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DOS CAMPOS E QUADRAS PARA AS TELAS: COMO ANNA AZEVEDO RETRATA A MAGIA DO ESPORTE NO CINEMA

14 / julho / 2025

por Victoria Lapenda

A cineasta e jornalista Anna Azevedo é reconhecida internacionalmente por filmes que misturam memória, afeto e crítica social. Ela radiografa o universo esportivo, como espelho humano, em produções como o longa “Geral” (2010), exibido no festival Cinefoot deste ano; e a série “Sem Bloqueio”, que acompanha os bastidores da seleção brasileira feminina de vôlei rumo à Olimpíada de Paris 2024. 

Anna conta que o mergulho cinematográfico na geral, expressão da alma popular do nosso futebol, extravasou o desejo de preservar aquele simbólico espaço do Maracanã. “A histórica geral tinha uma movimentação muito teatral. Cada torcedor ali era um personagem. Como tinham decidido extinguir a geral, quis registrar esse anfiteatro, essa misancene esportiva que só existe aqui”, justifica a diretora, numa conversa durante o 15º, maior festival de cinema sobre futebol da América Latina.

Lançado em 2010, o documentário “Geral” é uma das obras de maior prestígio de Anna Azevedo. Expõe momentos derradeiros do folclórico setor no Maraca. O foco da produção, enfatiza a cineasta, era retratar os “geraldinos” – nome eternizado pelo cronista Washington Rodrigues (1936-2024) aos que ali torciam, de forma tão passional, espontânea, aglutinada.

A narrativa documental se inspirou no Canal 100, cinejornal criado em 1957 por Carlos Niemeyer, cujas imagens conjugavam cenas autênticas do campo e da torcida.  Exibido em festivais brasileiros e internacionais, “Geral” conquistou, por exemplo, o Prêmio Especial do Júri no Festival do Rio em 2010 e o prêmio de Melhor Curta no Festival Internacional de Documentários do Irã.

A produção constrói, curiosamente, um jogo que nunca existiu. Embora a montagem insinue um confronto entre Flamengo e Fluminense, o documentário mescla flagrantes dos últimos cinco jogos disputados antes do fim da geral. O espectador tem a impressão de acompanhar um Fla-Flu – no gramado e na galera.

Ao tabelar o cinema com futebol, Anna abraça a vontade – e a vocação – de iluminar a dimensão sociocultural do esporte no país reconhecido pela afinidade com as chuteiras. Uma dimensão que estampa a identidade cultural brasileira.

“O brasileiro se vê representado na paixão pelo futebol, como um povo capaz de vencer, de participar de grandes disputas, de chegar ao nível das grandes nações e ganhar. Um orgulho nacional. E a gente gosta disso, né? O brasileiro gosta de se mostrar bonito para o mundo. A consolidação da identidade nacional passa pelo esporte, como representação do povo”, opina a documentarista.

Desde a infância o mundo esportivo habita o coração e a cabeça de Anna. Antes de virar cineasta, a graduação em Jornalismo, na PUC-Rio, impulsionava o sonho de participar da cobertura esportiva. Sonho reforçado de novas cores com a ênfase em Cinema do mestrado em Comunicação, também pela PUC; e com a pós em Literatura Brasileira, na UFF. 

“Cursei Jornalismo porque queria trabalhar com esporte. Quando parti para o cinema, fiz filmes sobre esporte. ‘Berlin Ball’ ganhou o prêmio Berlin Today Awards. Depois, eu fiz ‘Geral’ e ‘Três do Tri’. Voltei a trabalhar com esporte, recentemente, com a série do Sportv chamada ‘Sem Bloqueio’, sobre a seleção brasileira de vôlei feminino”, recorda.

As gratificações que a comunicação esportiva lhe rende não dissimulam as dificuldades enfrentadas ao desbravar uma área historicamente dominada por padrões masculinos e machistas. Ela afirma que, “apesar de o jornalismo esportivo ainda ser fortemente marcado por desigualdades de gênero”, o avanço feminino é “inevitável”, e deve ser naturalizado:

“Quem não acha isso é normal vai ter que começar a achar, porque têm muitas mulheres fazendo cinema, fazendo jornalismo e trabalhando com esporte. Nos postos-chaves são outros quinhentos, né? Mas essa realidade está mudando. E é um caminho sem volta”.

Anna também destaca a importância da presença feminina nos estádios e demais ambientes esportivos, onde ainda incidem diversos tipos de preconceito:

“O esporte é um meio machista. Mesmo dentro do esporte feminino, observamos machismo de quem comanda e do torcedor. Só com muita educação, muita campanha (de conscientização) e muita punição, a gente vai conseguir mudar esse jogo e levar cada vez mais mulheres aos estádios”.

O alerta carrega a autoridade de quem acompanha o universo esportivo há 20 anos, como se vê em “Sem Bloqueio”. Dirigida por Anna Azevedo, a coprodução do Sportv com o Canal Azul revela treinos, viagens e jogos da seleção feminina brasileira de vôlei. Uma “experiência muito desafiadora”, orgulha-se. Em vários momentos, relata, foi necessário filmar com o celular: “a prioridade era registrar os bastidores, da forma que fosse possível”. Ela ressalta:

“Foi um aprendizado. Aprender a filmar aqueles corpos, sabe? Como filmar aquela equipe com todas as especificidades de uma equipe feminina. Tem uma delicadeza ali, né? A gente usou muita criatividade e muita cara de pau. Contamos também com a amizade da seleção e do técnico (José Roberto Guimarães), que abriu as portas para a gente. Foi uma mesmo uma escola”.

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