SAMPAOLI: O RESGATE DE SI, DA LEVEZA E ALEGRIA DO FUTEBOL SANTISTA
por Ivan Gomes
Estamos nos dias finais para encerrarmos o primeiro semestre de 2019. Nesse quase meio ano, quem torce para o Santos Futebol Clube pode acompanhar o renascer de um técnico que, com seu renascimento, resgatou a alegria e a leveza da prática do futebol no alvinegro praiano, algo que não víamos há alguns anos.
Um dos clubes mais vitoriosos e respeitados do futebol brasileiro e mundial precisou que um argentino, deixado quase no ostracismo após mau desempenho na Copa do Mundo de 2018 com sua seleção, resgatasse aquilo que todo santista sempre gostou: ousadia, gols e belas jogadas.
Desde as primeiras apresentações do time de Sampaoli notamos que poderíamos ter algo diferente. Muitos disseram, após alguns jogos, que ele não havia inventado a roda. Óbvio que não! Sampaoli fez somente o básico. Estudou, buscou se aprofundar na história do clube. E o que ele fez não é invenção, mas sim o resgate dos bons tempos, que todo torcedor sente falta. E esse jeito que gostamos de ver nosso Santos jogar, encaixa perfeitamente com o estilo de jogo que o argentino gosta de proporcionar ao torcedor/espectador.
Quem acompanhou o moribundo Santos de 2018 e vê o Santos em 2019 não acredita que o time é quase o mesmo, sem citar que perdeu dois atacantes considerados importantes: Gabriel e Bruno Henrique. A diferença de um ano para outro é abissal. O alvinegro praiano, se não me falha memória, estava na zona de rebaixamento na nona rodada do Brasileiro passado, este ano é vice-líder.
Com reposição de algumas peças e o trabalho no dia a dia, Sampaoli transformou aquele time que teve somente apresentações pífias com Jair Ventura e Cuca em um time que pratica um futebol leve, que ataca, que não se dá por satisfeito, mesmo quando o placar aponta vantagem considerável. Não tem esquema de atacar em casa e jogar fechado fora, é sempre o padrão de busca pelo gol, não há qualquer custo, mas com um jeito que foi muito difundido nos primeiros meses dele na Vila: amor pelo balón.
Outra obviedade é que não se consegue mudar tudo de hora para outra, a aposta no tempo é essencial. Críticos dirão que o Santos foi eliminado de quase tudo neste ano. Que a equipe sofreu algumas goleadas. Não negamos isso. Mas acreditamos que são percalços inerentes ao crescimento e mudança de estilo e padrão de jogo.
Talvez as sementes plantadas por Sampaoli este ano ainda não rendam frutos. Espero que a torcida não seja tão imediatista, assim como a diretoria, e deixem o argentino trabalhar e lhe deem condições para isso. O próximo ano pode ser melhor, um exemplo, apenas uma analogia, o Liverpool investiu no tempo quando contratou Klopp. O retorno começa a ser dado algumas temporadas e derrotas depois.
Claro que queremos ver nosso time campeão todo ano se possível, mas não é assim que “a banda toca”. Quem acompanhou o Santos ano passado pela TV, rádio, internet ou arquibancada, sabe o quanto foi sofrido. Este ano, ao menos, vemos um time com vontade, com ímpeto, que se impõe, que respeita a camisa e toda história feita pelos gigantes que um dia passaram e fizeram história na Vila Belmiro.
A Sampaoli fica o agradecimento por tudo que ele fez. Enquanto ele resgatou nosso futebol, nós o resgatamos como técnico. Que a partir de agora, o alvinegro não saia dessa trajetória, pois como bons santistas que somos, não nos basta apenas vencer, mas sim convencer, assim como foram nossos títulos à época do rei Pelé, assim como em 2002 com os Meninos da Vila.
DONA ALZIRA E SEUS DOIS AMORES
Não é só de ídolos que se vive o Museu da Pelada. O personagens por trás dos espetáculos, aliás, são os que mais gostamos e, por isso, ficamos muito honrados com o convite para conhecer a história de Alzira Mattos.
Filha do saudoso Aniceto Mattos, roupeiro do Flamengo por mais de 50 anos, e casada com José Alves de Carvalho, o homem que não deixava o Maraca sem luz, Alzira respira futebol e coleciona histórias de tirar o fôlego.
A equipe do Museu da Pelada foi recebida com muito carinho na casa do casal e ouviu histórias sensacionais sobre o verdadeiro Maracanã e o futebol raiz, além, é claro, de conhecer a coleção de camisas que deixaria qualquer colecionar de boca aberta!
NEM A DISTÂNCIA SEPARA
por Wendell Pivetta
Amor pelo clube do coração é algo inexplicável. Não existem fronteiras para dedicação do torcedor, ainda mais aquele que mora longe do estádio, que muitas vezes acaba falecendo e nunca teve a oportunidade de assistir o clube do coração na cancha futebolística. Algumas cidades ainda fazem excursões, porém o custo é alto, até porque os estádios ficam cada vez mais elitizados e não compreendem talvez que boa parte do público venha de longe.
No caso de hoje, conto a história da minha cidade, Tupanciretã, fixada no centro do Rio Grande do Sul, com a torcida Camisa Vermelha, que em média, 1 vez por mês marca presença no Beira Rio. Eliandro Amarante, criador do movimento, começou a divulgar e reunir pelos bares com transmissões dos jogos e via Whatsapp a ideia de ir para o estádio, ver pela primeira vez seu time de coração atuar no gramado que, ao vivo, era muito mais verdinho. A cidade costumava ir apenas uma vez ao ano para o estádio, e hoje a realidade já é outra, tendo em média um micro ônibus mensal, dobrando inclusive o quadro de sócio torcedor da cidade pelo Clube do Povo do Rio Grande do Sul.
A viagem tem o total de 800 quilômetros, cerca de 5 horas de viagem, para até então, ter participado de 13 jogos, nenhuma derrota e apenas um empate assistido que foi neste ano, diante do River Plate pela Libertadores da América (dados levantados antes da parada da Copa América). Famílias percorrem a longa estrada para vislumbrar o grande evento que é uma partida de futebol da capital, algo que não tem preço para os organizadores das excursões que passam semanas organizando e reunindo o dinheiro, contatando empresas com transporte, e garantido o ingresso de todos para dentro do jogo.
Nossa primeira partida que a excursão vislumbrou foi o jogo Internacional 2×1 Corinthians pelo Brasileirão de 2018. Lotaram uma van de 15 pessoas, um dos transportes mais difíceis para percorrer 5 horas de viagem, porém naquela data o nosso país enfrentava a greve dos caminhoneiros, e a falta de gasolina era algo que cada vez mais iria se tornando realidade entre os transportes. Quando chegamos e entramos no estádio, era possível ver o aglomerado de pessoas, e sem perceber o sangue ia fervendo, o coração mal parava de bater e isso tudo só de entrar estádio a dentro, então, quando você passa pelo corredor, o Beira Rio no setor inferior conta com escadas para você subir até a parte do gramado, e subindo pela primeira, e ainda até hoje, não existe colorado que não se arrepia todo ao ver a imensidão do estádio, da beleza fenomenal do interior e aquele sol que bate no gramado e o torna ainda mais verde. O torcedor se sente completamente em casa. Sem falar as histórias do pré jogo, como por exemplo ao passarmos por dentro da Porto Alegre vazia, visualizamos o ídolo e ex-zagueiro Índio andando a pé para o estádio, ou no clássico gre-NAL que ao estacionarmos nosso ônibus, começamos assar a carne do almoço e fazer uma cantoria, logo chega torcedores de outra cidade, Horizontina, para tocar com nós e em menos de 2 minutos o local encher de torcedores vislumbrando do mesmo momento mágico.
Encarar frio, chuva, falta de sono e preços absurdos ao totalizar passagem, ingressos e alimentação realmente é algo que prova a força das excursões do interior do estado para assistir aos espetáculos, e a Camisa Vermelha de Tupanciretã é uma ótima representante destes momentos que só o torcedor passa.
O POVO FOI BARRADO NO BAILE
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Abro o jornal e leio que Michel Platini, ex-presidente da UEFA, foi preso por suspeitas de corrupção envolvendo a Copa de 2022. Ele é um dos tantos investigados na operação que apura possíveis irregularidades na escolha do Catar como sede do próximo mundial. Joguei muito contra esse craque quando eu atuava no Olympique de Marselha e essa era a recordação que gostaria de guardar. Tenho uma foto de nós dois trocando camisas no final de uma dessas partidas.
Uma pena, mas alguém duvida que rolou muito dinheiro para a escolha do país sede? E é justamente essa ganância, clubes, federações e confederações infestados de empresários e dirigentes corruptos, que estão destruindo o futebol. Mas uma hora a conta chega, como chegou para Michel Platini, Sergio Cabral, José Maria Marin e outros da turma. Alô, foras da lei do futebol, a sua hora vai chegar!!!
Mas, por falar em país sede, como o Brasil conseguiu trazer essa Copa América, Copa das Confederações, sei lá como chamam isso, mesmo depois dos escândalos na Copa do Mundo e Olimpíadas? Que moral esse governo e esses dirigentes esportivos têm para ganhar alguma concorrência?
Como a arrecadação de uma partida horrível, como Brasil x Bolívia pode ter rendido quase R$ 23 milhões se nem cheio o estádio estava???? Como pode um ingresso ser vendido a R$ 500,00???? O futebol é do povo, esqueceram-se? Essa elitização será a pá de cal no futebol, podem anotar. Quem investiga isso??? Será que nenhuma autoridade brasileira, Ministério Público, Defesa do Consumidor, ninguém vai fazer nada? Continuaremos vendo a maior paixão nacional continuar na mão desses crápulas? Acabou a paixão!
Quem paga R$ 500,00 para assistir um jogo desses? Onde estão os torcedores que saíam se acotovelando dos trens da Central, que sofriam, choravam e se esgoelavam por seus ídolos??? Onde estão esses ídolos???
Phillipe Coutinho, meu preferido da seleção, tem o semblante triste. Os jogadores estão milionários, só querem dançar e fazer dancinha nas redes sociais, nenhum deles mora no Brasil e os que moram estão loucos para ir embora. Nenhum deles entende o significado de vestir a camisa da seleção brasileira. Preferem as Calvin Kleins e Lacostes da vida. Por que não montar uma seleção nacional com os jogadores com quem os torcedores mais convivem?
Dirigentes, entendam algo bem simples. Mesmo vencendo a Copa América ou qualquer outro torneio, essa turma do Tite nunca encantará, pois a empatia com a torcida é zero. O discurso do Tite causa arrepios, sua data de validade expirou. Lembrem-se: os que amam o futebol de verdade, desfraldavam bandeiras gigantes e socavam o bumbo com vontade eram os mais pobres e, sem dó nem piedade, eles foram barrados no baile. Mas futebol sem alma, podem ter certeza, não é futebol, mas é isso que está aí.
MARTA, A ARTILHARIA E A REPRESENTATIVIDADE
por Josie Rodrigues
Eu gosto de clichês, apesar de óbvios eles funcionam para traçar paralelos da vida, do cotidiano, daquilo que parece tão lógico que precisamos de expressões e frases para dar um certificado a alguns sentimentos. Um dos meus clichês favoritos é que o futebol é uma paixão. Mas não é qualquer paixão, é talvez a única capaz de durar a vida inteira, aquela que te dará um êxtase, uma pulsão a mais, um frescor. Tenhas tu oito ou oitenta anos.
Mas paixões nunca são fáceis. A minha por futebol não havia de ser diferente. Nasci e cresci em uma sociedade que apesar de ter no esporte bretão o mais popular do país, sempre renegou às mulheres o direito igualitário de se fazer presente. Idiotas da objetividade dirão que não, uma vez que até a expressão “torcer” tem como origem uma homenagem dos cronistas esportivos – do início do século XX – às nervosas moças que “torciam” luvas e roupas enquanto assistiam às partidas de futebol. Mas a verdade é que tirando os estereótipos de musa, torcedora ou a terrível expressão Maria Chuteira, o campo futebolístico nunca foi acessível para nós, mulheres.
A primeira Copa que guardo na memória foi a de 1994, estava empolgadíssima com Romário e Bebeto, decidi junto com uma amiga que iríamos começar a jogar futebol. O único problema é que nas aulas de educação física nos era oferecido apenas dois esportes: o inútil handebol e o odioso voleibol. Futebol só para os meninos. Não é esporte de mulher.
E de fato não era. Mulheres batendo uma bola era prática proibida através do Decreto-Lei 3199 de 1941 de Getulio Vargas, decreto esse que durou até 1979. Esse importante ano na história ludopédica, que além de liberar o futebol feminino, também conheceu o único campeão invicto brasileiro: O Glorioso Colorado de Porto Alegre, mas isso é assunto para outra crônica.
Mas voltando a minha infância, quando eu estava começando a me apaixonar por futebol, fazia apenas quinze anos que ele deixava de ser proibido para mulheres. Não havia escolinhas, nem quadras, nem tradição que permitisse uma menina jogar. Restou-me apenas a paixão por um clube e minha obsessão por participar de todas as formas possíveis. Seja criando times com as crianças da escola, batendo boca com os meninos para provar o que era impedimento, pesquisando, escrevendo, indo a estádios. Essa era a única forma de viver minha paixão.
Corta para 2019, ano de Copa Feminina. Parei para ver a seleção brasileira jogar. E pensei o quanto queria ter visto isso com dez anos de idade! Queria que minha geração pudesse ter a Marta como ídolo. Poder assistir e me identificar, sonhar em ser jogadora, ter um nome feminino nas costas de uma camisa. Aquilo que chamamos de representatividade e toda a força e identificação quando temos um exemplo que “parece com a gente”.
Chorei quando a Marta marcou seu 17º gol, ultrapassando Klose como a maior artilharia de todas as Copas. E eu só conseguia pensar em quantas forças tentaram impedi-la de estar lá. Quantas vezes ficou sem clube para jogar, quantas vezes pensou em desistir, em quantas meninas que, assim como a que fui, amam futebol, mas que nessa tarde de terça-feira viram uma mulher ganhando um jogo em Copa do Mundo, se tornando a maior artilheira de todas os tempos. Fica a certeza que ainda existe um árduo caminho pela frente para as mulheres e o futebol, mas por hoje Marta nos fez acreditar que tudo é possível.