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DE BRITO À MILAGRE

15 / março / 2019

por Marcos Vinicius Cabral


– Ouvi sempre coisas boas sobre meu avô, que jogou até os 64 anos! – diz Rodrigo Santos Brito, de 34 anos, ao Museu da Pelada.

Mas se o filho de seu Newton e de dona Ivana não se cansa de elogiar o octogenário e craque da família, foi por causa de suas atuações na ponta-direita do Veterano Futebol Clube nas manhãs de sábado no Campo do Bairro Rosane, que ele decidiu que era aquilo que queria fazer na vida: jogar futebol profissional.

Coisa que seu avô não conseguiu em sua época, mesmo tendo jogado com Gérson, o Canhotinha de Ouro, um pouco antes do tricampeão mundial se profissionalizar no Flamengo.

– Era difícil. Jogador era taxado como vagabundo. Ou casava ou jogava – lamenta seu Waldir dos Santos, casado há 58 anos com dona Nicinha.

Mas taxações à parte no mundo cruento da bola, o neto não se arrepende de ter desfrutado da constância de seu Waldir na sua vida.

– Peguei gosto por estar sempre com ele, que me levava para o campo e ficava batendo bola comigo! – diz Brito como passou a ser conhecido no mundo do futebol.


E arremata:

– Foi com meu avô Waldir que aprendi o beabá do futebol, como dominar, tocar, driblar, lançar e chutar uma bola. Deveria ter uns 5 anos de idade – diz.

Aprendeu tanto que em 1995, aos 10 anos de idade, já era destaque jogando no meio campo no time do Bairro Rosane Futebol Clube, e dois anos depois ingressava na escolinha Toque de Bola Futebol de Base, comandada por seu Ruterley ou Telê Ventura como é até hoje chamado.

– Brito era um jogador muito técnico, organizador de jogadas, aplicado, com uma leitura de jogo impressionante, além é claro, de bater faltas como poucos – gaba-se o ex-treinador de 69 anos.

Com tantas qualidades foi levado ao Club de Regatas do Vasco da Gama, onde treinou no campo anexo de terra batida de São Januário que fica atrás das arquibancadas e agradou.

O talentoso garoto que confirmaria o DNA da família Santos Brito viu a alegria no brilho dos olhos de seu Santos Brito, viu a alegria no brilho dos olhos de seu Waldir ao ser aprovado.

Brilho efêmero convenhamos, pois alguns meses depois, viu o mesmo olhar de reprovação do avô para os empresários que administravam as carreiras de vários garotos.

Preterido por ser do mirim e integrar a escolinha do clube vascaíno, Brito foi desligado.

Mas não desligou da vida o sonho de vestir a camisa de um clube de futebol.

Passou na peneira do Nova Iguaçu Futebol Clube, fundado em 1990 por Crizam César de Oliveira Filho, mais conhecido como Zinho, tetracampeão mundial em 1994 :


– Eu não tinha dinheiro de passagem para treinar. Nem almoçar eu conseguia por causa do horário. Abri mão! – queixa-se sobre os quase 57 km de distância entre sua casa em São Gonçalo e a sede do Carossel da Baixada.

No Bonsucesso Futebol Clube, onde Leônidas da Silva, o inventor da bicicleta, se profissionalizou em 1934, a história foi diferente:

– O clube estava sem recursos para disputar o Campeonato Carioca – lamenta sobre o rubro-anil.

Depois dessas experiências, a primeira tristeza: a escolinha onde dera seus primeiros chutes numa bola de futebol observado pelos olhos atentos do avô encerrava suas atividades.

Recomeçou então no rubro-negro mais famoso do bairro: o Flamenguinho da Brasilândia, time que revelou o meio campista Diogo Oliveira, hoje no Brasil de Pelotas.

Nesse período, estudava no primeiro ano do segundo grau no Colégio Estadual Padre Manuel da Nóbrega e jogava os interestaduais pela tradicional escola do bairro, sob a batuta do treinador Mekerra, que lapidou a joia no começo de carreira.

Com um futebol encantador conquistou Carlos Roberto – ex-jogador do Botafogo nos anos 1960 e atualmente treinador do Al Tai Sport Club da Arábia Saudita -, e Silvinho – que jogou no Fluminense -, que o levaram ao Madureira Futebol Clube.

No infantil do Tricolor Suburbano, jogou ao lado de Maicon (atualmente no Grêmio de Porto Alegre), Muriqui (ex-Vasco) e André Lima (hoje no Austin Bold FC dos EUA).


– O treinador me valorizava tanto que eu pedi para ser dispensado e me emprestaram. Queriam que eu fosse dispensado e me emprestaram. Queriam que eu voltasse, mas não quis mais – revela.

Poderia continuar mas os malditos contratos “de gaveta” (que viriam a ser proibidos pela CBF apenas em 2015) o desanimaram.

A vida continuou seu curso e Brito acabou indo parar no Centro Esportivo Arraial do Cabo mas foi no Angra dos Reis Esporte Clube que disputaria sua única Copa São Paulo como profissional em 2005.

Ainda jogaria profissionalmente na Associação Atlética Ranchariense e na Associação Esportiva Araçatuba, um pouco depois de vestir as camisas do América/RJ e o Canto do Rio de Niterói.

Enquanto buscava um lugar ao sol em equipes profissionais, nos campos de várzeas de São Gonçalo assinaria súmulas pelas equipes do Duro na Queda e Aranha (ambos do Coroado), Xeque-Mate de São Gonçalo, Jovem Fla do Boa Vista, Santos do Porto Velho, Renascença de Itaboraí, além de no F7, pelas equipes do Atlantic e Al Ain.

Ganhando títulos e jogando o fino da bola, surgiu a oportunidade de ir para Portugal.

Certo dia, tomando banho, sentiu uma forte dor na nuca e desmaiou.

Levado às pressas para o HEAT (Hospital Estadual Alberto Torres), no Colubandê, ficou em observação numa maca em um corredor lotado.

– Ouvi o médico dizendo ao enfermeiro pra ficar de olho no meu irmão, pois ele não estava bem – recorda o irmão Felipe.

Numa ala de isolamento, seu estado ia agravando e para visitá-lo era preciso colocar uma roupa específica.

A situação era grave, muito grave.

O craque que aprendera futebol com seu Waldir, agora lutava contra um adversário que queria a qualquer custo vencê-lo: a morte!

Brito então entra em coma induzido e o chefe da equipe médica responsável está pessimista.

– Se ele não reagir se preparem para o pior, mas se sobreviver, viverá numa cama para sempre – enfatiza após medicá-lo.

E completa:

– Mas tudo indica sua morte! – sentenciou.

– Nunca! Eu sei em quem tenho crido. O senhor vai ver o agir de Deus na vida do meu filho – diz o padrasto Rogério segurando uma bíblia e com lágrimas nos olhos.

Deus começa a operar na vida daquele rapaz cheio de sonhos e com uma vida inteira pela frente.

Depois de doze dias internado, Brito sai do coma, porém, uma inflamação no cérebro é diagnosticada.

Era necessário uma drenagem e uma cirurgia.

Após ser operado é transferido para o HEPJBC (Hospital Estadual Prefeito Jõao Batista Caffaro), em Manilha.

– Ele foi evoluindo mas um médico queria fazer traqueostomia nele e queriam que eu assinasse para liberar – conta dona Ivana, mãe do craque.

Nesse instante, Deus opera outro milagre.

– Ei, Ro! Lembra de mim? – sopra no seu ouvido a fisioterapeuta.

– Claro que sim, Lu! -, diz lembrando da colega de academia Smartfit, onde malhavam.

Aquela “anja” que atendia pelo nome de Luciana, faz alguns testes ali e diz que o jovem não precisa ser traqueostomizado.

Em seguida uma junta médica o examina e fica comprovado que não é necessário a cirurgia.

Alguns dias depois, a evolução começou a ocorrer com ganho de massa corporal e a tão sonhada alta.

Hoje, quem o vê cantarolar “Deus é Deus” de Delino Marçal, não entende o milagre ocorrido na vida deste jovem de 34 anos que se divide nos treinos em alto rendimento, em palestras motivacionais, trabalhos sociais e na Igreja Evangélica Assembleia de Deus, no Porto da Pedra, onde é Missionário.

Mas confessa:

– Duas das maiores alegrias que a bola me deu foi poder jogar ao lado do meu avô. Eu com 14 anos e ele com seus 64, em 1999 – lembra.

E finaliza:

– A outra foi marcar um gol de falta para ele um ano após ter vencido a meningite no qual fui acometido – diz sorrindo o camisa 30 do Boleiros FC.

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