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FLAMENGO, UM GRANDIOSO REI DO RIO

por Péris RIbeiro

Durante 102 anos – 1906 a 2008 -, o Fluminense dominou o futebol carioca. Tanto
que, até ali, eram 30 os títulos de campeão da cidade, do clube da rua Álvaro Chaves.
Porém, na temporada de 2008, eis que um determinado Flamengo consegue, depois
de décadas e décadas de intensa luta, igualar tudo. Agora, os números mostram 30
conquistas para cada um.

E é logo na temporada seguinte – 2009 -, que o clube da Gávea parte para superar o,
até então, imbatível tricolor das Laranjeiras, conquistando o 31º título de campeão.
Exatamente, 103 anos depois da primeira edição do tradicional Campeonato Carioca
de Futebol.

No ano de 2011, o que vemos é o time rubro-negro obter o 32º título, aumentando,
portanto, a diferença. Porém, o Fluminense é campeão de 2012, o que deixa o número
de conquistas em 32 a 31.

Nesse meio tempo, eis que ocorre um ponto fora da curva, pois o Flamengo
consegue engrenar nada menos de cinco títulos, entre 2014 e 2021 – incluindo-se aí, o
tricampeonato de 2019/20/21. O que faz com que as estatísticas mostrem, àquela
altura, seis conquistas a mais a seu favor: 37 a 31. Por sinal, a maior vantagem obtida
pelos rubro-negros na história da competição.

No entanto, um marcante bicampeonato tricolor, obtido nas temporadas de
2022/23, provoca, de repente, uma substancial mudança nessas estatísticas. Tão
somente, porque a diferença volta a cair, passando desta vez para 37 a 33.

Mas é uma irretocável campanha invicta, ocorrida logo no início de 2024, que vem
para solidificar de vez a vantagem do Flamengo. Um Flamengo que chega assim, ao seu
38º título de campeão carioca através dos tempos.

Um baque e tanto – como negar? -, para um já combalido Fluminense, que mantém-
se, portanto, com 33 conquistas. E uma afirmação em alto estilo para o Flamengo,
consagrado entusiasticamente como o grande Rei do Rio!


Campeonatos Cariocas

Flamengo – campeão 38 vezes
Fluminense – campeão 33 vezes
Vasco da Gama – campeão 24 vezes
Botafogo – campeão 21 vezes
America – campeão 7 vezes


Campeões Invictos

Flamengo – 7 vezes
Vasco da Gama – 6 vezes
Fluminense – 3 vezes
Botafogo – 1 vez
São Cristóvão – 1 vez

UM CORPO VENDIDO PARA SONHAR

por Zé Roberto Padilha

Aos 15 anos disseram que puxei o meu pai. E que iria ser jogador de futebol. De fato, me saia melhor no recreio com a bola nos pés, do que em sala de aula, encrencado com a soma dos catetos e com a tal da hipotenusa.

E embarquei para um período de testes nas Laranjeiras. Só que o Beto Bom de Bola, de Três Rios, encontrou bons de bola de todo o estado. A briga para ser titular da ponta esquerda era acirrada.

Inibido, tinha pesadelos com a ideia de desembarcar na nossa modesta rodoviária e perder o meu sonho de menino. Jogar futebol e no meu time de coração. O Fluminense. E estava disposto, como Fausto ao demônio Mefistófeles, a deixar levar meu corpo em troca de permanecer na casa tricolor e não ser eliminado no paredão.

Desde esse dia, entreguei meu corpo como cobaia aos professores da Escola de Educação Física do Exército. Parreira, Chirol, Cláudio Coutinho, Ismael Kurtz e Raul Carlesso precisavam de cobaias para seus experimentos.

Saía o futebol arte de 70 e veio à tona o futebol força da Alemanha, que ganhara a Copa de 74. E os Testes de Cooper, Interval e Circuit Training, treinamentos em regime full time, máquinas Apolo e Nautilus precisavam serem testados e aplicados. Jogadores de futebol, essa era a meta, precisavam se tornar atletas.

Eu estava ali me esforçando para ser um ponta moderno e poder ficar. E fui cobaia de todos eles.

Para ser fiel ao trato, subia a Estrada das Paineiras com tenis sem amortecedores, as arquibancadas do clube com saco de areia nas costas e treinava com coletes à prova de balas.

Consegui não apenas permanecer sete anos nas Laranjeiras, como em outros oito clubes em três estados da federação por mais dez anos. Fiz do futebol a minha profissão, porém, logo chegou a conta para o “Pulmão do Gerson”, “O motorzinho da Máquina Tricolor” pagar. Era frágil demais para suportar o tamanho da carga.

E aí lamentava as segundas-feiras que ia comer na casa da minha avó porque era dia de fígado lá em casa. Fez uma falta danado tal frescura.

Os meniscos foram se esfacelando, tornozelos sendo fraturados, hérnias rompidas, perônio e maxilar afundados. Quando o tempo esfria, meus ossos doem, quando esquenta, boto gelo nas articulações. E pior de tudo: fiquei dependente de uma dose diária de hormônio simpaticomimetico, vulgarmente conhecido como Adrenalina. E não consigo mais evitar a primeira pedalada ou braçada ao amanhecer.

Sendo assim, meu corpo, me perdoe por abusar dos seus limites e sacrificá-lo em prol dos meus sonhos. E que Mefistófeles me poupe. E não me carregue.

GOL HISTÓRICO

por Elso Venâncio

Sempre que via o famoso gol de falta de Petkovic na tevê, o polêmico cartola Eurico Miranda reagia:

“E o gol do Cocada? Por que não mostram?”

Na final do Carioca de 1988, Cocada entrou no lugar do ponta Vivinho com a missão de marcar Leonardo, que apoiava fortemente pela esquerda. Acácio havia realizado, pelo menos, três defesas espetaculares. De repente, Cocada recebeu de Bismarck em seu campo, correu pela direita lembrando o irmão Müller, puxou para a meia direita, driblou o zagueiro Edinho, que se desequilibrou, e bateu forte, enviesado, com a perna esquerda. Ele entrou aos 41 minutos, marcou aos 44 e foi expulso, por tirar a camisa na comemoração, aos 45 do segundo tempo. A bola entrou no ângulo direito do goleiro Zé Carlos, no gol à esquerda das cabines de TV e Rádio. Vitória por 1 a 0 sobre o Flamengo, com direito a gol histórico para selar o bicampeonato carioca do Vasco.

No ano anterior, 1987, outro que passou pela Gávea firmou seu nome com o uniforme cruzmaltino. Campeão mundial em 1981, Tita fez o gol do título, no mesmo clássico, após receber passe açucarado de Roberto Dinamite.

Cocada chegou a São Januário depois de passar pelo Americano e pelo futebol português. Seria o substituto natural de Paulo Roberto. Seu irmão Müller trocara o São Paulo pelo Torino, da Itália.

Houve dois jogos decisivos entre Vasco e Flamengo em 1988. No primeiro, Vasco 2 a 1, gols de Bismarck e Romário. No gol do baixinho, falha de Leandro, que atuava na zaga. Ele atrasou mal para Zé Carlos e Romário, rápido e sagaz, aproveitou o toque errado para se antecipar e dar um lençol no goleiro antes de marcar, de cabeça.

Na finalíssima, disputada numa quarta-feira, 22 de junho, o Vasco, com melhor campanha, jogava pelo empate. Os atletas do Flamengo já chegaram ao Maracanã sérios e cabisbaixos. Na escalação, o motivo do clima de velório. O técnico Carlinhos ‘Violino’ barrou o ídolo Leandro. O jovem Aldair, aos 22 anos, assumia a posição. Fez tanto sucesso que, no ano seguinte, já estava no Benfica, que o revenderia à Roma, da Itália, onde se tornou titular e capitão por mais de uma década.

Sebastião Lazaroni, técnico que comandaria a seleção brasileira, dois anos depois, na Copa da Itália, escalou seu Vasco àquele dia com Acácio, Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Zé do Carmo, Geovani e Henrique; Vivinho (Cocada), Bismarck e Romário.

No finalzinho da partida, Renato Gaúcho não aceitou as provocações de Romário e deu um tapa no artilheiro do campeonato. Briga generalizada em campo! Paulo César Gusmão, goleiro reserva de Acácio, deu uma voadora – que lembrou os tempos do Telecatch – em Alcindo, levando-o a nocaute.

A festa da vitória ocorreu numa boate em Copacabana. Nessa época, imprensa e jogadores conviviam de perto com os craques. O compositor vascaíno Erasmo Carlos pegou o microfone e puxou com força o sonoro grito de guerra ‘Casaca’.

NOS PERDOE, JOÃO PEREIRA LOPES, ODAIR GAMA, REMO RIGHI

por Zé Roberto Padilha

Seria fácil jogar apenas na conta da atual gestão a culpa pela devastação total do gramado (foto) de um dos clubes de futebol mais importantes do estado: o Entrerriense FC.

Não foram apenas eles, os gestores da vez, que construíram piscinas em casa. E deixaram de frequentá-lo e ainda levaram familiares e amigos para um mergulho cada vez menos social.

Muito menos os que afastaram os sócios que deixaram de comparecer às serestas. E deixarem no caixa do bar a garantia do pagamento das suas heroínas Heloisa e Vitória. Fora o 13* do Zé sem a qual o mato o cobriria.

Muito menos, foram eles que deram Playstation para seus filhos e os deixaram no quarto exercendo sua iniciação ao sedentarismo no lugar de os matricularem nas escolinhas de futebol.

O Entrerriense FC desabou debaixo do nosso teto é não conseguimos mantê-lo opulento e forte, disputando campeonatos e dando oportunidades de tantos garotos alcançarem seus sonhos, como nos deram um dia para alcançar os nossos.

Todos falhamos. E quando mais um Parque de Diversões parte, ele não deixa apenas crateras em um gramado em que nossos heróis Quarentinhas, Marianos e Traíras desfilaram sua arte. Escreveram, com uma bola de futebol nos pés e uma paixão no coração nas arquibancadas, parte da nossa preciosa história esportiva.

Ele deixa crateras em nossa porção cidadã, trirriense, pessoas de boa índole, trabalhadoras, honestas e, infelizmente, incapazes de honrar o patrimônio e a memória daqueles que tanto lutaram para erguê-lo.

Nunca será tarde para reerguê-lo. Desde que aceitemos que todos nós poderíamos ter feito um pouco mais por ele.

A PARTIDA PERFEITA

por Zé Roberto Padilha

O Estádio Rei Pelé, em Maceió, é um daqueles templos sagrados do futebol brasileiro que foram inaugurados durante o “Milagre econômico ” da década de 70. Quando você está jogando por lá a laje fecha sobre você e te engole, como no Mineirão, canalizando o eco da torcida para perto de onde você vai bater o corner. Como no Serra Dourada, no antigo Olímpico e no Maracanã.

De lá, bem longe, entre Bahia e Pernambuco, numa quarta-feira à noite, durante o Campeonato Brasileiro de 1978, jogando pelo Santa Cruz, contra o CRB, guardo uma das mais marcantes lembranças e lições da minha carreira como atleta profissional de futebol.

Em 17 anos com carteira assinada, foi ali que exibi talvez a única atuação perfeita com a bola nos pés. Qual desportista, ator, médico ou engenheiro não se lembra do dia em que acertou tudo durante a prática do seu ofício?

Naquela noite iluminada, em que Júpiter deve ter se entendido com Netuno, as cartas e os Búzios conspiraram a meu favor, devo ter errado apenas dois das centenas de passes que realizamos em média durante as partidas. Jogadas de linha de fundo? Em três das seis tentativas deixei o lateral para trás e acertei o cruzamento na cabeça do Nunes. No outro, para um voleio do Betinho e, pra fechar o placar de 3×0, um cruzamento certeiro para um peixinho fatal de Luiz Fumanchú.

Durante essa abençoada partida não corria. Voava. E enquanto saboreava minha própria atuação, pensava: mas por que justo ali, longe da grande mídia, tendo como testemunha apenas a Rádio Clube de Pernambuco e da Gazeta de Alagoas? Por que não no Maracanã em um daqueles Fla x Flu que joguei?

Se tivesse iluminado daquele jeito defendendo camisas pesadas, de empregos anteriores, certamente seria convocado para a seleção. Como aprendi a não discutir com o destino, e ele quis que fosse ali meu dia de Rivelino, que tal tentar uma bomba de fora da área?

Juro, arrisquei e a bola passou raspando a trave.

É impressionante o que pode alcançar a mente, jogava e pensava, uma vez desobstruída das limitações cotidianas que nós mesmos nos impomos.

Terminada a partida, parti para o vestiário como um atleta olímpico que alcançara um recorde e se preparava para subir ao pódio. Passei pelo meu treinador, Evaristo Macedo, que disse:

– Valeu, garoto!

Mas como valeu se eu nunca havia atuado antes daquele jeito?

E fui encontrando pelo caminho repórter alagoano, narrador pernambucano, jogadores adversários e me trataram como quem tivesse jogado uma partida qualquer.

Mal sabiam que havia treinado muito, evitado noitadas, cigarros e bebidas alcoólicas para um dia atingir a perfeição. E quando chego próximo dela, ninguém foi capaz de reconhecer. E se o meu máximo não causou a mínima atenção, entrei no vestiário bem arrasado.

Não tinha medalha, pódio, hino nacional, um abraço apertado e, muito menos, um Motorádio me aguardando. E quando me dirigi a balança na qual seu Amauri, um simpático funcionário do Santa Cruz, nos pesava, antes e depois das partidas, após conferir o que tinha perdido, ele me confidenciou baixinho:

– Que atuação, hein, Zé Roberto. Hoje, você foi perfeito!

Que alívio senti naquele instante. Não fiquei prosa ou mascarado, apenas feliz. E aliviado. Afinal, de que valeria a busca pela perfeição, em qualquer profissão, se quando a alcançamos, nem que seja por apenas 90 minutos, ninguém for capaz de perceber seu esforço e obstinação?

Depois dessa partida, até 1985, quando encerrei minha carreira no Bonsucesso, continuei a ser o Zé Roberto de sempre. Aplicado e determinado, nunca mais o Zico, um Rivelino, um Gerson, mestres que me concederam aulas com chuteiras ao meu lado.

Mas foi com seu Amauri que aprendi uma nova lição. E adotei um novo hábito.

Sempre que assisto de perto uma performance acima da média, e que me encante, faço questão de esperar o final da partida, da peça de teatro, do show do rapaz que fez o papel de Michael Jackson no Vivo Rio para lhe dar um abraço.

Só eu sei o que foi preciso para conseguir ser um dia perfeito no que fazia. E jamais me esqueci como a indiferença e o descaso são capazes de nos abater minutos depois de tal conquista.