS

por Marcos Eduardo Neves

Lembra do Edmundo em 1997? Junior, 1992? Alex, 2003? Nenhum deles foi melhor do mundo. Vinicius Júnior já é. Que o atacante do Real Madrid é talentosíssimo, uma joia preciosa, não temos dúvida. Mas daí a ser melhor do mundo, bom, vamos conversar.

Vou falar de quatro jogadores. Vini – já falei e tornarei a falar –, Djalminha, Arda Güler e Alex. Bora começar?

Par ou ímpar – de cada lado, um de frente para o outro, Vini Jr. e Djalminha. Quem você escolhe? Sei que são posições diferentes, mas ambos estão com a mesma idade… sinceramente, você escolhe quem? Só quem viu os dois responde.

Djalminha nunca foi melhor do mundo. Mas foi e é maior do que Vini hoje. Porque é daquele seleto grupo de craques que puxam mais dez para subir a campo com ele, chama a responsa e resolve. Pisa o gramado, sua segunda ou primeira casa, plenamente consciente do que é.

Lembro de Maradona subindo, dez às costas, com seu Napoli. Zico levando Flamengos. Vou além: Neto em 1990; Bobô, 1988; Túlio, 1995, Fred, 2012; Carlitos Tevez, 2005 – incontáveis os que um dia foram assim. Tal qual os melhores do mundo: Messi, Cristiano Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Zidane, e por que não Weah, Kaká, Rivaldo, Mattaus, Figo.

Pensar que nossos talentos supremos de hoje são Vini Jr. e o ex-Neymar, se eu for recordar a dupla Romário e Ronaldo, Rô, Rô, Rô, só rindo. Nem cito Garrincha e Pelé. O papo é sobre humanos.

Alex nunca foi o melhor do mundo. Mas foi a a referência de Arda Güler, clássico meia que encanta no meio de campo de um time onde seu mestre, que lhe encheu os jogos na Turquia, nunca jogou. Espelho total. Plenamente consciente do que é. Longe de ser o melhor do mundo, mas subestimado. Por ser turco? Não acredito. Por ser jovem.

Vini ajudou o Real a se classificar em primeiro, fez um bom jogo na rodada classificatória, mas ainda está amadurecendo. Quando for o melhor do mundo, escuta, vai até zombar de quem o elegeu tão cedo.

PORQUE ZICO É O MELHOR JOGADOR BRASILEIRO NOS ÚLTIMOS 50 ANOS

por Luis Filipe Chateaubriand

Por acompanhar futebol há 47 anos, muitos me perguntam.

O ZICO jogava isso tudo?

Eu, como vascaíno que sou, sei muito bem.

O Zico jogava isso tudo… e mais um pouco!

Sendo vascaíno, sofria com ele.

Sendo admirador do bom futebol, ficava extasiado!

O cara pegava a bola no meio de campo, evoluía com ela, driblando ou não, vertical, até chegar próximo à área.

E, ali, servia o centroavante, para esse sair para o abraço…

No Flamengo, gente como Cláudio Adão, Nunes e Bebeto.

Na Seleção Brasileira, gente como Roberto Dinamite, Careca e Reinaldo.

O cara pegava a bola no meio de campo, evoluía com ela, driblando ou não, vertical, até chegar próximo à área.

E, ali, decidia seguir ele próprio com a “redonda”, para entrar com bola e tudo.

O cara pegava a bola no meio de campo e, dali mesmo, fazia lançamentos preciosos, de 50 metros, para quem viesse na corrida penetrar na área e fazer o gol.

Lançava, armava, concluía.

Como diria o saudoso jornalista Armando Nogueira, “arco e flecha”!

E, aí, ainda querem contestar?

Quem viu MESSI jogar, pode imaginar o que era ZICO jogando…

O ZICO é o maior jogador brasileiro dos últimos 50 anos!

Afirmo e reafirmo.

E, como diria o meu amigo Sergio Pugliese, estamos conversados.

A NOITE EM QUE VOAMOS

por Zé Roberto Padilha

Donos de um excelente preparo físico, que nos fazia competir pela liderança nas corridas de longa distância, lembro sempre de uma partida do Santa Cruz em que eu e nosso lateral-direito, Carlos Alberto Barbosa, ao entrar em campo resolvemos combinar algo inusitado.

Único. Tanto que nunca mais experimentei algo parecido e ainda tinha muita lenha para queimar. Algo assim como:

– Vamos aprontar esta noite a maior das correrias?

Deveria ser a noite em que os problemas ficaram em casa. Só a chuteira, macia, entrava em campo. E como uma luva. A noite anterior, com certeza, fora a melhor dormida. A alimentação? Deveria estar no equilíbrio perfeito para o corpo ser colocado à prova daquele jeito.

E, durante os 90 minutos, nós voamos por todos os cantos daquele impecável gramado do sagrado José do Rego Maciel. Não lembro quanto foi o jogo, só da saúde e disposição que ostentávamos para correr daquele jeito.

E foi inesquecível. Pobre coitado do lateral que me marcava e do ponta esquerda que ousava acompanhá-lo.

Lembro sempre dessa passagem quando percebo um torcedor xingando um jogador.

– Mas que porcaria! Não está jogando nada. Deve estar de sacanagem…

Será que não sabem, e o Luiz Roberto também, que dentro de uma camisa consagrada existe algo mais do que um atleta? Que, muitas vezes, não vai poder jogar tudo o que sabe para lhe fazer momentaneamente feliz.

E esse desempenho não é alcançado todos os jogos porque que ele, torcedor, mal sabe que o filho do seu camisa 10 estava com febre. A esposa, aflita, demorou a voltar da farmácia para lhe dar notícias.

A coxa ainda dói do tostão, e o contrato ainda não foi renovado. Tem muitas partidas em que as asas não abrem porque não são pássaros que entram em campo. São gente.

E elas muitas vezes não conseguem levantar voos para alcançar a glória passageira como se eterna fosse. Por mais que cresça a Inteligência artificial, haverá sempre um ser humano, com IPTU, IPVA para pagar, entrando em campo dentro de uma camisa de futebol.