por Zé Roberto Padilha

Sei que vocês, das novas gerações, ao ouvirem os surtos nostálgicos de quem testemunhou o passado, devem pensar: lá vem mais uma crônica saudosista. Um personagem que só vive do ontem. Pode ser. Ou não? Sou apenas saudoso, com a memória fixada nas grandes jogadas de Zico, nas canções de Gonzaguinha, nos intensos debates políticos de Ulisses Guimarães com Leonel Brizola. Enfim, em toda a arte que desapareceu, substituída pela mediocridade: no futebol, apenas correr; na música, pancadão; no Congresso, adesivar a boca por falta de argumentos.
No futebol brasileiro, já tivemos vários pensadores, românticos como Arrascaeta — aquele meio-campo de imensa categoria, que não corria, deslizava, sempre com a bola colada aos pés e uma solução criativa para cada jogada. Ademir da Guia, Afonsinho, Didi, Sócrates, Deley, Marco Aurélio, Geraldo, Nei Conceição, Mendonça… meu pai dizia que Zizinho também era assim. Ganso, Ricardinho e Pita também fazem parte dessa linhagem.
Cabeça erguida, jogavam com o freio de mão puxado e a lucidez acelerada. Davam canetas como quem molha plantas, faziam lançamentos precisos e invadiam a área com a sutileza de um amanhecer. Pensavam, logo existiam. Como a bola não pensa, precisavam pensar por ela.
O problema é que faziam tudo parecer tão fácil que, no dia seguinte, as escolinhas lotavam de aspirantes ao estrelato, achando que também poderiam repetir. “Pai, eu também quero jogar bola!”. Foi quando a bola, ferida pelas caneladas, reagiu: “Estudem! Logo existirão!”.
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