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O VALOR DE UMA COPA

9 / julho / 2018

por Gabriel Galo e Heraldo Iunes


Enche o meu saco essa história que “o país está uma merda, a economia fodida, tem ladrão pra todo lado e você preocupado com futebol”. É como se o futebol fosse SÓ para alienados. 

Os céticos dão seus ultimatos sectários, não notando que há no futebol uma saudável anormalidade que comove, sensibiliza e une às pessoas. E em campo estava a seleção brasileira, ainda que tal tenha menos importância que o Fluminense. 

Quando comecei a curtir a Copa do Mundo, que entrei na onda do verde e amarelo, o Brasil foi “despachado” pela Bélgica. Sexta foi fim de festa. 

Fui momentaneamente tragado por uma inércia paralítica provocada pela frustração, pela decepção e pela adaga afiada da realidade. Não deu e, agora, resta-me esperar mais quatro anos.

Torcer é o auto-engano disfarçado de esperança. Pode estar difícil, mas nada é impossível. 

Confesso que torci. E muito. Só que, no escanteio para a área, relógio ainda em aquecimento, o gol contra do para-sempre-amaldiçoado Fernandinho tirou o meu sossego. E na reprise do contra-ataque de almanaque anteriormente orquestrado contra o Japão, gritei para que marcassem o cara que vinha pela direita. Não fui ouvido e o tirambaço de De Bruyne levou-me a esperança. 

No apito final, o empate não veio e o sonho do hexa na Rússia estava morto. 

Uma Copa do Mundo vai muito além do resultado, é mais do que futebol. 


As pessoas se reúnem em torno de simbologias únicas. A questão não é ganhar, é viver a Copa. Ainda somos o país do futebol. Os melhores. Penta. Então, bastam os amigos para uma grande confraternização. “Vai ser na casa de quem?”… até às mulheres, que normalmente não são chegadas, se transformam em torcedoras loucas e fanáticas. A Copa do Mundo junta bons sentimentos e, por instantes, protege-nos das mazelas. Depois a gente vê se “o país está uma merda, a economia fodida, tem ladrão pra todo lado”.

E aí, aproveitamos o máximo o que ela representa. Jogo, ponto facultativo, alegria, união, cerveja, churrasquinho, ressaca. Bom demais.

A Copa do Mundo tem este peculiaridade: é de quatro em quatro anos e a gente nunca sabe ao certo quanto tempo a festa vai durar. Na sexta, a festa chegou ao fim. Decepção e tristeza. 

Lidamos com a perda de diversas maneiras. Observo nos meus Amigos as diferentes reações. Uns quietos, administrando a frustração. Outros blasfemando: dizem não ligar para o resultado, que a seleção não joga nada, enforcam Neymar e cia. Não só pelo álcool, mas estão todos emocionados. 

Aprendemos a nos defender das agruras da vida como podemos. Abster-se de emoções que nos apaixonam não é coisa boa, tanto pelo contrário. Na esteira da derrota consumada para a Bélgica, não teremos mais o feriado prolongado da terça-feira, os encontros obrigatórios com os amigos, todos vestidos de verde e amarelo, o ufanismo das transmissões passando por cada canto do Brasil, mostrando que podemos, sim, ser um. 


A rua vai voltar ao normal, as decorações serão guardadas – como acontece em aniversários, no São João, no Natal, no Ano Novo, em qualquer época de celebração.

Assimilo, com viés de desolação, que a dor maior não é da derrota em si, porque perder faz parte do esporte. Não houve humilhação, tal qual 2014. Sem muletas que nos escore, a dor vem do fato de que a realidade, mesmo deixada de lado, retorna. O fim de festa sempre vem. O que não nos impede de admitir que queríamos a fuga por mais um tempo, porque o prazer é libertador.

O que será então da próxima terça-feira, senão mais um dia comum na vida de todos nós? Algo insossa, sem surpresa, sem inesperado, sem magia? Ora, de terças-feiras ordinárias estamos fartos! E chego a ter pena de quem proclama ao vento que se recusa a viver intensamente a delícia que é este tal do futebol.

Pois, sim, concluo que o sonho do hexa, por hoje, “tem, mas acabou”. Amanhã volta. Só que esse amanhã dura longos quatro anos. Foi, digamos, apenas adiado, empurrado com a barriga. Vai ser guardado no porão da memória, cabendo a nós resgatá-lo, limpá-lo e exibi-lo como nosso. Em 2022, no Catar, estaremos quatro anos mais velhos, porém, da mesma forma, contagiados pelo clima de Copa, torcendo pelo Brasil, cantando o hino à capela, reunindo a galera, vestidos de verde e amarelo, rindo, chorando, cornetando e esperando que a festa dure por mais tempo. 

Ao menos até a final.

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